O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

A politica externa de Dilma - Joao Bosco Monte

ANÁLISE INTERNACIONAL
Que esperar da politica externa brasileira em 2013
Joao Bosco monte
O Povo online (Fortaleza), 30/12/2012

Antes de tentar fazer uma análise do que pode acontecer em 2013 com relação à politica externa brasileira é importante destacar que nos primeiros dois anos de governo de Dilma Rousseff, as atenções do Palácio do Planalto estiveram mais direcionadas para assuntos domésticos, redundando em uma agenda internacional sensivelmente tímida.

Rousseff como a primeira mulher a ocupar a presidência do Brasil, fez o improvável e apostou, de forma pragmática, que o foco de suas ações deveria ser o cenário interno em seus dois primeiros anos de mandato. O resultado, talvez surpreendentemente até para o próprio governo, se traduz nos altos índices de popularidade de Dilma, considerada uma neófita na política e vista por muitos como uma mera extensão de seu predecessor e mentor,Luiz Inácio Lula da Silva.

De fato, embora Dilma Rousseff não tenha definido ainda qual é o foco da política externa de seu governo, o que se percebe, principalmente por diversas ações orquestradas pelo Itamaraty, é um direcionamento para as relações com a América do Sul e a África e no mundo em desenvolvimento, em geral. Por outro lado, também é interessante notar que isso não favoreceu para o prejuízo das tradicionais relações como Estados Unidos e a União Europeia, nosso principal parceiro comercial.

Mas o que parece importar neste momento é que a luz vermelha da economia nacional já está acesa há muito tempo e dados econômicos demonstram que o Brasil, cujo PIB (ou pibinho) em 2012 com muita dificuldade alcançará 1%, já não é a máquina de crescimento de apenas três anos atrás. Na verdade, o país que sobreviveu à maior crise de crédito mundial nos tempos modernos está crescendo menos do que os Estados Unidos, África ou os países dos BRICS.

Dilma Rousseff entende, portanto que o Brasil precisa dialogar de forma mais direta e contundente com os parceiros internacionais, abrindo dessa forma as portas para marcas e produtos brasileiros no exterior. Como sinal desta nova percepção, a agenda internacional da presidente brasileira em 2013 deve ser foi mais incisiva que nos anos anteriores de seu governo, quando visitou 17 países, num total de 15 viagens.

E parece que este novo momento já se pode notar com as últimas viagens ao exterior de Dilma. Em novembro deste ano ela esteve em Madri, e reafirmou seu desejo e o compromisso do governo brasileiro de dar um novo ânimo à parceria bilateral com o país ibérico.

Também foi notória a importância conferida às visitas oficiais realizadas recentemente à França e Rússia. Na capital francesa, o presidente François Hollande reiterou a intenção de aumentar a cooperação franco-brasileira e em Moscou a presidente brasileira se reuniu com o colega russo Wladimir Putin e o Primeiro Ministro Dmitry Medvedev. A principal ênfase foi a expansão do comércio e do investimento, a cooperação no âmbito BRICS e G20 e de forma objetiva temas ligados ao esporte. E neste item, é importante destacar que a Rússia sediará o Mundial de Futebol da FIFA em 2018 e os mesmos problemas enfrentados pelo Brasil, também são encontrados por lá. Para o ano de 2013, Rousseff já tem programada uma série de viagens: no roteiro se destacam visitas aos Estados Unidos, Chile, África do Sul e Índia e México.

O que deve ser levado em consideração neste momento de incertezas sobre o rumo da economia mundial é o Brasil por diversas razões não pode perder sua importância no cenário internacional: sua dimensão continental (ocupando quase metade da América do Sul), relativa proximidade geográfica com a África, Europa, América Central e Estados Unidos, importante provedor de matéria prima, população de quase 200 milhões de habitantes e o processo de modernização de seu parque industrial.

E aqui faço uma referência ao artigo da revista Foreign Affairs, intitulado Nova Política Externa do Brasil escrito por Jânio Quadros quando nitidamente previa a nossa transformação em uma potência econômica. O ex-presidente afirmou “Sairemos à conquista desses mercados; em casa, na América Latina, na África; na Ásia, na Oceânica, em países sob a democracia e naqueles que se uniram ao sistema comunista. Os interesses materiais não conhecem doutrina e o Brasil está atravessando um período em que sua própria sobrevivência como nação, ocupando uma das áreas mais extensas e privilegiadas do globo, depende da solução dos seus problemas econômicos.”

As ideias de independência e autonomia, ao mesmo tempo em que buscavam a ampliação das relações internacionais do Brasil com objetivos comerciais e sua participação nas decisões internacionais apresentadas em 1961, podem certamente ser aplicadas para os dias atuais.

Para onde deve então apontar a agenda internacional do Brasil na era Dilma Rousseff? O alvo das ações do governo brasileiro devem ser a China, Turquia, Indonésia ou Argentina? A saída parece messiânica e certamente não é fácil de responder. Mas a resposta pode se materializar se cada vez mais se evidenciar a proximidade e cumplicidade entre governo federal, governos subnacionais e empresas (estes dois simbolizando o que se conhece como paradiplomacia) e desta forma, se consolidar em trocas comerciais.

João Bosco Monte
Pos doutorado em Relações Internacionais Consultor internacional

"Em novembro deste ano ela esteve em Madri, e reafirmou seu desejo e o compromisso do governo brasileiro de dar um novo ânimo à parceria bilateral com o país ibérico"

"Para onde deve então apontar a agenda internacio
nal do Brasil na era Dilma Rousseff? O alvo das ações do governo devem ser a China, Turquia, Indonésia ou Argentina?"

1962: o ano que nao terminou nas relacoes internacionais - RBPI 2/2012, Editorial A.C. Lessa e P.R. Almeida

Um ultimo (acredito) trabalho publicado em 2012: o editorial que o editor Antonio Carlos Lessa e eu, como editor-adjunto, assinamos neste numero da RBPI, tratando de todos os temas ainda pendentes de 1962, cinquenta anos depois.

Editorial - O ano que ainda não terminou nas relações internacionais: 1962 nas páginas da RBPI, por Antônio Carlos Lessa & Paulo Roberto de Almeida

