O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

Meu Twitter: https://twitter.com/PauloAlmeida53

Facebook: https://www.facebook.com/paulobooks

(interrompido desde maio de 2024)

quinta-feira, 25 de julho de 2024

Nota sobre os trágicos eventos ocorridos na Venezuela (2014) - no Facebook do Partido Novo

 Nota sobre os trágicos eventos ocorridos na Venezuela

Partido Novo

Fevereiro de 2014 

 

A Venezuela tornou-se, desde o início do poder chavista, uma sociedade dividida e profundamente alterada pelas políticas antidemocráticas do finado Coronel Hugo Chávez, hoje ainda mais dividida pelo agravamento da situação econômica e social, pelo aumento da delinquência, pelas arbitrariedades políticas e pelos atentados cometidos pelo próprio poder governamental contra as liberdades democráticas e os direitos humanos, ocorridos em escala crescente desde a eleição altamente irregular, e contestada, do sucessor Nicolás Maduro, em dezembro de 2013. 

O Partido Novo vem a público denunciar a violência cometida pelo aparato de segurança do regime chavista, e por milícias irregulares por ele controladas, contra manifestantes pacíficos, em sua maioria estudantes, que foram às ruas expressar sua desconformidade com a situação geral do país, com a falta de liberdades democráticas e com a deterioração da situação econômica e de segurança. 

O Partido Novo também expressa sua desconformidade com a nota emitida em 17/02/2014, pelos Estados Partes do Mercosul, entre eles o governo brasileiro, que tende a atribuir a responsabilidade pela violência registrada na Venezuela aos próprios manifestantes, numa demonstração inacreditável de má-fé política e de sectarismo ideológico. O Partido Novo denuncia essa nota, indigna de nossas melhores tradições diplomáticas, que só deve sua emissão ao fato de que o governo brasileiro atual valoriza mais suas alianças espúrias no plano regional e internacional do que o respeito aos direitos humanos e as liberdades democráticas. 

O Partido Novo declara seu apoio político aos manifestantes pacíficos da Venezuela e expressa sua solidariedade à oposição democrática, que tenta, num ambiente de extrema dificuldade, continuar seu trabalho legítimo de defesa da democracia e de todas as liberdades civis, violadas continuamente pelo poder chavista.

O Partido Novo também expressa suas condolências aos familiares das vítimas e espera que fatos deploráveis como os recentemente ocorridos não venha a repetir-se na presente conjuntura, de alta tensão no país. Finalmente, o Partido Novo chama o governo brasileiro a assumir uma atitude de defesa plena dos princípios e valores que caracterizam o Mercosul, em especial aqueles expressos em seus protocolos em defesa da democracia e dos direitos humanos.

Hartford, 17 de Fevereiro de 2014

 

=======

 

Texto publicado no Facebook do Partido Novo: 

https://www.facebook.com/partidonovo?fref=ts

 

PARTIDO NOVO (18/02/2014)

A Venezuela tornou-se, desde o início do poder chavista, uma sociedade dividida e profundamente alterada pelas políticas antidemocráticas do finado Coronel Hugo Chávez, hoje ainda mais pelo agravamento da situação econômica e social, pelo aumento da delinquência, pelas arbitrariedades políticas e pelos atentados cometidos pelo próprio poder governamental contra as liberdades democráticas e os direitos humanos, ocorridos em escala crescente desde a eleição contestada, do sucessor Nicolás Maduro, em dezembro de 2013.

Julgamos inaceitável a violência cometida pelo aparato de segurança do regime chavista, e por milícias irregulares por ele controladas, contra manifestantes pacíficos, em sua maioria estudantes, que foram às ruas expressar sua desconformidade com a situação geral do país, com a falta de liberdades democráticas e com a deterioração da situação econômica e de segurança.

Expressamos nossas condolências aos familiares das vitimas e solidariedade à oposição democrática, que tenta, num ambiente de extrema dificuldade, continuar seu trabalho legítimo de defesa da democracia e de todas as liberdades civis, violadas continuamente pelo poder cravista.

Declaramos também nossa desconformidade com a nota emitida em 17/02/2014, pelos Estados Partes do Mercosul, entre eles o governo brasileiro, que tende a atribuir a responsabilidade pela violência registrada na Venezuela aos próprios manifestantes, numa demonstração de má-fé política e de sectarismo ideológico. Fica mais uma vez evidente que o governo brasileiro atual valoriza mais suas alianças espúrias no plano regional e internacional do que o respeito aos direitos humanos e as liberdades democráticas.

 


Ruptura democrática no e do Mercosul: a “suspensão” do Paraguai e “adesão” da Venezuela (2012) - PRA (revista Política Externa)

 Ruptura democrática no e do Mercosul: a “suspensão” do Paraguai e “adesão” da Venezuela

Artigo publicado sob nom de plume

Professor universitário; especialista em relações internacionais.

Política Externa (vol. 21, n. 3, jan./fev./mar. 2013, p. 29-55).

