Estou em Fortaleza neste momento, participando da Conferência sobre Relações Exteriores (CORE), realizada pela Fundação Alexandre de Gusmão (Funag-MRE) em cooperação com a Unifor.
Devo coordenar os debates da mesa 6, esta tarde, a última, que vai ocupar-se de um projeto de pesquisa e de elaboração de textos sobre o tema acima, ou seja, o pensamento brasileiro em política internacional, que parte justamente da hipótese de que existe um pensamento brasileiro nessa área.
Sem entrar aqui em controvérsias conceituais ou práticas, transcrevo abaixo o documento de planejamento, mas aberto a sugestões e críticas, sobre como poderia desenvolver-se um projeto acadêmico-funcional nessa área.
Pensamento Brasileiro em Política
Internacional
Proposta preliminar para
um projeto de trabalho: primeira parte
Texto preparado
para servir de base para discussão na
Mesa 6:
Caminhos da Cooperação Academia-Diplomacia
na Conferência sobre Relações Exteriores (CORE);
Fortaleza, 30
de Novembro de 2012, 14:00-16:30hs.
Moderador:
Ministro Paulo Roberto de Almeida;
Debatedores: Embaixador José Vicente Pimentel;
Embaixador João Clemente Baena Soares.
O presente texto,
que está sendo distribuído previamente à sua apresentação
e discussão em Fortaleza (em 30/11/2012), pretende servir de base
para os debates que ocorrerão na mesa supracitada. Ele foi concebido como constituindo
a primeira parte de um projeto de trabalho coletivo
sobre a formação e o desenvolvimento das grandes linhas da diplomacia
brasileira, nos planos conceitual e operacional. Nesta primeira etapa, o
projeto tratará dos grandes formuladores e protagonistas principais da política
internacional do Brasil desde a era constitutiva da diplomacia nacional até a
passagem dos anos 1960, ao final da República de 1946, quando ocorre uma
ruptura na história política brasileira. Uma segunda parte, a ser objeto de
novo projeto de trabalho, mas seguindo basicamente as mesmas linhas
metodológicas e editoriais, tem a pretensão de cobrir o pensamento brasileiro
em política internacional na era contemporânea, ou seja, o período de meio
século que se estende a partir do início dos anos 1960.
A responsabilidade operacional pelo desenvolvimento deste projeto de
trabalho, relativamente ambicioso nos anais da cooperação interinstitucional
entre a diplomacia profissional e entidades acadêmicas voltadas para a pesquisa
e a produção de qualidade em temas de relações internacionais do Brasil, é
assumida pela Fundação Alexandre de Gusmão, do Ministério das Relações
Exteriores, mas sua concepção e encaminhamento prático se farão sob a égide de
um conselho independente, formado por diplomatas e acadêmicos, sob a direção do
presidente da Funag, Embaixador José Vicente Pimentel, que estabelecerá as
regras de procedimento e os métodos de trabalho válidos para o conselho e para
o projeto em seu conjunto.
Espera-se, que na sessão dedicada a este tema, no encontro de
Fortaleza, de caráter puramente exploratório e destinada a recolher subsídios e
sugestões para a implementação prática do projeto em apreço, a discussão possa
ser ordenada em função das seguintes questões, cujas diretrizes são aqui
oferecidas a título indicativo:
Esquema deste documento e sugestões tópicas para
possível debate sistemático:
Objeto
Metodologia
Implementação
Desenvolvimento
Cronológico
Objetivo
Final
Responsabilidades
Possível
esquema de trabalho coletivo e publicação
Objeto
O objeto deste texto,
no momento uma mera proposta preliminar de trabalho, é a realização de um
projeto de pesquisas e de elaboração de textos acadêmicos em torno da temática
coberta pelo seu título, doravante referido simplesmente como PBPI. O termo
cobre, grosso modo, aspectos essenciais da formulação e da execução da política
internacional do Brasil, o que compreende não apenas as suas relações exteriores
(conduzidas pelo Executivo e pelo seu instrumento diplomático, o MRE), mas
também concepções sobre as relações internacionais do Brasil, tanto pelo lado
do pensamento de intelectuais e de diplomatas (tal como refletido em seus escritos),
como também pelo lado daqueles executores que deixaram registro de alguma
formulação sistemática em torno do que deveria, ou do que poderia, ser, idealmente,
a política internacional do Brasil (implementada ou não pelo Executivo).
