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quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Otaviano Canuto e o atraso mental economico do Brasil - entrevista Denise Crispim Marin

O Brasil não tem só um problema de ineficiência logística, protecionismo comercial, custo-Brasil (ou seja, todas as ruindades juntas) e diversos outros descompassos técnicos e econômicos. Tudo se resolve com políticas correntas, o que poderia ser feito em 6 meses a um ano. Ou seja, tudo é resolvível.
Mas o Brasil tem um problema mais grave, que é o atraso mental de suas elites, não apenas dos dirigentes atuais (esses irrecuperáveis), mas das elites em geral, que são tacanhas mentalmente...
Acho que vai ser difícil corrigir, consertar.
Vai demorar...
Paulo Roberto de Almeida


'O Brasil não pode se fechar'
Denise Crispim Marin
O Estado de São Paulo, 17/10/2013

Além de acentuar o atraso do País, a proteção alimenta o parasitismo e não empurra as reformas necessárias

Não há argumento para convencer Otaviano Canuto de que a proteção comercial traria benefícios para os setores produtivos e para a sociedade brasileira. Ex-secretário de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda na época em que as negociações na Organização Mundial do Comércio, com os Estados Unidos e o restante das Américas.e com a União Europeia estavam em curso, nos primeiros anos do século, Canuto vê a falência desses processos como perda de oportunidades para " o Brasil e a exclusão de sua indústria de cadeias internacionais de valor.
Neste momento em que o "custo Brasil" se soma ao "peso morto" na corrosão da competitividade dos setores brasileiros, Canuto defende o engajamento do País em negociações abrangentes de livre-comércio - não só de bens como de serviços. O relançamento das conversas com os europeus, depois de quatro anos de paralisia, é bem-vinda, em sua opinião. Fechar-se seria a pior opção. A seguir, os principais trechos da entrevista.
O Brasil adiantou-se ao Mercosul e apresentou sua proposta de liberalização comercial para a UE. Quão atrasado o País está?
Antes tarde do que nunca. Dado o impasse na agenda multilateral, proliferaram as iniciativas regionais. Os dois exemplos mais gritantes são as negociações dos Estados Unidos no Pacífico e com a Europa. A Parceria Transpacífico vai garantir o acesso privilegiado dos asiáticos ao mercado americano. Em contrapartida, haverá abertura das agendas de liberalização de serviços, de regras de propriedade intelectual e outras, o que é uma forma de os EUA colocarem pressão sobre a China.
Há dez anos, o Brasil estava envolvido nas negociações na CMC e de liberalização comercial com as Américas e a UE. A ruína desses processos, o desinteresse do Brasil por novas iniciativas e sua omissão na agenda de aprofundamento do Mercosul significaram perdas de oportunidades?
Certamente, houve perda de oportunidades. Apesar de pequenos retrocessos mais recentes na defesa comercial, o mundo orientou-se para a maior liberalidade dos fluxos de comércio. Houve fragmentação geográfica do processo de produção e a emergência das cadeias de valor, que são incompatíveis com as estruturas de proteção comercial. Esse não é o fator dominante para explicar a falta de dinamismo da inserção comercial brasileira. Mas a prejudicou. As exceções do Brasil justamente confirmam a regra. A Embraer está na cabeça de uma cadeia de valor, mas tem a liberdade de montar seus produtos comprando os componentes do exterior.
Como inserir o País nas cadeias de valor se a competitividade está minada pelo custo Brasil?
Os fatores logísticos têm sido impeditivos para a maior competitividade brasileira. Não se pode participar de uma cadeia de valor sem ter logística e meios de transportes adequados, burocracia reduzida, custos baixos para se poder fazer negócio.
É difícil, no Brasil, aceitar que salário real maior possa ser problema, dado o passado de arrocho e o benefício que esse aumento trouxe para a economia.
O salário real mais alto não foi grande problema enquanto se estabeleceu uma relação virtuosa de ampliação da demanda agregada. Mas esse ciclo maravilhoso chegou ao limite, e a evolução do salário acima da produtividade pressiona os ganhos do empresariado.
A desvalorização do câmbio não reduz essa pressão?
A desvalorização recupera um pouco a competitividade dos setores que estavam com seus lucros reduzidos pelos gargalos logísticos. Mas se não houver uma agenda em paralelo de redução do custo Brasil, os ganhos com a desvalorização real não serão suficientes. Os países de baixa renda perceberam que esse custo é, na verdade, um "peso morto".
Na estratégia de liberalização, qual área será central?
Apesar das dificuldades na Organização Mundial do Comércio, a liberalização vai se expandir para a área de serviços por meio dos acordos regionais, e o Brasil não pode ficar atrás nessa corrida. Na OMC, se há uma área com chance positiva na reunião ministerial de Bali, em dezembro, é a de facilitação do comércio. Não por acaso, o embaixador Roberto Azevêdo, diretor-geral da OMC, está concentrando esforços nessa área.
Levando em conta o nosso passivo em produtividade, pesos mortos e custo Brasil, este é o momento adequado para o País se lançar em negociações liberalizantes ou melhor seria se fechar para limpar esse atraso?
Não, pelo amor de Deus, O Brasil não pode se fechar. Fechar-se significaria ficar de fora das cadeias produtivas. O atraso seria maior ainda. O Brasil tem neste momento condição de emprego muito favorável, um sistema de proteção social que eventualmente pode ser usado para apoiar a adaptação da força de trabalho, flexibilidade cambial e estabilidade econômica.
O País deve, portanto, mergulhar em uma agenda abrangente, inclusive de liberalização dos serviços, que são insumos importantes da competitividade industrial
O Mercosul garantiu ao Brasil mercado ampliado e reservado para seus produtos industriais. O bloco deve continuar como prioridade na agenda brasileira?
O Mercosul foi importante. Mas, na relação custo-benefício, o resultado não foi o melhor possível. Gosto de comparar o Mercosul a dois processos. A UE foi um processo político, no qual os países continuam abdicando de soberania.
O outro caso é a integração do Sudeste Asiático, onde só agora, com a integração econômica e comercial consolidada, os governos começam a desenhar o arcabouço institucional do bloco. O Mercosul seguiu a Europa, mas sem a base de cessão de soberania. Com o benefício de olhar para trás, creio que uma base mais pragmática para o Mercosul teria dado melhores resultados. Isso não quer dizer que não se possa tomar, agora, esse caminho.
Pragmatismo significa o abandono da união aduaneira?
Ou reconhecer que, se o desejo dos países é ter tantas exceções à Tarifa Externa Comum, o Mercosul está mais para uma área de livre-comércio do que para união aduaneira. Se os seus países não querem abdicar de soberania, poderiam buscar acordos em conjunto, quando convém, ou criar flexibilidades. A ideia de ter na América do Sul um bloco tão integrado, como é economicamente o Sudeste Asiático ou politicamente a Europa não passa de uma quimera.

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