terça-feira, 28 de outubro de 2014

Eleicoes 2014: O Dia Seguinte - Rubens Barbosa

Essa ideia de fazer diálogo e conciliação poderia até funcionar se estivéssemos lidando com partidos normais, com pessoas razoáveis, democratas e respeitadores das regras do jogo.
Mas ela simplesmente não funciona quando estamos confrontados a uma tropa de neobolcheviques mafiosos abrigados num partido totalitário, que não pretende largar o poder, que deve ser usado não necessariamente para instalar o socialismo no Brasil -- os companheiros estão muito contentes com o capitalismo, sabem que ele funciona melhor do que a porcaria da ditadura bolivariana -- mas para preservar e ampliar esse mesmo poder, para simplesmente dominar e ficar ricos e poderosos. Esse é o projeto deles...
Paulo Roberto de Almeida

O dia seguinte



Rubens Barbosa
O Estado de S.Paulo, 28.10.2014

Ao final de uma das eleições mais renhidas das últimas décadas, as urnas falaram de forma clara e 120 milhões de votantes manifestaram-se de forma ordeira e tranquila, dando mais um sinal de maturidade democrática. Na disputa entre dois modelos distintos de governo, a maioria mais apertada desde 1945 optou pelo do PT. Não se deu a alternância de poder, tão saudável para a democracia,
Ao final de uma das eleições mais renhidas das últimas décadas, as urnas falaram de forma clara e 120 milhões de votantes manifestaram-se de forma ordeira e tranquila, dando mais um sinal de maturidade democrática. Na disputa entre dois modelos distintos de governo, a maioria mais apertada desde 1945 optou pelo do PT. Não se deu a alternância de poder, tão saudável para a democracia.
Nos dias seguintes aos resultados, contudo, temos de pensar no Brasil em primeiro lugar, virar a página dessa histórica eleição e tratar de olhar para a frente pensando no futuro de nosso país. O Brasil não para e não pode ficar refém de rixas radicais entre grupos políticos. A sociedade brasileira espera que de norte a sul, dos mais favorecidos aos mais desvalidos, as feridas e os ressentimentos deixados pelos duros embates e evidentes exageros das campanhas eleitorais sejam superados. A intolerância atingiu níveis perigosos e inaceitáveis no contexto de um rotineiro enfrentamento político que se pressupõe civilizado e conducente ao aperfeiçoamento das práticas democráticas.

O País terá de enfrentar a partir de agora a dura realidade da economia em recessão e das contradições e dos desafios na política nacional.

O governo vai ter de cumprir os principais compromissos assumidos pela presidente reeleita, tais como medidas para estabilizar a economia, ajustes na política econômica para reduzir a inflação, volta do crescimento para manter o nível de emprego e reforma política para permitir o avanço das mudanças de que tanto o País necessita. Por outro lado, esperam-se o prometido combate à corrupção e o restabelecimento dos princípios éticos com a punição dos culpados pelo assalto aos cofres públicos e que tanto prejuízo causaram à maior e mais prestigiosa empresa brasileira.

As oposições, que saem derrotadas, têm de se reinventar e atuar de forma diferente da dos últimos 12 anos para melhor defenderem o modelo e as políticas que expuseram na campanha eleitoral e cobrar resultados do governo nas áreas política, econômica e social.

Os ataques pessoais e a exacerbação das críticas fizeram crescer as paixões partidárias e a animosidade entre os simpatizantes do PSDB e do PT. O ardor da disputa em diversos momentos, não só nos debates na televisão, mas também nas ruas, acirrou os espíritos e fez com que o País emergisse, depois da eleição, dividido eleitoralmente entre Norte-Nordeste e Sul-Sudeste, e socialmente entre pobres e ricos, povo e elite, entre "nós e eles".

Olhando para os interesses permanentes do Brasil, esse elemento novo é preocupante. A insistência na divisão, tão explorada pelo PT para se manter no poder, é uma receita bastante perigosa para a preservação da democracia e da tranquilidade em nosso país.

O novo mandato não se prenuncia fácil para o governo do PT. Se a tática de divisão entre "nós e eles" continuar, a radicalização política e o enfrentamento derivado das opções que serão adotadas vão provocar uma situação de conflito que não deveria interessar a ninguém.

Temos de encontrar formas de restabelecer a harmonia interna para podermos avançar nas agendas que interessam ao Brasil. Desde o início do novo governo petista teremos de estabelecer pontes e canais de comunicação para evitar que a radicalização e a polarização dos últimos meses da campanha eleitoral se mantenham, fracionando a nossa sociedade. Isso vai exigir um esforço de moderação dos dois lados. Temos de demonstrar maturidade para poder dialogar de forma democrática e pacífica.

A legitimidade consagrada pela vitória eleitoral impõe a responsabilidade de que as propostas apresentadas durante a campanha sejam discutidas e aprovadas pelo Congresso Nacional, que, passando a contar com representantes de 28 partidos, normalmente verá seu processo decisório tornar-se mais difícil e complexo.

O próximo ano prenuncia-se difícil não só, como tudo indica, pela gradual deterioração da economia - o que exigirá a tomada de medidas fortes para equilibrar as contas públicas, conter a escalada da inflação e tentar aumentar o crescimento econômico -, mas também porque, do ponto de vista político, os detalhes divulgados nas delações premiadas no caso de corrupção na Petrobrás começarão a ser expostos com provas ao grande público e os acusados deverão começar a ser julgados.

Algumas das políticas e medidas prometidas pela então candidata, agora presidente reeleita, têm grande potencial de levar ao aprofundamento das divisões internas. O plebiscito para a reforma política, o controle social da mídia, o controle econômico das empresas de comunicação, a revisão da Lei de Anistia, a criação da política nacional de representação social e a modificação da lei que torna privativas funções de chefia no Itamaraty - para mencionar apenas algumas - não contam com o apoio da maioria da sociedade brasileira. Caso o governo reconduzido queira aplicá-las, haverá, sem dúvida, o aprofundamento da divisão interna e um novo inevitável choque de consequências imprevisíveis para a democracia e a estabilidade do nosso país.

Embora o discurso da presidente Dilma Rousseff após o anúncio oficial dos resultados, no domingo, tenha conclamado "todos os brasileiros e todas as brasileiras sem exceção" à "união" e ao "diálogo", não houve um gesto em relação à oposição, nem sequer uma menção, como é de praxe, a seu opositor, que a havia cumprimentado pouco antes.

O grande desafio que o Brasil vai enfrentar nos próximos meses será como estabelecer as referidas pontes para evitar a radicalização e procurar deixar as diferenças de lado. Não será fácil.

Governo e oposição têm responsabilidade compartilhada para evitar que a divisão se agrave, se aprofunde e leve a uma crise institucional.

*Rubens Barbosa é presidente do Conselho de Comércio Exterior da Fiesp 

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