Em entrevista ao jornal O Financista, o cientista político Bolívar Lamounier afirma que "o impeachment deve vingar". O PT, diz ele, fará "uma defesa emocional" de Dilma, mas a recessão engrossará os protestos de rua - e isto será decisivo:
Esqueça os políticos de Brasília. Quem decidirá o desfecho do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, aceito pelo seu arqui-inimigo e presidente da Câmara, Eduardo Cunha, não serão os parlamentares. Será o povo, em manifestações de rua pró ou contra o impedimento de Dilma.
A avaliação é do cientista político Bolívar Lamounier, diretor da Augurium Consultoria. “Se houver uma manifestação importante, a alma do Congresso pode mudar”, afirma. No auge dos protestos contra Dilma, em março, quase 2 milhões de pessoas foram às ruas em várias cidades. A hesitação dos partidos de oposição (sobretudo, o PSDB) em apoiar claramente o impeachment e as divergências entre os líderes dos movimentos (há desde os que defendem o cumprimento da Constituição e até quem queira uma intervenção militar) esvaziaram as manifestações seguintes.
Agora, a temperatura pode voltar a ferver, segundo Lamounier, devido ao agravamento da recessão, à inflação alta, ao desemprego perto de 2 dígitos e à falta de perspectivas de que Dilma seja capaz de adotar as medidas corretas para redimir os erros de seu primeiro mandato. Para ele, a esperança de que, uma vez enterrado o impeachment, Dilma poderia governar tranquilamente “é um conto da carochinha”, simplesmente, porque ela já está lá há 5 anos. Leia os principais trechos da entrevista de Lamounier a O Financista:
O Financista: O senhor avalia que o processo de impeachment pode terminar com a saída de Dilma Rousseff da presidência?
Bolívar Lamounier: Se isso fosse um jogo de futebol, eu diria que o governo leva vantagem nesse começo. Isto porque o fator mais importante, até aqui, é que o pedido foi aprovado por Cunha [Eduardo Cunha, presidente da Câmara], que tem uma reputação muito ruim. Além disso, a oposição parece atordoada. Vamos ver as ruas. Há uma movimentação marcada para o dia 13. Se houver uma manifestação importante, a alma do Congresso pode mudar. Além disso, a economia está cada vez pior.
O Financista: Alguns políticos apontam 3 condições para o impeachment vingar: a pressão das ruas, o vice-presidente Michel Temer aceitar ser um governo de transição, sem se candidatar em 2018, e o PSDB assumir claramente uma posição. O senhor concorda?
Lamounier: De tudo isso, o ponto mais fraco desse encadeamento é o que se refere ao PSDB. Se houver uma pressão forte das ruas, o PSDB vai ter de se posicionar. Além disso, o partido não pode cobrar nenhuma posição de Temer. Se ele assumir a presidência, poderá governar com quem quiser, e como quiser. Pode se aliar, inclusive, com o PT, já que é o vice-presidente de uma chapa encabeçada pelos petistas. É verdade que já vimos o que isso significa... mas continuo achando que o fator decisivo é a rua.
O Financista: Pois é, mas muitos contestam a representatividade dos movimentos de rua. De um lado, quem defende o governo são sindicatos e movimentos ligados ao PT. De outro, quem quer o impeachment não tem representatividade partidária, institucional...
Lamounier - Mas eu acho que isso é uma vantagem: conseguir reunir 1 milhão de pessoas sem ser ligado a nenhuma legenda. Se os partidos chamassem uma manifestação de rua, não teriam força nenhuma. Não iria nem um quinto das pessoas que esses movimentos reúnem. Os partidos brasileiros estão falidos.
O Financista: E como o senhor vê os empresários no meio disso?
Lamounier: O que os empresários querem é que haja uma solução o quanto antes. Para eles, ou Dilma é afastada e um novo governo começa; ou ela é confirmada e começa a governar. Isso é um conto da carochinha. Dilma está no Planalto há 5 anos e não fez nada. Como os empresários cobrarão algo?
O Financista: Mas, ainda assim, haverá uma disputa dos 2 lados para desqualificar os adversários e enfraquecer as ruas, com a história dos petralhas versus a elite branca.
Lamounier - Sim, haverá um conflito de representações. Aparecerão as acusações de que os movimentos que apoiam o governo são pelegos, e quem é contra é a elite. Ambos têm um pouco de verdade, mas eu não subestimo a capacidade de reação do PT, neste momento. Isto porque, agora, a resposta terá elementos emocionais, tribais, de autodefesa.
O Financista: Com tudo isso, o senhor acredita que o impeachment será aprovado?
Lamounier: O tempo está a favor do governo, mas acredito que o processo tem boas chances de vingar. Primeiro, porque Dilma já está em seu segundo mandato. Por isso, tudo o que ela poderia barganhar, em troca de apoio político, já foi concedido. Não há mais muita margem. Depois, por causa da pressão das ruas, que deve engrossar devido à recessão.
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