Os telegramas confidenciais revelados pela CPI da Pandemia confirmam que o Itamaraty atuou corretamente nos contatos e nas informações, mas o Planalto e a Saúde foram além de INCOMPETENTES, praticamente criminosos nas negociações para aquisição de vacinas, com tomadas de decisão ESCANDALOSAS.
Paulo Roberto de Almeida
Governo Bolsonaro negociou Covaxin três vezes mais rápido que vacina da Pfizer, mesmo após alertas do Itamaraty
Negociação foi concluída em 97 dias, mas telegramas diplomáticos apontaram dúvidas sobre eficácia e segurança do imunizante indiano
Natália Portinari, Júlia Lindner e Paula Ferreira
17/06/2021 - 12:33 / Atualizado em 17/06/2021 - 13:16
BRASÍLIA — O governo brasileiro foi alertado em sucessivas ocasiões sobre "dúvidas" em relação à eficácia, à segurança e ao preço da vacina indiana Covaxin, mostram telegramas diplomáticos enviados à CPI da Covid pelo Itamaraty. Ainda assim, o processo de aquisição do imunizante foi o mais célere de todos, segundo documento do próprio Ministério da Saúde.
Enquanto o período entre a negociação e a assinatura do contrato para aquisição da Covaxin levou 97 dias, o processo para compra do imunizante da Pfizer demorou 330 dias, o prazo mais longo entre todas as vacinas. Nenhuma outra negociação demorou menos de 100 dias, aponta uma nota informativa da Saúde enviada à CPI.
A pressa ocorreu mesmo após alertas da Embaixada do Brasil em Nova Déli sobre dúvidas envolvendo as condições da aprovação da vacina na Índia. Os problemas foram informados ao Itamaraty no mesmo período em que o presidente Jair Bolsonaro citava a vacina como uma das "escolhidas" pelo governo brasileiro, junto à da Oxford, em carta ao premiê indiano.
A CPI investiga os detalhes envolvendo a compra da Covaxin — o imunizante mais caro adquirido pelo país, a R$ 80,70 por dose, quatro vezes o valor unitário da AstraZeneca. A comissão quer saber como a representante da fabricante no Brasil, a empresa Precisa, alvo de inquéritos do Ministério Público, lucrou com a transação avaliada em R$ 1,6 bilhão para fornecer 20 milhões de imunizantes. A vacina é produzida pela Bharat Biotech, companhia indiana.
Com o atraso para a aprovação do laboratório pela Anvisa, as 20 milhões de doses adquiridas pelo Brasil ainda não foram enviadas. Em março, o Ministério da Saúde tentou importar três lotes da Covaxin com prazo de validade perto do fim, mas foi impedido pela Anvisa.
A Embaixada do Brasil em Nova Déli informou os problemas no mesmo período em que o presidente Jair Bolsonaro citava a vacina como uma das "escolhidas" pelo governo em carta ao premiê indiano.
Em 5 de janeiro deste ano, a Embaixada informou que a autoridade sanitária da Índia havia aprovado a Covaxin e uma outra vacina, a Covishield (também conhecida como Oxford/AstraZeneca). Enquanto a vacina de Oxford já estava com a fase 2 e 3 de pesquisa em andamento, a fase 3 da Covaxin ainda não havia começado. O diplomata apontou que, segundo a imprensa local, seria difícil confiar nos dados finais de eficácia da Covaxin coletados após a aprovação.
"A imprensa (indiana) celebrou o iminente processo de vacinação e saudou os esforços dos cientistas indianos, mas levantou dúvidas com relação à aprovação sem dados finais de eficácia para ambas as vacinas e ao processo alegadamente opaco de deliberação dos órgãos oficiais, uma vez que não foram publicados os documentos que embasaram a decisão do painel de especialistas e do DGCI (autoridade sanitária indiana)", diz o telegrama enviado à CPI.
"Enquanto o 'The Hindu' destacou que a aprovação da Covaxin, ainda não testada, quase impossibilitaria uma boa condução da fase 3 de testes, o 'Mint' afirmou que a recusa do DGCI em receber perguntas após a coletiva de imprensa de anúncio da aprovação teria sido uma oportunidade perdida para afastar dúvidas com relação à eficácia e segurança das vacinas", aponta o documento de 5 de janeiro.
