Paulo Roberto de Almeida
Vale a pena ler o
que é o método Paulo Freire
Blog Tomatadas, maio 2014
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Embora muito se fale sobre o dito "Método Paulo
Freire" de ensino, a opinião pública sabe bem pouco sobre no que isso
consiste. Em grande parte, tal situação se dá pelo fato de que Paulo Freire e
os propagandistas desse método não se preocuparam muito em explicá-lo,
restringindo-se quase o tempo todo à denúncia da dita "educação
bancária" e à repetição do mantra "educar é um ato
político".
Nesse contexto, não deixa de ser proveitoso ler o
livrinho O que é método Paulo Freire, de Carlos Rodrigues Brandão.
O autor é um discípulo de Freire que participou das primeiras experiências de
aplicação desse método, em 1961, no interior do Nordeste. A proposta do livro é
explicar tais experiências passo a passo, tendo em vista que "[...] em
alguns livros de Paulo Freire e de outros educadores, são poucas as páginas
sobre o método e, não raro, elas estão escondidas em algum 'anexo'"
(Brandão, 1984, p. 14). Na seção final do livro, o autor explicita que, em
realidade, as reflexões metodológicas ocupam um lugar pequeno na obra
freiriana: "quem voltar aos livros que Paulo Freire escreveu vai notar
que, de propósito, falei muito do que ele fala pouco e pouco do que ele fala
muito" (Idem, p. 111).
Ora, essas citações já evidenciam que, como dizem os
críticos de Freire, esse autor e seus seguidores não se preocupam muito com a
educação em si mesma, e sim em fazer da educação um instrumento de luta
política contra o capitalismo. E o livro de Brandão, precisamente por se
concentrar na descrição do método, acaba por fornecer elementos que corroboram
as críticas lançadas contra as propostas freirianas. Neste texto, vou destacar
apenas a crítica relativa à falta de originalidade do tal método.
Como era e como ficou
O historiador David Vieira sugere,
com base numa boa revisão bibliográfica, que os procedimentos que compõem o
dito "Método Paulo Freire" eram empregados na alfabetização de
adultos, já em 1915, pelo missionário Frank Charles Laubach (1884-1970). Ao ser
enviado numa missão religiosa para as Filipinas, Laubach precisava elaborar uma
escrita para a língua maranao e, ao mesmo tempo, alfabetizar as pessoas nessa
língua para que pudessem estudar a bíblia. Assim, ele "[...] adaptou um
antigo método de ensino norte-americano, de reconhecimento das palavras
escritas por meio de retratos de objetos familiares do dia-a-dia da vida do
aluno, para ensinar a leitura da nova língua escrita. A letra inicial do nome
do objeto recebia uma ênfase especial, de modo que o aluno passava a reconhecê-la
em outras situações, passando então a juntar as letras e a formar
palavras".
Ora, o trabalho de alfabetização realizado por Freire e
seus seguidores consistia basicamente nos seguintes passos - embora Brandão
repita várias vezes que o método era modificado a cada vez que o empregavam:
•
eles faziam uma pesquisa sobre o cotidiano dos
alunos para selecionar os "temas geradores" e as "palavras
geradoras"
•
usavam desenhos e fotos para estimular
discussões em grupo sobre esses temas (por exemplo, os problemas de habitação,
alimentação e outros na favela onde os alunos moravam)
•
apresentavam uma palavra geradora, como
"favela", "tijolo" ou "salário", por meio de um
slide
•
em seguida, eram apresentados slides com as
"famílias fonêmicas" de cada sílaba (no caso de "favela",
começava-se mostrando "fa - fe - fi - fo - fu", depois "va - ve
- vi - vo - vu", etc.)
•
posteriormente, os alunos eram estimulados a
criar palavras combinando todas as sílabas dispostas numa "Ficha de
Descoberta", isto é, num quadro com todas as famílias fonêmicas
relacionadas à palavra geradora (Brandão, 1984, p. 70-72).
Qual é a originalidade disso em relação ao que Laubach e
outros já faziam desde muitas décadas? Brandão não se detém em discutir o que
haveria de original no trabalho realizado com Freire, mas, ao tratar dos
critérios empregados para a seleção das palavras geradoras, explica o seguinte:
Ora, no Método Paulo Freire entra um critério que, se não
é novo, apareceu repensado. [...] aqui, as palavras não são só um instrumento
de leitura da língua; são também instrumentos de releitura coletiva da
realidade social onde a língua existe, e existem os homens que a falam e as
relações entre os homens. Portanto, as palavras precisam servir para as duas
leituras e os seus critérios de escolha são três, dois deles usuais em outros
métodos, o outro, novo e renovador:
1º) a riqueza fonêmica da palavra geradora;
2º) as dificuldades fonéticas da língua;
3º) a densidade pragmática do sentido (Idem, p. 30-31).