Divulgado na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/122347060/2442_Ruptura_democratica_no_e_do_Mercosul_a_suspensao_do_Paraguai_e_adesao_da_Venezuela_2012_);

 

Abstract: Reappraisal, and analysis, of the facts and processes that lead, at the 2012 Mercosur Mendoza’s summit, to Paraguay’s “surrendering” from this trade bloc, after the constitutional dismissal of its president, and to the simultaneous “adhesion” of the Bolivarian Republic of Venezuela into this integration scheme, at the expense of the legal commitments of member countries. Argentina and Brazil, together with other Unasur countries, acted at the margin of, and totally contrary to the main foundation treaties of Mercosur, including the Ushuaia Protocol on the democratic clause. The episode reaffirms the transformation of Mercosur from a trade bloc into a political mechanism, subjected to arbitrary maneuverings of the leftwing presidencies.

Key-words: Mercosur. Paraguay. Venezuela. Brazil. Argentina. Unasur. Democracy.

 

1. Objetivos e metodologia

O presente texto pretende oferecer um relato objetivo dos fatos e processos ocorridos a partir da reunião de cúpula do Mercosul em Mendoza (junho de 2012), quando se decidiu a “suspensão” do Paraguai das reuniões do bloco, medida de tipo político imediatamente seguida de outra, sem qualquer fundamentação política ou jurídica: a “adesão” da Venezuela. Duas seções iniciais tratarão dos antecedentes de cada um dos eventos, contextualizando-os historicamente; as seções seguintes tratarão dos episódios factualmente; ao final, uma análise explicativa. Título, propósitos e o uso de aspas nos conceitos acima requerem de imediato uma explicação introdutória. 

A peculiaridade do título – ruptura democrática “no e do” Mercosul – expressa concretamente o que ocorreu, tanto em um, quanto em outro episódio; ou seja, o que se registrou, efetivamente, foi uma quebra, de natureza política, da institucionalidade do Mercosul, bem como uma evidente falta de respeito aos instrumentos fundacionais, por iniciativa de dois de seus membros. 

(...)

BRICS: an alliance that more than twenty countries now want to be part of - Pedro Scuro

 As President Lula recently admitted, the best thing for Brazil is to play its cards as a member of BRICS (first of the countries by alphabetical order, but also by political decision) and compete not only economically, but also by developing an innovative social policy. 


BRICS: an alliance that more than twenty countries now want to be part of

We grow up hearing that in a different way from people, countries have no mutual affections, only interests. It’s maybe not the case of BRICS nations, among whom, as in great love affairs, things got serious on a beautiful summer day in Yekaterinburg thanks to their shared characteristics. So serious that from timid handshakes in the beginning at each subsequent meeting partners exchanged “engagement rings,” so from brief encounters emerged an “alliance” of which at present more than twenty other countries want to be part.

Far from a fleeting matter it became apparent that BRICS is written in the stars – like in Rihanna’s song: “From the moment of our inception/ we were destined to be together/ on a mission to last forever”. A tune not sung in the global South as much as in powerhouses of Western academia, where the disintegration of world financial markets and their weak recovery is associated with the demise of Bretton Woods institutions created after World War II to put subaltern economies on the halter.

Those straps have done terrible damage, nearly destroying entire societies, including what was left of former Soviet Union. Corsets relying on school-boy convictions on the merits of market-led strategies that, by favoring people at the top in developing countries they eventually pass on to the lower strata. Wonders such as when the rich receive tax cuts these somehow pass down creating jobs for the hoi polloi.

To wangle what typically turns out a mess – and to bestow afterlife to IMF and World Bank – the elite lot of Western democracies carved out G-7, dreamt as the world’s informal steering committee, mission soon reassigned to G-20 expressly to persuade Brazil, China, and India that at last they were recognized as ‘coordinators’ of new clusters of global players. It worked in the beginning. In 2009 Brazil and China were given the dubious privilege to contribute to ensure IMF and World Bank “as much as $1 trillion in additional resources” to support Greece, Hungary, Iceland, Ireland, Latvia, Pakistan, and Ukraine through their financing shortfalls.

By the same token, too eager to play a serious role Brazil became the largest troop contributor – and the only sponsor, according to Lula – to the disastrous “United Nations Stabilization Mission” in Haiti. The aftereffect of a coup d’état orchestrated by France and United States to topple a lawful president advocate of liberation theology, and to dissuade him from returning. Ironically, as foreign screwups became unbearable, it was not U.S. and French flags but that of Brazil which the populace burned in the streets of Port-au-Prince, chanting “Down with the occupation!

Haiti has shown China and Brazil the futility of learning from imperialism of power whose last offspring is the Jewish settler state, endowed with autonomy and countless resources to carry out fiendish lessons learned from its paragons. As Lula recently admitted, the best for Brazil, and possibly for China, is to play cards as members of BRICS and compete not only in economic and political casinos but in terms of innovative social policy. For that matter, poorly conceived U.S.-inspired schemes such as “race quotas” were supplanted by cash transfer programs and preventing vulnerable youth from falling prey to organized crime and/or to murderous police squads, yet another imperialist residue.