Cinquenta anos atrás, esta revista recém completava quatro anos, a partir de seu lançamento, em 1958. A periodicidade, estabelecida em seu número inaugural, se fazia à razão de quatro números por ano: a revista, portanto, abria o ano de 1962 com o número 17, já contando com o prestígio que lhe conferia a condição de ser uma espécie de “porta-voz” por escrito (embora informal) da política externa independente, inaugurada um ano antes com a ajuda do famoso artigo do presidente eleito Jânio Quadros na prestigiosa Foreign Affairs. A Revista Brasileira de Política Internacional (RBPI) republicou a versão original, em português, desse texto seminal da nova diplomacia brasileira na seção de documentos de seu número 16, de dezembro de 1961 (Nova Política Externa do Brasil, já, então, como “artigo do ex-Presidente Jânio Quadros”), junto com o texto integral da Carta de Punta del Este, conferência diplomática na qual tinha sido instituída a Aliança para o Progresso.
O que se poderia dizer a respeito do ano de 1962 é que ele ainda não terminou de acabar, tanto para a RBPI quanto para o próprio mundo; tantos foram e tantos ainda são, mesmo hoje, os processos ali forjados, ou os eventos então ocorridos que continuam a impactar o cenário contemporâneo. Sua continuidade é manifesta, seja na área da segurança estratégica – armas nucleares e não proliferação –, seja na questão do desenvolvimento – a partir da descolonização da África e de boa parte da Ásia –, nos primeiros passos da integração latino-americana, no deslanchar de mudanças nas regras do comércio internacional, ou ainda na própria revolução cubana.
O que, sim, terminou foi a bipolaridade estrita das duas grandes potências nucleares, numa época em que o Reino Unido já era estritamente alinhado aos Estados Unidos, em que a França recém começava a testar seus primeiros artefatos nucleares (no deserto argelino) e quando a China comunista ainda não havia se capacitado nessa área (o que ela faria apenas em 1964). O segundo grande contendor, a União Soviética, que desafiava os EUA pela voz de Krushev na Assembleia Geral da ONU, dizendo que o socialismo iria “enterrar o capitalismo”, já não existe mais. Não obstante o fato de que o atual cenário geopolítico se apresente sob outras roupagens, ele preserva, de certa forma, algumas feituras do anterior, ao preservar a divisão entre os cinco “mais iguais” do Conselho de Segurança e todos os demais, embora a República da China tenha sido finalmente substituída pela República Popular.
Vários outros temas, alguns de bastante atualidade, enchiam as páginas da revista, com um sabor que alguns americanos chamariam de déjà-vu all over again: tensão no Oriente Médio, corrida armamentista, Movimento dos Países Não Alinhados (MNA), valorização dos produtos de base, emergência do Sul e financiamento do desenvolvimento, entre outros ainda bem presentes no menu de todas as boas revistas de Relações Internacionais. Vale a pena, pois, conferir o que a RBPI publicou nesse ano que ainda não terminou. Uma nova visita aos índices do ano de 1962, meio século depois, pode ser útil, portanto, ainda que fosse apenas para confirmar tanto a importância diplomática e a relevância continuada de vários desses temas para os nossos dias quanto a essencialidade da RBPI para toda e qualquer pesquisa acadêmica que se empreenda, hoje, para uma retrospectiva da época ou para efetuar qualquer avaliação que se pretenda fazer, à distância, no que tange a agenda diplomática do Brasil naquela conjuntura.
O último número de 1961, publicado em dezembro, e circulando, portanto, no início de 1962, trazia artigos de diplomatas sobre as relações Brasil-Estados Unidos (Henrique Valle) e sobre o intercâmbio comercial entre o Brasil e a União Soviética (Paulo Leão de Moura), fluxos ainda engatinhando, depois de um primeiro artigo do ex-chanceler Oswaldo Aranha (n. 2, junho de 1958), defendendo, já sob a administração de Juscelino Kubitschek, a retomada das relações diplomáticas entre os dois países: se pretendia, então, a intensificação das vendas de café para os mercados socialistas. Naquele contexto, a RBPI refletia os primeiros passos da Política Externa Independente, com o seguimento das primeiras reuniões do MNA e a promoção de relações comerciais com a China de Mao. Por meio de artigos ou de notas tópicas, a RBPI seguia todos esses movimentos, profundamente desafiadores para a diplomacia brasileira de então.
A posição do Brasil na conferência de Punta del Este de 1961 está inteiramente refletida no artigo do intelectual Alceu Amoroso Lima, membro da delegação brasileira, no primeiro número de 1962 (ano 5, n. 17, março). Seguia-se um artigo do americano Richard Goodwin, sobre O futuro da liberdade e a Aliança para o Progresso, mas também um outro de Pedro C. M. Teichert sobre a América Latina e o impacto socioeconômico da revolução cubana. A seção de documentos trazia a posição do Brasil sobre a questão de Angola na ONU, onde se discutia a resistência do governo português em garantir a independência para sua maior colônia africana, como tinha ocorrido com quase todas as demais dependências europeias naquele continente; merecia ainda destaque nessa mesma seção a transcrição da Declaração dos Chefes de Estado ou de Governos dos Países não compromissados(como alguém traduziu os depois chamados não alinhados). O MNA acaba de realizar uma conferência em Teerã (agosto de 2012), talvez com as mesmas acusações às potências capitalistas que eram feitas em 1962.
O segundo número do ano (n. 18, de junho de 1962) se abria com um artigo do já prestigiado diplomata economista Otávio Dias Carneiro sobre o comércio entre o Brasil e a Europa Oriental. O jornalista nacionalista Barbosa Lima Sobrinho comparecia em seguida com um tema que animou as relações do Brasil com os Estados Unidos: O Brasil e a encampação de concessionárias estrangeiras. O historiador José Honório Rodrigues, que logo depois publicaria seu livro pioneiro sobre as relações entre o Brasil e a África (“novos horizontes”, como ele caracterizou), estava presente com um artigo sobre O presente e o futuro das relações africano-brasileiras. Mestre Gilberto Freyre criticava asIdeias errôneas sobre o Brasil e o então deputado Nelson Carneiro, depois conhecido como o “pai do divórcio no Brasil”, já se preocupava com A situação dos contratados das legações, ou seja, dos funcionários estrangeiros nas embaixadas do Brasil no exterior.
A seção Resenha desse número – na verdade compilando notas de atualidade – registrava a visita do presidente João Goulart aos Estados Unidos e ao México e a viagem a Washington do ministro San Thiago Dantas, buscando aliviar a difícil situação cambial em que se debatia então o Brasil. A seção de Documentos, por sua vez, trazia, entre outros atos de importância, um discurso na Assembleia Geral das Nações Unidas do Senador Afonso Arinos (que tinha sido chanceler de Jânio Quadros) sobre a posição do Brasil em Punta del Este, onde a questão central foi a postura de Cuba socialista em face do sistema hemisférico interamericano. Esse ponto permanece, portanto, embora o Brasil tenha hoje caminhado para reinserir plenamente Cuba no contexto latino-americano; no plano do balanço de pagamentos e da disponibilidade de divisas, a situação, hoje, é infinitamente mais confortável.
No segundo semestre, o número 19 (de setembro de 1962) se abria com um novo artigo do diplomata economista Otávio Dias Carneiro sobre um dos temas mais relevantes da diplomacia econômica brasileira durante décadas: o comércio internacional de produtos de base; eles são, ainda hoje, uma presença constante na pauta exportadora brasileira, até com maior intensidade do que nas décadas imediatamente seguintes, ocupadas pela promoção comercial e a busca de novos mercados para os produtos manufaturados brasileiros. José Honório Rodrigues também voltava a abordar O presente e o futuro das relações africano-brasileiras (II), enquanto o diplomata jurista Geraldo Eulálio Nascimento e Silva discorria sobre a conferência de Viena sobre relações e imunidades diplomáticas, ainda uma das bases das relações internacionais contemporâneas. Entre os livros resenhados, encontra-se a primeira edição da coleção de discursos e artigos de San Tiago Dantas, Política Externa Independente, que a Fundação Alexandre de Gusmão acaba de republicar, em nova edição ampliada com estudos contemporâneos.
Finalmente, o quarto número do ano (n. 20, de dezembro de 1962) se abria com um artigo do então secretário da Organização dos Estados Americanos (OEA), ex-presidente equatoriano Galo Plaza, sobre um problema infelizmente ainda atual na região: Problemas de educação na América Latina. Um outro, do ex-presidente da Costa Rica, José Figueres, também tocava em assunto recorrente, talvez não mais tão tenso, embora tampouco desprovido de conflitos: O comércio entre países pobres e ricos como causa de tensões. Um dos economistas pioneiros nas questões do desenvolvimento dos países então chamados de subdesenvolvidos, Arthur Lewis, comparecia com um artigo sobre osProblemas econômicos do desenvolvimento.
Esses foram, portanto, os principais assuntos abordados nas páginas da RBPI em seus quatro números de 1962. Curiosamente não comparecia o grande assunto do ano, a crise dos foguetes soviéticos em Cuba, ocorrida em duas semanas tensas de outubro, provavelmente pelo caráter absolutamente imediato daqueles eventos dramáticos, que ameaçaram, de fato, deslanchar pela primeira vez um enfrentamento nuclear entre as duas grandes potências. O tema estaria presente, contudo, em diversos números posteriores, como ainda percorre as páginas de vários periódicos importantes da área.
Nos números seguintes, a RBPI continuaria a abordagem dos grandes temas da agenda diplomática mundial e brasileira, com artigos e ensaios de autores brasileiros e estrangeiros: Associação Latino-Americana de Livre Comércio (Alalc) (Henrique Valle), comércio internacional de produtos de base (Otávio Dias Carneiro), África (Arthur Cézar Ferreira Reis), o incidente nas relações Brasil-França causado pela chamada “guerra da lagosta”, além do seguimento dos projetos da Aliança para o Progresso. Já nessa época se discutia a desnuclearização da América Latina, que seria objeto do Tratado de Tlatelolco, de 1967, não muito bem-visto pela diplomacia brasileira.
Pouco adiante, em meados de 1963, a revista registrou a assinatura do primeiro instrumento de contenção da proliferação, o Tratado de Proscrição das Experiências com Armas Nucleares na Atmosfera, no Espaço Cósmico e sob a Água, tema ainda atual, embora o Comprehensive Nuclear-Test-Ban Treaty (CTBT), o tratado de proscrição completa dos testes nucleares, dos anos 1990, não tenha ainda entrado em vigor. Um outro número desse ano trazia a resenha de um livro, já então sob a forma de alerta, do famoso economista Robert Triffin, sobre o ouro e a crise do dólar, denunciando as fragilidades do sistema de Bretton Woods e antecipando e prenunciando o fim da era do padrão ouro-dólar, o que só ocorreria dez anos depois.
Todos esses exemplos, recolhidos um pouco aleatoriamente nas páginas da RBPI entre o final de 1961 e o início de 1963, demonstram como a conjuntura de meio século atrás ainda impregna o panorama atual das relações internacionais, tanto em seus aspectos políticos e de segurança estratégica quanto nos seus elementos econômicos e sociais. Uma releitura desses números, sobretudo os de 1962, nos instrui, realisticamente, sobre a imanência dos grandes temas da agenda diplomática internacional e brasileira, confirma, infelizmente, a modéstia das capacidades humanas em transformar positivamente o mundo, mas nos enriquece, intelectualmente, sobre a grande marcha da história e sobre as grandes e pequenas tragédias da política internacional.
A RBPI, que nasceu sob essa conjuntura histórica de transformação – que ainda é a nossa, meio século depois –, continua a alimentar o debate, o conhecimento e a pesquisa sobre esses temas cruciais das relações internacionais. Já tendo completado, ela mesma, 54 anos de existência continuada, a RBPI promete continuar, nos próximos 46 anos que a separam de seu primeiro centenário, o mesmo trabalho de compilação de análises relevantes sobre a atualidade internacional. Se recordar é viver, como diz a canção popular, a RBPI tem vida longa pela frente.
Temos trabalhado intensamente no resgate da nossa memória, do acervo de artigos, estudos, análises e documentos publicados ao longo da nossa trajetória. Todos os números da RBPI estão digitalizados e estão sendo progressivamente incorporados a bases de dados acessíveis a todos os pesquisadores. A denominada série Rio de Janeiro está inteiramente disponível no projeto de divulgação científica Mundorama (disponível em ).
Ao mesmo tempo, temos operado importantes mudanças na nossa linha editorial, justamente para que essa extraordinária tradição possa se renovar em parâmetros modernos e de elevada competitividade. Fizemos a partir deste número um novo e importante ajuste na política editorial da RBPI: a partir da próxima edição publicaremos apenas contribuições em inglês e em português, privilegiando os trabalhos em língua inglesa. Esta edição, portanto, é a última em que publicamos trabalhos em espanhol. Incentivaremos os nossos autores a submeterem as suas contribuições em bom inglês, ou buscaremos meios para traduzir em número crescente os artigos mais impactantes. É nosso desejo que, em pouco tempo, o formato impresso circule predominantemente em língua inglesa, ao tempo em que cuidaremos para que versões em português sejam publicadas paralelamente na nossa página no Scielo.
Entendemos que esses são ajustes que nos permitirão perseverar com a sincronização das nossas tradições com o perfil de uma revista moderna e inspirada por uma visão arrojada e cosmopolita de procedimentos e políticas editoriais, uma publicação que soube se renovar e se fazer a cada dia mais relevante, publicando ciência impactante tanto para a comunidade brasileira de Relações Internacionais quanto para o crescente número de especialistas de outros países que se motivam em acompanhar o debate especializado no nosso país.

