A economia e a política do
Brasil em tempos não convencionais
(nunca antes mesmo...), 2
Paulo
Roberto de Almeida
Palestra
na UnB: 24/04/2014, 19hs
Em
voo, de Bradley a Atlanta, e a Brasília, 17-18/04/2014
(continuação da parte anterior)
Não foi fácil essa volta às origens, pois as elites, sempre de
mentalidade atrasada, tentando mimetizar o que nos vinha do exterior, se
contentaram apenas em abolir a escravidão, aliás, tardiamente, e acharam que já
tinham feito muito. Elas desprezaram as recomendações de Joaquim Nabuco, que
queria os negros libertos, mas com distribuição de terras e com educação, o que
não havia sequer para brancos pobres. Nabuco foi um derrotado, como já o tinha
sido, desde a independência José Bonifácio, e depois Irineu Evangelista de
Souza, que conseguiu apenas o título de Barão de Mauá, mas não a concretização
de suas ideias de progresso industrial e financeiro. Rui Barbosa também tentou,
à sua maneira, fazer o Brasil avançar, como o gigante do norte, mas tudo o que
conseguiu foi estimular o espírito rentista das elites parasitárias.
Nada do que pregavam esses estadistas se fez, e os negros libertos,
os mestiços e todos os brasileiros pobres continuaram a vegetar no interior do
Brasil, ou às margens das grandes cidades, se empregando precariamente, sem
educação e sem capacidade de se inserir produtivamente numa economia que recém
começava a se industrializar, aos soluços, aos trancos e barrancos, ao sabor
das políticas comerciais, que visavam mais defender as receitas do Estado do
que propriamente estimular uma indústria nacional. Sim, as elites preferiam
importar agricultores brancos da Europa, e foram estes que, dotados de uma
ética que Max Weber pensava encontrar unicamente nos protestantes,
verdadeiramente modernizaram o Brasil.
A modernidade se espalhou gradativamente pelo Brasil, ao ritmo da
urbanização e da industrialização, mas também com a expansão das fronteiras
agrícolas, graças ao trabalho de novos bandeirantes. Aqui é preciso fazer uma
homenagem aos gaúchos, filhos de imigrantes, que levaram a agricultura moderna
para os mais diversos rincões do interior brasileiro. Os novos bandeirantes
civilizaram o interior atrasado do Brasil, onde quer que eles tenham tocado,
com seu vigor no trabalho, seu espírito cooperativo, suas máquinas agrícolas e
suas churrascarias. Foram eles que venceram a linha de Tordesilhas econômica,
que fazia a atividade produtiva do Brasil depender de uma estreita faixa
atlântica de não mais de 200 quilômetros a partir da costa.
Mas as elites, em geral, continuaram atrasadas, o que é
manifestamente patente na política e na educação. Incapazes de se entender
sobre os rumos do país, os políticos provocaram mais de uma vez, aliás
incontáveis vezes, intervenções dos militares na vida política. Militares são típicos
representantes da classe média, amantes da ordem, inimigos da corrupção
política – que eles desprezam fundamentalmente –, encarregados
constitucionalmente da segurança da pátria e diretamente interessados num país
poderoso, dotado de uma indústria moderna, que seja capaz de assegurar a
autonomia nacional no abastecimento prioritário e nos equipamentos que lhes são
necessários. Foi por causa das desordens civis, da inflação destruidora das
poupanças dos cidadãos, do caos administrativo e da incapacidade da classe
política em resolver, sem corrupção, os problemas básicos da nacionalidade que
os militares interviram tantas vezes na vida civil, alegadamente para colocar o
Brasil nos trilhos do desenvolvimento, como eles não se cansam de dizer.
A República começou com um golpe militar, porque o império já
estaria carcomido, segundo se dizia. Depois de muitas turbulências, e revoltas
militares e civis, foi a República que ficou carcomida em muito pouco tempo. Os
militares voltaram a se envolver nos assuntos públicos desde o início dos anos
1920, em ondas sucessivas, até culminar, com apenas uma parte das Forças
Armadas, na revolução de 1930, que de fato alterou o padrão das intervenções
militares, como seria o caso novamente em 1964. A despeito de uma fratura em
1932, a vigilância contra a desordem civil e no caso de ameaças ao Estado
continuaram a constituir prioridades da agenda política dos militares. A
intentona comunista de novembro de 1935 selou definitivamente o anticomunismo
como doutrina oficial do Estado brasileiro, estabelecendo um dos critérios
básicos para a intervenção dos militares na política.
(continua)
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