A Política
Internacional do Brasil não se confunde com sua política externa, de caráter
mais executivo, mas tampouco cobre o vasto campo das Relações Internacionais do
país, que compreende não apenas o conjunto de interações mantidas pelos
diferentes agentes nacionais (inclusive privados) com a comunidade
internacional, mas também, na sua extensão acadêmica, a produção relevante, por
parte de autores brasileiros, de trabalhos e análises de política externa (ou
de relações exteriores), bem como de história diplomática (eventualmente feita,
também, por diplomatas com vocação acadêmica). Embora mais raros, começam a
despontar textos de relações internacionais, verdadeiramente conceituais,
feitos no Brasil, mas este não será o enfoque privilegiado por este projeto.
Optamos aqui pelo termo PI por ser, justamente, indicativo do que se pretende
como objeto próprio do projeto, e por ser suficientemente abrangente para
abrigar concepções, propostas e formulações de políticas, que foram e são os
campos de trabalho dos pensadores e dos operadores brasileiros dessa área.
O período coberto
pelo presente projeto é o do Brasil independente, desde a fase constitutiva da
diplomacia nacional, ainda marcada pela herança portuguesa, mas já voltada para
as questões regionais e de afirmação do Estado, até o período contemporâneo,
este objeto de um segundo a projeto a ser ainda desenvolvido. A maior parte das
contribuições acadêmicas tratando das relações internacionais do Brasil tende a
se concentrar no período pós-Segunda Guerra Mundial, mas o presente projeto,
nesta fase, cobrirá apenas o período imediatamente anterior à ruptura política
de 1964, deixando para um segundo projeto o tratamento do pensamento brasileiro
em política internacional na era contemporânea.
Pela sua
natureza, de exercício de cooperação entre a diplomacia profissional e entidades
acadêmicas, o projeto pretende suscitar o interesse e mobilizar os esforços e as
atenções das instituições que poderão nele se inserir, por meio de
participantes já engajados nesse tipo de pesquisa, ou de colaboradores independentes
que possam ser selecionados para o trabalho de elaboração de textos. O projeto,
no plano prático, se desenvolverá, idealmente, em duas fases, constantes,
primeiro, da organização e realização de um seminário fechado, de caráter
acadêmico-profissional, voltado para os fundamentos conceituais e as derivações
operacionais do PBPI, com discussão e análise crítica dos textos preparados,
seguido de uma conferência aberta na qual serão apresentados os resultados do
projeto, etapa final prévia à publicação dos textos redigidos em seu formato
definitivo.
O “pensamento”
brasileiro de que trata o presente projeto é aquele expresso pela voz,
escritos, memórias e registros de formuladores conceituais da política
internacional do Brasil, bem como pela ação de executores que marcaram época
pelo papel renovador e definidor dessa política durante suas respectivas gestões
ou participação na formulação e execução da política externa brasileira. Em
outros termos, a análise do PBPI seria feita pela via de seus propositores
individuais e de alguns operadores da política externa brasileira, numa
perspectiva relativamente linear, isto é, cronologicamente alinhada e vertical.
A exposição e
análise dos fundamentos conceituais da diplomacia brasileira seria feita,
portanto, pelo exame dos escritos dos que influenciaram a política externa
brasileira, desde a independência, representativos, nesse sentido, do PBPI:
estadistas, diplomatas (profissionais ou não), políticos que atuaram na
política externa, militares que abordaram aspectos políticos de estratégia e de
segurança, e vários acadêmicos (universitários ou intelectuais autônomos) que
possam ter influenciado o PBPI.
