O Fed e as fraquezas do Brasil
13 de fevereiro de 2014 | 2h 11
Editorial O Estado de S.Paulo
Verdadeira ou falsa, a imagem do Brasil como um dos emergentes mais vulneráveis à turbulência econômica internacional foi autenticada pelo banco central mais poderoso do mundo, o Federal Reserve (Fed), dos Estados Unidos. A vulnerabilidade brasileira, classificada como só inferior à da Turquia, foi exposta sem atenuantes no relatório semestral de política monetária entregue na terça-feira ao Congresso americano. A entrega coincidiu com o primeiro depoimento da nova presidente do Fed, Janet Yellen, perante a Comissão de Serviços Financeiros da Câmara dos Representantes. Na parte sobre a política do Fed, o discurso e o relatório funcionaram como calmantes para os mercados. O Fed continuará apoiando a recuperação econômica e a elevação do emprego e os estímulos serão retirados, como até agora, gradualmente e com base nos indicadores de atividade, prometeu Yellen. No essencial, foi uma repetição das falas do antecessor, Ben Bernanke. Em todo o mundo a reação a esse anúncio foi muito boa - muito melhor que a reação de Brasília aos comentários sobre a situação brasileira.
O comitê responsável pela moeda e pelo crédito, assegurou a nova chefe do Fed, permanecerá empenhado em cumprir o duplo mandato da instituição - cuidar da inflação, por enquanto muito baixa, e buscar ao mesmo tempo o maior nível de emprego compatível com a estabilidade geral dos preços. Os juros, nesse quadro, devem permanecer próximos de zero ainda por longo tempo, depois de abandonada a injeção mensal de dinheiro nos mercados. A primeira redução, no começo do ano, foi de US$ 85 bilhões para US$ 75 bilhões. A segunda, anunciada há poucos dias, diminuirá o volume para US$ 65 bilhões. As seguintes dependerão de novos dados sobre a economia.
O relatório semestral do Fed contém análises do quadro americano e do cenário global e uma prestação de contas da política adotada e de seus efeitos. Desde quando Bernanke anunciou, no ano passado, o plano de redução dos estímulos, investidores e especuladores em todo o mundo tentaram ajustar-se às mudanças previstas. A expectativa de uma oferta menos ampla de dólares mexeu com os fluxos de capitais em todo o mundo e valorizou a moeda americana.
Alguns países foram especialmente atingidos e a desvalorização de suas moedas foi mais acentuada. No balanço apresentado no relatório do Fed, o Brasil foi um dos mais severamente afetados nas duas fases da turbulência - logo depois de anunciado o plano de mudança, no ano passado, e no início de 2014, quando começou de fato a redução dos estímulos.
A avaliação apresentada no documento foi baseada em um índice composto de seis variáveis. O saldo em conta corrente, a dívida pública, a evolução do crédito ao setor privado nos últimos cinco anos e o volume de reservas são apresentados como porcentagens do Produto Interno Bruto (PIB). A dívida externa é comparada com as exportações. Além disso, considera-se a inflação nos últimos três anos. A análise mostra uma relação entre as maiores desvalorizações e os piores índices de vulnerabilidade calculados a partir daqueles elementos.
Não se trata de uma avaliação baseada em vagas impressões ou em critérios estritamente subjetivos. A fragilidade do Brasil é perceptível sem muito esforço em vários desses indicadores, como a rápida expansão do crédito, o aumento da dívida pública bruta e a inflação acima dos padrões internacionais. Os autores do estudo citaram medidas tomadas em vários países a partir do ano passado, como a elevação dos juros e a adoção de reformas. Isso enfraquece os argumentos da direção do Banco Central do Brasil em reclamação dirigida ao pessoal do Fed.
Mesmo com alguma possível injustiça, a avaliação contida no relatório pode produzir efeitos e, além disso, coincide com a opinião de operadores do mercado e de especialistas em análise de risco de crédito. Por seus muitos desacertos e por seu voluntarismo, o governo brasileiro comprometeu sua credibilidade e expôs o País ao risco de julgamentos como o dos técnicos do Fed. Não adianta reclamar. A imagem só será melhorada com medidas sérias e com a reconquista da credibilidade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comentários são sempre bem-vindos, desde que se refiram ao objeto mesmo da postagem, de preferência identificados. Propagandas ou mensagens agressivas serão sumariamente eliminadas. Outras questões podem ser encaminhadas através de meu site (www.pralmeida.org). Formule seus comentários em linguagem concisa, objetiva, em um Português aceitável para os padrões da língua coloquial.
A confirmação manual dos comentários é necessária, tendo em vista o grande número de junks e spams recebidos.