Financial services, hand-in-hand with fiscal irresponsibility, radical Christianity, and refusal to address the oil crisis lead Brazil to the “point of Armageddon”

As regards industrial policy also very little is to be expected from the advanced West, unless contrariwise. As the president of the Brazilian development bank, Aloisio Mercadante, points out, the country industrialized late, under the pressure of 1929 commodity crisis. The precise moment when real difference was made by – what Zygmunt Bauman called – “active utopias” (“makeable society,” social justice, socialism) uphold by founding members of the International Labor Organization (1919) and used as catalysts to balance idealism and pragmatism and put social reforms into practice through “international labor regimes.”

Bearing those utopias in mind reforms were set going in the 1940s and shaped a state-controlled social order consistent with the interests of large groups. They served as beacons for private competition but also met the basic agenda of labor movement. Identities of business and trades were redefined, citizenship stratified by splitting occupations into professional categories, giving rise to a highly vigorous, plural and primordially urban society in a capitalist, “artifacted” context resulting from technology, organization, and total (economic, symbolic, political) confrontation.

Subsequently, the state and productive basis put together in the forties and fifties, entered a period of accelerated growth and fashioned one of the world’s most modern urban societies, in which industry accounted for more than 30% of GDP, higher that China and Korea in 1980’s. All at the expense of public debt. Brazilian financial intermediary system services basically a mercantile economy, and since the public sector lacks effective fundraising instruments, imbalances already present in the economy invariably increase. Quite the opposite in China and Korea, Professor Mercadante remarks.

China and Korea make the most of “a creative relation between state and market, development-inducing state sectors, and strategic public companies in key sectors”, allowing both countries “to formulate new financing mechanisms not subordinated to the logic of financialization” – whereby financial services, broadly construed – hand in glove with fiscal irresponsibility, radical Christianity and refusal to deal with the oil crisis – take over an overriding economic, cultural, and political role, accruing no real benefit to society, in point of fact edging it to a “point of Armageddon.”

Lula can build a stronger, fairer, and more generous country, ready to become a “window of historic opportunity”

For that matter, rather than spooky “Armageddon” better to acknowledge the true nature of things in a changing world and refer – as Antonioni in “Zabriskie point” – to “the void” of the ruling elites’ culture that over and over and in ever more ferocious ways commands the collapse of everyone and everything. A crippling “void” in point is Brazil’s tax system, seen by media and academia as “a madhouse” set to preserve privileges.

In December, to a standing ovation in Congress Lula announced the most telling overhaul that, after more than 30 years in the making, will simplify such a perverse mechanism. Still, asked The Economist, can he “withstand the pressure from special-interest groups in order to implement it fully?” Some say no, since in January Lula announced a new industrial policy involving hundreds of billions in grants, subsidized loans and import-tax exemptions for inputs to national companies between now and 2026. Moves that certainly “undermine the idea of a simplified tax system”, the journal concludes naively.

Indeed, more than “keeping fiscal accounts in order,” the idea is to reverse a long-lasting process of deindustrialization, this time avoiding delusional fantasies of wealth, power, or omnipotence, such as when the country uncunningly went by G-20 rules or when it expected to deliver something good relying on undependable partners such as EU, US, Brazilian generals.

Then again, as in the old Jimmy James’s song, “now is the time to set things right”and punctuate that as part of BRICS Brazil may – provide no obsession with grandiose actions is involved – be about to initiate an effort no one better than Lula represents for. It means increasing mass consumption, credit and investment, primacy for innovation-minded companies, and a country more vigorous, just and generous, ready to become a “window of historical opportunities” in a world beleaguered by pain, war, crisis, risk, strain, and despair.

SOCIOLOGIST

Pedro Scuro


As President Lula recently admitted, the best thing for Brazil is to play its cards as a member of BRICS (first of the countries by alphabetical order, but also by political decision) and compete not only economically, but also by developing an innovative social policy. 

BRICS: an alliance that more than twenty countries now want to be part of

We grow up hearing that in a different way from people, countries have no mutual affections, only interests. It’s maybe not the case of BRICS nations, among whom, as in great love affairs, things got serious on a beautiful summer day in Yekaterinburg thanks to their shared characteristics. So serious that from timid handshakes in the beginning at each subsequent meeting partners exchanged “engagement rings,” so from brief encounters emerged an “alliance” of which at present more than twenty other countries want to be part.

Far from a fleeting matter it became apparent that BRICS is written in the stars – like in Rihanna’s song: “From the moment of our inception/ we were destined to be together/ on a mission to last forever”. A tune not sung in the global South as much as in powerhouses of Western academia, where the disintegration of world financial markets and their weak recovery is associated with the demise of Bretton Woods institutions created after World War II to put subaltern economies on the halter.

Those straps have done terrible damage, nearly destroying entire societies, including what was left of former Soviet Union. Corsets relying on school-boy convictions on the merits of market-led strategies that, by favoring people at the top in developing countries they eventually pass on to the lower strata. Wonders such as when the rich receive tax cuts these somehow pass down creating jobs for the hoi polloi.

