Na França, o governo do presidente Emanuel Macron teve de recuar da decisão anterior, digamos inadequada, de aumentar um pouco mais o preço de mercado dos combustíveis fósseis – uma medida aparentemente racional, para induzir a um maior uso de combustíveis renováveis – e de aumentar ao mesmo tempo os impostos sobre esses combustíveis, com o mesmo objetivo "ecológico". Na verdade, o Estado francês não tem mais de onde tirar recursos, para compensar a defasagem entre o volume de receitas – pois a carga fiscal já supera 45% do PIB – e o total das despesas públicas, que supera 51 ou 53% do PIB, ou seja, com aumento constante da dívida pública.
A população em geral, congregada por militantes não partidários reunidos sob o símbolo dos "coletes amarelos" – vestimenta de segurança obrigatória no âmbito do trânsito – saiu às ruas para protestar contra esses aumentos, e o resultado foi o que se viu em termos de destruição de bens, enfrentamentos com a polícia, e o mal estar generalizado na política e na sociedade francesa.
O francês médio ainda não se deu conta da esquizofrenia criada por hábitos longamente mantidos no país, independentemente de governos conservadores, reformistas, socialistas, ou qualquer outro tipo de arranjo político: a população quer amplos serviços sociais – saúde, educação, habitação, previdência, etc. – mas ainda não se deu conta que a situação fiscal do país já chegou ao limite do suportável. Esse generoso Estado de bem estar social já não cabe mais no PIB e nas receitas de impostos, e portanto algum outro tipo de arranjo fiscal tem de ser encontrado: ou menos benefícios sociais, ou mais impostos (ou mais inflação e dívida pública, as outras duas maneiras de se enganar com o problema).
Compreendemos a angústia dos franceses, mas cabe reconhecer que eles estão vivendo uma equação impossível: querem que o Estado gaste mais com serviços coletivos, mas não suportam mais pagar por isso. Greves e protestos não vão resolver nada, mas já é um começo o reconhecimento de que algo precisa ser feito para evitar esse recurso do Estado a sempre arrecadar mais. Um dia, que espero em breve, os franceses vão ter de se convencer que estão na quadratura do círculo.
Isso me leva a tratar da situação brasileira, que é quase a mesma coisa. As despesas públicas não cabem mais nas receitas fiscais e não cabem mais no PIB.
O que vão fazer os dirigentes políticos? Passar a fatura à população, sob a forma de mais impostos, para suportar despesas públicas em crescimento constante?
Não se trata apenas de financiar os terríveis déficits da Previdência, em especial os privilégios dos aposentados do setor público, mas também o mandarinato do Estado em geral, um grande extrator de riquezas do resto da sociedade.
Quando teremos no Brasil uma revolta de equivalentes funcionais de "coletes amarelos"?
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 6 de dezembro de 2018
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