Antônio Carlos Lessa é Professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB), editor da Revista Brasileira de Política Internacional (RBPI) e pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) (aclessa@gmail.com).Paulo Roberto de Almeida é Professor do Centro Universitário de Brasília (Uniceub), diplomata de carreira e editor-adjunto da RBPI (pralmeida@me.com).

Balanço de um ano feliz: viagem, estudos, novos projetos - Paulo Roberto de Almeida


Balanço de um ano feliz: viagem, estudos, novos projetos

Paulo Roberto de Almeida
Último trabalho de 2012

Este é meu último texto de 2012, escrito na madrugada do dia 31, quando ainda tenho diversas tarefas a cumprir durante o dia, antes de terminar o ano. Pretendo tecer aqui algumas considerações sobre, respectivamente, o que foi feito, isto é, o que eu consegui fazer durante o ano que hoje se encerra, o que faltou fazer – e foi muita coisa, a julgar pela minha pasta, que deixo de herança para o ano que inicia amanhã – e o que pretendo fazer em 2013, se por acaso as musas da inteligência, da arte da reflexão e da escrita (existem estas, por acaso?; digo especificamente) forem generosas comigo, e me permitirem uma produtividade igual ou maior do que nos anos precedentes.
Talvez eu devesse começar pelo que eu deixei de fazer, uma vez que o resto do texto será dedicado a um balanço de 2012, com uma contabilidade “escritural” e alguma avaliação de tipo qualitativo. Eu havia prometido escrever um texto sobre as relações Brasil-Bélgica, para um livro coletivo, até o final do ano, e não consegui fazer, em função dos preparativos da próxima mudança para os Estados Unidos, onde devo começar a trabalhar no Consulado em Hartford, escolhido em virtude de sua posição estratégica entre grandes universidades americanas. Claro, deixei de cumprir também várias outras tarefas, auto-assumidas na maior parte dos casos, outras encomendadas no ambiente acadêmico em que me movimento, paralelamente ao trabalho oficial na diplomacia, outras ainda surgidas por acaso, de um impulso do momento, ou de uma inconsequência intelectual, provavelmente de uma incontinência da escrita, um desses males que cultivo, não impunemente, junto com essa outra loucura dos livros e da leitura, já chamada de “gentle madness” por algum outro viciado dessa área.
Talvez eu devesse caracterizar minhas atividades essenciais, as que sempre me acompanharam em minha vida adulta, ou talvez mesmo antes, desde a mais precoce adolescência, como integradas por estas quatro práticas: ler, refletir, escrever e divulgar. Ler, sempre o fiz, desde que aprendi a técnica numa infância que classifico como tardia: apenas aos sete anos de idade, e isto porque minha casa não exibia nenhum material de leitura, sendo meus pais alfabetizados apenas parcialmente, já que não conseguiram terminar sequer o curso primário. Refletir, também o fiz, embora talvez de maneira não sistemática, provavelmente ajudado pela circunstância de que escolhi ter poucos amigos, não jogar futebol ou me juntar aos outros bandos de garotos e adolescentes do bairro, preferindo ficar na biblioteca ou lendo os livros que trazia quase todos os dias para casa, para continuar a leitura a contra luz, deitado na cama, um dos poucos lugares tranquilos numa casa pequena demais para todos os membros da família. Escrever, também comecei a escrever desde que dominei a técnica, mas infelizmente não guardei esses registros das primeiras composições escolares; e o que tinha acumulado como notas, resenhas e trabalhos escolares até os dezoito ou vinte anos de idade, ficaram para trás e se perderam, na mudança voluntária para a Europa em 1970. Divulgar foi mais raro, embora me recorde de uma primeira resenha de livro – de Erich Fromm, um alemão refugiado do nazismo nos Estados Unidos – que ficou para trás, num desses jornais impressos a mimeógrafo do diretório acadêmico do curso colegial; os escritos do ginasial, onde também participei de boletins escolares, se perderam todos, com uma única exceção (que um dia divulgarei, mas é perfeitamente inocente). Desde então, consegui divulgar, e até publicar, com maior intensidade, talvez até devendo passar para a auto-publicação, com todos os recursos atualmente disponíveis para tanto.
Retornando agora ao que deixei de fazer, a principal delas, a que está em meus working files desde 2001, pelo menos, é o segundo volume da história da diplomacia econômica no Brasil, que me comprometi a elaborar em três partes desde a concepção original do projeto, ainda na primeira metade dos anos 1990. Talvez eu consiga terminar o projeto, incluindo um terceiro volume para o período posterior a 1945, em meados da presente década, mas isto à condição que retome o trabalho no segundo semestre de 2013, depois de terminar o seminário sobre o pensamento brasileiro em política internacional, que me comprometi a fazer para a Fundação Alexandre de Gusmão. Tem também uma lista inteira de trabalhos ou livros inacabados, que tentarei avançar de modo paralelo aos encargos já inscritos para o primeiro semestre (e que compreendem a finalização de um livro coletivo sobre o Mercosul e diversos outros trabalhos anotados na agenda de trabalho imediata. Mas deixo a lista para lá, pois arriscaria ser incompleta além de aborrecida (e alguns deles estarão também na lista deixada para 2014).
Passando agora o que consegui fazer, talvez alguma contabilidade elementar ajudaria na avaliação quantitativa, pelo menos. Comecei o ano pelo trabalho n. 2.349 e estou terminando por este aqui, que leva o nº 2.457; são, portanto, 108 trabalhos completos, sem que eu dê agora o trabalho de contar o volume de páginas escritas (farei uma contabilidade detalhada nos primeiros dias de 2013). Em todo caso, essa mais de uma centena de trabalhos no ano representa exatamente nove trabalhos por mês, ou um trabalho a cada três dias (não contabilizadas aqui vários outros trabalhos incompletos, ou em curso de redação, e notas para futuros trabalhos). Com base na contagem das páginas escritas, poderei calcular quantas páginas por dia, ou por mês, e qual a média de páginas por trabalho, sendo de se esperar uma enorme variação entre eles. Falarei sobre os mais importantes mais tarde, sendo apenas de se destacar o livro sobre integração regional que preparei para a Editora Saraiva e que deve ser publicado no início de 2013. Outros virão, certamente, e ainda no decorrer de 2013, pelo menos assim espero.
Deixando de lado o balanço quantitativo, quero apenas referir-me ao título deste último trabalho do ano: foi, sim, um ano feliz, que comecei com uma viagem pessoal de estudos e termina agora pelo que sempre gostei de fazer: elaborando novos projetos de trabalhos acadêmicos, o que combina inteiramente com o meu lado mais intelectual do que propriamente executivo. Passei, no primeiro semestre, quase seis meses em Paris, para aulas no Institut de Hautes Études de l’Amérique Latina – e viajando intensamente pela Europa – e estou no limiar de nova viagem, desta vez a trabalho, mas que pretendo combinar igualmente ao meu hobby habitual (bem mais que distração, uma verdadeira segunda natureza, dada a intensidade da dedicação voluntária a essas lides acadêmicas).
Se eu fizer uma pesquisa por conceitos na lista dos trabalhos de 2012, a palavra livro é, provavelmente, a que aparecerá com mais frequência, inclusive pelas muitas mini-resenhas que preparo para a seção “Prata da Casa” do Boletim da Associação dos Diplomatas Brasileiros, selecionando os livros de meus colegas de carreira que mais merecem registro para a atenção dos demais colegas. Se eu pudesse, eu me dedicaria à arte da resenha com maior intensidade, inclusive num gênero que não é muito comum nesse tipo de empreendimento: a resenha de velhos livros, talvez com mais de século e meio de publicação, pois é especialmente gratificante visitar novamente as grandes obras do passado para ver em que medida elas conservam o frescor da reflexão, a pertinência do argumento, a relevância da problemática abordada e sua importância para os dias que correm. Esta pequena arte se combina também a outro projeto meu, este permanente, pois se trata de percorrer os clássicos, revisitados e reescritos numa nova abordagem. Já fiz isso para Marx, Tocqueville, Maquiavel, um pouco para o Sun Tzu, e pretendo continuar praticando esse pequeno crime do “anacronismo” voluntário sempre que a ocasião e o tempo me propiciarem essa distração (ou divertissement, como chamo este jogo). A mesma palavra francesa eu emprego, aliás, para a minha atividade de blogueiro anarco-libertário, um simples entretenimento que me serve para diversos fins, entre eles o de registro, ou de memória, mas também para chamar a atenção dos meus seguidores para os muitos materiais interessantes que recebo ou que “pesco” todos os dias na vasta rede de informação e análise que nos submerge, literalmente, em ondas contínuas, incessantes, e cada vez mais intensas.
O blog é um divertimento, mas também uma maneira prática de não deixar passar uma infinidade de textos relevantes que de outra forma se perderiam no tsunami de informações com as quais entramos em contato de uma forma ou de outra durante uma única jornada de 24 horas (hélas, insuficientes para tudo o que gostaria de ler e escrever). O site, por isso mesmo, anda um pouco abandonado, por absoluta falta de tempo, mas também por que fazem vários anos que pretendo reformulá-lo totalmente, e ainda não encontrei (também não procurei) uma alma generosa e atenta que sente comigo para que planejamos juntos o site genial, visualmente bonito e funcionalmente operacional e prático, que vai me dar pouco trabalho para alimentar continuamente, com trabalhos antigos, recentes e futuros. Talvez possa fazê-lo nos EUA, contratando algum garoto adolescente, desses capazes de fazer qualquer coisa numa máquina infernal.
Sim, preciso prestar homenagem a este meu modesto, pequeno, mas altamente eficiente MacBook Air, que me permitiu exibir uma produtividade razoável, ao lado do iPad e do iPhone que o complementam de modo prático e na mobilidade inevitável de uma vida bastante agitada (feita de pouco sono, muita leitura e alguma escrita). Ao concluir este meu último trabalho do ano – que será devidamente complementado em duas ou três semanas por uma avaliação qualitativa desses escritos – só posso esperar, em 2013, um pouco de ordem e concentração no que é essencial, evitando a enorme dispersão de interesses e afazeres que costuma caracterizar este espírito inquieto que aqui escreve.
Evitei, por isto mesmo, pronunciar-me sobre a situação do país – tanto por que minhas opiniões são bastante conhecidas pelas pequenas notas que sempre introduzem minhas postagens de caráter econômico ou político – e resolvi falar apenas do que me atrai, me prende, me consome, como um vício insanável: a leitura, a reflexão, a escrita e, quando possível, a publicação desses meus rabiscos desordenados, uma coleção razoável de trabalhos que devem preencher várias estantes, quando impressos e alinhados nas prateleiras de minha biblioteca particular.
Uma última nota de tristeza: por absoluta impossibilidade material, estou sendo obrigado a me separar de meus muitos livros – confesso não ter ideia do volume total, uma vez que já estão divididos em dois locais – que representariam talvez metade de minha mudança (estou exagerando, claro); vou levar comigo apenas os essenciais à continuidade dos trabalho de curto prazo, deixando aqui todos os americanos, pois eu os encontrarei facilmente em qualquer boa biblioteca universitária americana. Sinto ter de me separar desses altamente charmosos objetos de meu prazer intelectual (vários mal cuidados, é verdade), mas é provável que acumule algumas novas centenas de exemplares na minha nova estada no exterior (livrarias americanas de grande porte são irresistíveis, assim como as pequenas livrarias de bairro, ou até os sebos e garage sales ocasionais. Prometo (mas não acredito nisso) classificar minha pequena biblioteca que me acompanhará, o que deve ser o início de um trabalho de catalogação que se estenderá ao Brasil em meu retorno (que não tenho ideia de quando será). Provavelmente não vou fazer nada disso, a não ser listagens de livros para as próximas doações (o que não consegui fazer agora).
Termino este texto já no alvorecer, tendo ainda de acordar cedo para “liquidar” alguns assuntos urgentes que não podem esperar o novo ano. Voltarei, prometo, em algum momento de janeiro de 2013, já com alguma coisa mais séria e mais compatível com a vocação deste escriba. Já fiz minhas previsões imprevisíveis para 2013 (busquem no blog), e tenho quase certeza que nenhuma delas se materializará no curso do ano (et pour cause). Agora tenho apenas de fazer minhas próprias previsões previsíveis, e vigiar meu ânimo dispersivo para tentar fazer pelo menos metade da lista ideal que tenho anotado em meu Moleskine de bolso (que aliás aposento agora, para logo iniciar dois outros, de viagem).
Bom ano a todos os que me leem, cobrem-me os trabalhos planejados e as leituras prometidas, e que cada um tenha o máximo de felicidade naquilo que estima ser a sua atividade essencial. As minhas são quatro, como já disse, e repito aqui em conclusão: ler, refletir, escrever e divulgar. Vale!

