terça-feira, 30 de novembro de 2021

Brazil in the Global Nuclear Order, 1945-2018, a book by Carlo Patti

 Um dos maiores conhecedores, senão o maior, da questão no Brasil atual:

Brazil in the Global Nuclear Order, 1945-2018 

A questão de Taiwan e o interesse para o Brasil - Paulo Antônio Pereira Pinto

 Meu amigo e colega, Paulo Antônio Pereira Pinto, envia seu mais recente artigo publicado em Mundorama, da UNB, sobre a Questão de Taiwan e o interesse para o Brasil:


A questão de Taiwan e o interesse para o Brasil

Editoria Mundorama
Nov 30 · 10 min read

Paulo Antônio Pereira Pinto


Sobre o autor

Convite da revista Topoi: número especial - Qual Brasil? Projetos de nação em debate no contexto da independência brasileira

 

https://revistatopoi.org/site/dossie-tematico/

Dossiê temático

Chamada de artigos

Dossiê 2022, v. 23, n. 31, setembro-dezembro

Qual Brasil? 

Projetos de nação em debate no contexto da independência brasileira


Este dossiê tem por objetivo reunir artigos inéditos sobre o processo de Independência do Brasil, tendo em vista as várias visões que orientaram as ações das pessoas, as mobilizações e os movimentos que tiveram papel estratégico naquele contexto. 

No momento de sua independência, o Brasil era ainda uma entidade indefinida, com fronteiras instáveis no extremo norte e no sul; com uma população que englobava pessoas com diversas origens e relações com a terra, propriedade e autoridade real. Para alguns, os sentimentos nativistas estavam mais associados à província ou mesmo à vila de origem, enquanto para outros a conservação de sua unidade territorial era fator de definição do que deveria vir a ser o Brasil Independente. 

Ao mesmo tempo, os sentimentos dos portugueses com relação ao território, recentemente elevado a reino, também implicavam visões próprias do destino que se deveria dar ao Brasil no contexto dos debates das Cortes Constitucionais em Lisboa. Sentimentos separatistas no norte e no sul brasileiros encontraram ressonância na antiga metrópole e fizeram com que o processo de separação fosse mais difícil e prologado do que fazem crer os marcos temporais oficialmente estabelecidos. 


Nesse contexto, surgiram distintos projetos de um Brasil independente, desde os apontamentos que José Bonifácio enviou às cortes de Lisboa até as manifestações de Frei Caneca no âmbito da confederação do Equador; passando pelos argumentos da maçonaria do Rio de Janeiro, liderada por Joaquim Gonçalves Ledo; pelas reações contra a independência do português Silva Maia, na Bahia; identificando ainda tanto a presença de republicanos nesses debates quanto a quase ausência do tema da escravidão em uma disputa em que estava tão presente a palavra liberdade.


Neste dossiê reuniremos trabalhos que apresentem reflexões acerca de projetos e visões do Brasil que estiveram em disputa no contexto da Independência.


Os artigos a serem submetidos à avaliação podem ser escritos em inglês, espanhol e português e devem ser apresentados entre os dias 1º  de novembro de 2021 e 2 de fevereiro de 2022. 


O dossiê será publicado no número 31, volume 23, entre setembro e dezembro de 2022. 


Topoi. Revista de História é um periódico com revisão por pares publicado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), https://revistatopoi.org/site/


Os artigos devem ser originais e ter entre 40 mil e 60 mil caracteres, incluindo notas e referências. As submissões devem seguir as diretrizes do periódico Topoi sobre formatos de citação e submissão: https://revistatopoi.org/site/submissao/.


Os artigos e resenhas serão avaliados inicialmente pelas editoras do dossiês, quanto à sua pertinência ao mesmo e à qualidade do periódico. Caso a submissão seja aceita, os manuscritos serão avaliados por pelo menos dois pareceristas externos anônimos, nos sistema de revisão por pares, duplo-cego. Os autores serão informados da decisão até aproximadamente três meses após a submissão do manuscrito. 