To wangle what typically turns out a mess – and to bestow afterlife to IMF and World Bank – the elite lot of Western democracies carved out G-7, dreamt as the world’s informal steering committee, mission soon reassigned to G-20 expressly to persuade Brazil, China, and India that at last they were recognized as ‘coordinators’ of new clusters of global players. It worked in the beginning. In 2009 Brazil and China were given the dubious privilege to contribute to ensure IMF and World Bank “as much as $1 trillion in additional resources” to support Greece, Hungary, Iceland, Ireland, Latvia, Pakistan, and Ukraine through their financing shortfalls.

By the same token, too eager to play a serious role Brazil became the largest troop contributor – and the only sponsor, according to Lula – to the disastrous “United Nations Stabilization Mission” in Haiti. The aftereffect of a coup d’état orchestrated by France and United States to topple a lawful president advocate of liberation theology, and to dissuade him from returning. Ironically, as foreign screwups became unbearable, it was not U.S. and French flags but that of Brazil which the populace burned in the streets of Port-au-Prince, chanting “Down with the occupation!

Haiti has shown China and Brazil the futility of learning from imperialism of power whose last offspring is the Jewish settler state, endowed with autonomy and countless resources to carry out fiendish lessons learned from its paragons. As Lula recently admitted, the best for Brazil, and possibly for China, is to play cards as members of BRICS and compete not only in economic and political casinos but in terms of innovative social policy. For that matter, poorly conceived U.S.-inspired schemes such as “race quotas” were supplanted by cash transfer programs and preventing vulnerable youth from falling prey to organized crime and/or to murderous police squads, yet another imperialist residue.

Financial services, hand-in-hand with fiscal irresponsibility, radical Christianity, and refusal to address the oil crisis lead Brazil to the “point of Armageddon”

As regards industrial policy also very little is to be expected from the advanced West, unless contrariwise. As the president of the Brazilian development bank, Aloisio Mercadante, points out, the country industrialized late, under the pressure of 1929 commodity crisis. The precise moment when real difference was made by – what Zygmunt Bauman called – “active utopias” (“makeable society,” social justice, socialism) uphold by founding members of the International Labor Organization (1919) and used as catalysts to balance idealism and pragmatism and put social reforms into practice through “international labor regimes.”

Bearing those utopias in mind reforms were set going in the 1940s and shaped a state-controlled social order consistent with the interests of large groups. They served as beacons for private competition but also met the basic agenda of labor movement. Identities of business and trades were redefined, citizenship stratified by splitting occupations into professional categories, giving rise to a highly vigorous, plural and primordially urban society in a capitalist, “artifacted” context resulting from technology, organization, and total (economic, symbolic, political) confrontation.

Subsequently, the state and productive basis put together in the forties and fifties, entered a period of accelerated growth and fashioned one of the world’s most modern urban societies, in which industry accounted for more than 30% of GDP, higher that China and Korea in 1980’s. All at the expense of public debt. Brazilian financial intermediary system services basically a mercantile economy, and since the public sector lacks effective fundraising instruments, imbalances already present in the economy invariably increase. Quite the opposite in China and Korea, Professor Mercadante remarks.

China and Korea make the most of “a creative relation between state and market, development-inducing state sectors, and strategic public companies in key sectors”, allowing both countries “to formulate new financing mechanisms not subordinated to the logic of financialization” – whereby financial services, broadly construed – hand in glove with fiscal irresponsibility, radical Christianity and refusal to deal with the oil crisis – take over an overriding economic, cultural, and political role, accruing no real benefit to society, in point of fact edging it to a “point of Armageddon.”

Lula can build a stronger, fairer, and more generous country, ready to become a “window of historic opportunity”

For that matter, rather than spooky “Armageddon” better to acknowledge the true nature of things in a changing world and refer – as Antonioni in “Zabriskie point” – to “the void” of the ruling elites’ culture that over and over and in ever more ferocious ways commands the collapse of everyone and everything. A crippling “void” in point is Brazil’s tax system, seen by media and academia as “a madhouse” set to preserve privileges.

In December, to a standing ovation in Congress Lula announced the most telling overhaul that, after more than 30 years in the making, will simplify such a perverse mechanism. Still, asked The Economist, can he “withstand the pressure from special-interest groups in order to implement it fully?” Some say no, since in January Lula announced a new industrial policy involving hundreds of billions in grants, subsidized loans and import-tax exemptions for inputs to national companies between now and 2026. Moves that certainly “undermine the idea of a simplified tax system”, the journal concludes naively.

Indeed, more than “keeping fiscal accounts in order,” the idea is to reverse a long-lasting process of deindustrialization, this time avoiding delusional fantasies of wealth, power, or omnipotence, such as when the country uncunningly went by G-20 rules or when it expected to deliver something good relying on undependable partners such as EU, US, Brazilian generals.

Then again, as in the old Jimmy James’s song, “now is the time to set things right”and punctuate that as part of BRICS Brazil may – provide no obsession with grandiose actions is involved – be about to initiate an effort no one better than Lula represents for. It means increasing mass consumption, credit and investment, primacy for innovation-minded companies, and a country more vigorous, just and generous, ready to become a “window of historical opportunities” in a world beleaguered by pain, war, crisis, risk, strain, and despair.

