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terça-feira, 27 de fevereiro de 2024

O drama da Ucrânia e o uso de sanções econômicas como arma de guerra (parte 1) - Paulo Roberto de Almeida (portal Interesse Nacional)

Artigo publicado no portal da revista Interesse Nacional, em três partes, aqui a primeira (27/02/2024)

O drama da Ucrânia e o uso de sanções econômicas como arma de guerra (parte 1)

Paulo Roberto de Almeida: 

Revista Interesse Nacional, 27/02/2024

https://interessenacional.com.br/edicoes-posts/paulo-roberto-de-almeida-o-drama-da-ucrania-e-o-uso-de-sancoes-economicas-como-arma-de-guerra-parte-1/

Introdução editorial (trecho do artigo): 

Guerra iniciada com ataque de Putin é a ameaça mais relevante para a segurança na Europa desde a Segunda Guerra Mundial. Nesta primeira de três partes de um artigo, diplomata analisa o impacto da agressão da Rússia sobre as relações internacionais – incluindo a situação do Brasil

Artigo PRA:

Poucas pessoas bem-informadas sobre o estado do mundo atual recusariam a constatação de que a guerra de agressão deslanchada por Putin contra a Ucrânia em fevereiro de 2022, e continuada desde então, constitui a ameaça mais relevante para a segurança e a paz na Europa e no mundo desde que Hitler empreendeu a conquista da Polônia em setembro de 1939, dando início ao mais devastador conflito global da contemporaneidade. A invasão, ilegal nos termos da Carta da ONU e sob todos os pontos de vista, tornou o mundo menos seguro e mais propenso a um conflito ainda mais devastador (Livres, 2023).

Eu escrevi Putin, e não Rússia, e Hitler, em lugar de Alemanha nazista, pois que ambos os ataques criminosos e ilegais, entre muitos outros atos criminosos que precederam tais ataques devastadores, são devidos exclusivamente à vontade pessoal de duas personalidades autoritárias, a rigor animadas por instintos tirânicos, e não aos desejos do povo alemão, em 1939, ou aos do povo russo em 2022.

Similarmente, poucas pessoas informadas sobre o estado do Brasil atual recusariam o fato de que estamos, agora, bem melhores, em termos de civilidade, de política “normal”, de comportamentos minimamente previsíveis dos agentes públicos, do que estávamos nos anos do governo precedente. Por outro lado, não há como deixar de reconhecer que a guerra de agressão da Rússia à Ucrânia afetou não só interesses econômicos e materiais do Brasil como um todo — inflação, comércio exterior, tensões internacionais —, mas também a própria política externa e a diplomacia brasileiras, a partir de seu início. 

Cabe, portanto, abordar essas duas questões — o estado incerto, na Europa e do mundo, na atual conjuntura, e os desafios daí decorrentes para o Brasil como um todo, em especial para as suas relações exteriores — numa abordagem de natureza conceitual, tanto quanto de ordem prática, dadas as múltiplas facetas do mundo pós-invasão da Ucrânia e do Brasil pós-terremoto bolsonarista. Não há como recusar o fato notório de que o mundo se ressente de diversos elementos disruptivos desde a guerra de agressão à Ucrânia, assim como o Brasil ainda suporta o impacto das ameaças ao sistema democrático brasileiro feitas durante os quatro anos do mandato imediatamente precedente ao atual.

Na raiz de ambas as questões, o estado do mundo e o do Brasil, existem processos objetivos — as relações econômicas e políticas entre os respectivos atores globais e regionais — tanto quanto elementos subjetivos, derivados das personalidades envolvidas nos contextos respectivos. A complexidade dessas interações requer uma abordagem metódica e linear de cada um dos problemas, pois que o estado atual do mundo e do Brasil decorre de escolhas feitas no passado, no plano mais geral das políticas nacionais, assim como de decisões tomadas segundo o arbítrio dos personagens mais diretamente envolvidos nas questões.

A história não se repete, mas ela pode trazer de volta fantasmas do passado

(...)

[corte devido à extensão do artigo]

(...)

O diplomata e cientista político José Guilherme Merquior, ao analisar em sua tese de doutoramento na London School of Economics, a obra de Rousseau e de Weber (1980), cunhou um novo conceito, o de “carisma burocrático”, como para sinalizar que o fenômeno, no sistema soviético, tinha deixado de ser personalista para ser encarnado na organização do partido leninista. Esse fator humano pode, doravante, deixar de funcionar no quadro do “carisma burocrático” do PCC, criado depois da liderança demencial de Mao Tse-tung por Deng Xiaoping e mantido nas décadas seguintes, a partir do terceiro mandato concedido a Xi Jinping, que parece estar impulsionando novamente o carisma personalista, eventualmente responsável por um futuro ataque a Taiwan (mas ainda assim minuciosamente planejado pelo partido e pelas Forças Armadas). No caso de Putin, esse “carisma” já deixou de funcionar há muito, como amplamente demonstrado na pequena biografia de Karen Dawisha (2015), sobre a verdadeira natureza do atual regime neoczarista (que tem alguns traços de stalinismo).

(a continuar)


* Paulo Roberto de Almeida é diplomata de carreira, doutor em ciências sociais pela Université Libre de Bruxelles, mestre em Planejamento Econômico pela Universidade de Antuérpia, licenciado em ciências sociais pela Université Libre de Bruxelles, 1975). Atua como professor de economia política no Programa de Pós-Graduação em direito do Centro Universitário de Brasília (Uniceub). É editor adjunto da Revista Brasileira de Política Internacional.


Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional. 

(O texto continua nas partes 2 e 3, que serão publicadas nas próximas semanas)\

Leitura integral desta primeira parte neste link: 

https://interessenacional.com.br/edicoes-posts/paulo-roberto-de-almeida-o-drama-da-ucrania-e-o-uso-de-sancoes-economicas-como-arma-de-guerra-parte-1/

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