Primeiro a informação, na sequência a análise.

Paulo Roberto de Almeida
Governo duplica restos a pagar para conseguir cumprir meta fiscal
Embora o ministro da Fazenda tenha comemorado a economia de R$ 75 bi no ano passado, meta só foi cumprida graças ao adiamento de 51 bilhões de reais em despesas
Veja.com, 8/01/2014

O montante de restos a pagar em 2013 ficou bem acima da média dos últimos anos, de cerca de 25 bilhões de reais desde 2009 (Marcelo Sayão/EFE)
Ao antecipar em tom de comemoração, na última sexta-feira, o resultado do superávit primário do governo central em 2013, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou com ironia que o anúncio tinha o objetivo de “acalmar os nervosinhos”. Na ocasião, Mantega desqualificou as preocupações do mercado em relação à deterioração das contas públicas. Contudo, um levantamento da ONG Contas Abertas divulgado nesta quarta-feira mostra que o cumprimento da meta tão celebrado pelo ministro não passou ileso à mais uma manobra fiscal feita no último minuto. O governo deixou de desembolsar 51,3 bilhões de reais em despesas que já haviam sido executadas e autorizadas, restando apenas a efetuação do pagamento. Ou seja, o montante ficou "na boca do caixa", mas não saiu dos cofres justamente para não impactar o superávit.
Como a despesa terá de ser efetuada em 2014, o impacto fiscal foi apenas adiado. O valor consta do balanço da União como 'restos a pagar processados' não é incomum o adiamento de parte dessas despesas. O problema, segundo o Contas Abertas, é que desde 2009 o montante de restos a pagar processados estava praticamente constante, na casa dos 25 bilhões de reais. De 2013 para 2014, a previsão, no entanto, deu um salto. O total dessa categoria de despesa no ano passado foi de 26,3 bilhões de reais. O valor é 25 bilhões de reais menor do que este ano.
Não fosse esse adiamento de despesas, o resultado primário do governo central – economia feita para o pagamento dos juros da dívida – teria sido bem inferior aos 75 bilhões de reais anunciados pelo ministro. Na semana passada, Mantega decidiu antecipar o resultado primário do governo central – formado por governo federal, Banco Central e Previdência Social — que seria divulgado apenas no final de janeiro.
Receitas extraordinárias - Além da manobra, a economia de 75 bilhões de reais só foi garantida com a ajuda de, pelo menos, 35 bilhões de reais em receitas extraordinárias: 15 bilhões de reais do pagamento do bônus de assinatura do campo de Libra do pré-sal; e outros 20 bilhões de reais do programa da Receita Federal de parcelamento de dívidas, o Refis. Essas receitas extras podem ser ainda maiores, já que os 20 bilhões se referem apenas ao resultado parcial do Refis de 2013.
Outras manobras - Recursos bem menos nobres do que as receitas extraordinárias também foram usados no ano passado. O governo adotou medidas de “contabilidade criativa” ao antecipar dividendos de empresas estatais e fazer repasses do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Sustentável (BNDES) ao Tesouro Nacional. Além disso, também foi “apagado” da lista de despesas 35,1 bilhões de reais em desonerações e investimentos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O valor foi abatido da meta do primário.
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O Contas Abertas afirma ter questionado o Ministério da Fazenda sobre o crescimento de restos a pagar processados para 2014 e a influência da medida no resultado do superávit primário. Até o fechamento da reportagem, a Fazenda não havia respondido aos questionamentos.
Os restos a pagar não processados inscritos (ou seja, despesas apenas empenhadas em 2013) atingiram o valor de 180,7 bilhões de reais em 2014, o que aumenta o total dos restos a pagar (somando processados e não processados) para 232,016 bilhões de reais, um recorde histórico. Essa posição é de segunda-feira e poderá ser alterada até o fim de janeiro. O total de restos a pagar inscritos no ano passado foi de 176,677 bilhões de reais – assim, o aumento, até agora, foi de 55,339 bilhões de reais.
Os artifícios usados para engordar o superávit em 2013
O governo vem tentando a duras penas cumprir a meta de superávit primário deste ano. A economia feita para o pagamento de juros foi reduzida de 3,1% para 2,3% do PIB e ainda assim não deve ser alcançada. Por meio de Medidas Provisórias e decretos, o governo federal vem criando mecanismos para 'maquiar' as contas públicas na tentativa de garantir o cumprimento do primário — expediente que vem sendo usado desde 2010, por sinal. Mas em 2013, os mecanismos se tornaram mais elaborados. Confira quais são:
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Aumento de Capital da Caixa
Em 2013, o governo autorizou, por meio de duas medidas provisórias, a Caixa Econômica Federal a aumetar seu capital. O objetivo era viabilizar os financiamentos aos programas Minha Casa Minha Vida e Minha Casa Melhor, concedendo uma linha de crédito de 18,7 bilhões de reais para a compra de eletrodomésticos por beneficiários do programa habitacional. A MP 600, editada em dezembro de 2012 e retificada em janeiro de 2013, permite à União conceder até 7 bilhões de reais à Caixa. Já a MP 620 autoriza a capitalização do banco em até 8 bilhões de reais.
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