segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

Petrobras: sobrevivera' aos torpedos companheiros? - Editorial Estadao

Em 4 meses, estatal perdeu R$ 150 bi em valor de mercado 

FERNANDA NUNES, ANTONIO PITA / RIO - O Estado de S.Paulo /01Fev2015

Situação se agravou na última semana, com R$ 20 bi de perdas após divulgação de balanço e rebaixamento da nota 

O valor de mercado da Petrobrás minguou em R$ 150 bilhões, ou 58%, quase à metade, desde outubro, data reiteradamente relembrada pela presidente da empresa, Graça Foster. Naquele mês, a diretoria da empresa teve acesso aos depoimentos de Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento, e descobriu que cada projeto liderado por ele foi superfaturado em 3%, propina paga ao ex-funcionário por um cartel de fornecedores também investigados na Operação Lava Jato.

O cenário foi ainda agravado na sexta-feira, depois que a agência de classificação de risco Moody's rebaixou a nota da Petrobrás de Baa2 para Baa3. 

A última semana foi marcada por baixas sucessivas do valor de mercado da petroleira. O auge ocorreu na quarta-feira, quando, por volta das 4h da madrugada, o mercado tomou conhecimento de que R$ 88,6 bilhões do patrimônio, de um total R$ 597 bilhões, estão mal dimensionados - a maioria, superestimado. 

Consultorias independentes contratadas pela petroleira recomendaram uma baixa contábil de R$ 61,4 bilhões, mas nem todo esse valor diz respeito à corrupção. Há também um efeito de ineficiência de gestão, entre outras fragilidades. 

Na fatídica quarta-feira, a perda de valor de mercado foi de R$ 14 bilhões e, por fim, na sexta-feira, quando a Moody's rebaixou a nota da petroleira, foram mais R$ 6,94 bilhões. 

Ainda em outubro, quando tomou conhecimento da dimensão do rombo da corrupção no patrimônio, a diretoria da Petrobrás passou a lidar com outro fato de forte impacto no seu caixa: o preço do barril de petróleo iniciou uma trajetória de queda, despencando de US$ 100 para US$ 50 em cerca de três meses. 

O adiamento da divulgação do balanço financeiro relativo ao terceiro trimestre do ano passado por duas vezes agravou ainda mais a crise. Se considerado esse marco, a perda do valor de mercado até sexta-feira é de 44%, superior a R$ 57 bilhões.

Grau de investimento. O valor de mercado não é a principal preocupação da empresa. Segundo fonte ligada à cúpula da estatal, a grande preocupação dos conselheiros na reunião de terça-feira, era evitar a perda do grau de investimento, selo concedido pelas agências de classificação de risco às companhias de capital aberto de "primeira linha". Com esse selo, a Petrobrás obtém acesso a grandes investidores, como fundos de pensão no exterior. 

Os conselheiros consideraram que, se adotassem a baixa contábil de R$ 61,4 bilhões, a relação entre o endividamento e o patrimônio líquido, o nível de alavancagem, daria um salto. Com isso, os investidores perceberiam que a empresa está muito endividada, sem capacidade de investir, e não seria um bom negócio investir numa empresa com esse perfil de caixa. 

O resultado não auditado do terceiro trimestre de 2014, divulgado na quarta-feira, trouxe uma relação entre endividamento e patrimônio de 43%. A meta da empresa é alcançar o nível máximo de 35%. No esforço de evitar a elevação da alavancagem, a Petrobrás se comprometeu a não contrair nova dívida.

O professor do Insper e diretor da consultoria M2M, Eric Barreto, avalia que, sem a baixa contábil da corrupção, a situação da Petrobrás não é das melhores. O nível de dependência do dinheiro de terceiros onerado por juros, tecnicamente denominado "recursos onerosos", é de 40%. Com a baixa contábil, pularia para 43%, como demonstra estudo elaborado por Barreto para o Broadcast, serviço em tempo real da Agência Estado. 

A situação da Petrobrás, nesse ponto, é "preocupante", avalia o especialista, e pior que a de concorrentes como BP, Chevron, Shell e Exxon, segundo o estudo. Para cada R$ 1 do patrimônio da empresa, R$ 0,74 estão comprometidos com dívidas onerosas. Ou seja, o índice é de 0,74. Com uma baixa de R$ 61,4 bilhões dos ativos, passaria para 0,90, bastante acima do registrado, em média, pelas rivais da estatal, cujo índice é 0,20.

O que diferencia a Petrobrás das demais, explica Barreto, é que a petroleira brasileira costuma recorrer a bancos e ao mercado de capitais para se financiar, pagando altos juros, enquanto as outras são financiadas, em sua maioria, pelos fornecedores. Elas estabelecem prazos mais longos de pagamento por bens e serviços contratados.