Metodologia
Após uma definição
inicial, e ideal, dos objetivos do presente projeto, se pensa partir para uma
seleção criteriosa dos objetos próprios que devem integrar o projeto, nesta primeira fase, ou seja, dos “representantes”
do PBPI; em função dessa seleção serão escolhidos, em seguida, colaboradores
possíveis, convidados a escrever textos-síntese – sob estrita direção editorial
dos organizadores, que lhes ditarão os termos de referência – sobre os
personagens selecionados; se procederá igualmente a uma escolha adicional quanto
a possíveis debatedores ou comentaristas dos textos, que serão apresentados no
seminário fechado. Tal seminário fechado poderá, se necessário, ser realizado em
duas etapas: uma de apresentação preliminar e de debate inicial; uma segunda
etapa dedicada ao exame dos trabalhos revistos. Eventualmente, cada expositor poderia
se beneficiar da leitura crítica de pelo menos dois debatedores, talvez de
perspectivas metodológicas diversas, para comentar e oferecer contrapontos e
sugestões aos textos.
Implementação
Após a elaboração
de um documento-guia e de planejamento de trabalho, que deverá orientar e
dirigir todo o processo, serão expedidos convites para participação no projeto,
com prazos para redação e ulterior apresentação dos trabalhos designados num seminário
fechado de exame e discussão do PBPI. O debate em torno dos trabalhos apresentados
deverá ser pautado pelo rigor acadêmico e, tanto quanto possível, desprovido de
vieses políticos. Um segundo seminário, já com os textos revistos, será aberto
ao público externo, sob a forma de nova conferência nacional.
Como base nesse
documento de planejamento serão previstos os meios e adotados os procedimentos
para a convocação de autores-colaboradores, o convite a
debatedores-comentaristas, e dada a partida à realização dos seminários. O
objetivo último, se o projeto e o processo forem exitosos, seria a publicação
de um volume de referência, organizado e editado pela Funag, sob a direção de
seu presidente.
Desenvolvimento
Cronológico
Novembro e
dezembro de 2012: Etapa preparatória, por meio de consultas, questionamentos,
conversas informais, subsídios e exame das alternativas possíveis quanto à escolha
dos “personagens” do PBRI; fixação de um esquema preliminar, possivelmente com
base no que vem oferecido in fine a
este documento.
Janeiro de 2013:
Fixação do documento de trabalho, ou de planejamento, com o orçamento
pertinente e o cronograma (quase definitivo) da implementação do projeto e do
processo, e expedição dos convites aos colaboradores principais; essa etapa
implica uma definição precisa quanto aos termos de referência, bem como das diretrizes
de trabalho pelas quais deverão se pautar os autores convidados.
Julho de 2013:
realização do primeiro seminário, fechado, para apresentação da primeira versão
dos trabalhos e discussão obrigatória da coerência metodológica, adequação
intrínseca dos trabalho às diretrizes propostas pelo diretor do projeto.
Agosto-setembro
de 2013: revisão dos trabalhos pelos autores e novo envio aos comentários e
debatedores do primeiro seminário, eventualmente também a consultores externos
e outros especialistas do assunto; eventualmente se poderá efetuar novo
seminário fechado para discussão final.
Novembro-dezembro
de 2013: Apresentação dos trabalhos em evento aberto ao público; definição da estrutura
final de possível publicação.
Janeiro-março de
2014: revisão, edição, editoração de livro, se tal resultar factível, em função
da implementação do projeto.
Objetivo
Final
Idealmente, um
livro de referência na área, a ser editado exclusivamente pela Funag, ou em regime
de coedição com editora comercial. Registre-se que, na presente concepção do
projeto, não se trata, especificamente, de uma história da diplomacia
brasileira, que poderia ser objeto de um outro projeto, ou de um outro livro,
de caráter institucional, ou seja, sobre como o Itamaraty conduziu a diplomacia
brasileira. O presente projeto trata do pensamento, ou seja, as elaborações
conceituais que fundamentaram a diplomacia brasileira ao longo do tempo, não
exclusivamente restritas ao ambiente profissional diplomático.
