quinta-feira, 17 de abril de 2025

Lula e Xandão: adeptos da reciprocidade equivocada - Paulo Roberto de Almeida

 Lula e Xandão: adeptos da reciprocidade equivocada

Paulo Roberto de Almeida

Nota sobre a aplicação equivocada do princípio da reciprocidade por dois dirigentes de instituições.


        Reciprocidade é um dos conceitos centrais das relações internacionais. Ela quer dizer que os Estados se tratam igualmente, pelo menos na letra fria dos acordos e dos tratados. Eu abaixo as minhas tarifas se você abaixar as suas. Eu vou abolir os meus vistos de entrada se você abolir os seus. Tudo muito bonito no papel e no território abstrato dos princípios.
        Acontece é que, como não existem duas pessoas absolutamente iguais, tampouco existem países, nações, formações estatais que sejam semelhantes, sequer similares ou próximos, ou seja, equivalentes em poder, capacidade, forças e fraquezas, abertura ou fechamento, cooperativos ou introvertidos. Não existe sequer estabilidade no comportamento dos países e na postura dos Estados, que trocam de governos, assim como as pessoas vão trocando de emprego, de carros, de roupas. Interesses, ganhos e concessões variam muito, desde a família até as relações entre Estados membros da comunidade internacional.
        Reciprocidade é, repetimos, um princípio básico nas relações internacionais, mas jamais isso foi aplicado de maneira uniforme.
        No Congresso de Viena (1815), tudo foi basicamente decidido entre quatro ou cinco grandes potências, inclusive a potência derrotada, a França, já na Restauração. Na conferência de paz de Paris (1919), tudo foi decido entre os chefes de Estado, ou de governo, de quatro países: EUA, Reino Unido, França e Itália, para desgosto de muitos outros. Não foi diferente em Ialta (1945), e o que dela resultou na Carta da ONU e sobretudo no CSNU.
        Já antes, em Bretton Woods (1944), não havia nenhuma distinção entre países ricos e países em desenvolvimento, e todos foram tratados como se fossem iguais, mas quem decidiu tudo, basicamente, foram os EUA e o Reino Unido.
        O Brasil foi, na história da ONU e sobretudo na trajetória do sistema multilateral de comércio, o país que mais lutou CONTRA a reciprocidade, pois que achava injusto o tratamento igual para países ricos e em desenvolvimento. Obteve vitória na reforma do GATT, em 1964, e na criação da Unctad, logrando consagrar o TRATAMENTO DIFERENCIAL E MAIS FAVORÁVEL para países em desenvolvimento, ou seja, estes poderiam receber concessões, vantagens, tarifas baixas ou zero, sem necessidade de reciprocar, ou seja, oferecer concessões equivalentes.
        E continuou assim, defendendo ardorosamente a não reciprocidade, pelo meio século seguinte, aliás até hoje.
        De repente, Lula se empenha a defender a reciprocidade na questão dos vistos, como se todos os países fossem iguais, na oferta e na demanda de viagens de turismo ou a negócios, ou como se todos os países devessem ser absolutamente recíprocos em sua política de fluxos humanos ou migratórios, independentemente das características de cada um, ou seja, SEM TRATAMENTO DIFERENCIAL, para justamente contemplar a não similaridade de situações, ou de competitividade, como na questão do comércio entre distintas economias.
        Depois, em face da ameaça irracional de Trump e seu tarifaço absurdo, Lula volta a falar em aplicar a "reciprocidade", como se isso, ou seja, a aplicação vingativa de tarifas iguais, pudesse melhorar as condições de comércio entre o Brasil e os EUA.
Ninguém importa nada de algum outro país apenas para fazer favor a ofertantes externos, mas simplesmente por uma questão prosaica de qualidade, preço e NECESSIDADE.
        Agora é o ministro da Suprema Corte Alexandre de Moraes que DENEGA a extradição de um criminoso comum, alegando falta de reciprocidade da Espanha na extradição de um criminoso político que não preenche os requisitos estabelecidos na legislação espanhola, ou sequer no tratado "recíproco" de extradição. Em 2010, foi a vez de Lula descumprir um tratado de extradição com a Itália, devidamente mandatado pelo STF, apenas para proteger um terrorista que se abrigava no rótulo de combatente de esquerda (contra um governo democrático).
        Desculpem-me dizer isso, mas ambos são dois desvairados da reciprocidade, um princípio geral, que nunca pode ser aplicado em todo e qualquer caso do relacionamento complexo entre países, assim como não pode ser aplicado entre pessoas, por mais que a Constituição assegure que todos são iguais perante a lei. Aliás, o PT e Lula são os primeiros a pregar e aplicar tratamentos desiguais para pessoas desiguais, na renda, nas oportunidades, nas condições próprias ou na situação pessoal.
        Reciprocidade é um princípio, não uma lei absoluta e obrigatória.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 17/04/2025

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Comentários são sempre bem-vindos, desde que se refiram ao objeto mesmo da postagem, de preferência identificados. Propagandas ou mensagens agressivas serão sumariamente eliminadas. Outras questões podem ser encaminhadas através de meu site (www.pralmeida.org). Formule seus comentários em linguagem concisa, objetiva, em um Português aceitável para os padrões da língua coloquial.
A confirmação manual dos comentários é necessária, tendo em vista o grande número de junks e spams recebidos.