A versão final revisada dos artigos será entregue em 1º de junho de 2022.


As inscrições devem ser feitas via ScholarOne, marcando a caixa que especifica o Dossiê Independência: https://mc04.manuscriptcentral.com/topoi-scielo


Topoi. A Revista de História é um periódico de acesso aberto, e não há cobrança de taxa de inscrição ou publicação.


Isabel Lustosa (CHAM/FCSH-Universidade Nova de Lisboa) e Kirsten Schultz (Seton Hall University), Editoras Convidadas

Luiza Larangeira da Silva Mello, Editora


Informações adicionais pelos e-mails: isabellustosa@gmail.comKirsten.Schultz@shu.edu ou topoi@revistatopoi.org

 

Casa Stefan Zweig: 140 anos do nascimento do autor de "Brasil, um país do futuro" - Webinar (5/05/2021)

140 anos do nascimento do autor de "Brasil, um país do futuro".

segunda-feira, 29 de novembro de 2021

Chile: mais avanços na democracia social ou retorno ao passado autoritário? - Cesar Maia (Estadão)

 KAST, BORIC E O PARADOXO DA POLÍTICA CHILENA!

Cesar Maia
O Estado de S. Paulo., 25/11/2021 

O segundo turno da eleição presidencial do Chile será uma corrida em direção ao centro, já que a maioria dos eleitores quer mudanças, mas sem radicalismos. Algum dos candidatos conseguirá isso?

Em um primeiro olhar, algo parece inexplicável: apenas um ano depois de 80% dos eleitores terem comparecido às urnas para pedir uma nova Constituição, e seis meses depois de escolherem a Assembleia Constituinte encarregada de redigir a nova Carta, com clara maioria à esquerda, no domingo, os chilenos demonstraram pluralidade no primeiro turno, ao votar em José Antonio Kast, um ex-deputado conservador que se opõe à nova Constituição e tem minimizado violações de direitos humanos cometidas pela ditadura militar.

Com um evidente impulso a seu favor, Kast tem agora chance real de se tornar o próximo presidente do Chile, no segundo turno que será realizado em 19 de dezembro. Estarão os eleitores chilenos se comportando de maneira errática? Estarão arrependidos do processo de redação da nova Constituição?

Eu argumentaria que não, que não há nenhum tipo de confusão nem arrependimento. No ano passado, a maioria dos chilenos queria – e continua querendo até hoje – mudanças pragmáticas e moderadas em políticas sociais e inclusão econômica, mas sem jogar a criança fora com a água do banho. Ainda que os chilenos queiram uma nova Constituição, que lhes conceda mais direitos sociais, eles também querem manter muitos aspectos do modelo econômico que levou seu país a tanta prosperidade ao longo das três décadas recentes. Querem que a nova Constituição garanta mais direitos sociais, mas também um governo que siga a lei e a ordem. A disputa pela presidência deverá ser vencida pelo candidato que articular melhor esse equilíbrio.

RUMO AO CENTRO. Conforme esperado, Kast e Gabriel Boric, esquerdista e deputado no segundo mandato, acabaram em primeiro e segundo lugar no primeiro turno das eleições presidenciais. Kast e Boric receberam, respectivamente, 28% e 25,7% dos votos – em linha com as previsões das pesquisas. Já que os outros 46% dos eleitores optaram por outros candidatos, a corrida para vencer o segundo turno obrigará Kast e Boric a conquistar esses eleitores.

Com um comparecimento às urnas pouco abaixo de 50%, o primeiro turno não atraiu mais eleitores do que as disputas presidenciais anteriores, colocando em dúvida a alegação de que os chilenos estão altamente polarizados e mais interessados em política do que nos pleitos anteriores.