Responsabilidades
Todo o projeto e
o seu processo de implementação, tanto do ponto de vista executivo, quanto
operacional, estarão sob a responsabilidade exclusiva do presidente da Funag. Ele
constituirá dois grupos de trabalho: um conselho, de tipo organizador,
encarregado das grandes definições substantivas do ponto de vista intelectual;
um outro, executivo, que tratará da implementação prática do projeto. O
orçamento do projeto estará a cargo da Funag.
[Segue possível esquema, exemplificativo, da primeira
parte da publicação planejada]
Evolução do Pensamento
Brasileiro em Política Internacional:
a contribuição dos principais formuladores e dos
grandes atores (primeira parte)
00. Apresentação geral do Projeto
(Embaixador José Vicente Pimentel – Pres. Funag)
01. Introdução metodológica e de
conteúdo (Paulo Roberto de Almeida)
Parte I
– Concepções iniciais do pensamento diplomático
02. José Bonifácio e a inserção do
Brasil no mundo na era das independências ibéricas
03. Paulino Soares de Souza e a
construção do instrumento diplomático
04. Duarte da Ponte Ribeiro e a
concepção geográfica do território nacional
Parte
II – Consolidação de uma diplomacia nacional
05. O Visconde do Rio Branco e a defesa
da soberania do Império
06. Joaquim Nabuco e a consciência
do atraso nacional
07. O Barão do Rio Branco e a
fixação das fronteiras da pátria
08. Ruy Barbosa e a igualdade
soberana das nações
09. Manoel de Oliveira Lima e a reforma
da diplomacia brasileira
Parte
III – A política internacional da Velha República
10. Euclides da Cunha e os
desafios do Brasil na América do Sul
11. O episódio da Liga das Nações
e seus atores políticos e diplomáticos
12. Pandiá Calógeras e a primeira
síntese da história diplomática
13. Octávio Mangabeira e a reforma
do instrumento diplomático
Parte
IV – A reforma do Estado e a modernização da diplomacia
14. Oswaldo Aranha e a busca de
uma relação especial com os Estados Unidos
15. Presentes na criação:
diplomatas e estadistas na construção da ordem internacional
16. As bases da política externa
independente: o IBRI, a RBPI e os desalinhamentos
17. Afonso Arinos e San Tiago
Dantas: mudanças numa fase de transição
Apêndices:
18. Cronologia da diplomacia brasileira,
1808-1964
19. Ministros das relações exteriores no
período
20. Fontes primárias e documentos
fundacionais da diplomacia brasileira
21. Bibliografia geral sobre as relações
internacionais do Brasil
Esquema preliminar
[PRA]:
23 de Novembro
de 2012
NÂO TENHO A MENOR SIMPATIA , PELAS ATUAIS RELAÇÕES EXTERIORES DO BRASIL ,( PT ) SAUDADES DO TEMPO DO MINISTRO AZEREDO DA SILVEIRA ....O BRASIL APOIAR O " ESTADO " PALESTINO NA ONU , FOI UMA VERGONHA MUNDIAL ...SE EU PUDESSE EU DEIXARIA O BRASIL .VENDERIA A MINHA CHACARA E IRIA MORAR NO TEXAS ( USA ) ....malachha-mavet@hotmail.com
ResponderExcluirDoutor,
ResponderExcluirSerei breve, conscisa e sem erudição.Tive a oportunidade de conhecê-lo, na CORE, na UNIFOR. Impressionou-me no evento a distinção clarividente entre dois "Brasis". Especialmente, a "pulverização" da língua materna.Cumprimento-o pelos conhecimentos, que são inacessíveis para a maioria. Bem lembrada a reflexão de Karl Popper, para todos que participaram do evento.Sucesso em sua tão referenciada viagem.