A novidade do tal método estaria na forma de aplicar o
terceiro critério, portanto, já que os dois primeiros, referentes à sintaxe e à
semântica, foram importados de outros métodos e aplicados basicamente do mesmo
modo. E no que consiste a inovadora maneira freiriana de aplicar o critério
pragmático? Brandão esclarece que este diz respeito ao "[...] maior ou
menor teor de conscientização que a palavra traz em potencial, ou conjunto de
reações socioculturais que a palavra gera na pessoa ou grupo que a
utiliza" (Idem, p. 31).
Nesse sentido, Brandão acaba reconhecendo que os elementos
propriamente técnicos do tal "Método Paulo Freire" foram herdados de
outros que já existiam, e que a grande novidade estava em selecionar as
palavras que fossem mais úteis para direcionar as discussões em grupo de modo
tal a "conscientizar" os alunos, sendo que "conscientização"
deve ser entendida como sinônimo de "compreensão de mundo"
(Idem, p. 39 – itálicos no original).
Falando com franqueza, não parece lícito atribuir a Paulo
Freire a invenção de um método de ensino que leva seu nome se ele se serviu de
métodos já existentes e apenas mudou a forma de aplicar um dos critérios de
seleção de palavras geradoras de maneira a combinar o trabalho de alfabetização
de adultos com doutrinação ideológica de esquerda! E isso considerando
especialmente que o critério pragmático, ao contrário dos dois primeiros (que
são totalmente importados), não tem nenhuma relação direta com as operações
cognitivas que constituem o ato de ler. Não admira que Freire falasse tão pouco
de método em seus livros...
Diálogo enviesado
É claro que alguém poderia objetar que, embora Brandão
admita que as palavras geradoras são selecionadas propositalmente pelo seu
potencial de uso como instrumentos de "conscientização", não há como
predeterminar o resultado das discussões feitas com os alunos, o que
invalidaria ou ao menos relativizaria a crítica de que se estaria fazendo
doutrinação ideológica disfarçada de diálogo. Contudo, eu expliquei no
texto Paulo Freire e a
"educação bancária" ideologizada como funcionam
de fato essas discussões em grupo: o professor freiriano apresenta uma única
via para explicar as situações relatadas pelos alunos, que é a ideologia em que
ele acredita. Assim, o aluno é deixado na ignorância sobre a existência de
pesquisas que explicam as situações de pobreza, desigualdade, problemas urbanos
e ambientais, entre outros, fora do universo teórico e ideológico do professor!
Em suma, é muito forçado dizer que existe um "Método
Paulo Freire" de ensino, pois o que esse autor fez foi apenas transformar
métodos de alfabetização bastante antigos num processo de doutrinação
ideológica que se dá por meio de diálogos nos quais o aluno, deixado na
ignorância de explicações alternativas e mais sofisticadas, não tem poder nem
espaço para contestar os "novos saberes" que lhe são apresentados.
Paulo Freire: pobreza intelectual, dogmatismo e amor
assassino
Quando o jornalista José Maria e Silva publicou uma
crítica contundente ao mal chamado "Método Paulo Freire", na Gazeta do Povo,
esse jornal publicou também textos de freirianos para apresentar o famoso
"outro lado da questão" - muito embora os freirianos não proponham
apresentar visões de mundo diferentes aos seus alunos, conforme se vê pela
leitura de Pedagogia do oprimido (Freire, 1987).
Mas o que chama a atenção nessas respostas é que
os seguidores de Freire, na verdade, não respondem! Primeiro, eles usam o
argumento de autoridade, dizendo que Freire é o patrono da educação brasileira
e que trabalhou nesta e naquela instituição de prestígio. Depois, repetem a
velha cantilena de que o método de ensino que leva o nome dele teria tido
resultados impressionantes, ignorando o fato de os críticos desse método, como
Silva, alegarem que os resultados efetivos ficaram muito aquém da propaganda.
Por fim, citam uma ou duas passagens da obra de Freire sobre a educação ser um
"ato político" e sobre a importância de tornar o estudante
"sujeito de si mesmo". E param por aí! Em nenhum momento eles
procuram formular uma resposta específica para as críticas elaboradas contra o,
vá lá, "pensamento" de Paulo Freire. Repetem a velha fórmula de
propaganda do tal método como se esta já contivesse resposta para qualquer
crítica, e está feito.
Por que fogem do debate? Em parte, é claro, para tirar
proveito do fato de que a imagem de Paulo Freire como grande educador e suposto
inventor de um revolucionário método de alfabetização de adultos já está
fortemente entranhada entre os professores e na opinião pública. Mas a razão
oculta está no fato de que qualquer tentativa séria de defender as ideias
freirianas implica ter de admitir que estas não têm nenhuma base científica e
nem mesmo racional!