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 2457: 31 dezembro 2012, 5 p.

domingo, 30 de dezembro de 2012

Nossos aliados no Brics: a India e suas mulheres

Por que a Índia trata tão mal suas mulheres?

Estupro e morte de estudante traz à tona a difícil realidade do país, considerado o pior para se nascer mulher em todo o mundo

30 de dezembro de 2012 | 8h 42
BBC Brasil
TrustLaw qualificou a Índia como o pior lugar para se nascer mulher em todo o mundo - AP
AP
TrustLaw qualificou a Índia como o pior lugar para se nascer mulher em todo o mundo
Muitos a chamaram de "coração valente" ou "filha da Índia". Mais do que motivar uma onda de orações e protestos em todo o país, a estudante de 23 anos morta no sábado após ser estuprada por seis homens em um ônibus em Nova Déli fez o país se perguntar: "Por que a Índia trata tão mal as suas mulheres?".

No país, não são raros os casos de aborto de fetos femininos, assim como os de assassinato de meninas recém-nascidas. A prática levou a um assombroso desequilíbrio numerico entre gêneros no país.

As que sobrevivem enfrentam discriminação, preconceito, violência e negligência ao longo da vida, sejam solteiras ou casadas.

TrustLaw, uma organização vinculada à fundação Thomson Reuters, qualificou a Índia como o pior lugar para se nascer mulher em todo o mundo.

E isso se dá em um país no qual a líder do partido do governo, a presidente da Câmara de Deputados, três importantes ministras e muitos ícones dos esportes e dos negócios são mulheres.

Crimes em alta - Apesar do papel mais importante desempenhado pelas mulheres no país, crimes de gênero estão em alta na Índia. Em 2011 foram registrados 24 mil casos de estrupo - 17% só na capital, Nova Déli. O número é 9,2% maior do que no ano anterior.

Segundo os registros policiais, em 94% dos casos os agressores conheciam as vítimas. Um terço desses eram vizinhos. Parte considerável era de familiares.

E não se tratam apenas de estupros. Segundo a policía, o número de sequestros de mulheres aumentou 19,4% em 2011 (em relação ao ano anterior). O aumento dos casos assassinato foi de 2,7%, nos de torturas, 5,4%, nos de assédio sexual, 5,8%, e nos de violência física, 122%.

Discriminação mortal - Segundo Amartya Sen, prêmio Nobel de Economia de 1998, mais de 100 milhões de mulheres desapareceram ou foram mortas em todo o mundo vítimas da discriminação.

De acordo com os cálculos dos economistas Siwan Anderson e Debraj Ray, mais de dois milhões de indianas morrem a cada ano: cerca de 12% ao nascer, 25% na infancia, 18% em idade reprodutiva e 45% já adultas.

O estudo mostrou que mais mulheres morrem na Índia por ferimentos do que por complicações no parto. E esses ferimentos seriam um indicador da violência de gênero.

Outro dado estarrecedor é o de 100 mil mulheres mortas por queimaduras. Segundo os dois economistas, boa parte delas são vítimas de violência relacionada ao pagamento de dotes matrimoniais. Não raro, os agressores queimam as mulheres.

Sociedade patriarcal - Para os analistas, é preciso uma mudança estrutural nas atitudes da sociedade para que as mulheres sejam mais aceitas e tenham mais segurança na Índia.

O preconceito de gênero é reflexo de uma sociedade de tradição patriarcal, ainda mais forte no norte do país.

Para os manifestantes que saíram às ruas após o estupro da jovem estudante de medicina, os políticos, inclusive o primeiro-ministro Manmohan Singh, não são sinceros quando prometem leis mais duras contra a violência de gênero.

Eles ainda questionam o fato de que 27 candidatos nas últimas eleições regionais eram acusados de estupro. Além disso, seis deputados respondem pelas mesmas acusações. Como crer, então, na classe política?

Ainda é cedo para saber se o governo realmente concretizará suas promessas de leis mais duras e julgamentos mais ágeis em casos de estrupo. Os protestos em Nova Déli, no entanto, parecem trazer alguma esperança de que algo poderá mudar, para o bem das mulheres indianas. 

Veja também:
link Índia acusa seis homens de matar jovem estuprada
link Corpo de jovem morta após estupro retorna à Índia e é cremado
link Curta o 'Internacional Estadão' no Facebook  


BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.

