sábado, 7 de setembro de 2013

Matias Spektor e o Itamaraty: um artigo mal escrito e mal informado - FSP

O problema dos articulistas regulares é que eles precisam, invariavelmente, estar afinados e atualizados sobre todos os assuntos, se é que pretendem escrever ao grande público comentando os temas do momento.
O artigo abaixo, de um especialista em política externa, não foi muito feliz, desde a sua primeira linha, aliás.
Pode até ser que o Itamaraty não tenha sido feliz no tratamento do assunto do senador boliviano, mas a ação (ou omissão) do Itamaraty não foi o único fator, ou sequer o mais relevante nesse triste episódio, e no seu desenlace que pode sinalizar uma punição indevida, injusta e ilegítima.
Um artigo infeliz...
Paulo Roberto de Almeida
Folha de S.Paulo, 04/09/2013

Uma abertura para Figueiredo

Matias Spektor *
Patriota não caiu pela intolerância de Dilma, mas porque o Itamaraty não funcionou. Diante da crise boliviana, o ministério protelou decisões difíceis e, acuado, apanhou da imprensa sem revidar.
Quando a "IstoÉ" publicou injusta matéria criticando Eduardo Saboia no caso dos corintianos presos, o ministério não foi à luta para proteger seu funcionário, que fazia um trabalho exemplar.
Meses depois, quando o senador asilado na embaixada começou a esticar a corda, Brasília ignorou o alerta. Ciente de que seria sacrificado, Saboia escolheu cair com decência.
No Itamaraty, a tropa é disciplinada porque sabe que tem a proteção de quem está no topo. Paralisado, o comando do ministério abdicou de sua parte da barganha. Quem violou a lógica estabelecida não foi Saboia, mas a chefia.
Por que uma máquina que funciona relativamente bem travou?
Penso que jornais e revistas errem ao atribuir o problema a Patriota, que é o melhor diplomata de sua geração. Erram também ao denunciar as supostas simpatias do PT por Evo Morales.
A máquina travou por motivos mais fundamentais e de longa data. Nos últimos anos, o Itamaraty assistiu a um processo brutal de centralização. Nada avança sem a anuência do chanceler.
Não à toa, os melhores embaixadores preferem a distância de um posto no exterior, onde podem respirar com alguma autonomia.
Em Brasília, todos têm medo de assumir riscos.
Como ninguém se responsabiliza por nada, a pilha de problemas sem resolução é alarmante.
Como falar é arriscado, a relação com a imprensa é amadora. Trata-se de um incentivo estrutural ao festim de vazamentos dos últimos meses.
Além disso, o fosso geracional é vasto. Não há mecanismos para que a experiência dos mais velhos seja complementada pela energia dos mais jovens.
No passado, a estrutura piramidal sem canal de baixo para cima funcionava. Com as novas tecnologias, isso caducou.
Hoje, muitos diplomatas jovens têm mais e melhor informação do que os embaixadores a quem servem. Muitas vezes, têm mais desenvoltura em língua estrangeira e navegam melhor as relações internacionais contemporâneas.
Chancelarias mundo afora lidam com esses problemas de modo criativo. Aqui, tapa-se o sol com a peneira.
Se Figueiredo quiser tirar seu ministério do inferno astral em que se encontra, precisará equacionar esses problemas. Sem uma abertura, a próxima crise autoinfligida é questão de tempo.
O novo chanceler está consciente disso?
Ele promoveu o embaixador responsável pela imprensa de Patriota à chefia de seu gabinete. O sinal que filtra para baixo e para fora é o de que ninguém aprendeu nada com a crise. Fica tudo como está.
Resta torcer para que a decisão tenha sido uma manobra tática: eliminando suspeitas de uma possível caça às bruxas contra o grupo de Patriota, limpa-se o terreno para a necessária ofensiva reformista de caráter estratégico.

Matias Spektorr ensina relações internacionais na FGV. É autor de "Kissinger e o Brasil". Trabalhou para as Nações Unidas antes de completar seu doutorado na Universidade de Oxford, no Reino Unido. Foi pesquisador visitante no Council on Foreign Relations, em Washington, e em King's College, Londres. Escreve às quartas, a cada duas semanas, em "Mundo".

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