Em vez de ciência, fé ideológica
A melhor maneira de constatar isso é ler a obra freiriana,
como os livros Pedagogia do oprimido e Pedagogia da
autonomia, ambos já citados neste blog, que se caracterizam por um
simplismo de ideias constrangedor. Mas quem quiser ganhar tempo e ir direto a
um trabalho freiriano que deixa essa falta de fundamentação bem
explícita pode recorrer ao livrinho O que é método
Paulo Freire, comentado no post anterior. Após descrever os procedimentos
que compõem o método de alfabetização de adultos aplicado por Freire e seus
seguidores já em 1961, o autor, Carlos Rodrigues Brandão, escreve o seguinte:
Às vezes é muito difícil falar sobre as ideias que deram
origem ao Método Paulo Freire, porque elas são muito simples e algumas pessoas
precisam complicá-las.
Na verdade Paulo Freire não tem sequer uma teoria
pedagógica definitiva. Ele tem um afeto e a sua prática. Por isso fica difícil
teorizar a seu respeito, sem viver a prática que é o sentido desse afeto. Por
isso é fácil compreender o que ele tem falado e escrito, quando se parte da
vivência da prática do compromisso que tem sido, mais do que sua teoria, a sua
crença (Brandão, 1984, p. 102).
O que se vê nessa passagem da conclusão do livrinho é o
reconhecimento de que Paulo Freire e seus seguidores não têm como justificar a
suposta eficácia do tal método, já que os seus escritos consistem apenas em
ideias simples embaladas por palavras atraentes, como "afeto". Nesse
sentido, Brandão fornece a melhor comprovação da pertinência das críticas
lançadas contra a pobreza intelectual de Paulo Freire.
De fato, José Maria e Silva, no artigo citado, afirma
que Pedagogia do oprimido não passa de um panfleto político e
de um "manual de autoajuda marxista" exatamente por causa da pobreza
das ideias ali expostas. De modo similar, Sol Stern afirma
que essa obra nem ao menos pode ser considerada um trabalho sobre educação, já
que ignora todos os temas importantes nessa área do conhecimento ao longo do
século XX, tais como avaliações, padrão de ensino, currículo escolar, o
papel dos pais na educação, entre outros, e se perde em "platitudes
marxistas". E Brandão, ao reconhecer que não há mesmo nenhuma teoria ou
argumento racional que fundamente esse ou qualquer outro trabalho de Freire,
vê-se forçado a desqualificar críticas como essas da seguinte forma:
Como discutir com os termos complicados da ciência um
educador cuja ideia-chave é o amor?
Procure, leitor, folhear de alma limpa os
escritos dele. Aos olhos ferozes dos tecnocratas do poder e da educação, pode
ser que tudo aquilo não passe de uma espécie de poesia pedagógica, tão
edificante quanto inviável. E aos seus olhos? (Brandão, 1984, p. 103).
Trata-se aí de uma óbvia desqualificação intelectual
daqueles que acusam o simplismo dos escritos freirianos mediante a estratégia
de associar os críticos ao rótulo odioso de "tecnocratas do poder e da
educação". E, pior ainda, Brandão procura manipular as emoções de seus
leitores ao enfeitar sua exposição com palavras bonitas, como "amor",
e pedir-lhes que folheiem a obra de Freire com "alma limpa", pois
assim dá a entender que uma obra edificada sobre o "amor" só pode ser
compreendida por quem deixar a razão de lado e se entregar a uma apreciação
igualmente emocional do que está lendo!
As ideias de Paulo Freire são simplistas e dogmáticas, já
que não têm justificativa racional, e só podem ser admiradas por quem não leu
seus escritos ou por aqueles que leram esse material imbuídos das mesmas
ideologias superficiais do autor e do seu mesmo ideal de fazer da educação um
instrumento de doutrinação a serviço do socialismo. A quem duvidar disso,
proponho que aprecie, de "alma limpa", a seguinte passagem de Pedagogia
do oprimido, também citada por Silva, na qual o amoroso Paulo Freire elogia
os fuzilamentos praticados pela revolução cubana.
A revolução é biófila, é criadora de vida, ainda que, para
criá-la, seja obrigada a deter vidas que proíbem a vida (Freire, 1987,
localização 99).
Postagens relacionadas
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BRANDÃO, C. R. O que é método Paulo Freire. 7.
ed., São Paulo: Brasiliense (Coleção Primeiros Passos, v. 38), 1984.
FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 17. ed., Rio
de Janeiro: Paz & Terra, (Coleção O Mundo, Hoje, v. 21), 1987.
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