Ha-Joon Chang: o mau samaritano do nao desenvolvimento - Rodrigo Constantino e Paulo Roberto de Almeida

Recentemente, um aluno universitário que deve ter sido a vítima inocente de lições (lições??!!) mal dadas por algum professor universitário certamente convencido da perversidade do neoliberalismo e das benesses e bondades do dirigismo estatal e do protecionismo comercial, escreveu-me para criticar-me por algo que não fiz, mas que teria feito com prazer se colocado na mesma situação: uma resenha sobre um livro do economista coreano de Cambridge Ha-Joon Chang, um convertido tardio a outras más lições: as do cepalianismo prebischiano requentado dos anos 1950 e as do antineoliberalismo vulgar que começou a soterrar corações e mentes de milhares de universitários a partir dos anos 1990, quando se acreditava nessas más academias que o neoliberalismo e um suspeito complô dos autores do Consenso de Washington eram os responsáveis pelos fracassos, frustrações e pelo não desenvolvimento de nações em desenvolvimento, entre elas e principalmente as da América Latina, que nessa versão simplificadora e mistificadora teria sido impedida de se desenvolver pelos mesmos vorazes capitalistas centrais que a exploram há mais ou menos 500 anos.
Como ele me criticou pelo que não fiz, vou fazer o que ele não fez, e que pode ter escapado aos leitores dos muitos blogs que mantenho. Um deles é dedicado apenas a resenha de livros, e lá anda um pouco esquecido.
Portanto, vou postar aqui a resenha de Rodrigo Constantino de um dos livros desse mau economista que é Ha-Joon Chang, não sem antes esclarecer sobre um artigo meu, que desmantela suas pretendidas "lições" de história econômica

Paulo Roberto de Almeida:
Falácias acadêmicas, 5: o mito do complô dos países ricos contra o desenvolvimento dos países pobres
Brasília, 21 janeiro 2009, 11 p. Continuação da série, tratando desta vez das teses do economista Ha-Joon Chang. 
Espaço Acadêmico (n. 93, fevereiro 2009; arquivo em pdf); 

Aqui vai a resenha de Rodrigo Constantino, já postada em outro blog meu: 

-->
O Mito do Protecionismo Esclarecido
Rodrigo Constantino

Uma coletânea de falácias econômicas. Assim pode ser resumido “Maus Samaritanos”, o novo livro do economista de Cambridge Ha-Joon Chang, que é também o autor de “Chutando a Escada”. Ele tomou emprestada essa expressão de Friedrich List, o economista do século XIX que defendia o nacionalismo mercantilista. O novo livro de Chang ataca o livre comércio e defende o protecionismo estatal, através tanto de subsidies como de tarifas alfandegárias. O prefácio da edição brasileira foi escrito por Luiz Carlos Bresser-Pereira, que foi ministro das Finanças durante o governo Sarney e adotou o congelamento de preços como meio para combater a inflação galopante. Bresser denomina a estratégia pregada por Chang de “novo desenvolvimentismo”. Na verdade, trata-se do velho mercantilismo de List.
A principal tese do livro é que os países atualmente desenvolvidos chegaram neste patamar de desenvolvimento graças ao protecionismo estatal, e não ao livre comércio. Uma vez no topo, eles pretendem “chutar a escada” e impedir o acesso aos demais países pobres. Contam com um grande e poderoso aparato de economistas neoliberais – os “maus samaritanos” – para defender essa estratégia. Assim, a privatização, a redução da burocracia, um banco central menos politizado, a meta de inflação, a abertura comercial e o equilíbrio orçamentário do governo seriam medidas prejudiciais aos países pobres, defendidas pelos neoliberais por auto-interesse ou ignorância. A “Trindade Profana”, representada pelo FMI, OMC e Banco Mundial, seria o principal mecanismo para derrubar essa escada de acesso ao desenvolvimento.
O desenvolvimentismo de Chang é muito similar ao nacionalismo de List, economista que representava o oposto daquilo que Adam Smith defendia. Contra a “mão invisível” do mercado, seria necessária a “mão benevolente” do governo. O protecionismo de Chang é o mercantilismo com um véu novo. Retirando o eufemismo, resta o velho dirigismo estatal, a crença de que o Estado deve assumir a locomotiva do desenvolvimento econômico. Friedrich List já dizia que somente onde o interesse dos indivíduos estivesse subordinado ao da nação, haveria desenvolvimento decente. A nação era vista como um ente concreto, com desejos e interesses, que justificavam inclusive o sacrifício dos indivíduos. Quem saberia dizer quais os verdadeiros interesses da nação? Com certeza, os “sábios”, entre eles List. A glória futura da nação valeria mais que tudo. Nesse aspecto ao menos, Hitler não foi muito criativo.
O nacionalismo de Chang parece um marxismo exportado para nações. Os países ricos exploram os países pobres. Portanto, as regras do jogo não podem ser iguais. Seria injusto, segundo o autor, tratar da mesma forma países desiguais. Os países ricos deveriam aceitar o protecionismo dos mais pobres sem reclamar, pois são mais ricos. Justiça, por esta ótica, é garantir um tratamento diferencial com base na renda. Um dos problemas disso é que o protecionismo não beneficia os países pobres, mas sim alguns grupos ricos desses países, à custa do restante do povo. É análogo ao próprio marxismo dentro de cada nação: atacar os mais ricos não favorece os mais pobres, e sim o contrário. Outro problema desse raciocínio é que o protecionismo seria, então, desejável dentro da nação também. Cada estado deveria proteger suas indústrias para garantir seu desenvolvimento. A lógica poderia continuar: cada bairro deveria fazer o mesmo, para estimular seu desenvolvimento. Afinal, o que há de tão especial no conceito de nação? No extremo, acaba-se na conclusão de que a auto-subsistência do indivíduo pode ser desejável.
Chang parece confundir correlação com causalidade. Ele cita que fases protecionistas e com intervenção estatal forte apresentaram bons resultados, enquanto reformas neoliberais geraram crises. A falácia desse raciocínio é que o crescimento desenvolvimentista apenas hipotecou o futuro. O autor chega a defender abertamente essa política, quando afirma que “faz sentido para um país em desenvolvimento ‘emprestar das gerações futuras’, assumindo déficits orçamentários para investir por seus próprios meios no presente e, portanto, acelerar o crescimento econômico”. Após uma era de crescimento artificialmente criado pelos gastos estatais sem lastro, um duro ajuste se faz necessário. Mas Chang prefere condenar o termômetro pela febre. Ele ataca os sintomas expostos pelo livre mercado, em vez das causas plantadas pelo desenvolvimentismo. Não obstante essa falácia estatística, resta questionar qual país não está em desenvolvimento. O autor trata os países mais desenvolvidos como países que chegaram ao patamar máximo de desenvolvimento, e não mais tivessem que se desenvolver.
O autor defende até mesmo os programas de substituição das importações, que nos remete ao caso brasileiro da “Lei da Informática”, que condenou o país ao atraso tecnológico. Como pode ser bom para o desenvolvimento de uma economia comprar verdadeiras carroças pelo preço de uma Ferrari? Chang defende ainda que uma inflação de até 40% ao ano pode ser desejável. Ele afirma: “A inflação baixa e a prudência do governo podem ser prejudiciais ao desenvolvimento econômico”. Dificilmente um brasileiro poderá concordar com isso, se tem alguma memória.
O caso da Coréia, terra natal de Chang, é freqüentemente citado no livro. Fica a impressão de que o protecionismo comercial seletivo e a clarividência do governo foram responsáveis pelo sucesso relativo do país, e não a maior abertura comercial e o investimento na educação, respeitando-se a meritocracia. As falhas do modelo coreano acabam transformadas pelo autor nas causas do sucesso. Nenhuma vez é citada no livro a palavra “chaebols”, por exemplo. O autor fala da ajuda estatal à Samsung, mas esquece que os grandes conglomerados ajudados pelo governo estiveram no epicentro da grande crise de 1997. O modelo da Coréia deu certo a despeito do protecionismo, não por causa dele.
Outra falácia comum praticada pelo autor chama-se non sequitur: de premissas verdadeiras, ele conclui coisas que não seguem delas. Se há protecionismo nos países desenvolvidos, então ele é causa do sucesso, afirma Chang. No livro, “aprendemos” que Taiwan, Cingapura, Irlanda, Estados Unidos, Inglaterra e Suíça são exemplos de sucesso do protecionismo esclarecido, e que Argentina, Brasil e Rússia são casos de fracassos do neoliberalismo. Quanta inversão!
O autor afirma que o livre-comércio pode trazer benefícios no curtoprazo, mas condena o país pobre no longo prazo. É justamente o contrário: proteger empresas nacionais pode gerar algum ganho artificial no curto prazo, mas sacrifica o desenvolvimento do país no futuro.
Como todo desenvolvimentista, o autor se coloca sempre do lado do poder. Ele parece acreditar que um “déspota esclarecido” irá decidir qual protecionismo é desejável, e tomar medidas sempre com o “bem-comum” em mente. O governante será clarividente e honesto, uma espécie de “rei filósofo” platônico. Chang chega a afirmar: “O desenvolvimento econômico requer pessoas como Henrique VII, que constroem um futuro novo, em vez de pessoas como Robinson Crusoé, que vivem o dia de hoje”. Em outras palavras, os indivíduos não conseguem, através da sua liberdade, gerar desenvolvimento econômico por conta própria. Eles precisam da sabedoria dos governantes, sob o auxílio dos conselheiros, Chang incluído. A arrogância vem à tona quando o autor diz: “O comércio é simplesmente muito importante para o desenvolvimento econômico para ser deixado por conta dos economistas do livre-comércio”. Ou seja, o comércio não deve ser livre, mas sim controlado pelos economistas “esclarecidos”, os desenvolvimentistas, como o próprio Chang. Apenas eles sabem quais são os “interesses da nação”, e estão dispostos a sacrificar seus próprios interesses por este fim.
O paternalismo está presente na mentalidade desenvolvimentista também. O governo é o pai que ama seu filho – o povo, e que irá cuidar dele. De fato, Chang usa a analogia para defender o protecionismo das “empresas nascentes”, alegando que cuida de seu filho de seis anos, protegendo-o da concorrência até sua maturidade. Getúlio Vargas, o “pai dos pobres”, não faria uso de uma metáfora diferente. De fato, esses paternalistas são mesmo os “pais dos pobres”, já que suas políticas costumam parir muita pobreza.
Em um abuso da linguagem orwelliana, Chang chega a afirmar que, “paradoxalmente, a política de livre-comércio reduz a liberdade dos países em desenvolvimento que a praticam”. Bota paradoxo nisso! Como um povo pode perder liberdade ao receber mais liberdade para escolher de quem comprar os bens e serviços demandados, independente da nacionalidade do vendedor? Eis um mistério que somente o “duplipensar” pode explicar.
Chang entende os problemas da gestão estatal, como o uso do dinheiro da “viúva”, o orçamento ilimitado e a falta de incentivos adequados. Mas ele acha que o mesmo se dá no setor privado, na mesma escala. Para defender esta estranha premissa, ele cita exemplos de fracassos no setor privado, como a WorldCom, e supostos casos de sucesso de empresas estatais, como a Petrobrás e Embraer no Brasil, e a POSCO na Coréia. Ele apela para a falácia de usar alguns casos isolados para concluir algo generalizado. Além disso, ele ignora o custo de oportunidade, ou seja, como teriam sido utilizados os recursos drenados pelo governo para sustentar por tanto tempo essas estatais. Como já alertava Bastiat, existe aquilo que se vê e aquilo que não se vê. Para a Petrobrás atingir uma tecnologia de ponta em águas profundas, quanto custou ao país suas décadas de monopólio garantido pelo governo? Como estaria o setor atualmente se o governo tivesse permitido a livre concorrência desde cedo, incluindo empresas estrangeiras? O caso da Embraer é ainda mais enganoso: o governo sustentou a empresa deficitária por anos, e apenas com sua privatização ela realmente deslanchou. A POSCO foi privatizada como um conglomerado bastante ineficiente, que investia em diversos setores sem ligação alguma.
A inversão que Chang faz em relação ao foco no longo prazo é total. Para ele, apenas o governo tem esse foco, enquanto o capitalista quer somente o lucro imediato. É justamente o contrário. O político foca nas próximas eleições, pois precisa ser eleito para sobreviver como político; enquanto o capitalista foca na maximização do valor presente dos fluxos de caixa, muitas vezes distantes no tempo.
Para Chang, entre as principais causas da corrupção estão a baixa receita tributária do governo e os salários baixos dos funcionários públicos (que no Brasil ganham, na média, o triplo do que ganha o setor privado). Reduzir as regulamentações, a burocracia e a quantidade de recursos que transita pelo governo levaria a um aumento da corrupção! Ele diz com todas as letras: “A corrupção normalmente existe porque há muitas forças de mercado, não poucas”. A Rússia que o diga! Ou o Brasil também, um país com problema crônico de corrupção e um governo totalmente inchado. Chang  parece defender o uso de sanguessugas para curar a leucemia.
Chang se coloca como o “bom samaritano” em defesa dos países pobres, mas, na verdade, ele é apenas o defensor dos ricos dos países pobres. Seu discurso nacionalista e protecionista seria abraçado com empolgação pelos grandes empresários da FIESP, por exemplo, interessados em barrar a livre concorrência que vem de fora. Nenhum “lobista” dos grandes grupos de interesse dos países pobres poderia contar com um apoio mais sintonizado que aquele oferecido por Chang. Após expor tantas falácias, pode-se concluir apenas uma coisa: com “bons samaritanos” como o senhor Chang, os pobres dos países subdesenvolvidos não precisam de inimigos!