É improvável que o comparecimento às urnas seja muito maior no segundo turno. Por isso, os candidatos terão de conquistar os eleitores cujas primeiras escolhas já não estão na disputa. Será mais fácil para Kast atrair eleitores que votaram no primeiro turno em Sebastián Sichel (12,7%), candidato do atual presidente, Sebastián Piñera. Por sua vez, será mais fácil para Boric atrair quem votou em Yasna Provoste (11,6%), candidata do Novo Pacto Social, de centro-esquerda (coalizão que ocupou o poder na maior parte do período dentre 1990 e 2018), e nos candidatos de esquerda Marco Enríquez-ominami (7,6%) e Eduardo Artés (1,5%).

Mas o grande trunfo serão os eleitores que votaram no candidato que surpreendeu a todos, terminando em terceiro lugar, com 12,9% dos votos: o economista Franco Parisi, que vive nos EUA e fez campanha somente pela internet (já que estava alegadamente impossibilitado de viajar ao Chile em razão de um processo que sofre por falta de pagamento de pensão alimentícia dos filhos). Ele já havia disputado a presidência anteriormente, em 2013, com uma plataforma populista de direita e amigável ao mercado.

Desta vez, Parisi fez campanha como candidato antissistema. Alguns desses eleitores poderão se abster, mas Kast tentará atraí-los com uma mensagem de igualdade de condições no capitalismo e respeito à lei e à ordem, enquanto Boric deverá tentá-los com segurança social e uma agenda moralmente progressista.

Em seu discurso de vitória, Kast falou diretamente com o eleitor médio, enquanto Boric colocou foco mais nos eleitores de esquerda e no grande desafio adiante. Ainda que inflamar as bases seja mais importante para Boric, ele também precisará do apoio de eleitores mais moderados, que se preocupam com sua falta de experiência, pouca idade (35 anos) e suas propostas radicais. Por sua vez, Kast precisará convencer eleitores de que é sensato e precisará abandonar propostas mais populistas de direita (como isenções fiscais e aumentos de gastos).

O campo político de Kast tentará transformar as eleições em uma escolha entre democracia e comunismo, enquanto o campo político de Boric tentará transformá-las numa escolha entre democracia e fascismo. Como ambos tentarão apavorar os eleitores em relação ao rival, veremos muita campanha negativa.

Como em outros segundos turnos de eleições presidenciais, os candidatos buscarão apresentar a si mesmos como moderados e qualificar o rival como radical. A população poderá acabar escolhendo entre o menor dos males e, quando o próximo presidente assumir, sua aprovação poderá despencar rapidamente, à medida que os eleitores se desapontarem com as prioridades de um presidente que não foi sua primeira escolha.

O próximo Congresso também será um ambiente difícil para aprovar reformas, com ambas as Casas tendendo um pouco à esquerda como resultado da votação do domingo, mas sem nenhuma maioria clara para os candidatos.

MENSAGEM. Como os candidatos de ambos os extremos ideológicos foram para o segundo turno, alguns podem se ver tentados a afirmar que os chilenos estão polarizados. Mais eleitores, porém, votaram em candidatos moderados – apesar do apoio fragmentado ter impedido que algum deles passasse para o segundo turno. Além disso, os chilenos sabem que todos os candidatos precisam adotar posições mais moderadas no segundo turno.

O país teve disputas em segundo turno em todas as eleições realizadas desde 1999.

Os chilenos também sabem que o impacto da eleição presidencial deste ano será mais limitado, já que uma nova Constituição está sendo redigida. Se a nova Carta realizar mudanças grandes o suficiente no sistema político, novas eleições poderão ser convocadas quando (e se) a Constituição for aprovada num referendo a ser realizado no segundo semestre de 2022. Colocado de outra maneira: o mandato tanto de Kast quanto de Boric poderia ser encurtado, e o Chile poderia adotar, por exemplo, um sistema parlamentarista.

