O comércio
do Brasil acorrentado
SUELY
CALDAS
O Estado de S.Paulo, 24/03/2013
Não foi só o truque de deixar para janeiro o
lançamento de importações de petróleo feitas em 2012 o único causador do enorme
déficit de US$ 5.5 bilhões da balança comercial registrado até agora. O governo
parece não se dar conta, mas o fato é que as exportações têm caído fortemente
em quantidade, sinalizando tratar-se de um problema estrutural, a exigir
tratamento também estrutural para tentar virar o jogo do nosso comércio com o
mundo.
A Fundação Centro de Estudos do Comércio
Exterior (Funcex) constatou que em fevereiro a quantidade de produtos
exportados caiu 13,2% em relação a fevereiro de 2012. E uma queda expressiva
que precisa ser levada a sério, não menosprezada. Por mais que o ministro Guido
Mantega insista na ladainha de culpar a crise internacional, a verdade é que o Brasil
vem perdendo mercados em países onde a crise passa ao largo e que em 2012
registraram crescimento muito acima do nosso pibinho de 0,9%.
Em política comercial, o Brasil tem seguido
na contramão do mundo. Isola- se, em vez de se integrar. E quando sai do
isolamento busca parceiros errados. País que mais cresce na América Latina, o
Chile escolheu caminho inverso ao do Brasil: abriu sua economia; reduziu
tarifas de importação; ao expor sua indústria à concorrência com importados,
melhorou seu produto em qualidade e preço; e adotou uma pragmática política
comercial de fechar acordos com países e blocos econômicos isoladamente, o que
lhe tem rendido bons resultados. Assinado em 2004, o acordo com os EUA expandiu
as exportações chilenas em 31% já no ano seguinte. Nessa mesma época o Brasil
rejeitava dar prosseguimento à Área de Livre Comércio das Américas (Alca) por
puro preconceito ideológico e complexo de inferioridade: alegara que a Alca
daria ganhos aos poderosos e ricos EUA e perdas aos países pobres da América. O
PT falava o mesmo da globalização, e hoje a crise econômica abala os ricos, não
os pobres.
Números de 2012 comparados com 2011 mostram
que a crise pode explicar as perdas com os países europeus (que poderiam ser
menores ou até nulas, se o comércio fosse amparado por um tratado de comércio
com a União Europeia), mas não explicam com a China, a Rússia e a Argentina. De
2011 a 2012 nossas exportações para esses três países caíram nada menos que US$
8,7 bilhões (US$ 3,1 bilhões com a China, US$ 4,7 bilhões com a Argentina e
US$S 900 milhões com a Rússia). A economia chinesa desacelerou, desculpa-se o
governo. Nada, cresceu 7,8% em 2012. As razões são outras, e os velhos e não
resolvidos gargalos em estradas e portos são uma delas. A outra é o prometido acordo
de comércio entre os Brics (Brasil, China, índia, Rússia e África do Sul), que
não anda.
Foto de capa deste jornal na sexta-feira
mostrou uma fila interminável de caminhões parados que levam horas, dias paia
descarregar soja no Porto de Santos. Com isso, o embarque nos navios caiu 40%
no 1.° bimestre. Esse enorme atraso nos embarques produz estragos: a
importadora chinesa Sunrise acaba de cancelar a compra de 2 milhões de
toneladas de soja do Brasil, transferindo-a para a Argentina. "Não adianta
nada ter um preço bom se a soja não é entregue", disse
ao Estado Shao Guorui, gerente comercial da Sunrise. Com isso o
Brasil perdeu um negócio de US$ 1 bilhão.
Com seu protecionismo, a Argentina tem
sistematicamente violado regras do Mercosul e forçado a queda de vendas do
Brasil. Aliás, por vezes o Mercosul mais prejudica do que ajuda o Brasil. O
caso da União Europeia é emblemático: desde 1999 o bloco do Mercosul discute um
ambicioso acordo de zona de livre comércio com a Europa. As negociações
paralisaram e o governo brasileiro se sente preso, impedido de negociar sozinho
um pacto que abriria as portas de 27 países para o Brasil.
A tendência do mundo inteiro é a integração,
não o isolamento, não a exclusão. Nos últimos anos a União Europeia concluiu
acordos com Canadá, Cingapura e Coréia do Sul e está nos detalhes finais com
Japão, Vietnã e Tailândia. O mundo avança por esse caminho. Por que o Brasil
deve ficar preso aos briguentos vizinhos do Mercosul?
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comentários são sempre bem-vindos, desde que se refiram ao objeto mesmo da postagem, de preferência identificados. Propagandas ou mensagens agressivas serão sumariamente eliminadas. Outras questões podem ser encaminhadas através de meu site (www.pralmeida.org). Formule seus comentários em linguagem concisa, objetiva, em um Português aceitável para os padrões da língua coloquial.
A confirmação manual dos comentários é necessária, tendo em vista o grande número de junks e spams recebidos.