Across the Empire, 2014 (14): Flanando em Vancouver
Paulo Roberto de Almeida
A palavra do título é um tremendo
galicismo, mas ela se aplica à ocasião: Walter Benjamin, um autor que
reencontrei na loja do museu de arte de Vancouver, que visitamos pela manhã,
era um adepto das flanêries em Paris.
O museu em si não é nenhuma maravilha de nenhuma arte: tem coisas modernas e
contemporâneas, horríveis e não visitáveis (no terceiro andar), e coisas
razoáveis e amplamente visitáveis, no segundo andar: arte regional canadense,
inclusive uma “escola flamenga” em pleno Canadá. O artista mais importante é Emily
Carr, presente com muitos quadros tanto de sua fase parisiense, quanto do
retorno ao Canadá, cem anos atrás.
Mas a lojinha do museu era muito boa, e como sempre eu fui direto na seção de livros. Lá encontrei a nova (talvez definitiva) biografia (crítica) de Walter Benjamin por Howard Eiland e Michael W. Jennings, da qual já tinha ouvido falar por notas ou mini-resenhas nos jornais, mas sem prestar muita atenção pois ainda não saiu uma daquelas grandes, na NYRBooks ou outros pasquins literários. A biografia é, em si, impressionante, tanto pelo volume (mais de 700 páginas), como pelas fontes utilizadas, as mais variadas possíveis, primárias, secundárias, depoimentos, correspondência, etc.. Encontrei na bibliografia o título que primeiro me introduziu à obra de Benjamin, a correspondência de Gershom Sholem com ele, que li numa edição francesa, no começo dos anos 1980: Histoire d’une Amitié. Mesmo sendo um judeu engajado, e religioso, Scholem foi um dos melhores amigos, senão o melhor, de Benjamin, um judeu ateu, ou agnóstico, e totalmente imerso na alta cultura germânica, mas grande admirador da modernidade, que vinha em grande medida da França (pelo lado literário) e da Grã-Bretanha (pelo lado prático). Em sua época, primeira metade do século 20 (na verdade só até 1940, pois ele morreu na fronteira da França com a Espanha, em Port Bou, tentando escapar dos nazistas), a Alemanha já tinha ascendido à condição de primeira potência europeia, tanto no domínio das técnicas, como no das artes, onde os vanguardistas se destacavam justamente na modernidade artística e arquitetural (mas também na música, nos musicais, no teatro, enfim, em tudo).
Benjamin teve de sair da Alemanha no
momento da ascensão de Hitler ao poder, em 1933, e foi para a sua cidade
preferida, Paris, ao passo que Gershom Scholem já tinha ido para a Palestina
britânica, como bom sionista que era. No Brasil se conhece pouco da obra de
Benjamin, basicamente o “panfleto” sobre a obra de arte na época de sua
reprodutibilidade técnica (estou citando de cabeça, e posso me enganar no
título), e seria recomendável que essa biografia fosse traduzida e publicada,
pois ela apresenta o essencial, numa perspectiva crítica, como diz o subtítulo.
Não comprei o livro, não tanto pelo seu volume, ou pelo seu preço (bastante
modesto para um livro dessas dimensões e ilustrado, mas talvez porque seja de
uma editora universitária), mas pelo fato de que ainda não terminei um outro
grosso volume, a biografia de Albert Hirschman (outro alemão que fugiu do
nazismo no mesmo momento da ascensão de Hitler) por Jeremy Adelman, que é
também espetacular.
Pela tarde, fomos ao Canadá Place,
um imenso embarcadouro projetado sobre um canal do mar, com imensos painéis da
história canadense. Carmen Lícia me fotografou em frente de um, sobre as
guerras sustentadas pelos súditos de Sua Majestade no dominion da América do
Norte, contra os vizinhos irriquietos do sul, sempre imperialistas, como diriam
alguns mais ao sul. Ao largo da costa, heliporto e embarcadouro de hidroaviões
de passeio por Vancouver, Vitória e imediações. Os navios vão passando ao
largo, carregados de conteiners. Isso ao norte do West End, que é a ponta mais
ocidental na qual estamos (sem contar a grande ilha Vancouver, mais a oeste),
mas plenamente urbana, aliás em pleno centro da cidade.
Depois fomos do outro lado, mar
aberto, justamente na English Bay beach, onde fica nosso hotel. Passeio a pé,
portanto, com direito a esculturas gigantes, gaivotas que parecem desprezar a
presença humana, e uma foca do Pacífico nadando tranquilamente a 20 metros da
praia. Desta vez não entrei no mar, pois estava muito frio, e de toda forma não
teria entrado mesmo; ficamos ali contemplando o por-do-sol, e Carmen Lícia fez
mais algumas de suas fotos profissionais.
Amanhã, ou melhor, hoje, 11 de
setembro (dia fatídico para dois países do continente), temos mais visitas:
museu de antropologia, talvez o mercado da ilha de Granville, e o que sobrar...
Vancouver é provavelmente uma das melhores cidades do Canadá, junto com
Montreal, sem desprezar Toronto (onde também vamos voltar desta vez) e Ottawa,
que é bonitinha, com seu parlamento estilo inglês, e seu museu cultural
excepcional e espetacular.
Mas é hora de ler mais notícias e
dormir quando o sono cerrar os olhos.
Paulo
Roberto de Almeida
Vancouver,
11 de setembro de 2014
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