Isso explica por que o impacto que a Assembleia Constituinte surtirá nas instituições políticas chilenas será muito maior do que qualquer prioridade política que o governo seja capaz de levar adiante. Na realidade, se a Assembleia Constituinte e o novo governo discordarem a respeito de prioridades, a Assembleia Constituinte terá a última palavra, já que completará a redação da nova Constituição meses depois de o novo governo ser empossado.

Como um conflito entre um novo governo que avance com suas prioridades e a Assembleia Constituinte, que tem prioridades próprias, parece possível, os chilenos poderão querer introduzir provisões de pesos e contrapesos votando por um governo capaz de restringir o ímpeto fundamental da Assembleia Constituinte.

De fato, quatro meses após iniciadas suas deliberações, mais chilenos rejeitam do que aprovam o trabalho que a Assembleia Constituinte está realizando. Assolada por escândalos e controvérsias em razão de comentários exagerados de alguns de seus integrantes (como mudar o nome do país ou alterar sua bandeira), a Assembleia Constituinte está começando a causar preocupações entre os que temem que a nova Constituição possa trazer mudanças demais.

Ainda assim, o crescente descontentamento em relação à Assembleia Constituinte não deve ser confundido com uma rejeição à nova Constituição. Da mesma maneira que pais descontentes com a escolha de seus genros, mas animadíssimos com o fato de que serão avós, os chilenos ainda adoram a ideia de ter uma nova Constituição que tornará seu país um lugar mais justo.

IGUALDADE. Mesmo sabendo também que redução de desigualdade de renda e mais oportunidades para todos dependem de uma economia forte, os chilenos parecem ter sinalizado na eleição de 21 de novembro que, agora que a Assembleia Constituinte está colocando o foco nas maneiras de distribuir melhor a riqueza, eles querem um governo que coloque o foco em fazer a economia crescer novamente e priorize a lei e a ordem.

Enquanto a campanha para o segundo turno está só começando, e Boric e Kast precisam duplicar a quantidade de votos que tiveram no primeiro turno para se tornar o próximo presidente do Chile, ainda é cedo demais para sabermos o nome do próximo líder. O que bem sabemos é que os chilenos recompensarão quem fizer um bom trabalho em convencer os eleitores moderados.

Priceless Roman mosaic spent 50 years as a coffee table in New York apartment - Gloria Oladipo (The Guardian)

Priceless Roman mosaic spent 50 years as a coffee table in New York apartment

Long-lost mosaic commissioned by Emperor Caligula disappeared from Italian museum during second world war

Architect Dario del Bufalo attends the exhibition of the Caligula Mosaic at the Museo delle Navi Romane in Nemi, Italy. Photograph: Ernesto Ruscio/Getty Images 

A priceless Roman mosaic that once decorated a ship used by the emperor Caligula was used for almost 50 years as a coffee table in an apartment in New York City.

Dario Del Bufalo, an Italian expert on ancient stone and marble, described in an interview with CBS’s 60 Minutes on Sunday how he found the mosaic.

In New York in 2013, Del Bufalo gave a lecture and signed copies of his book, Porphyry, about the reddish-purple rock much used by Roman emperors.

The book included a picture of the long-lost mosaic, which once formed part of a floor on one of two vast “party ships” commissioned by Caligula to float on a lake near Rome and sunk when the emperor was killed.

Nearly 70 years after that, as he signed copies of his book, Del Bufalo overheard a man and a woman say the woman had the mosaic they were looking at on the page.

“There was a lady with a young guy with a strange hat that came to the table,” Del Bufalo told CBS. “And he told her, ‘What a beautiful book. Oh, Helen, look, that’s your mosaic.’ And she said, ‘Yeah, that’s my mosaic.’”

Del Bufalo tracked down the young man, who confirmed that “Helen” had the mosaic in her apartment in Manhattan.

She was Helen Fioratti, an art dealer and gallery owner. According to an interview she gave the New York Times in 2017, she and her husband, an Italian journalist, bought the mosaic from an Italian noble family in the 1960s. When it arrived in New York, the couple turned it into a coffee table.

