Realmente, uma típica análise acadêmica sobre a política externa e a diplomacia brasileira nos anos gloriosos do Nunca Antes, e agora, nos anos depressivos da falta de lógica e de argumentos claros (fora dos discursos oficiais), se é que existem argumentos.
Os acadêmicos brasileiros, ou certo tipo deles, me lembram as análises do jovem Marx sobre os ideólogos alemães, que tomavam a aparência das coisas por sua essência.
Não preciso dizer mais nada, nem devo...
Paulo Roberto de Almeida
A política externa de volta à sombra
Adriano de Freixo e Thiago Rodrigues
Folha de S. Paulo, 6/08/2014
Adriano De Freixo, 45, é doutor em história social pela UFRJ e professor do Departamento de Estudos Estratégicos e Relações Internacionais da UFF (Universidade Federal Fluminense) Thiago Rodrigues, 37, é doutor em relações internacionais pela PUC-SP e professor do Departamento de Estudos Estratégicos e Relações Internacionais da UFF
Nos dois mandatos do ex-presidente Lula, o Brasil atingiu um grau de protagonismo internacional inédito em sua história. Retomando uma orientação autonomista de política externa –que remonta ao final da década de 1950 e fortemente enraizada em amplos setores do Itamaraty– e somada a uma ativa diplomacia presidencial calcada no prestígio internacional do ex-presidente, a "dobradinha" Lula/Celso Amorim alçou o país à condição efetiva de ator global.
Assim, a posse de Dilma Rousseff, em 2011, gerou a expectativa de que essas orientações gerais da política externa fossem mantidas, ainda que com a incorporação de novas ênfases. A princípio, isso parecia se confirmar com a sinalização de que questões como direitos humanos e meio-ambiente passariam a desempenhar um papel mais relevante na agenda de política exterior. Dilma se posicionou contra o apedrejamento de mulheres no Irã e, ao abrir a Assembleia Geral da ONU de 2011, lançou o conceito de "responsabilidade ao proteger" como proposta para a regulação das chamadas intervenções humanitárias.
No entanto, após quatro anos, pode-se afirmar que Dilma encolheu a política externa do país. O aparente desinteresse da presidente por política internacional e o estilo mais discreto dos ministros Antônio Patriota e Luiz Alberto Figueiredo contribuíram para certo imobilismo e muitas omissões do Itamaraty como, por exemplo, nas discussões conduzidas desde 2010 sobre a guerra civil na Síria.
No âmbito regional, o impulso dado por Lula à Unasul e à ampliação do Mercosul, assim como o papel autoassumido de mediador de crises na América do Sul, seguiu, no governo Dilma, apenas um curso inercial, o que também aconteceu com outras iniciativas, como a liderança militar na missão da ONU no Haiti, iniciada em 2004. O tema da "responsabilidade ao proteger", que gerou atenção e polêmica, foi praticamente abandonado pelo Itamaraty, enquanto a aproximação com países africanos perdeu ritmo.
O escândalo da espionagem norte-americana sobre o governo e empresas brasileiras, que emergiu em 2013, deu ao país a oportunidade de assumir uma posição relevante na crítica a esse tipo de prática, retomando um pouco do protagonismo internacional perdido. No entanto, depois de uma reação inicial –que incluiu um cancelamento de visita oficial aos EUA e a organização de um encontro da ONU sobre o tema–, a questão foi caindo no esquecimento. Até mesmo a recente assinatura do tratado sobre a criação do Novo Banco de Desenvolvimento –Banco dos BRICS–, que pode ser tida como a maior realização internacional de Dilma, concretiza um projeto iniciado pelo governo anterior.
No entanto, essa relativa perda de protagonismo está longe de ter transformado o Brasil em um "anão diplomático", expressão usada recentemente pelo porta-voz do Ministério da Defesa israelense e endossada por alguns dos nossos críticos liberais. Por sinal, a posição do governo brasileiro na condenação do uso desproporcional da força por parte de Israel em Gaza se aproxima de uma política externa bem mais assertiva do que a usualmente praticada pelo governo Dilma.
Não se trata de positivar o governo Lula, mas de constatar um nível de pretensão muito menor do governo Dilma em termos de projeção internacional para o Brasil. É possível que se argumente –bem ao gosto diplomático – que as linhas gerais dessa fase teriam sido lançadas por Lula e continuadas como "política de Estado" por Dilma. Em todo caso, a presença brasileira em temas e foros para o gerenciamento de questões internacionais diminuiu fazendo com o que o Brasil apareça menos no noticiário internacional de hoje do que em 2010.
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