Sinto ter de recorrer ao engraçado, mas patético, título do conhecido romance de Lima Barreto sobre um coronel que se acreditava predestinado, mas que acabou morrendo melancolicamente, embora eu creio que a metáfora se aplica: o Mercosul, pelo andar da carruagem (ou simples carroça) se aproxima do final, e ninguém parece muito preocupado com isso, como se fosse um fim de festa, ou talvez um "fin de règne"...
Nenhum país membro parece interessado no cumprimento de regras ou em negociações conjuntas com terceiros mercados. Pior: ninguém se preocupa mais em manter as aparências. Chefes de Estado e ministros sequer se dão ao trabalho de comparecer às cúpulas. Uma chatice, devem pensar: para que? Se é para sorrir amarelo, melhor ficar em casa...
Brasil cede e Mercosul prorroga listas de exceção à TEC até 2011
Daniel Rittner, de Montevidéu
Valor Econômico, 08/12/2009
Relações externas: Mudanças na tarifa foram as únicas definidas na esvaziada 38ª cúpula
Por pressão da Argentina, o governo brasileiro concordou em adiar o fim das listas de exceção à Tarifa Externa Comum (TEC), pilar da união aduaneira no Mercosul. Na abertura da 38ª reunião de cúpula do bloco, a decisão evidenciou as dificuldades dos quatro sócios em acertar a uniformização das alíquotas cobradas de produtos importados. Em vez de terminar em dezembro de 2010 e de forma gradual, conforme haviam prometido dois anos atrás, os países do Mercosul resolveram extinguir o mecanismo apenas em dezembro de 2011 e de uma só vez.
Embora esse seja o novo compromisso formal, diplomatas brasileiros admitiam ontem que dificilmente o prazo será cumprido. "A essa altura haverá até mesmo outro governo na Argentina e ninguém pode prever como se dará a discussão daqui em diante", dizia um diplomata.
Para proteger ou estimular setores específicos de suas economias, Brasil e Argentina podem colocar 100 produtos cada um em listas de exceção à alíquota conjunta cobrada no momento da importação. O Uruguai e o Paraguai têm direito a 125 e a 150 produtos, respectivamente, por serem economias menores e mais frágeis. Essas listas reforçam o que se chama de "perfuração da TEC". Ou seja, ao negociar em bloco acordos comerciais com outros países, o Mercosul se vê numa situação em que, na prática, cada sócio cobra uma tarifa de importação diferente.
Mesmo lamentando a decisão, negociadores do Itamaraty apresentaram argumentos para justificar que o recuo não era tão grave. "Temos mais de 9 mil posições tarifárias (produtos) e deixar 100 deles numa lista de exceção não é tanta coisa assim", afirmou um diplomata. A ministra argentina da Produção, Débora Giorgi, minimizou: "Não é nada novo. O sistema continua sendo exatamente o mesmo."
Além de prorrogar o mecanismo das exceções, os quatro sócios do Mercosul aceitaram o pedido brasileiro de aumentar a TEC para 11 produtos lácteos, cujas alíquotas passarão de 11% para 28%. Entre esses produtos estão leite em pó, soro de leite e algumas variedades de queijo. O objetivo é conter a entrada de lácteos provenientes da União Europeia e dos Estados Unidos que são subsidiados nos países de origem. A alíquota de 28% já vigorava no Brasil, que havia colocado esses produtos na lista de exceção à tarifa comum. Agora, com a uniformização da alíquota entre os países do Mercosul, o Brasil poderá alterar sua lista.
Também houve acordo para outras mudanças na TEC. Para evitar a invasão de matérias-primas chinesas, as alíquotas para fios e filamentos têxteis subirão de 14% para 18%. Já produtos como mochilas e bolsas de mão, a pedido da Argentina, terão tarifas de até 35% - vinha sendo cobrada alíquota de 16% a 18%.
Esvaziada de autoridades, a cúpula começou ontem com um encontro de ministros de Economia e presidentes dos bancos centrais. Guido Mantega e Henrique Meirelles, os titulares do Brasil no grupo, enviaram representantes. A reunião de chanceleres, prévia à dos chefes de Estado, não teve a participação do ministro Celso Amorim - do lado brasileiro, a delegação foi chefiada pelo secretário-geral do Itamaraty, Antônio Patriota.
O próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva planejava ficar poucas horas no Uruguai. Ele tinha chegada prevista à 1 hora de hoje e voltaria a Brasília logo após o almoço. Diante da ausência de muitas autoridades, chamou atenção a falta de novos acordos e mecanismos para aprofundar a integração regional. A cúpula deverá acabar se transformando apenas em um encontro de amigos, marcando a despedida do presidente do Uruguai, Tabaré Vázquez, que deixará o cargo em março. Seu sucessor eleito há dez dias, o ex-guerrilheiro tupamaro José Mujica, participará da reunião e fará sua estreia na arena internacional. A Argentina assumirá por seis meses, em seguida, a presidência pro-tempore do Mercosul.
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
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