“It was an innocent purchase,” Fioratti told the Times. “It was our favorite thing and we had it for 45 years.”

The office of the Manhattan district attorney says evidence suggests the mosaic was stolen, possibly during the second world war. Returned to Italy, it went on display at the Museum of the Roman Ships in Nemi in March this year.

“I felt very sorry for her,” Del Bufalo said of Fioratti, “but I couldn’t do anything different, knowing that my museum in Nemi is missing the best part that went through the centuries, through the war, through a fire, and then through an Italian art dealer, and finally could go back to the museum.

“That’s the only thing I felt I should have done.”

Del Bufalo said he wanted to make a copy of the mosaic for Fioratti to keep in her apartment.

“I think my soul would feel a little better,” he said.


Die aktuellen Beziehungen Brasiliens zu den USA - Paulo Roberto de Almeida (Brasilicum)

 Um artigo publicado meses atrás, cujos dados editoriais recebi recentemente. Ele foi meu segundo trabalho publicado em alemão, sendo o primeiro meu livro Nunca Antes na Diplomacia, publicado em alemão, em tradução de Ulrich Dressel, sob o título de: 

Die brasilianische Diplomatie aus historischer Sicht: Essays über die Auslandsbeziehungen und Außenpolitik Brasiliens (Saarbrücken: Akademiker Verlag, 2015, 196 p.; Übersetzung aus dem Portugiesischen ins Deutsche: Ulrich Dressel; ISBN: 978-3-639-86648-3).


 

3907. “Relações do Brasil com os Estados Unidos”, Brasília, 4 maio 2021, 5 p. artigo baseado no trabalho n. 3783, em versão reduzida, para revista Brasilicum, a convite de Ekrem Eddy Güzeldere. Publicado, em versão traduzida para o alemão, sob o título de “Die aktuellen Beziehungen Brasiliens zu den USA”, na revista Brasilicum (edição 261, junho 2021, p. 23-26; ISSN: 2199-7594). Relação de Publicados n. 1429.


Vou postar as imagens da publicação em alemão, e depois transcrever a versão completa do artigo em português: 






Transcrevo o original em Português, na versão completa: 


Relações do Brasil com os Estados Unidos

 

 

Paulo Roberto de Almeida

Diplomata, professor no Uniceub, Brasília.

(Colaboração revista Brasilicum; Ekrem Eddy Güzeldere)

Publicado, em versão traduzida para o alemão, sob o título de “Die aktuellen Beziehungen Brasiliens zu den USA”, na revista Brasilicum (edição 261, junho 2021, p. 23-26; ISSN: 2199-7594). Relação de Publicados n. 1429.

 

 

Os Estados Unidos estiveram entre os primeiros países a reconhecer, em 1824, a independência do Brasil, antes da própria Grã-Bretanha (1825). A política externa americanista do início do Império só teria continuidade na República, 20 anos depois da fundação do Partido Republicano, em 1870, que tinha como slogan: “Somos da América e queremos ser americanos”. Os Estados Unidos já eram o maior importador do principal produto brasileiro de exportação, o café, e também foram os primeiros a reconhecer a República, em 1889, que assumiria o nome de Estados Unidos do Brasil.

Foram os monarquistas Rio Branco e Joaquim Nabuco, colocados a serviço da diplomacia republicana, que administraram a transição da preeminência europeia nas relações externas do Brasil para um inevitável equilíbrio com, e logo a predominância, dos Estados Unidos nos fluxos de todos os tipos; essa fase representou uma espécie de “aliança não escrita”. Os investimentos americanos no Brasil tiveram início após a Grande Guerra e as relações comerciais cresceram antes da Segunda Guerra, face à forte competição da Alemanha nazista. 