Economia dilmista: dois anos de fiasco - Editorial Estadao

Comentário inicial Paulo Roberto de Almeida:
Não existe novo modelo econômico, ou se existe não é modelo, e não é econômico, e sim uma vontade política, inscrita na mesma vertente autoritária que caracteriza o partido dos companheiros, e que pretende baixar os juros por decreto, e aumentar o consumo, como se isso garantisse crescimento. O que o governo está conseguindo é maior inflação e menor investimento, e portanto menor taxa de crescimento, em face das crescentes intervenções improvisadas do governo na economia. O ambiente macroeconômico é o mais confuso possível, pois não se sabe o que o governo vai ainda encontrar para o que ele chama de estímulo à economia. Manifestamente, o governo não confia nos mercados, e prefere usar seus próprios recursos para produzir, politicamente, crescimento. O que consegue, na verdade, é menos crescimento e mais inflação.
Paulo Roberto de Almeida  

Dois anos de fiasco econômico
Editorial O Estado de S.Paulo, 30/12/2012

A presidente Dilma Rousseff completa meio mandato com um balanço econô­mico assustador - dois anos de produ­ção estagnada, in­vestimento em que­da, inflação longe da meta, exporta­ção emperrada e contas públicas em deterioração. Desemprego baixo e um consumo ainda vigoroso são os dados positivos, mas insuficientes pa­ra garantir a reativação de uma indús­tria sem músculos para disputar espa­ço nos mercados. Sobram palavras: um discurso triunfal sobre um "novo modelo macroeconômico", baseado em juros mais baixos e câmbio me­nos valorizado, promessas de gran­des obras de infraestrutura e de refor­mas de amplo alcance. De concreto, houve a redução dos juros, o que cer­tamente contribuiu para o aumento da popularidade de Dilma. Um balan­ço provisório basta para mostrar o al­to custo dos erros cometidos em dois anos pelos condutores da política eco­nômica, liderados, é bom lembrar, por uma presidente voluntariosa.
O crescimento econômico deste ano está estimado em torno de um por cento por economistas do Banco Central (BC), do mercado financeiro e das consultorias mais importantes. Esse resultado seria em em qual­quer circunstância, mas no caso brasileiro há uma circunstância especial.
No ano anterior o Produto Interno Bruto (PIB) havia aumentado apenas 2,7%. O País perdeu o passo entre os emergentes de todo o mundo. Este detalhe é importante, porque desqua­lifica as tentativas de atribuir o mau desempenho brasileiro à crise global, ao tsunami monetário criado pelos bancos centrais do mundo rico e à má vontade dos deuses.
Os problemas são internos, todos fabricados no Brasil por uma política há muito tempo defeituosa e piorada pela teimosia do atual governo. Se­gundo o Tesouro, os investimentos do governo central foram de janeiro a novembro 22,8% maiores que os de um ano antes e atingiram R$ 54,9 bi­lhões. Mas isso eqüivale a pouco mais de 50% do total previsto no Orçamen­to. Além disso, o valor inclui os finan­ciamentos do programa Minha Casa, Minha Vida e boa parte dos desembol­sos foi de restos a pagar. Se depender da eficiência federal, continuarão fal­tando investimentos tanto para reati­var a economia em 2013 quanto para garantir um crescimento mais vigoro­so nos anos seguintes,
Tudo somado, o valor investido pe­lo setor privado, pela administração pública direta e pelas estatais deve ter ficado em torno de 18% do PIB. Em outros países latino-americanos ja proporção ultrapassa 25% e nos emergentes da Ásia supera 35%. Além disso, é preciso levar em conta a qualidade dos projetos e a eficiência da execução. Não basta investir. Os al­vos podem ser mal escolhidos e o dinheiro, desperdiçado. O histórico dos projetos federais, tanto da administração direta quanto das estatais, tem sido muito em há vários anos. Aparelhamento, loteamento de car­gos, incompetência e corrupção têm custado muito caro.
A inflação alta contrasta com o bai­xo ritmo de atividade. Em outros paí­ses, tolera-se alguma alta de preços para garantir algum impulso à econo­mia, e sempre por um tempo muito li­mitado. No Brasil, o governo vem mantendo há vários anos a meta de 4,5%, muito alta quando comparada com os padrões internacionais. Neste ano, o BC cortou juros e renunciou a combater o aumento de preços, em troca de um crescimento econômico humilhante para um Brics.
Os preços ao consumidor medidos pela Fundação Getúlio Vargas e in­cluídos no IGPM subiram 5,79% nes­te ano, De novembro para dezembro houve aceleração de aumentos em seis dos oito componentes do indica­dor, O IPCA, calculado pelo IBGE e usado como referência para a política oficial, aumentou 5,53% nos 12 meses terminados em novembro. A alta in­ternacional dos preços agrícolas foi obviamente apenas uma parte dessa história.
A balança comercial refletiu a fra­queza da indústria diante dos compe­tidores, o erro de uma política de estí­mulos voltada para o consumo e, naturalmente, a dependência excessiva das vendas de matérias-primas à Chi­na. Até novembro, o valor exportado foi 4,9% menor que o de um ano an­tes, pela média dos dias úteis, e o sal­do comercial, 31,1% inferior ao de igual período de 2011. Os números fi­nais do ano devem sair na quarta-fei­ra e confirmarão, com certeza, o alto custo de vários erros políticos.

A arquitetura stalinista kitsch da Coreia do Norte - book review (WSJ)

Oscar Niemeyer provavelmente elogiaria as horrendas construcoes da Coreia do Norte.