SOCIOLOGIST

Pedro Scuro


Crônica de um desastre anunciado: o socialismo do século 21 na Venezuela (2009) - Paulo Roberto de Almeida

 Crônica de um desastre anunciado: o socialismo do século 21 na Venezuela

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 20 de julho de 2009

 

1. A construção do socialismo dito do século 21

Começo por transcrever trechos selecionados de matéria do jornal espanhol El País, de 20 de julho de 2009, de autoria de seu correspondente em Caracas: “Chávez apunta a la propiedad privada”. Segundo somos informados pelo que relatou o autor desse despacho, Maye Primera: “La publicidad consume cada vez más segundos del programa televisivo dominical del presidente venezolano, Hugo Chávez, desde que se ha propuesto hacerse con el control de los medios de producción del país, bien creando ‘empresas de producción social’ o confiscando empresas privadas ‘capitalistas’.” As chamadas de matéria, ou seja, os subtítulos, sublinham os dois focos principais desse despacho: “La Ley de Propiedad Social abre la puerta a nuevas expropiaciones de bienes y empresas” e “El proyecto prevé la militarización de los trabajadores estatales”.

Como ainda se lê nessa matéria: “El Gobierno venezolano ha emprendido un viraje hacia la economía socialista y el último paso ha desatado todas las alarmas: se trata del proyecto de Ley de Propiedad Social, que abre la puerta a nuevas confiscaciones de empresas y bienes y que, según cámaras empresariales y organizaciones no gubernamentales, permitirá al Ejecutivo arrasar con la propiedad privada. En el último año, Chávez ha convertido a más de 12.000 firmas contratistas de la estatal Petróleos de Venezuela en ‘empresas de producción social’, gracias a la entrada en vigor de una nueva Ley de Contrataciones Públicas y a la aprobación, en mayo de este año, de una ley que reserva al Estado todos los negocios vinculados a la explotación de hidrocarburos. Por decreto o mediante expropiaciones, el presidente venezolano también ha ordenado la nacionalización del sector eléctrico, de las telecomunicaciones, de la metalurgia, de la industria del cemento, de plantas procesadoras de alimentos y de tierras para la siembra y la ganadería. Su última gran compra fue la de la filial venezolana del Banco Santander, que otorga al Estado el dominio del 25% de las captaciones de la banca nacional.

Não contente com a transformação de muitas empresas em “contratadas” da PDVSA, o governo do coronel Chávez deseja ir um pouco mais além na socialização da economia: “Si bien la Constitución establece la posibilidad de que el Estado declare la utilidad pública y expropie una propiedad, la revolución desea ir más allá en los supuestos que justifican la medida. El proyecto de Ley de Propiedad Social, en el que trabaja desde abril la mayoría oficialista en el Parlamento, faculta al Gobierno a ‘declarar la utilidad pública y el interés social de bienes, materiales e infraestructuras que se determinen susceptibles de ser declarados de propiedad social, para asegurar, mediante la producción socialista, la satisfacción de las necesidades sociales y materiales de la población’. El borrador de la ley también establece que el Ejecutivo ‘podrá decretar la expropiación forzosa, mediante justa indemnización’, de los bienes ‘cuya actividad productiva no se corresponda con los intereses nacionales y el modelo socioproductivo’.

 

2. De volta às teorias de Marx e Engels

Os fundamentos conceituais do socialismo do século 21 estão baseados na chamada ‘teoria do valor’, com todos os equívocos conceituais e anacronismos históricos que esse tipo de ‘salto epistemológico’ pode implicar, como já tive ocasião de explicitar e de analisar neste meu trabalho: “Falácias acadêmicas, 9: o mito do socialismo do século 21”, Espaço Acadêmico (vol. 9, n. 97, junho 2009, p. 12-24; http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/7184/4136).

Agora o que se pretende, segundo se lê ainda na matéria do El País, seria a aplicação das recomendações dos dois teóricos do socialismo do século 19 às realidades contemporâneas: “Los redactores del proyecto también han hecho una lectura bastante literal de la idea de crear ‘ejércitos industriales’, planteada por Carlos Marx y Federico Engels en elManifiesto ComunistaAdemás de ‘asumir el compromiso del trabajo productivo por la patria’ y de ‘formarse técnicamente para el manejo de las empresas socialistas’, el proyecto de ley establece que será deber de los trabajadores ‘formarse militarmente para la defensa de la soberanía nacional’.” Observo, de passagem que se trata de uma idéia bem mais leninista – a constituição de milícias operárias e camponesas, ou soviets – do que propriamente marxista, cujo foco estava no exército industrial estrito senso, ou seja, uma classe universal de trabalhadores organizados na atividade manufatureira, não de um corpo militarizado a serviço do Estado ou do partido no poder.

Aparentemente, esse tipo de mobilização não atraiu muito o interesses dos próprios trabalhadores ou de seus representantes sindicais. Em todo caso, isso não parece abalar os dirigentes socialistas da Venezuela, segundo se lê ainda na mesma matéria: “Pero esa clase obrera ‘revolucionaria’ llamada a conducir las industrias no ha crecido al mismo ritmo que el capital de este Estado petrolero. A pesar de los esfuerzos del Partido Socialista Unido de Venezuela, la revolución no ha logrado, en 10 años, hacerse con una base sindical sólida, y las reivindicaciones laborales en el sector público, desde el magisterio hasta los petroleros, están a la orden del día.” Em função dessas reticências, a evolução se dá nesta direção: “Por eso, para cerrar el círculo, el Gobierno también se ha planteado sustituir a los sindicatos por ‘comités socialistas de trabajadores’ con los que el Estado-patrón sí estaría en disposición de negociar contratos y salarios.