A partir da grande aliança consolidada por Oswaldo Aranha – embaixador em Washington, 1934- 1937; chanceler de 1938 a 1944 –, o Brasil conheceu um processo de “americanização”, reforçado no auge da Guerra Fria, com a assinatura do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (1947) e com Acordo de Assistência militar de 1953, que só será denunciado pelo general Ernesto Geisel, em 1977. Ponto alto nessa aliança foi o apoio americano por ocasião do golpe militar de 1964. A partir de meados dos anos 1960 começam a emergir fricções entre os dois países, não apenas propósito de questões comerciais (sobretaxas americanas a calçados ou café solúvel), e sim em questões mais relevantes do ponto de vista da hegemonia americana em questões de segurança internacional. O Brasil recusou o Tratado de Não Proliferação Nuclear por três décadas, até que o governo Fernando Henrique Cardoso – já no quadro da proibição do desenvolvimento de armas nucleares pela Constituição de 1988 – decide pela adesão ao TNP, para diminuir o cerceamento americano às tecnologias de ponta.

A diplomacia de Lula promoveu discreto bloqueio aos interesses americanos na região, começando pela implosão, em 2005, do projeto de uma Área de Livre Comércio das Américas, continuando com instituições exclusivamente latino-americanas, como a União das Nações Sul-Americanas. A Unasul passou a dispor, graças aos petrodólares de Hugo Chávez, de uma sede em Quito; ela abrigou um Conselho Sul-Americano de Defesa, valorizada pelos militares brasileiros, e um outro, voltado para a integração física. Mas, antes mesmo da grande ruptura trazida pela diplomacia bolsonarista na política externa brasileira, o continente já se fragmentava em propostas econômicas e políticas divergentes, depois da certa primazia esquerdista.

A administração Temer, que pode ser classificada como de transição, fez com que a política externa e a diplomacia profissional do Itamaraty retomassem os padrões anteriores de trabalho, de conduta e de orientação que sempre foram os seus nas duas décadas subsequentes à democratização, ou seja, a busca de autonomia no cenário mundial, o apoio fundamental ao direito internacionais e ao multilateralismo, o reforço (pelo menos tentativo) em prol da integração regional. As relações com os Estados Unidos foram corretas, mas não mais do que isso, uma vez que, a partir da eleição de Trump, no final de 2016, apenas alguns meses depois da transição definitiva do lulopetismo para a socialdemocracia, não havia tempo para que fossem tomadas grandes iniciativas no plano bilateral ou em outras esferas.

O retorno a uma coalizão centrista, quando do impeachment da presidente Dilma Rousseff, não significou a reconstrução dos antigos laços com os EUA, mas a simples retomada da diplomacia autônoma e equilibrada que foi a do Itamaraty desde o segundo governo do regime militar. A grande surpresa, antes do início do governo Bolsonaro, não foi o fato de se ter anunciado uma preferência por uma “relação especial” com os EUA, pois tal postura poderia ser enquadrada numa nova orientação hemisférica, ou “ocidentalista”, do Brasil, dissonante em relação ao que vinha sendo registrado nas últimas décadas – quando a política externa foi enfaticamente terceiro-mundista e moderadamente antiamericana –, mas ainda assim capaz de ser acomodada numa diplomacia pretensamente voltada para novas iniciativas com o grande parceiro tradicional do Brasil durante todo o século XX. Na verdade, o fato surpreendente foi uma adesão à pessoa do presidente Trump, no quadro da transformação das bases conceituais da diplomacia, que saiu da independência assumida em relação às grandes potências, da defesa do direito internacional e do multilateralismo, por uma rejeição deste último em nome de teorias conspiratórias da nova direita americana e contra a suposta ameaça do comunismo internacional (doravante representada pela China). 

