(...)
Durante os lazeres burocráticos, estudou, mas estudou a Pátria, nas suas riquezas naturais,
na sua história, na sua geografia, na sua literatura e na sua política. Quaresma sabia as espécies de
minerais, vegetais e animais que o Brasil continha; sabia o valor do ouro, dos diamantes exportados por Minas, as guerras holandesas, as batalhas do Paraguai, as nascentes e o curso de todos os
rios.
Defendia com azedume e paixão a proeminência do Amazonas sobre todos os demais rios do
mundo. Para isso ia até ao crime de amputar alguns quilômetros ao Nilo e era com este rival do
"seu" rio que ele mais implicava. Ai de quem o citasse na sua frente! Em geral, calmo e delicado, o
major ficava agitado e malcriado, quando se discutia a extensão do Amazonas em face da do Nilo.
Havia um ano a esta parte que se dedicava ao tupi-guarani. Todas as manhãs, antes que a
"Aurora, com seus dedos rosados abrisse caminho ao louro Febo", ele se atracava até ao almoço
com o Montoya, Arte y diccionario de la lengua guaraní ó más bien tupí, e estudava o jargão
caboclo com afinco e paixão.
Na repartição, os pequenos empregados, amanuenses e escreventes,
tendo notícia desse seu estudo do idioma tupiniquim, deram não se sabe por que em chamá-lo —
Ubirajara.
Certa vez, o escrevente Azevedo, ao assinar o ponto, distraído, sem reparar quem lhe
estava às costas, disse em tom chocarreiro: "Você já viu que hoje o Ubirajara está tardando?"
Quaresma era considerado no arsenal: a sua idade, a sua ilustração, a modéstia e honestidade
de seu viver impunham-no ao respeito de todos.
Sentindo que a alcunha lhe era dirigida, não perdeu
a dignidade, não prorrompeu em doestos e insultos.
Endireitou-se, concertou o pince-nez, levantou o dedo indicador no ar e respondeu:
—Senhor Azevedo, não seja leviano. Não queira levar ao ridículo aqueles que trabalham em
silêncio, para a grandeza e a emancipação da Pátria.
(...)
Leiam a íntegra aqui: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bv000159.pdf
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