Ou seja, em última instância, o Estado – ou melhor, o líder supremo – não confia nos sindicatos e busca substituí-los por obedientes correias de transmissão da vontade soberana do líder máximo. Já assistimos esse filme em outras experiências de “revolução” socialista e o mínimo de que se pode dizer é que não existe, de fato, mudança real na situação da classe trabalhadora, apenas a substituição de um patrão por outro. Como dizia uma velha piada, o capitalismo é a exploração do homem do homem pelo homem; o socialismo é exatamente o contrário...

 

3. Já vimos o mesmo filme várias vezes antes; aliás, já sabemos o final...

Permito-me, agora, agregar meus comentários sobre a matéria em questão, com o objetivo precípuo de oferecer esclarecimentos aos mais jovens, entusiastas talvez do ‘socialismo do século 21’ que vem sendo tentado na Venezuela, e que provavelmente não conhecem ou não leram suficientemente sobre os diversos experimentos realizados no século 20 em torno dessas mesmas idéias e objetivos.

Não parece difícil prever a trajetória econômica futura da Venezuela, com base nesses objetivos declarados de sua liderança de construir o tal de socialismo do século 21. Não vou tratar agora do itinerário político do país, que me parece também reproduzir outros experimentos falidos no século 20, em especial nos diversos tipos de regimes estatizantes tentados entre as duas guerras mundiais.

No caso da Venezuela, o que estamos assistindo, na verdade, é a um laboratório vivo, em tempo real, de todos os desastres acumulados pelos coletivismos do século 20, com seu cortejo de tragédias humanas e catástrofes econômicas. Não é necessário ser historiador para ressaltar que as mais importantes experiências de mudança histórica nos fundamentos econômicos da sociedade ocorreram em dois grandes países da Eurásia, a partir de 1917 e de 1949, respectivamente, a Rússia e a China, ambas convertidas ao socialismo de tipo marxista. Uma retrospectiva histórica do que constituíram esses experimentos pode ser encontrada nos bons livros de história, ou pelo menos naqueles ostentando um mínimo de objetividade ou de honestidade intelectual para apresentar o que foram, efetivamente, essas duas grandes revoluções do século 20. 

 O fato de transportar esses experimentos do século 20 para o século 21, apenas agregando novas roupagens a velhas ideias, não parece mudar muito a essência do problema. De fato, já sabemos como vai terminar essa história toda, e parece inacreditável que pessoas normais, brasileiros ou venezuelanos, não o percebam ou finjam ignorar os precedentes históricos Se podemos prever algo certo – pois não sabemos ainda qual exatamente será o desfecho, se tudo vai terminar com uma lenta deterioração econômica, uma implosão política, uma explosão ou catástrofe social, ou qualquer outro tipo de conclusão para o caso, inclusive aventuras guerreiras do líder máximo – o fato e' que o povo venezuelano vai sofrer muito, com penúrias no abastecimento, erosão do poder de compra, desinvestimento produtivo, desemprego, mercado negro, enfim, o cenário habitual de todo socialismo conhecido (basta mirar nos dois exemplos que ainda restam, Cuba e Coréia do Norte, para comprovar).

Quanto ao panorama político e social, o itinerário tampouco é difícil de ser traçado: como no experimento cubano, grande parte da classe média vai se exilar em Miami, na Espanha, ou alhures, os aparatchiks do partido e a Nomenklatura do novo regime vão se consolidar no poder, como sempre até o desastre final, cujos contornos ainda não sabemos definir com precisão.

Este breve comentário constitui, obviamente, a crônica de um desastre anunciado, com a única diferença de que o desastre já ocorreu em ocasiões anteriores e que seu desfecho era facilmente previsível.

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 20 de julho de 2009

 

“Nenhum país é governável com a mentalidade gasto é vida" - Entrevista - Luis Stuhlberger (Valor Econômico)

 Introdução de Mauricio David:

Luis Stulberger é considerado por muitos o Warren Buffett ( o “mago” de Omaha...) brasileiro. É uma questão de opinião, mas algumas das coisas que ele diz são de gente, como ele, que conhece as condições de mercado. Algumas das suas previsões são complicadas (o governo Lula III seguindo os passos do desastre Dilma II, o dólar apontando para 7,0, o gasto previdenciário estourando, etc e tal). Um Deus nos acuda ! Mas que as suas previsões são realistas, lá isto são. O País está à beira do caos, com um presidente doidivanas que pensa que sabe economia e com um Ministro da Fazenda que entende um pouquinho – mas bem pouquinho mesmo...- de Sociologia e nada de Economia... Eh!, o futuro que se vislumbra não é nada otimista... Salve-se quem puder ! Ainda bem que 2026 está às portas, com novas eleições presidenciais... Mas falta ao Brasil um novo Fernando Henrique (o atual está fora de combate, preso ao leito), um novo Ricupero ( que se coloca fora de cogitação), quem nos sobrará ? O Malan não tem gosto pela política, o Bacha só pensa nas vaidades da Academia Brasileira de Letras, o Ciro rifou-se a si próprio, só sobra o Eduardo Paes que pensa que pode governar distribuíndo benesses e estádios às torcidas do Vasco e do Flamengo... Mas que país é esse ?, se perguntavam os roqueiros da Legião Urbana. Uma Pasárgada, como dizia Manuel Bandeira. Ou talvez a Maracangalha, do Dorival Caymmi...