As “inovações” tiveram início no dia da posse do presidente, quando o chanceler, na presença do seu parceiro americano, disse estar de acordo com a instalação de uma base americana no Brasil, para receber o rechaço dos ministros militares, e logo em seguida pela adesão do Brasil a uma aventura de Trump contra o governo Maduro, disfarçada de “ajuda humanitária à Venezuela, a partir das fronteiras do Brasil e da Colômbia. Ocorreu ainda o apoio solitário do Brasil, na companhia de Israel, à posição do governo americano de sanções unilaterais a Cuba, à eliminação pelos EUA, no Iraque, do general iraniano chefe das Brigadas Revolucionárias, assim como a um “plano de paz” de Trump para a Palestina. 

O presidente havia prometido uma diplomacia “sem ideologia”, e o que mais houve foi uma inversão completa dos padrões do Itamaraty: em lugar da avaliação técnica e de uma consulta estrita aos interesses nacionais, sempre conduzidos, até 2018, com absoluta isenção por um corpo de diplomatas profissionais, passou-se à consideração de elementos estranhos ao trabalho diplomático habitual, de fundo religioso, de oposição a um suposto comunismo ameaçador, de negação a quaisquer direitos de minorias sexuais ou de proteção às mulheres que poderiam representar “ideologia de gênero” (sic) ou possibilidade de aborto (que já está contemplado na legislação brasileira em casos especiais). A intromissão de elementos ideológicos da diplomacia do novo governo, especificamente vindos da franja lunática da direita alternativa americana fortemente influenciada pelo negacionismo das teorias conspiratórias também esposadas pelo presidente Trump, encontrou uma das expressões mais bizarras na acusação do chanceler ideológico de que a China estaria na origem de um “comunavirus” que teria sido disseminado pela China com o objetivo de fragilizar o Ocidente (que, para ele, teria um “salvador natural” no presidente Trump). 

Mais grave ainda, do ponto de vista do interesses materiais concretos do Brasil, foi representado por uma série completa de concessões unilaterais feitas pelo governo brasileiro a Trump, para ajudá-lo em sua tentativa de reeleição em 2020: importação sem tarifas de etanol e de trigo americano (contra interesses de produtores brasileiros e eventual importação adicional de grãos da Argentina); aceitação de novas restrições unilaterais, mediante salvaguardas ilegais, de aço e alumínio brasileiro (sem que o governo introduzisse uma reclamação na OMC); acompanhamento das posturas de Trump no casos de políticas de meio ambiente (uma ameaça potencial ao agronegócio), de antiglobalismo, de restrições a imigrantes, a denúncia pelo Brasil do Pacto Global das Migrações, um instrumento inócuo do ponto de vista da soberania nacional, assinado pelo Brasil três semanas antes de se encerrar o governo Temer. 

A diplomacia bolsonarista assumiu um total servilismo a Trump pessoalmente, o que confrontou os interesses nacionais: no comércio bilateral, nas posturas defendidas em órgãos internacionais, no relacionamento do Brasil com o principal parceiro comercial, a China, assim como no âmbito regional. Nesta área, um aspecto confrontou a política externa das quatro décadas anteriores: os esforços de integração regional, em especial, a construção de uma estreita relação com a Argentina. Suscitando a quase unânime rejeição da maior parte da opinião pública, em especial do agronegócio, na questão do meio ambiente, tal política veio a cabo no final de março de 2021, quando o chanceler ideológico foi substituído por um outro diplomata profissional, sem vínculos aparentes com a ‘franja lunática’ do governo Bolsonaro. O novo chanceler, Carlos Alberto França, empossado em 6 de abril, promete reequilibrar a diplomacia profissional – e, se possível, a política externa – nos moldes tradicionais conhecidos no Itamaraty desde muitas décadas; as dúvidas remanescentes derivam da postura do próprio presidente quanto ao conteúdo mesmo dessa diplomacia alternativa.

 

Paulo Roberto de Almeida

[Brasília, 4 de maio de 2021]

 

O artigo em alemão está disponível na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/62708889/3907_Die_aktuellen_Beziehungen_Brasiliens_zu_den_USA_Brasilicum_2021_).