BNDES-Tesouro, uma aliança ruim
Editorial O Estado de S.Paulo, 17/08/2013
Com previsão de desembolsos na faixa de R$ 185 bilhões a R$ 190 bilhões, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) poderá precisar de mais ajuda do Tesouro no último trimestre do ano, segundo o presidente da instituição, Luciano Coutinho. O Tesouro já emprestou R$ 280 bilhões ao banco entre 2009 e 2012 e contribuiu neste ano com R$ 15 bilhões para aumentar seu capital. O novo auxílio, segundo fontes de Brasília, poderá ficar entre R$ 20 bilhões e R$ 30 bilhões. O governo tem aumentado sua dívida bruta para conceder esses empréstimos, sempre subsidiados, e o resultado dessa cooperação tem sido, para dizer o mínimo, preocupante.
Ao converter o Tesouro em fonte de caixa para o crédito oficial, o governo recria, com pequena variação, a famigerada conta movimento, extinta no fim dos anos 80 depois de muitos estragos nas áreas fiscal e monetária. A relação promíscua entre o Tesouro e os bancos federais é apenas parte, mas muito importante, da crescente desordem na gestão das contas públicas.
Uma prova dessa desordem é o recurso cada vez mais óbvio do governo à contabilidade criativa para ajeitar seu balanço. A acomodação promíscua é recíproca. Do cofre do governo sai dinheiro para reforçar o caixa dos bancos. Esses bancos, em contrapartida, fornecem dividendos crescentes, e, até antecipados, para maquiar o resultado final das contas.
Autoridades econômicas falam de política anticíclica para justificar a transformação do Tesouro em fonte de financiamento repassado a empresas pelo BNDES. Essa tem sido a conversa desde 2009, quando foi instituído como instrumento provisório o Programa de Sustentação do Investimento (PSI), prorrogado várias vezes e ainda em vigor. Mas seria preciso, no mínimo, repensar totalmente essa política, tão custosa, tão perigosa para as contas públicas e abaixo de medíocre em seus resultados. A economia brasileira encolheu 0,3% em 2009, cresceu 7,5% em 2010, 2,7% em 2011, 0,9% em 2012 e para este ano as projeções estão abaixo de 3%. A maior taxa de investimento, nesse período, foi pouco superior a 19% do Produto Interno Bruto (PIB) e as perspectivas para este ano e para o próximo continuam desanimadoras.
Segundo o novo relatório do BNDES, apresentado na quarta-feira passada por seu presidente, os desembolsos no primeiro semestre, de R$ 88,34 bilhões, foram 65% maiores que os de janeiro a junho do ano passado. Em 12 meses o aumento foi de 39%. Esses números parecem apontar uma elevação importante dos investimentos. Mas os dados ficam bem menos entusiasmantes quando examinados com um pouco mais de atenção.
A maior fatia desses financiamentos, de 33%, foi destinada à indústria; a segunda maior, de 31%, à infraestrutura; e a terceira, de 20%, ao conjunto comércio-serviços. Mas o uso foi muito menos diversificado do que tem dado a entender o governo. A maior fatia do dinheiro destinado a esses três grandes itens foi aplicada na fabricação e no comércio de caminhões e ônibus - R$ 15,31 bilhões num total de R$ 74,5 bilhões, ou 20,5%.
Boa parte dessa demanda é explicável pelo crescimento da produção agrícola: safra recorde exige investimento em meios de transporte. Não por acaso os desembolsos para a agropecuária, R$ 6,83 bilhões, foram 142% maiores que os de um ano antes. A maior parte desses créditos, no valor de R$ 3,73 bilhões, foi para a compra de tratores e colheitadeiras.
A demanda de outros bens de capital cresceu bem menos. Pesquisas têm mostrado muita insegurança entre empresários urbanos, principalmente da indústria. A confiança nas perspectivas da economia é muito baixa e isso inibe o envolvimento em projetos de expansão e de modernização da capacidade produtiva. É fácil de encontrar as causas dessa desconfiança na política econômica improvisada e conduzida com muita teimosia.
Além disso, o BNDES continua dando mais atenção às grandes empresas. Com apenas 2% das operações, estas absorveram 57% dos desembolsos. Nos últimos 12 meses, levaram 63%.
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