A manipulação política da Petrobras: minhas explicações (fundamentadas)
Paulo Roberto de Almeida (10.10.2010)
Meu post anterior, que deveria ser uma simples transcrição do sério editorial do Estadão sobre a perda de valor patrimonial da Petrobras em função de sua manipulação pelo presidente da república,acabou se estendendo nos comentários condenatórios da ação do dito cujo, mais pelo lado das invectivas do que pelo lado das explicações.
Muitos leitores poderão, portanto, ter pensado assim: "ah, esse gajo [eu] é contra a Petrobras estatal, ele pretende vê-la privatizada, por isso diz essas coisas; ele é contra estatais em geral e a Petrobras em particular; pior, é contra o presidente da república, que quer preservar uma estatal num setor estratégico como o petróleo".
Certo? É o que pensaram vários de vocês?
Errado, eu digo, e me disponho aqui a dar algumas explicações sobre como eu vejo a (má) utilização da Petrobras pelo presidente da república, um ignorante em economia, um primário em gestão empresarial e, no entanto, presidente da república (uma coisa não impede a outra; já tivemos outros ignaros na presidência, e países ao lado tem jumentos).
Já escrevi alguma coisa sobre o petróleo, assim que me dispenso de retomar aqui meus argumentos sobre a essencialidade e o caráter estratégico dessa commodity. Ponto.
Desde 1997, a Petrobras foi levada a atuar como empresa, o que ela deveria ter feito desde a origem, e não fez, pois foi utilizada politicamente -- e para fins de política econômica -- por vários governos. Pois bem: desde que ganhou uma gestão isenta, profissional, isolada da política, a Petrobras cresceu, tremendamente, e se tornou a grande companhia que é hoje, isso num ambiente em que, pesem as mudanças no sentido da liberalização, as regras do jogo ainda são distorcidas, em função do enorme poder oligopolista dessa companhia, que de certa forma consegue "fixar" os preços de mercado, mesmo o mercado sendo teoricamente livre. Mas, sabemos que de fato não existe concorrência e que mesmo as distribuidoras privadas são obrigadas a seguir a Petrobras em seus preços.
Pois bem: todo mundo deve se lembrar - e se não se lembrarem eu me encarrego disso -- que depois de se ter convertido em companhia "comercial" -- parece óbvio mas não é -- a Petrobras disse que seguiria os preços do mercado internacional como referência para sua contabilidade interna, refletindo, portanto, no preço da gasolina ofertada internamente os altos e baixos dos mercados internacionais.
Isso de fato ocorreu, mas com algumas distorções, pois num mercado ainda oligopolista como esse, o preço dos combustíveis tem grande impacto nos índices de inflação.
Todo mundo também deve se lembrar que nas eleições de 2006, o governo fez pressão para que a Petrobras não aumentasse os preços internos, isso a despeito do enorme aumento do preço do barril nos mercados internacionais. Ele foi de 25 dólares em 2002 a mais de 140 dólares em 2006-2007, descendo um pouco depois disso. Todo mundo deve estar lembrado disso, mas aqui não houve alteração no preço da gasolina, durante a campanha eleitoral, o que deve ter gerado perdas para a Petrobras, ou pelo menos uma contabilidade distorcida.
Depois das eleições o preço subiu, subiu muito, e quando o petróleo despencou para menos de 60 dólares o barris, o preço interno não se moveu.
Conclusão: o brasileiro paga hoje uma das gasolinas mais caras do mundo, porque o governo resolveu "capitalizar" a Petrobras, que retem assim o dinheiro que deveria estar sendo "devolvido" aos consumidores.
Em qualquer hipótese, os preços no Brasil há muito deixaram de refletir as flutuações dos mercados internacionais (como aliás ocorre em países surrealistas no plano econômico como Venezuela e Irã).
Preços alinhados com os mercados internacionais são essenciais para refletir as verdadeiras condições econômicas em curso, para sinalizar aos investidores onde colocar o seu dinheiro, para estimular o uso de energias alternativas, enfim, por simples racionalidade econômica.
Se o governo mantem preços artificialmente baixos durante muito tempo, dá prejuizos à companhia, subsidia indevidamente a classe média que usa carro e estimula além da conta o consumo de um bem relativamente raro.
Se o governo por outro lado mantém preços absurdamente elevados, como faz agora, ele está extorquindo os consumidores, encarecendo o processo produtivo das empresas nacionais, fazendo-as menos competitivas no plano internacional.
Enfim, num ou noutro caso, ele deforma completamente as regras do jogo econômico e distorce as condições sob as quais uma empresa faz seus cálculos microeconômicos.
Existem muitas outras razões para a manipulação da Petrobras, algumas até de natureza mafiosa -- como o financiamento de sindicatos e de ONGs partidárias -- todas elas lamentáveis no plano da ética, da racionalidade econômica, da simples gestão administrativa.
Por essas e outras razões, os investidores internacionais -- que não são bobos ou mal informados como a média dos brasileiros (e isso não é preconceito, mas a simples realidade) -- tem desinvestido de ações da Petrobras, o que provocou a enorme queda revelada naquele editorial do Estadão.
Infelizmente, o Brasil tem primários conduzindo a sua economia e influenciando decisões importantes para o dia-a-dia dos contribuintes. Infelizmente somos reféns de ignaros em economia, se não formos objetos de chantagem de gente sem escrúpulos na gestão macroeconômica.
Infelizmente o Brasil não tem administradores nacionais à altura de suas responsabilidades, infelizmente não temos estadistas no comando da nação.
Paulo Roberto de Almeida
(10.10.2010)
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