MD

 

"Nenhum país é governável com a mentalidade gasto é vida"

 

VALOR ECONÔMICO - SP

24/07/2024

 

Entrevista - Para Stuhlberger, da Verde, câmbio depreciado veio para ficar e troca no BC preocupa

 

À frente do emblemático fundo Verde, um dos multimercados mais antigos da indústria de gestão de recursos no Brasil, Luis Stuhlberger mudou o posicionamento da carteira para um cenário mais pessimista a partir de abril. Foi quando o governo encaminhou a proposta do orçamento para 2025 que ficou claro que o arcabouço fiscal, desenhado no ano passado, não era crível. Com premissas de arrecadação extremamente agressivas, despesas subestimadas e um PIB projetado em 2%, a lógica do "gasto é vida" do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou à mesa.

O teto de gastos, diz, já tinha sido derrubado no final do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro. Depois de Lula conseguir com o Congresso cerca de R$ 150 bilhões com a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da transição, soma similar à obtida por Bolsonaro, o crescimento de gastos previdenciários e assistenciais mostra uma equação difícil de ser resolvida.

"A quantidade de gente no Brasil que recebe um cheque do governo por mês é de 111 milhões de pessoas. A massa que trabalha não consegue bancar pagamentos para quem não trabalha", diz Stuhlberger, ao atualizar o seu diagnóstico macroeconômico e refletir sobre a indústria de multimercados.

No ajuste do timão, o gestor passou a comprar dólar, diminuiu a parcela em ações e trocou a histórica exposição em Notas do Tesouro Nacional série B (NTN-B) pela equivalente americana, a Treasury Inflation-Protected Securities (TIPS). Foi insuficiente para superar o CDI no ano, mas o Verde é um dos poucos multimercados tradicionais que numa janela de 2,5 anos ainda tem gordura em relação ao referencial.

"Eu diria que o Brasil é uma corrida bancária que ficou controlada, mas a atuarial não. Isso foi um fator de perda para os fundos brasileiros, tanto multimercados quanto de ações." A sucessão de Roberto Campos Neto na presidência do Banco Central é um fator de preocupação se o indicado for alguém que ceda a pressões políticas por corte de juros. "O governo do PT quer sempre acelerar, vai no limite. Só que aí obriga o BC a brecar, e se tirar esse equilíbrio, que é o que a [ex-presidente] Dilma [Rousseff] fez, colocando o [Alexandre] Tombini, aí há um estrago. Se isso acontecer, eu garanto que a coisa que você vai ter mais saudades é do tempo que conseguia comprar dólar a R$ 5,60, porque ele vai pra R$ 7." Ele não vê, contudo, esse cenário se concretizando se Gabriel Galípolo, atual diretor de política monetária, for o escolhido, mas diz que o real mais depreciado veio para ficar.


A seguir, trechos da conversa com Stuhlberger, que recebeu o Valor na sede da gestora no fim da semana passada.

0 pé trocado dos multimercados Os multimercados, grandes e menores, operam bastante no exterior. Mas claro, têm o "edge" brasileiro. Dificilmente você vai ver um multimercado aqui que não tenha nenhuma posição no Brasil. E digamos assim que esses sete meses, seis meses mais um, o Brasil teve uma deterioração no preço dos ativos bastante significativa.

A gente pegou essa deterioração no começo. Fomos mal de janeiro a abril, mas de abril em diante, meio que virou. Eu já falei que me penitencio por ter acreditado que o PT teria alguma seriedade fiscal. Aí mudei de ideia, a gente passou a comprar dólar, diminuir a exposição a ações, trocamos as NTN-Bs por TIPS americanas, e aí melhoramos a performance. Não deu para compensar todas as perdas, que não foram enormes. Mas, pelo menos, eu acho que a gente agora está do lado certo do ciclo econômico.

Quebra de confiança 

O teto de gasto já levou um tiro no final do governo Bolsonaro. Aí vem uma fase de muita tensão no Brasil, no segundo semestre de 2022, que era política mesmo, tipo vamos ter um presidente? Bolsonaro falou que não ia aceitar o resultado das urnas. Foi extremamente sério. Estrangeiros dizendo assim: "não posso investir no Brasil porque não sei se vocês vão ter um presidente"; foi apavorante. Aí o Lula ganha por uma margem pequena, mas governa como se tivesse uma margem enorme. Esperava-se um Lula, digamos, mais parecido com o Lula 1 e Lula 2, vem aquela tensão de querer a PEC de transição, subindo já o gasto de 2022 para 2023 de maneira muito expressiva. Foi aprovada no Congresso que não é de esquerda, mas dá governabilidade. Deram uma quantia parecida àquela que deram para Bolsonaro, R$ 150 bilhões. E depois, com o passar do tempo, o [ministro da Fazenda, Fernando] Haddad foi reconstruindo a parte de tributos que o Bolsonaro excluiu.

