quarta-feira, 12 de junho de 2013

Economia brasileira e eleicoes: a conta da gastanca chegou - Cristiano Romero (Valor)

Tinha de chegar, um dia. Essa coisa de viver da bonança do crédito fácil e da demanda internacional um dia tinha de acabar. Acabou. Duras realidades para nossos keynesianos de botequim: vão ter agora de aplicar as mesmas políticas que antes criticavam nos seus "adversários" políticos, que na verdade consideravam como seus inimigos e inimigos do Brasil. Nunca antes a inconsciência foi tão grande; nunca antes tantos erros foram cometidos por tantos em tão pouco tempo. Nunca antes saímos de boas perspectivas, para afundar na mesmice da estagnação, ou talvez sim.
Como diria o Roberto Campos, o Brasil é um país que não perde oportunidade de perder oportunidades.
Paulo Roberto de Almeida


A conta chegou


Cristiano Romero
Valor Econômico, 12/06/2013
O nervosismo do mercado nos últimos dias, com reflexos nos segmentos de juros, câmbio e ações, mostra que chegou ao fim, pelo menos para os países emergentes, a era de experimentalismos em matéria de política econômica. Começa a se fechar a janela de oportunidade, propiciada pelo excesso de liquidez no mundo, para realização de reformas estruturais. O Brasil está saindo do ciclo internacional de liquidez com inflação mais alta, crescimento menor, baixa taxa de investimento, déficit externo crescente, deterioração das contas públicas e credibilidade abalada.
Nos últimos dois anos, o governo Dilma Rousseff abandonou o tripé de política econômica que regia o país havia 12 anos, sob a justificativa de que a crise nas economias avançadas teria efeito desinflacionário no restante do planeta e abriria, assim, uma oportunidade para o Brasil mudar seu equilíbrio macroeconômico. O país substituiria o binômio juro alto-câmbio apreciado por um bem mais vantajoso: juro baixo-câmbio competitivo.
Numa apresentação feita em novembro de 2011 e intitulada "Além do Consenso de Washington", o então secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, deu a senha das mudanças. Segundo ele, "uma política pró-crescimento é consistente com a estabilidade macro, desde que se evitem escolhas extremas". Por escolhas extremas, ele denominava aquelas que prevaleceram durante a maior parte do governo Lula, a quem também serviu - em livro publicado pela Fundação Perseu Abramo em 2010, Barbosa tachara a gestão Antonio Palocci na Fazenda (2003-2006) de "neoliberal".
Sem reforço fiscal, ajuste recairá sobre consumo das famílias
O fato é que o secretário, gozando então de grande prestígio junto à presidente Dilma, disse que, dali em diante, o tripé funcionaria da seguinte maneira: "Metas de inflação com redução na taxa real de juro e aceleração do crescimento; câmbio flutuante com acumulação de reservas internacionais e regulação dos fluxos de capital; metas fiscais com aumento nas transferências de renda e no investimento público".
A rigor, a taxa de câmbio passou a ser administrada, a conta de capitais foi parcialmente fechada, o superávit primário foi reduzido drasticamente e o Copom perdeu autonomia para fixar a taxa de juro, passando a viver sob forte cerco da Fazenda e do Palácio do Planalto. A primeira perna do tripé flexibilizado já mostrava que se tratava de um manifesto político, mais do que de uma decisão econômica, afinal, quem não quer reduzir juros e acelerar o PIB?
À medida que o "novo" equilíbrio macroeconômico foi resultando inútil do ponto de vista do crescimento econômico - o PIB médio anual do período Dilma é o menor desde a gestão Collor (1990-1992) -, o governo passou a adotar uma série de medidas pontuais para estimular o consumo. Mais uma vez, os estímulos não funcionaram. Diante da alta da inflação e da perda de credibilidade e previsibilidade da política, sem dúvida um desincentivo ao investimento privado, a Fazenda lançou mão de um sem-número de medidas fiscais para segurar os preços - o objetivo era impedir que o BC elevasse os juros.
Essa gestão macro contaminou o que o governo Dilma tem de melhor: uma agenda para estimular o setor privado a liderar os investimentos em rodovias, ferrovias, portos e aeroportos. Em que pese uma clara má vontade dos mercados em relação aos propósitos da presidente nessas áreas, além das idas e vindas do governo na definição das regras do jogo, trata-se de algo inédito - Dilma reconheceu, contra a vontade de seu partido, a incapacidade do Estado de tocar investimentos em infraestrutura e anunciou que o país não será socialmente justo se não tiver uma economia competitiva.
É impressionante como esse ímpeto liberalizante não combina com a gestão macroeconômica. Esta tem sido marcada por improvisos, pacotes a toda hora, malabarismos contábeis, desorganização do que estava organizado (o controle do endividamento dos entes federativos, por exemplo). Claramente, a presidente não teve sangue-frio para implantar sua agenda micro, cujos efeitos vão se dar no médio e longo prazo, enquanto assistia a um período, provavelmente temporário, de crescimento mais baixo da economia.
A conta chegou e veio puxada pela expectativa de investidores nacionais e estrangeiros de que o banco central americano acabará, antes do esperado, com a política de afrouxamento monetário iniciada em 2008. Ao respaldar o início de um novo ciclo de alta dos juros e a decisão do BC de deixar o câmbio flutuar, o governo Dilma reconheceu que o momento é difícil e que suas políticas precisavam de correção de rumo. É o que está ocorrendo.
Falta, agora, colocar de pé uma política fiscal que dê respaldo às políticas cambial e monetária. Não faz sentido o Comitê de Política Monetária (Copom) aumentar a taxa básica de juros (Selic), enquanto o governo segue expandindo os gastos públicos. A dúvida está posta: o Comitê está subindo os juros para frear a demanda agregada ou apenas o consumo das famílias?
Em entrevista ao Valor, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que o governo não aumentará os juros dos empréstimos com fundos públicos. Isto significa que o BC terá que aplicar uma dose mais forte de juros para conter o consumo das famílias e das pequenas e médias empresas, que têm acesso reduzido ao dinheiro subsidiado do BNDES. Para realizar a tarefa, portanto, o Copom terá que gerar mais desemprego para que as famílias consumam menos. É isso o que a presidente quer?
As últimas pesquisas de opinião mostram que Dilma já está começando a pagar, com perda de popularidade, a conta dos equívocos da política econômica. Com mais de 50% de aprovação, ela ainda é favorita à reeleição em 2014. Mas seu eleitorado está começando a encolher.
Cristiano Romero é editor-executivo e escreve às quartas-feiras
E-mail: cristiano.romero@valor.com.br

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Comentários são sempre bem-vindos, desde que se refiram ao objeto mesmo da postagem, de preferência identificados. Propagandas ou mensagens agressivas serão sumariamente eliminadas. Outras questões podem ser encaminhadas através de meu site (www.pralmeida.org). Formule seus comentários em linguagem concisa, objetiva, em um Português aceitável para os padrões da língua coloquial.
A confirmação manual dos comentários é necessária, tendo em vista o grande número de junks e spams recebidos.