”Empresa de sócio de filho de Lula era fachada para a Oi, diz ex-diretor” -
Folha de S. Paulo, 21/10/2017
Marco Aurélio Vitale, por sete anos diretor comercial do grupo empresarial de Jonas Suassuna, disse em entrevista à Folha que firmas foram usadas como fachada para receber recursos da Oi direcionados a Fábio Luís Lula da Silva, filho do ex-presidente Lula, e seus sócios. De acordo com ele, o Grupo Gol –que atua nas áreas editorial e de tecnologia e não tem relação com a companhia aérea de mesmo nome– mantinha contratos "sem lógica comercial" tendo como único objetivo injetar recursos da empresa de telefonia nas firmas de Suassuna. "A Gol conseguiu um tratamento que não existe dentro da operadora", afirma. As empresas de Suassuna receberam R$ 66,4 milhões da Oi entre 2004 e 2016, segundo relatório da PF. O empresário é dono de metade do sítio em Atibaia (SP) atribuído a Lula. No terreno de sua propriedade não houve reformas –só a instalação de uma cerca– o que o livrou de ser denunciado pelo Ministério Público Federal. Suassuna iniciou a relação comercial com a família de Lula em 2007, quando se tornou sócio da Gamecorp, de Lulinha, Kalil Bittar (irmão de Fernando Bittar, dono da outra metade do sítio) e da Oi. Vitale falou à Folha após ser intimado pela Receita Federal, onde afirma ter apontado irregularidades nas empresas. Ele diz não ter participado de atos ilícitos e quer escrever um livro, cujo nome provisório é "Sócio do filho".
Folha - Como o sr. começou a trabalhar com Jonas Suassuna?
Marco Aurélio Vitale - Conheci Suassuna entre 1997 e 1998, quando eu era gerente de marketing da Folha. Saí desse mercado, mas em 2009 apresentei ao Jonas um projeto. É quando ele me chama para trabalhar.
A sociedade com Lulinha [Fábio Luís] já existia.
Ela sempre foi colocada como uma sociedade lícita que não traria benefícios diretos para o Jonas. Exceto o fato de ser sócio do filho do presidente, o que te dá uma visibilidade natural.
Era mais do que isso?
A empresa não tinha negócios para suportar o custo dela. Era possível pensar que fosse algum investimento futuro. Mas isso se perpetua.
O Grupo Gol é conhecido pela "Nuvem de Livros" e como fornecedora de material didático. Eles não eram suficientes?
A editora de fato vendia os livros, com períodos de vendas altas e baixas. A "Nuvem" teve faturamento significativo, mas foi criada em passado recente [2011]. Como a empresa sobrevive de 2008 a 2011? A receita que existia era da Oi. Diretores sabiam que existiam contratos e receitas milionárias, mas nunca ficou claro quanto e pelo quê a Oi pagava.
O que Suassuna falava sobre esses contratos?
Ele não falava. O modelo de gestão sempre foi muito centralizado. Qualquer assunto era tratado de forma fechada com Fábio, Kalil e Fernando. Esporadicamente se encontravam com Lula em São Paulo.
Mas em nenhum momento os diretores questionaram [a relação com a Oi]?
Um deles um dia me viu muito agitado, trabalhando muito ainda no início, e disse: "O que você está fazendo? Aqui é para ganhar dinheiro e não fazer nada". Porque tinha os contratos com a Oi. Eu corria atrás. Mas a percepção que eu tinha era que os inimigos políticos não faziam negócio, e os amigos não faziam com medo de se comprometer.
E como era a relação com os executivos da Oi?
A Gol conseguiu um tratamento que não existe dentro da operadora. Os projetos não passavam pela área de compras, não existia proposta, e eram valores muito elevados tratados e aprovados diretamente pela presidência da Oi. Toda vez que mudava o presidente da Oi, existia um esforço do Jonas, do Kalil, e muitas vezes do Fernando, de ir até a presidência, fazer reuniões. Dava para notar que tinha que explicar por que se pagava dinheiro tão alto para negócios que não tinham fundamento. Era como se fossem pagamentos com compromisso de realização sem lógica comercial.
