Brasil-naúsea
Marcos Troyjo
Folha de S. Paulo
Embrulho no estômago vem de sensação de desperdício de oportunidades e futuro não construído.
A imagem do Brasil no mundo encontra-se em corrosão. Oxidantes são fartamente oferecidos por nosso disfuncional governo.
Consultorias, agências de risco e bancos viram o polegar para baixo. Telegramas das embaixadas em Brasília às suas capitais pintam nosso imbróglio político-econômico de cinza. Dissemina-se uma “Brasil-náusea”.
A reputação no exterior é balanço de ativos e percepções. No campo objetivo, fundamentos macroeconômicos, desempenho de empresas, recursos naturais, projeção geopolítica. No subjetivo, valores da política exterior, capacidade de inovar, projeto nacional alinhado às grandes tendências do cenário global.
Ambas as frentes estão em desequilíbrio. O mundo segue para um lado, o Brasil, para outro. Daí “náusea”, que remete à instabilidade no mar. Águas revoltas – menor liquidez disponível aos emergentes, desvalorização de commodities. Barco sem rumo – capitã e tripulação batem cabeça e dificultam as severas e necessárias manobras do timoneiro das finanças.
Em anos recentes, a percepção do país já foi pior. Quando o PT tentou desplugar o “lulômetro” em 2002, Wall St. aconselhou que o melhor era não ganhar as eleições. Com o risco-país a 2.500 pontos, era a Brasil-fobia.
A Carta ao Povo Brasileiro, Henrique Meirelles e a Fazenda de Lula 1.0 produziram a inflexão. Pré-sal, apetite chinês por commodities, demografia e a alavanca do crédito nutriram o entusiasmo pelo país.
A política comercial-industrial supostamente contracíclica em 2008/9 fabricou os 7,5% de crescimento em 2010. Paul Krugman nos chamava de “queridinhos do mercado”. Superávamos o Reino Unido como sexta maior economia. Segundo Mantega, ultrapassaríamos a França agora em 2015. Era a Brasil-mania.
Oscilações na imagem internacional não são monopólio do Brasil. E mudanças de humor ocorrem rapidamente.
Antes da chegada de Raghuram Rajan ao Banco Central e a eleição de Narendra Modi, a Índia atolava-se numa paquidérmica estagnação. O primeiro tornou-se czar da economia em setembro de 2013. O segundo conta apenas 9 meses como primeiro-ministro.
No rescaldo da crise dos subprimes, decretava-se o declínio definitivo dos EUA. Hoje, com a elevação dos custos na China, refluem operações para a indústria norte-americana. Sua economia descola-se do marasmo europeu. Sua diplomacia volta a ser crucial na Ásia, Europa do Leste e América Latina. Agora, os EUA são vistos como superpotência “reemergente”.
O sentimento no exterior não é de que o Brasil se tornará um “Failed State”. O embrulho no estômago vem da sensação de desperdício de oportunidades, gerações que se consomem e futuro não construído.
Os próximos 18 meses serão de provação, mas o país é maior que fantasmas do curto prazo. Esta fase de Brasil-naúsea pode não ser de todo ruim. Talvez signifique que o sistema de defesa do organismo está funcionando.
Algo de errado – o modelo brasileiro de capitalismo de Estado – teria de ser expelido. Com isso, o país retomaria seu amplo patrimônio de potencialidades.
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