terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Energia: as politicas equivocadas do governo - Editorial Valor Econômico

Energia: um novo esqueleto para o Tesouro?
Editorial Valor Econômico, 17/02/2014

Deu-se um importante passo na semana passada na discussão sobre as dificuldades que enfrenta o setor elétrico. Depois de insistir em negar o óbvio, o governo mudou o discurso e admite também o óbvio: se não chover, há risco de faltar energia no país. "Baixíssimo", segundo avaliam as autoridades federais, mas ainda assim, presente.

Não se deve desprezar o sinal vindo do governo. Qualquer sistema baseado em hidrelétricas, como é o caso do Brasil onde 75% da energia depende da água, terá risco aumentado com a falta de chuvas. Como bem disse o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, "um avião não é feito para cair, mas ele sazonalmente cai. O que não se pode dizer é que ele todo ano tem que cair. Assim é o sistema elétrico brasileiro". É, sem dúvida, um avanço no debate.

Falta ao governo, no entanto, reconhecer os outros riscos que o modelo atual de gerenciamento do sistema elétrico pode trazer para a economia brasileira, especialmente para a contas fiscais.

A exemplo do que fez com a Petrobras e o preço dos combustíveis, as decisões recentes do governo têm jogado para um futuro incerto a definição de como será paga a conta de evitar um apagão às custas da geração de energia térmica. No ano passado, o Tesouro Nacional gastou R$ 9,8 bilhões. Esse ano, o setor privado estima o gasto em R$ 18 bilhões. Isso sem falar nas indenizações e subsídios que o governo se comprometeu a pagar a partir do fim de 2012, quando renovou antecipadamente as concessões das geradoras de energia para reduzir a tarifa em 20% aos consumidores.

As usinas termelétricas têm um custo de operação muito mais elevado que as hidrelétricas. O desenho do sistema elétrico brasileiro, feito a partir do racionamento de 2001, se baseia na ideia de que as térmicas serão uma espécie de backup, para enfrentar situações conjunturais no mercado de energia. O que se tem visto, no entanto, é a exceção virar regra e o que era conjuntural se transformar em uma saída estrutural. As térmicas, que são usinas caras e poluentes, foram ligadas no fim de 2012, funcionaram a pleno vapor em 2013 e prosseguem ligadas em 2014.

De acordo com o último relatório do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) as térmicas geraram 13,166 MW, o equivalente a 17,92% de toda a energia do sistema.

Essa realidade se transforma em custo mais elevado da energia no mercado de curto prazo e desequilibra as contas das distribuidoras. A regra em vigor estabelece que esse aumento seja repassado às tarifas cobradas dos consumidores. É assim que o modelo, desenhado pela então ministra de Minas e Energia, Dilma Rousseff e aprovado pelo governo Lula, prevê lidar com o problema. Foi assim que funcionou até o ano passado.

Em 2013, o governo decidiu mudar a regra. O reajuste nas tarifas seria de tal magnitude que, somado à inflação já elevada, fez o governo assumir a despesa. Mas o Tesouro Nacional avisou que começaria a repassar o gasto adicional aos consumidores nas contas de 2014. Na semana passada a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) oficializou o adiamento da cobrança e disse, inclusive, que o governo estuda "isentar" os consumidores desse pagamento. Não se sabe como a conta de R$ 9,8 bilhões será paga.

Esse ano entrariam em vigor as "bandeiras tarifárias" para que os aumentos no custo de energia fossem repassados aos consumidores no mês seguinte ao ocorrido. A inflação ainda elevada de 2014, jogou a medida para o frente. A Aneel fala em 2015 e o governo voltou a falar em usar recursos do Tesouro Nacional para cobrir a conta das térmicas esse ano.

Além da operação corrente do sistema, há custos sobre os quais não se tem ainda clareza do valor. Um deles é a renovação das concessões das transmissoras de energia elétrica. A Aneel definiu a metodologia no início do ano e as empresas ainda preparam os cálculos. A estimativa feita pelo próprio governo é de R$ 10 bilhões. As geradoras ainda têm a receber recursos não calculados relativos às indenizações por investimentos feitos antes de 2000. Até o fim do ano, o governo terá quitado R$ 16,3 bilhões dos ressarcimentos devido pela renovação antecipada dessas concessões. Faltam ainda R$ 3,7 bilhões.

Num cálculo rápido, são R$ 41,5 bilhões em despesas já contratadas, suficiente para produzir um apagão fiscal.


Melhor seria seguir as regras já estabelecidas nos prazos combinados do que gerar um novo esqueleto fiscal

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