Sei que o título do autor é outro, mas me pareceu pouco forte nas circunstâncias atuais. O Mercosul está atualmente mais para Kafka do que para Kundera.
Paulo Roberto de Almeida
A inevitável leveza do Mercosul
Carlos Malamud
InfoLatam-EFE, Madrid, 2 Julho 2012
Na última cúpula do Mercosul foram tomadas duas medidas consecutivas, quase simultâneas, relacionadas entre si. Para começar, os presidentes da Argentina, Brasil e Uruguai suspenderam a participação do Paraguai até a realização de eleições e a recuperação da “normalidade democrática”, alterada pelo impeachment de Fernando Lugo. Quase sem opção, os mesmos atores validaram a incorporação da Venezuela ao Mercosul.
A primeira coisa que podemos pensar após essas medidas é que Fernández, Mujica e Rousseff assinaram a carta de morte do mercado austral. No entanto, observando o processo de integração latino-americano, onde as numerosas instituições que vão surgindo nunca morrem de todo, o mais provável é que o Mercosul comece um longo período de hibernação e irrelevância.
O presidente do Conselho de Comércio Exterior brasileiro acha que os responsáveis diretos pelo fim do Mercosul são as autoridades argentinas. Apesar de ter sido a presidente Fernández, juntamente com seu ministro de Exteriores, os que dispararam o gatilho, valeria a pena não esquecer que Rousseff e Mujica validaram a ação. Por isso, cabe se perguntar o que o Brasil quer do Mercosul e qual é a sua utilidade futura, dado seu crescente peso internacional e sua aliança com os BRICS.
Posteriormente, a Unasul seguiu os passos do Mercosul e os países membros (Chile e Colômbia inclusive) decidiram suspender o Paraguai do bloco regional. Como ali reina o acordo político no lugar do comércio e dos interesses econômicos, os paraguaios não se deixaram afetar e disseram que cumprido o período de suspensão, o mais provável é que não se reincorporassem ao grupo.
Ocorrerá algo parecido com o Mercosul? A resposta dependerá basicamente do que acontecer nos próximos meses. Ao estar fora, ainda que seja temporariamente, o Paraguai se sentirá livre para negociar acordos bilaterais (de livre comércio, investimentos ou outros) com quem achar oportuno, começando pelos EUA e, inclusive, com a China, com quem ainda não tem relações. Também poderia ser possível uma negociação bilateral UE Paraguai, à margem do Mercosul, ainda que por enquanto isso seja pouco provável.
A China é um caso interessante e será um bom teste sobre o futuro do Mercosul. Durante a visita do premiê chinês Wen Jiabao à Argentina, foram anunciadas, em alto e bom som, negociações sobre um tratado de livre comércio (TLC) com o Mercosul. Isto ocorreu depois do impeachment de Lugo e do presidente Franco ser excluído da teleconferência na qual esse anúncio foi realizado. Para Pequim, sua ligação com Taiwan tem prioridade em relação a outros objetivos diplomáticos. Por isso, o reconhecimento do Paraguai, o único país da América do Sul que tem relações com Taiwan, poderia fazer valer a pena abandonar temporariamente as negociações impossíveis com o Mercosul.
Assim, o futuro do bloco regional será irrelevante por vários motivos. Primeiro porque atravessa uma situação de bloqueio muito séria, agravada pelo extremo protecionismo argentino. Em Mendoza, em território argentino, discutiu-se aumentar de 100 para 400 o número de produtos gravados com o imposto externo comum, o que foi recusado pelos brasileiros. Mas não só isso. As desavenças e o mal-estar entre Brasil e Argentina são crescentes, como mostrou a forte disputa entre as duas funcionárias dos ministérios de Comércio na cúpula de Mendoza.
A esta situação soma-se a incorporação da Venezuela ao grupo. Segundo o comunicado lido pelo ministroTimerman, esta decisão é irreversível. No entanto, muitos políticos e acadêmicos se perguntam sobre a legalidade da medida e o que poderia ocorrer depois da volta do Paraguai, no caso de que isto aconteça. De todas as maneiras e independentemente do futuro da Venezuela, por enquanto o que está garantida é uma maior politização do Mercosul e um menor peso em relação às questões comerciais e econômicas, que passarão a um segundo plano.
O rendimento da Venezuela como membro pleno do Mercosul também implicava a adequação da legislação venezuelana sobre comércio exterior aos regulamentos do mercado austral. Temo que pouco se tenha avançado em relação a este assunto, ainda que isto não represente um problema para ninguém. Como assinalou o presidente Chávez em uma breve intervenção telefônica, seu rendimento ao Mercosul é uma dura derrota para o império e para as burguesias servis. A grande dúvida que fica é se também é uma grande vitória para os povos que integram o Mercosul, que assim veriam suas condições de vida melhorar, ou se apenas será uma nova promessa, dessas às quais os que controlam a retórica bolivariana nos acostumaram.
Legal seu blog. O conteúdo que realmente se preocupa. Bom sou novo nesse lance então tô procurando me familiarizar. =D
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