Kingdom of Kitsch
The oversize public monuments and buildings in the capital of North Korea confirm the subservience of the citizen to the state and display the ghastly aesthetic imperatives of totalitarian art.
By ERIC GIBSON
The Wall Street Journal, December 28, 212

Browse the travel section of any bookstore and along with old reliables such as Michelin you'll find a plethora of other titles and brands covering just about every destination and taste. Surely the strangest addition to this genre is the two-volume "Architectural and Cultural Guide: Pyongyang," edited by Philipp Meuser, a German architect and architectural historian. Strange because Pyongnang is unlikely to be on anyone's "see before you die" list and because, even if it were, it's not an easy place to see. The capital of the Hermit Kingdom receives only a few hundred visitors a year, the bulk of them officially sanctioned and accompanied every step of the way by government minders.

Architectural and Cultural Guide: Pyongyang
Edited by Philipp Meuser
DOM, 368 pages, $49.95

DOM
not to scale The Grand Monument on Mansu Hill features a 60-foot statue of Kim Il-sung; a sculpture celebrating the founding of the Communist Party (below).

"Architectural and Cultural Guide: Pyongyang" must also count as the only travel guide that comes with a warning to leave it behind. "It is possible that some of the information published is classified under North Korean law," reads an advisory note. "The publisher cannot accept liability for any problems with local authorities that may arise from taking this publication into North Korean territory."

Why write a guide to such a place? Mr. Meuser's stated aim is to "lend normalcy to the abnormal." He writes of the "pervasive feeling . . . of bemusement and perplexity in the face of the totalitarian regime" when you visit North Korea. Some of this feeling stems from the near-ghost-town character of Pyongyang. A city of some 1,200 square miles (about double New York's geographical size), it has a population of about three million. Although the book's photographs show vast residential areas populated by thick clusters of high-rise apartment buildings, the streets are virtually empty. One of the most memorable images in the book is of a traffic cop on duty at an intersection, without a single car in sight.

Enlarge Image

DOM
But the city's air of unreality derives in the main from the fact that Pyongyang is a suffocating propaganda hothouse where everything—the layout, buildings, monuments, billboards, signage—is designed to express the ideology of "Juche," or national self-reliance. As such, everything is geared to glorifying the state and its leader and reminding all the citizens that their primary raison d'être is to continue the revolutionary struggle. Mr. Meuser tries to understand all this by taking us through Pyongyang's streets "as though exploring this city were no different from rambling through Tokyo, Copenhagen or Berlin."

The book is not so much a Baedeker—there are no transportation tips, no business hours, no walking tours or other standard guidebook information—as an attempt to parse a city that Mr. Meuser describes as "an architectural cabinet of curiosities. . . . arguably the world's best preserved open-air museum of socialist architecture."

The first volume of the book consists primarily of photographs and is divided into sections such as "Urban Planning," "Residential Buildings" and "Monuments." The second is a collection of essays, three by Mr. Meuser and the rest by two other architectural historians, one South Korean and the other, like Mr. Meuser, German. As a bonus of sorts, "Architectural and Cultural Guide: Pyongyang" includes a 10,000-word excerpt from a manifesto titled "On Architecture" (1991). It was written—or so we are asked to believe—by Kim Jong-il, North Korea's leader from 1994 until his death in 2011. "It is more important that architectural structures reflect revolutionary ideals," reads a typical sentence.

For all its mix of elements, Mr. Meuser has produced a book that is at once unique and invaluable, the most in-depth study of totalitarian art and aesthetics since the Russian art historian Igor Golomstock published his sweeping history of the subject 12 years ago. Only this book has the advantage of being focused on work that is still standing and visible, unlike the material from the Nazi and Soviet eras discussed by Mr. Golomstock.

Pyongyang was 90% destroyed during the Korean War. So its later, ground-up rebuilding as a communist capital makes it a textbook showcase of totalitarian kitsch—that perverse byway of genuine art. The animating principle of totalitarian kitsch is the glorification of the state and its leader. The style borrows its vocabulary from the forms of legitimate art—the figure, the equestrian statue, the landscape—but it empties them of all but the most cloying, shallow emotion, relying on an inflated sense of scale and an off-the-shelf, formulaic realism.

Indeed, totalitarian kitsch uses scale as an autonomous aesthetic element. This quality is abundantly on display in Pyongyang, in its 60-foot statues of Kim Il-sung, the country's founding leader, and in the official buildings, with their floor areas running to hundreds of thousands of square feet. The idea here is that size is the message. By dwarfing the populace, such gigantism conveys the subservience of the individual to the state. Still, when it comes to size, Kim Il-sung and Kim Jong-il were pikers. Pyongyang's Arch of Triumph (1982) is about equal to Paris's Arc de Triomphe. The triumphal arch that Albert Speer designed for Hitler—part of a redesign of Berlin that was carefully planned but never built—was so vast that Paris's would have fit snugly into its aperture.

In Pyongyang, sometimes straining for the Big Statement has backfired, as in the case of the Ryugyong Hotel. Under construction since 1987, this 105-story, 6,000-bed pyramid is still unfinished, partly because its source of funding dried up with the collapse of the Soviet Union. "Looming over the city like a portent of doom, it is a daily reminder of the biblical Tower of Babel,'" writes Mr. Meuser. Or of a Potemkin village. Unusually for a building of that kind, the hotel is made entirely out of concrete. But "while a steel construction would have made better structural sense," writes Mr. Meuser, "it would have cost three times as much." Over the years, Pyongyang has moved away from Soviet-inspired concrete-block structures, seemingly the bastard children of Le Corbusier and a government planning bureau, to more modernistic, steel-and-glass structures like this hotel, all in an effort to appear more cosmopolitan.

If North Korea could be said to have made any "contribution" to the totalitarian-kitsch aesthetic, it is in Pyongyang's two giant memorial complexes, the Grand Monument on Mansu Hill (1972) and the Victorious Fatherland Liberation War Memorial (1993). Both consist of enormous plazas, some 450,000 square feet in area, dominated by a statue and subordinate sculptural groups. The Mansu Hill monument features, at its center, a 60-foot-high statue of Kim Il-sung; flanking him are two 150-foot-long sculptural groups, each with more than 100 figures parading ecstatically alongside a stylized, 75-foot-long flag. The war memorial is similarly designed but even more elaborate.

These memorial complexes allow us to speak of something totally new: the theater of totalitarian commemorative art. They are a hybrid form, a fusion of the traditional, stand-alone, single-figure monument and the Party rally. Think Nuremberg, only with dictator and martial attendants frozen in a perpetual act of exhortation. Visitors to these monuments become participants in a display of coercive propaganda as much as if they were attending a live outdoor assembly.

It's easy to make fun of Pyongyang's Ozymandias statuary, its comical anachronisms (such as the monument, unveiled in April, showing the late Kim Jong-il astride a rearing charger) and its government buildings dolled up with Vegas levels of glitz. But this book takes us beyond the laughter to see the cost to the Korean people of this preening ideological environment. Public monuments and buildings in Pyongyang are illuminated at night, but private residences are largely dark. Artists aren't independent creators but cogs working in teams with hundreds of others to crank out propaganda images of the Kims. Official buildings may be constructed of lavish materials—quarried stone and solid-gold door pulls—but housing for "the masses" is made from pre-cast concrete that quickly begins to crack and leak. The $100 million cost of the mammoth Mangyongdae Schoolchildren's Palace (1989), notes Mr. Meuser drily, "exceeds the total monthly income of the entire working population of North Korea." No wonder this book carries a warning.

One day the regime will fall and democracy will come to North Korea. We can only hope that, when it does, the successor government will preserve the monumental, public, propagandistic Pyongyang in all its perverse glory. It would be a real tourist destination, the world's only totalitarian-kitsch theme park—a kind of lopsided Disneyworld—and an object lesson in what happens when art is hijacked by the state, and the individual is ground beneath the wheels of a repressive ideology.

—Mr. Gibson is the Journal's Leisure & Arts Features editor.