Os periódicos locais repercutiram também a desconfiança de especialistas em saúde "quanto à rapidez do processo de aprovação, que poderia minar a confiança do público na segurança das vacinas e levar a problemas no processo de vacinação". A embaixada notou ainda que quem tomaria a vacina deveria assinar um termo de responsabilidade e ser monitorado, já que a eficácia não era comprovada.
Em seguida, em 7 de janeiro, a Embaixada do Brasil em Nova Déli recebeu o presidente da Precisa Medicamentos, Francisco Maximiano, para uma reunião em que ele defendeu o negócio com a Bharat. Um dia depois, o presidente Jair Bolsonaro informou por carta ao primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, que a Covaxin havia sido uma das vacinas "escolhidas", junto com a AstraZeneca, pelo governo brasileiro.
Em 15 de janeiro, a embaixada relatou questionamentos sobre o preço da Covaxin. "Especialistas em saúde pública têm criticado o alto preço que o governo informou teria pagado por cada dose da vacina (USD 2,70 para Covishield, USD 4,10 para Covaxin), superior ao que os governos europeus estariam desembolsando pela vacina Oxford/Astrazeneca, sobretudo considerando-se os menores custos de fabricação na Índia." No Brasil, a vacina custou 15 dólares a dose, mais de R$ 80.
O mesmo telegrama informa ao Brasil que governos estaduais indianos questionaram a aplicação da Covaxin, preferindo optar pela vacina da AstraZeneca. "Após alguns Estados, a exemplo de Chhattisgarh, terem manifestado preocupação com relação à falta de dados de eficácia da Covaxin (...) o vice-ministro da saúde, Rajesh Bhushan, informou que nem governos estaduais, nem indivíduos poderão optar entre as duas vacinas", registrou a correspondência da embaixada.
Após os avisos, o governo assinou o contrato com a Precisa Medicamentos em 25 de fevereiro de 2021. Fechou o negócio, portanto, antes da Janssen e da Pfizer, vacinas cuja documentação sobre a eficácia era mais robusta, segundo especialistas.
Bolsonaro atacava OMS enquanto Brasil pedia à instituição socorro por vacinas, mostram documentos da CPI
Por Amanda Almeida
17/06/2021 • 12:28
Oito dias depois de Jair Bolsonaro chamar a OMS de “desacreditada”, em mais um ataque desferido à instituição durante a pandemia, o então ministro da Saúde Eduardo Pazuello pediu socorro ao organismo multilateral pela antecipação de vacinas.
O relato está em um documento sigiloso, em posse da CPI da Covid, encaminhado pelo Itamaraty às delegações permanentes do Brasil em Washington e Genebra.
Em uma carta enviada ao diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom, no dia 19 de março passado, reproduzida às delegações pelo Ministério das Relações Exteriores, Pazuello dizia que o país enfrentava “momento crítico da pandemia de Covid-19, com aumento significativo de número de casos e de óbitos”.
Segundo o então ministro da Saúde, “a melhor maneira de fazer frente a essa situação é seguramente por meio da vacinação acelerada de toda a população”.
E concluía: “é nesse contexto que peço pela antecipação do recebimento das doses de vacinas contra a Covid-19 contratadas pelo Brasil no marco da iniciativa Covax Facility. Do total de 42,5 milhões de doses contratadas, temos alocadas 9.122.400 doses da vacina AZD1222, com apenas 2.997.600 doses com entrega prevista para março corrente."
No consórcio internacional, o Brasil optou por somente metade das doses que poderia contratar, desistindo de mais de 40 milhões delas.
Uma semana antes do apelo de Pazuello à OMS, que citou a Tedros Adhanom as "prósperas relações" entre o Brasil e a instituição, Bolsonaro distorceu falas de dirigentes da organização para chamá-la de “desacreditada”, depois de já ter anunciado que o Brasil poderia deixar de fazer parte dela.
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