O governo que tomar posse em janeiro de 2015, qualquer que seja sua orientação política, tem pela frente uma série de desafios na área econômica externa.
1. Economia internacional: uma variável independente
O cenário externo se subtrai às possibilidades de atuação do governo, que poderá, se tanto, influenciar posições do Mercosul em negociações multilaterais ou inter-regionais. O panorama é mais benigno, com a retomada do crescimento nos EUA e a superação das crises mais graves na zona do euro. Assim, o novo governo não poderá alegar que a crise internacional prejudica o Brasil, o que não foi verdade mesmo quando as duas grandes economias estavam deprimidas. Tendo a China como principal parceiro – o que assegurou altos preços nas commodities – o Brasil navegou sem grandes percalços durante o pico da crise; se o crescimento declinou, na fase recente, tal não se deve ao cenário externo. Continuarão as conversas no âmbito do G20 (mas elas são só conversas) e as de foros como o Brics, mas esse grupo não vai resolver a deterioração das transações correntes. Cabe tirar as lições que nos veem de novos emergentes, todos eles empenhados em se inserir mais e mais nos circuitos produtivos internacionais, em lugar de recorrer ao protecionismo, como foi fartamente o caso aqui, ultimamente.
2. Negociações comerciais: entre o minilateralismo e o multilateralismo
Não se deve esperar muito delas, já que quase todos os países esperam que os demais sejam mais abertos do que eles próprios. A conclusão da Rodada Doha não é facilitada pelas reticências de alguns dos “melhores amigos” do atual governo brasileiro no G20 comercial, a exemplo da Índia, que continua a impedir um consenso mínimo em temas como estoques agrícolas de segurança, ou da Argentina, na frente industrial, em ambos casos atendendo interesses protecionistas. O mundo vai continuar com os seus exercícios minilateralistas, com a possível marginalização da OMC. O Mercosul só fez recuar nos últimos doze anos, o que caberia remediar mediante uma renegociação de seu formato como união aduaneira, passando-se, possivelmente, a um simples acordo de livre comércio. O Brasil ficaria livre para negociar acordos atendendo a seus interesses, o que não quer dizer que será fácil, pois a indústria continua perdendo competitividade.
3. Finanças: menos riscos, mais volatilidade?
Depois de um ciclo de “tempestades perfeitas” na área bancária, é possível que os grandes atores – EUA, UE, Japão, e a China – se engajem numa fiscalização mais atenta dos fluxos de capitais. Mas nunca foi tão grande a liquidez internacional, o que permite prever, aos tomadores de recursos externos como o Brasil, o atendimento de suas necessidades de financiamento a juros razoáveis. Não deixa de ser uma ironia que os Brics, que pretendem opor-se à “hegemonia do dólar”, tenham criado um banco com capital subscrito de US$ 50 bilhões e um fundo contingente de US$ 100 bilhões. Não faltarão dólares para isso.
Os aplicadores de curto prazo, porém, continuarão ariscos e prontos a bater asas ao menor sinal de volatilidade. Esta, ao contrário do que acreditam os ingênuos, é mais provocada por mudanças na regulação interna do que por uma suposta “especulação internacional”. Um governo sensato sabe que deve manter estabilidade nas regras. Assim, se espera que diminuam as bravatas contra a “guerra cambial internacional” e os “tsunamis financeiros”.
Em síntese, o Brasil deve continuar a receber investimentos diretos estrangeiros, com base na abertura regulatória e em novas concessões “privatizantes”; a integração regional precisa abandonar a retórica, para enfrentar seus verdadeiros desafios; por fim, seria bom deixar de lado o stalinismo industrial, e inserir decisivamente a economia brasileira na globalização. Na verdade, todos os problemas econômicos externos do Brasil estão mesmo dentro do país, como qualquer observador atilado pode perceber.
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