Progressos e retrocessos do comercio mundial: adivinhem as escolhas do Mercosul - Editorial Estadao

Rumo a um acordo EUA-Europa

27 de dezembro de 2012
Editorial O Estado de S.Paulo
 
Americanos e europeus podem começar em breve a negociação de um acordo comercial entre os dois mais importantes mercados do mundo. Representantes dos Estados Unidos e da União Europeia reuniram-se várias vezes neste ano para discussões preliminares. As trocas de bens e serviços entre os dois parceiros são estimadas em cerca de 700 bilhões (US$ 927 bilhões) e já são facilitadas por tarifas em geral muito baixas, com média inferior a 2%. Mas há espaço para um aumento considerável do comércio e para a ampliação de investimentos entre as duas maiores potências do Atlântico Norte. Enquanto isso, brasileiros e seus sócios do Mercosul ficam limitados a assistir de longe a mais um capítulo importante da integração econômica internacional.
Preferências comerciais entre Estados Unidos e União Europeia tornarão mais difícil o acesso de outros parceiros a esses mercados. Para os muito competitivos, como a China e outros exportadores dinâmicos, o prejuízo poderá ser limitado, mas o custo será provavelmente considerável para os demais. Além disso, alguns países pobres e alguns emergentes já têm acesso facilitado aos mercados europeus e esse benefício será quase certamente mantido.
Nos últimos dez anos a integração avançou em todo o mundo, com dezenas de acordos bilaterais, regionais e inter-regionais entre países desenvolvidos e em desenvolvimento. O grande objetivo foi geralmente a expansão das oportunidades de comércio e de investimento, sem restrições ideológicas. O Mercosul foi uma exceção, sem pactos comerciais com as economias mais avançadas. Seus acordos de livre comércio foram celebrados com países da região e com uns poucos parceiros de fora, todos em desenvolvimento. Os entendimentos foram sempre liderados pelos dois maiores países do bloco, Brasil e Argentina, governados há mais de uma década por líderes populistas e com tendências terceiro-mundistas.
A primeira grande façanha desse terceiro-mundismo requentado e intelectualmente subdesenvolvido foi o abandono do projeto de criação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca). A façanha foi comandada pelos presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Néstor Kirchner. O governo dos Estados Unidos contribuiu, no final da história, para a liquidação do plano, mas a dupla sul-americana já havia feito o suficiente para enterrar a Alca. Outros governos da América do Sul acabaram negociando regras de livre comércio com Washington. O Brasil, naturalmente, ficou fora das preferências concedidas nesses acordos.
A negociação entre Mercosul e União Europeia, iniciada em 1999, permanece emperrada. As discussões foram interrompidas em 2004 e retomadas em 2010, mas sem sucesso, apesar das renovadas declarações de interesse das duas partes. Os negociadores brasileiros e argentinos concentraram a atenção na abertura dos mercados agrícolas europeus, como se pouca ou nenhuma vantagem se pudesse obter para a exportação de bens manufaturados. Ao mesmo tempo, foram sempre muito tímidos na liberalização dos mercados do bloco para produtos industriais.
A tendência protecionista sempre foi mais forte do lado argentino, mas o governo brasileiro sempre cedeu a pressões desse tipo. Indústrias da Turquia e do Norte da África têm acesso facilitado ao mercado da União Europeia, mas os negociadores do Mercosul parecem ter desprezado, sempre, detalhes como esses. Comportaram-se, em geral, como se representassem economias exclusivamente agrícolas.
A presidente Dilma Rousseff tem mantido as linhas principais da diplomacia inaugurada por seu antecessor. Além de insistir na orientação terceiro-mundista, mantém a tolerância ao protecionismo argentino, altamente prejudicial à indústria brasileira, e aceita a liderança da presidente Cristina Kirchner na fixação de rumos para o Mercosul. A suspensão do Paraguai e a admissão da Venezuela bolivariana, num evidente golpe contra as regras do bloco, foram novas demonstrações, em 2012, do compromisso do lulismo-kirchnerismo com o atraso. No resto do mundo, governos mais adultos, como os da Europa e dos Estados Unidos, tentam multiplicar as oportunidades comerciais.

Dez coisas para fazer (rapidamente) antes que o mundo acabe (ops, o ano)...

10 Things to Do Before 2012 Ends

Shutterstock/altafulla
Atlantic Monthly,  December 26, 2012 

It has come to my attention that we are firmly, if temporarily, ensconced in that weird, limbo-esque time that exists between Christmas and New Year's Eve. It is Boxing Day, which means relatively little to many people in the United States, given that it's really more of a British holiday. And whether we're anglophiles or not, we are all doing different things today: We are scattered about, some of us working and some of us still vacationing, some of us with family and some of us having returned to our own peaceful individual abodes. We are a nation awaiting something new, that being the year 2013, which will be ours in just five days, give or take a few hours and depending on when you read this post. As we wait, there are plenty of things to do in this strange shelf-time that I will call the Great Barrier Holiday Reef. Far from being doldrum-ish, though, this is a great moment in our annual history! Take advantage, because you will never get this year back (we don't think, but what do we know?).
1. Make peace with where you are this very moment. Not to get all spiritual or whatever, but this time — this strange, snail-like slog through the last red-and-green piney-fresh gasps of the holidays — only comes around once a year. And while the days may be slow and snail-like, perhaps, there is also something soothing and more relaxing than usual about them. The gifts have been given, that tension is past. We're all sated on eggnog and cookies and maybe a little bit slower than usual; stakes are lower, it's not about "success," it's about getting through the day, whether it's at work or with family. We can put off our great ambitions and aspirations until the new year, and just get through this time in the state in which we currently reside, comfortably and pleasantly, knowing new things are just around the corner. That's kind of nice, isn't it? Also: naps.
2. Return unwanted holiday gifts. If you can't just sit back and watch a Law & Order marathon or drink coffee after coffee while reading the newspaper, you are the type of person who must do things. If you must do things, and you feel better doing "productive" things, we suggest you take a moment over the next five days to return the gifts you didn't like or appreciate and replace them with something a bit better. Sales are on! The time is now! And if you wait too long, things will get busy and hectic and you'll forget about those boring Banana Republic sweaters from Aunt Bernice you've stashed in the back of your closet and then one day you'll pull one out and wear it because you have nothing else clean and then it will be too late to exchange it. So, do it now.
3. Take down the tree. This is a matter of some debate — some people leave their arboreal holiday masterpieces up through the first week in January, others even later (we cannot stand by such behavior, but we also cannot judge it outright). Still, if you do have a tree up, now might be the best time to take it down, because, mark our words, things are going to get hectic come January 2, when we're all back at work and busy with school and doing the regular old things we do. Plus, there's a little bit of leeway this week, and also, maybe you've got some hardy family members around to help you out. Then again, if you want to keep your tree up, if you insist on it, even, you should at the very least sit and look at it and feel cheery for a few minutes each day.
4. Be nice to your family. Maybe it's been a longish bit of togetherness time for you all, and not everyone is in the best of moods, given that the presents have been opened and the guests have stayed at just about past the point of welcome. This is when you need to dig in and find extra resources and grin and bear it, people! Trust me, no one wants to start 2013 guilty, or in a fight with a close family member (and those are the ones who are bound to bug you the most, trust me again!). So, grin and bear it. Grin and bear it. Take long walks when the need arises. Go to bed early and get up late. It's the holidays, you're on vacation! Smile and hug and know that you'll be back to your regular life soon enough, and then you'll rather miss these people who are getting on your nerves so much (or so we hear, having never experienced even a whit of annoyance among our kin ourselves).
5. It's your last chance to get something on the 2012 tax-write-off list. It's a double-whammy for folks who like to plan ahead. If you, say, spill coffee on your laptop today and buy a new one before the start of the year, that deduction goes on your 2012 taxes! Not that we're saying to spill coffee on your laptop, but the point is, if you're the type who cares about such things, you've got five days to make the purchases you need to for your write-off purposes. Also, you should probably go ahead and make your tax appointment, too, especially if your guy or girl tends to get booked up fast. April is fast approaching. And while you're at it, why not get your free credit score rating, too? It's a great jumpstart for your social life.
6. Go do something "cultural" (experience your city)! Ah, the holidays in the city, any city! — think museums, think movies, think markets, think walking around and holding mittened hands and catching little wafers of snow upon your tongues as you look in shop windows and feel rosy-cheeked and vital. Check the weather, put on some warm socks and waterproof boots if you need to, and tromp around in the out of doors before things get wet and unpredictable. Head inside to look at art or something pretty, or to drink hot chocolate, warming your cold hands around the mug, before you go back outside to skate on ponds or try delicious hot crepes at outdoor food festivals or look at the amazing architecture and sky and trees or just, again, walk around and see the lights and other humans, all of you hopefully a little more smiley than usual, because walking around is nice in a town, especially at this time of year.
7. Finish that thing you meant to finish! What was it this year? A book? A puzzle? A piece of art you were making, a sweater you were knitting, a TV-miniseries you were watching? Take this moment and finish it, so you can start 2013 fresh and ready for new and exciting adventures.
8. Resolutions? We guess. I'm not a huge fan of old-school resolution making, like that one needs to quit smoking or stop drinking so much or be a better student this year, but there is something about saying what you want to do, setting a date to start, and then doing it. So if there are these lingering goals hanging out in your brain, things you really want to accomplish or stop accomplishing, it doesn't hurt to write 'em down and get a big boost on January 1 in terms of getting them done, too.
9. Make New Year's plans. Yep, get on that. Which is not to say stress out about it. New Year's Eve is a holiday that divides the pros from the amateurs, and the amateurs tend to go out and spend big bucks at crowded places, or hang out in Times Square or other hectic environs filled with boisterous intoxicated types, while the pros sip their prosecco in a civilized fashion and wonder why. Neither of these behaviors is wrong, exactly; like all things, you need only admit which type you are and act accordingly. If you are the "amateur" and you don't yet have plans, make them! Anything goes, as long as it comes with the words "prix fixe" or "confetti" or "house party" or "ball drop." If you are the "pro" and you don't have plans, that is your plan. Set in some snacks and a good stock of booze and you'll be just fine.
10. Be briefly thankful that the world didn't end! Was it just a week ago we were worried about the supposed end of the world as we knew it via the Mayan calendar? Well, thank goodness that didn't happen. While you're at it, try something new in the few days left before we put on our 2013 glasses and ring in the new year in whichever way you see fit.
Insets via Flickr/writingortyping; Flickr/Simon Greig. Image via Shutterstock by altafulla.
Want to add to this story? Let us know in comments or send an email to the author at jdoll@theatlantic.com. You can share ideas for stories on the Open Wire.