.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-

Corrupção e incompetência 

Editorial/OESP/01Fev2015

A cada dia, a cada nova notícia, o escândalo da Petrobrás se revela mais amplo, mais complexo e mais difícil de entender em suas implicações financeiras e contábeis. Encontra-se, pois, sob grave ameaça o futuro daquela que já foi a maior e mais respeitada empresa estatal, motivo de orgulho para os brasileiros e de admiração no exterior. O que se torna mais claro e indesmentível a cada dia, a cada nova notícia é que, tomada de assalto pelos governos petistas e durante mais de uma década transformada em fonte de recursos para a promoção da imagem dos donos do poder, a Petrobrás acabou se transformando em um enorme pesadelo para a sociedade brasileira e para o próprio governo. Para este, de resto, sobra um merecidíssimo atestado de incompetência.

O enorme rombo provocado na estatal pela corrupção que a Operação Lava Jato trouxe à luz, aliado à crise provocada pela queda do preço internacional do barril de petróleo desde outubro e, ainda, à inépcia gerencial da empresa, levou a presidente da companhia, Graça Foster, a anunciar medidas amargas: nos próximos anos a exploração de petróleo será reduzida ao "mínimo necessário", investimentos serão cortados e novos projetos considerados com extremo rigor seletivo. Em resumo, a Petrobrás terá de ser "redimensionada", maneira eufemística de dizer que já se tornou uma empresa menor e menos importante.

O detalhe curioso - trágico talvez seja a expressão mais adequada - é que ninguém no corpo diretivo da empresa, da Diretoria Executiva ao Conselho de Administração, tem a menor ideia do tamanho do rombo. Os valores comprometidos com a corrupção são uma grande incógnita, segundo admite a própria diretoria da empresa ao justificar não tê-los abatido dos ativos declarados no balanço apresentado dias atrás: "Existem severas limitações que tornam a quantificação desses valores impraticável, tanto para fins de correção quanto para evitar capitalizações futuras". Uma auditoria independente indicou que seria preciso dar baixa a R$ 88,6 bilhões em ativos. Pode ser mais, como poder ser menos. Ninguém sabe.

O fato é que as declarações de Graça Foster levaram sua amiga Dilma Rousseff a mais um de seus acessos de irritação, que de tão frequentes e inconsequentes são cada vez menos levados em conta. A presidente teria esbravejado por causa do que considerou incompetência de Graça Foster ao divulgar de forma "amadora" os números da auditoria independente.

A chefe do governo pode se enfezar com o que quer que seja, mas, no caso da Petrobrás, a verdade é que ela teve quatro anos - um mandato inteiro de presidente da República - para promover o saneamento da maior empresa brasileira e levá-la a adotar padrões de excelência de governança, compatíveis com sua importância aqui e no exterior. Se não o fez, foi por incompetência, sua e do corpo diretivo que colocou na estatal.

Esta é a versão benevolente desta triste e obscura história, pois sempre ficarão no ar as perguntas que não se calam: ela deixou a situação chegar a esse ponto porque a esbórnia lhe era politicamente conveniente? E, depois de arrombadas portas e janelas, ela se preocupou realmente com a situação da estatal ou com as repercussões negativas do episódio sobre seu governo?

Afinal, não é descabida a hipótese de que a presidente da República, a quem seria impossível ignorar o que se passava na Petrobrás, tenha sido levada pelas "injunções políticas" a fazer vista grossa a uma armação que, na lógica safada de seu partido, era um "direito natural e legítimo" dos donos do poder. Nesse caso a incompetência do governo se limita ao fato de não ter sido capaz de abafar o escândalo. Seja como for, o fato é que Dilma Rousseff tem inegáveis responsabilidades pela situação em que se encontra a Petrobrás.

Como de hábito, pelo menos parte do preço de mais essa lambança na gestão da coisa pública vai acabar sendo paga pelos cidadãos, milhares de indivíduos que - como outro tanto de pessoas jurídicas - são acionistas da Petrobrás. Com a maior candura, o diretor de Finanças da petroleira anunciou que o pagamento de dividendos, na hipótese aparentemente remota de que existam, poderá ser "adiado". Esses acionistas devem estar perguntando, como a Nação: o que Dilma está esperando para trocar todo o corpo diretivo da Petrobrás?

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Comentários são sempre bem-vindos, desde que se refiram ao objeto mesmo da postagem, de preferência identificados. Propagandas ou mensagens agressivas serão sumariamente eliminadas. Outras questões podem ser encaminhadas através de meu site (www.pralmeida.org). Formule seus comentários em linguagem concisa, objetiva, em um Português aceitável para os padrões da língua coloquial.
A confirmação manual dos comentários é necessária, tendo em vista o grande número de junks e spams recebidos.