Novos atores na diplomacia brasileira:
o Itamaraty passará a ser “assessorado” por um Conselho Nacional de Política Externa?
Paulo Roberto de Almeida
Uma das características do
aparelhamento do Estado brasileiro pelo Partido dos Trabalhadores, hegemônico
na atual conjuntura política brasileira, tem sido a penetração das diversas
instâncias decisórias e consultivas do governo federal por meio de organizações
políticas que se proclamam participantes interessados em determinadas políticas
setoriais. Essa infiltração se dá mediante organizações que são aparentemente
autônomas, ou seja, consideradas como sendo da “sociedade civil”, mas que são,
de fato, controladas pelo PT ou por grupos que se movimentam no mesmo espectro
ideológico.
O objetivo, obviamente, é
o de controlar, ou pelo menos constranger, os decisores políticos e a própria
burocracia profissional de cada um dos setores visados, preferencialmente
aqueles com maior interface social. Aqueles setores de maior relevância social
são objeto da criação de “conselhos nacionais”, cuja institucionalidade foi
estimulada desde o início do governo do PT, em 2003. A metodologia é conhecida:
o governo já aparelhado pelos companheiros do PT estimula a formação de
Conselhos Nacionais, e depois passa a convocar encontros nacionais, organizados
cuidadosamente pelo próprio governo, aos quais, sem surpresas, são convidados
preferencialmente – ou exclusivamente? – órgãos e movimentos controlados pelo
próprio partido hegemônico.
Trata-se aqui de uma
típica tática gramsciana – que os franceses chamariam de noyautage –, como várias outras utilizadas pelo partido hegemônico,
que já domina uma fração substancial do movimento sindical: por meio de
decisões aprovadas de forma aparentemente “consensual” nesses encontros
nacionais dos “conselhos” que o próprio partido hegemônico criou dentro da
máquina governamental, os companheiros gramscianos pretendem guiar e controlar a
adoção de políticas que confirmariam justamente sua hegemonia, não mais apenas
sobre o governo, mas sobre toda a sociedade brasileira. Recorrendo não apenas
ao velho Gramsci – que poucos dos companheiros leram de fato – mas sobretudo a
recomendações dos companheiros cubanos – eles, sim, presentes, direta e
indiretamente, via Foro de São Paulo e outros canais menos transparentes –, os seus
companheiros tupiniquins cercam todas as possibilidades de ter a sociedade brasileira
sob seu controle. Não que eles pretendam fazer o Brasil adotar um modelo de
organização social e política baseado no socialismo à la cubana, pois eles não
seriam estúpidos a esse ponto: a intenção é a de “apenas” controlar o
capitalismo brasileiro, fazendo com que este alimente, sustente e subsidie o
seu próprio poder monopólico, se possível por prazo indefinido.
Não existe, até o momento,
nenhum Conselho Nacional de Política Externa, mas se depender do partido dos companheiros
poderá existir algum dentro de breve tempo, pelo menos no que depender da
continuidade das tentativas bolivarianas e da possível implementação do famoso
decreto n. 8.243, que instituiu uma “política nacional de participação social”.
As pressões para a criação de um conselho desse tipo existem e devem ser
reforçadas, independentemente do destino final que tenha tal decreto, e elas
são exercidas em diversas instâncias. Pode-se ler, por exemplo, numa declaração
emitida ao final da IV Conferência Nacional de Segurança Alimentar e
Nutricional”, realizada em Brasília, de 18 a 20 de março de 2014, o seguinte
trecho, que interessa de perto às atividades da diplomacia brasileira (ênfase
acrescida):
“Na área internacional,
faz-se necessário que o direito humano à alimentação adequada (DHAA) e à
soberania e a segurança alimentar e nutricional (SSAN) orientem as relações
transfronteiriças e as obrigações extraterritoriais, as negociações
internacionais de clima comércio e tratados bilaterais, bem como projetos de
investimentos de empresas estrangeiras no Brasil e de empresas brasileiras
realizadas em outros países, nas áreas de mineração, agronegócio e construção
civil, que contam com o apoio do governo brasileiro. A política externa brasileira no que se refere à segurança alimentar e
nutricional precisa ser mediada em instâncias plurais e representativas,
como o CONSEA. Requer, sobretudo, a criação
de um espaço institucionalizado de participação social, voltado para a
inserção externa do país. Nesse sentido, apoiamos
a criação de um Conselho Nacional de Política Externa onde as distintas visões,
interesses e propostas em disputa sejam apresentados e processados.”
George Orwell e sua novilíngua
estão claramente presentes nesse comunicado. Através de expedientes como estes
os companheiros prosseguem em sua obra de penetração, de controle e de dominação
das diversas instâncias da governança no Brasil. Pode-se dizer que se trata de
um bolivarianismo soft, adaptado às circunstâncias nacionais. Não por isso
menos nocivo à democracia e às liberdades em nosso país.
Hartford, 30 de junho de 2014.
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