Eu já postei aqui (ver mais abaixo, num dos posts anteriores,
este) a transcrição das notas taquigráficas da intervenção do ministro de Estado das Relações Exteriores, Embaixador Luiz Alberto Figueiredo Machado, na sessão da CREDN do Senado Federal que o acolheu, no último dia 6.
Agora tenho o prazer de postar apenas um trecho dessa intervenção, graças à diligência de meu amigo e colega blogueiro Mário Machado, responsável pelo blog Coisas Internacionais, relativo à preparação pelo Itamaraty de um Livro Branco sobre a política externa nacional (trechos enfatizados pelo Mário):
Eu considero fundamental valorizar a interação do Itamaraty com o conjunto do Governo, dos demais Poderes e da sociedade civil. Os temas de política externa, felizmente, mobilizam cada vez mais o interesse e a atenção dentro do País. Trata-se de um desenvolvimento muito positivo da nossa democracia que ocorre em momento em que se amplia a projeção externa do Brasil e cresce a percepção no plano interno sobre a relevância dos assuntos internacionais e seu impacto sobre a realidade e os destinos nacionais.Nesse contexto, Sr. Presidente, o Itamaraty iniciará ainda este mês uma série de eventos de diálogo entre Governo, Congresso e sociedade civil sobre temas centrais da política externa brasileira. Além de entidades públicas, os eventos reunirão representantes da academia, da imprensa, dos movimentos sociais, de organizações não governamentais, dos sindicatos e de setores empresariais. Com isso, nós daremos conteúdo concreto a essa determinação a qual eu me referi, de maior abertura e interação com a sociedade brasileira. Esses eventos, que eu chamo de diálogos sobre política externa, ocorrerão ao longo do mês de março, iniciar-se-ão este mês ainda, como eu disse, no final do mês. Ocorrerão ao longo do mês de março e contribuirão para o aperfeiçoamento desse diálogo. É óbvio que o diálogo não se esgotará com esse exercício, mas esse exercício abrirá portas e canais para a continuação desse diálogo. E, como resultado desse processo, o Itamaraty elaborará um livro branco da política externa brasileira, que conterá princípios, prioridades e linhas de ação da política externa. A elaboração desse livro branco, que eu acho da maior importância, será, sim, o fruto desse diálogo aberto, arejado, participativo, como necessariamente tem que ser. Com isso, eu creio que o Itamaraty poderá dar sua modesta contribuição para o aprimoramento, que deve ser permanente, do debate democrático sobre as políticas públicas implementadas no País. É um imperativo que nos mobiliza a todos aqui reunidos e que informará, em caráter prioritário, a minha gestão á frente do Ministério das Relações Exteriores. Eu queria agradecer sobremaneira a honra do convite, reiterar o meu prazer de estar nesta Casa, que é a Casa do povo brasileiro, e fico, desde já, à disposição de todos para responder a eventuais comentários ou eventuais pedidos de esclarecimentos. Muito obrigado, Sr. Presidente.
O que tenho a dizer sobre isso?
Uma boa iniciativa, uma grande abertura de espírito, uma legítima aspiração dos diplomatas e uma excelente oportunidade para a sociedade brasileira oferecer sua contribuição a um tema crucial da interface externa (e mesmo interna) do país, no contexto internacional.
Eu já ofereci, há muito tempo, minha contribuição a esse tipo de debate, sob a forma de um artigo, que não se referiu em nenhum momento ao Brasil -- em vista de um dispositivo, que considero correto, da lei do Serviço Exterior que comanda ao diplomata solicitar autorização superior em algum pronunciamento público que queira fazer sobre a política externa oficial -- mas que tinha tudo a ver com a diplomacia conduzida em gestões anteriores.
Esse ensaio, "Bases Conceituais de uma Política Externa Nacional", que está disponível no meu site pessoal, foi publicado num livro coletivo, e também pode ser achado sob a minha conta no Academia.edu, aqui, onde estou gradualmente organizando meus trabalhos que considero mais relevantes (esse certamente é, com perdão do self-praise, e antecipa, em quatro ou cinco anos, o debate que agora está sendo proposto). Ele permaneceu relativamente discreto (e não me lembro de jamais ter recebido qualquer comentário a respeito) por decisão deliberada, pois os tempos eram outros, de certa arrogância satisfeita com as próprias bases conceituais da diplomacia daquela época e bastante fechados ao tipo de exercício que agora se empreende.
O processo agora aberto é importante e deve ser comemorado.
Oferecerei minha contribuição, se for chamado para tal, o que creio, entretanto, que não ocorrerá.
Mas não deixarei de fazê-lo em quaisquer circunstâncias, já que, antes de ser diplomata, sou um cidadão brasileiro, livre (tanto quanto possa ser, sendo um agente do Estado, um funcionário do Serviço exterior, eventualmente um servidor de governo) e plenamente consciente de meus direitos e obrigações, mas também sempre participante de um diálogo que considero saudável e necessário à boa condução da interface externa do Brasil.
Talvez comece relendo (o que não fiz agora, e nem me lembro direito o que, exatamente, escrevi naquele ensaio) e eventualmente repostando (talvez aqui pela primeira vez) aquele ensaio no qual eu discorria sobre o que me pareciam ser os bons fundamentos de uma política externa nacional, de qualquer política externa, alguns talvez divergentes do que então se fazia, na diplomacia oficial, na esfera regional e em algumas vertentes internacionais.
Como sempre, não tenho nenhuma objeção a dizer clara e abertamente o que penso a respeito de qualquer aspecto da vida nacional, e não tenho restrições a me expor ao debate e a críticas de colegas ou especialistas sobre questões que considero relevantes para o país, desde que apoiadas em argumentos claros e transparentes sobre o que se pretende dizer, o que aliás sempre faço em meus artigos (algumas vezes de forma menos clara, tendo em vista as limitações acima expostas).
O exercício atual constitui uma espécie de revisão do "pensamento único" que durante muito tempo pautou a diplomacia brasileira.
Como diria um (péssimo) líder político: "Que floresçam as mil flores!" (O que veio depois, sabido dos que conhecem a história chinesa, foi um período difícil na vida do país.)
Desta vez, tenho certeza de que o exercício será coroado de sucesso.
Paulo Roberto de Almeida
Hartford, 8/02/2014
Caro diplomata! Meus respeitos! Parece-me, entretanto, típica ação assembleista, que o senhor conhece melhor do que eu! Além do que, quando citam logo de cara sociedade civil, gramscismo puro, já fico meio desconfiado. Espero que os militares participem ativamente dos debates, inclusive vários da reserva que cumpriram diferentes missões no exterior. Mas, temo que ao final, saia um documento sob o feitio que eles bem entenderem. E, ainda vão dizer que ouviram todo o mundo. Aguardo seu artigo sobre o 31 de março.
ResponderExcluirSim meu caro Marco Balbi, existe sempre a chance de que o livro branco saia meio cinzento, pois quem está no poder vai revisá-lo cuidadosamente antes de ser divulgado, de maneira a justificar inteiramente as políticas atuais, não as permanentes, que também não se sabe bem quais seriam atualmente, depois de tantos anos de gramscismo desenfreado, dentro e fora da academia.
ResponderExcluirQuanto ao 31 de março, não sei se terei tempo de preparar algo específico, pois tenho muitos textos no pipeline, que preciso terminar.
Já fiz algo no espírito do problema: um texto sobre as falacias em torno do golpe militar de 1964 (está na série Falácias, disponível no meu site) e um depoimento pessoal sobre os anos de chumbo, que explica como e porque estive envolvido na resistência ao regime militar...
Paulo Roberto de Almeida