Qual era o motivo desses contratos?
Muitos dizem que seria uma contrapartida pela mudança da lei da telecomunicação para permitir a compra da Brasil Telecom. Nunca ouvi falarem disso. Esse assunto não era tratado dessa maneira. Mas Jonas e suas empresas foram utilizadas, na minha opinião, como uma fachada necessária para que o Fábio e Kalil realizassem seus negócios através da ligação familiar. Nesse movimento, os negócios não eram o mais importante. O importante era a entrada de dinheiro.
O nome do ex-presidente era usado?
No caso da Oi, não se falava o nome do ex-presidente porque eles queriam buscar outros negócios e existia dentro da Oi uma noção clara de que a Gol só estava lá por causa do então presidente. As pessoas da Oi não se sentiam à vontade de falar sobre isso. Mas, em almoços que Jonas fazia com empresários, ele sempre se posicionava como sócio do filho do presidente, amigo do presidente.
Lula frequentava a empresa?
Não. Só vi uma vez quando já ele tinha saído da Presidência. Jonas queria mostrar as instalações.
Já se sabia do sítio na empresa?
Sabíamos do sítio, mas ele era do Lula. Nunca foi dito que era do Jonas. Ele nunca tratou sendo como dele, sempre tratou como sítio do Lula. [Após a divulgação do caso,] ele fala, em almoço na empresa, que tinha um sítio ao lado, que comprou como investimento.
Como ficou a empresa depois?
Jonas sempre colocou que era injustiça, perseguição.
Por que permaneceu na empresa por tanto tempo?
Eu trabalhava corretamente e ganhava um bom salário. Não fazia uma operação criminosa. Não cometi ilegalidade.
E por que decidiu falar agora?
Chegou o momento. Você não tem a noção da quantidade de pessoa que sabe do que foi feito. Mas ninguém fala.
O empresário Jonas Suassuna, dono do Grupo Gol, negou em entrevista à Folha ter sido beneficiado pela Oi em razão de suas relações comerciais com Fábio Luís Lula da Silva, filho do ex-presidente Lula. Ele disse que tem um "carimbão" da Polícia Federal, do Ministério Público Federal e da Receita Federal que atestam sua respeitabilidade. "Tudo isso já passou pelo escrutínio da Receita Federal. Já prestei todas as contas e não fui multado. Levei muito tempo para chegar aonde cheguei. Tenho currículo, respeitabilidade e um carimbão da Polícia Federal e do Ministério Público. Em nenhuma delação eu apareci", disse o dono do Grupo Gol, que não tem relação com a companhia aérea.
”E-mail indica contrato 'inflado' da Oi com empresas de Jonas Suassuna” - Planilha anexada num e-mail enviado pela Oi ao grupo empresarial de Jonas Suassuna indica que um dos contratos firmados entre as empresas gerou prejuízo milionário à telefônica. De acordo com os dados, a empresa de telefonia arrecadou apenas R$ 21,1 mil com um conteúdo produzido pela Goal Discos num período em que teve de pagar R$ 16,8 milhões à firma de Suassuna. O contrato usado como base para esses pagamentos é um dos firmados "sem lógica comercial" pelas duas empresas, de acordo com Marco Aurélio Vitale, ex-diretor do grupo, para beneficiar a família do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O contrato foi assinado em janeiro de 2009, dois meses após Lula assinar decreto que viabilizou a compra da Brasil Telecom pela Oi. Segundo as normas estipuladas pelo contrato, o Goal Discos, empresa do Grupo Gol – que atua nas áreas editorial e de tecnologia e não tem relação com a empresa do setor aéreo–, forneceria o conteúdo da "Bíblia na voz de Cid Moreira" para um portal de voz da Oi. Pelo acordo, as empresas dividiriam a receita com o serviço – a Oi, no entanto, garantiria um mínimo mensal de R$ 600 mil.
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