"Gasto é vida" 

Essas mudanças abruptas econômicas começam naqueles primeiros meses de governo Lula com "gasto é vida, sou contra qualquer tipo de controle, sempre governei gastando muito, mas depois o PIB cresce e tudo se resolve". Até que depois de um certo tempo de debate sai o arcabouço, no começo de 2023. Houve um período de calmaria relativamente longo, quase um ano. Teve outras tensões, mas do ponto de vista fiscal, o mercado acabou comprando a ideia de que o arcabouço funcionaria. A premissa não era a ideal, mas as tensões vinham muito mais de fora do que de dentro, basicamente dos Estados Unidos.

Começou a ficar claro que o arcabouço era uma peça de ficção quando o governo mandou o orçamento do ano que vem. Veio com premissas de arrecadação extremamente agressivas, depois de tudo que subiu em 2023, subiu em 2025 sobre 2024, 3,5%. Com o PIB que a gente imagina, que vai subir um pouco mais de 2%, é impossível. E aí tem aquelas metas, vai fazer R$ 50 bilhões de acordos no Carf, premissas que não vão ocorrer. A Fazenda governa no estilo, "eu aumento, mas não invento". E isso, no final, acaba deixando o Congresso irritado.

O nó previdenciário 

No gasto do governo federal, que deve estar por volta R$ 3,4 trilhões, 20% do PIB, há um crescimento expressivo dos gastos previdenciários totalmente incompatível com a reforma. A reforma da Previdência mostraria agora uma curva de crescimento muito abaixo do que se vê. E ninguém tem uma explicação para isso.

Eu não sei exatamente onde passaria essa curva, mas acho que seria mais perto de 1% e está subindo 3%. Nos últimos 12 meses, o acumulado é de R$ 930 bilhões. Mas previdência é previdência, as pessoas ficam mais velhas, se aposentam. Agora, o que está subindo de maneira muito mais intensa é aquilo que chamo de assistência social, vista fiscal, o mercado acabou comprando a ideia de que o arcabouço funcionaria. A premissa não era a ideal, mas as tensões vinham muito mais de fora do que de dentro, basicamente dos Estados Unidos.

Começou a ficar claro que o arcabouço era uma peça de ficção quando o governo mandou o orçamento do ano que vem. Veio com premissas de arrecadação extremamente agressivas, depois de tudo que subiu em 2023, subiu em 2025 sobre 2024,3,5%. Com o PIBque a gente imagina, que vai subir um pouco mais de 2%, é impossível. E aí tem aquelas metas, vai fazer R$ 50 bilhões de acordos no Carf, premissas que não vão ocorrer. A Fazenda governa no estilo, "eu aumento, mas não invento". E isso, no final, acaba deixando o Congresso irritado.

O nó previdenciário 

No gasto do governo federal, que deve estar por volta R$ 3,4 trilhões, 20% do PIB, há um crescimento expressivo dos gastos previdenciários totalmente incompatível com a reforma. A reforma da Previdência mostraria agora uma curva de crescimento muito abaixo do que se vê. E ninguém tem uma explicação para isso.

Eu não sei exatamente onde passaria essa curva, mas acho que seria mais perto de 1% e está subindo 3%. Nos últimos 12 meses, o acumulado é de R$ 930 bilhões. Mas previdência é previdência, as pessoas ficam mais velhas, se aposentam. Agora, o que está subindo de maneira muito mais intensa é aquilo que chamo de assistência social, é uma quase previdência. As rubricas são imensas, esse número já é de mais de R$ 500 bilhões e está subindo. Coisas como o Bolsa Família, o BPC [Benefício de Prestação Continuada], que é o valor de uma previdência para quem não contribuiu, mas se aponta que tem qualquer doença que não te deixa trabalhar, você consegue.

Por isso que o Haddad fala, "deve ter fraude, vamos achar uns R$ 15 bilhões nisso, R$ 20 bilhões". O governo promete e não acha. E deu uma acelerada no governo Lula.

Quando se soma a previdência mais toda a assistência social, esse número já chega a R$ 1,7 trilhão. E para o ano que vem vai ser maior. Por isso que o mercado não se acalma com corte R$ 15 bilhões, porque isso sobe R$ 200 bilhões por ano. A quantidade de gente no Brasil que recebe um cheque do governo por mês é de 111 milhões de pessoas. A massa que trabalha não consegue bancar quem não trabalha. Ainda assim, esses cheques não são grandes. Se tirar a fortuna de todos os brasileiros ricos juntos, você não paga um ano disso. O problema é que é o âmago do pensamento do Lula.

Nenhum país é governável com essa mentalidade, mas o Lula e a esquerda acreditam na teoria de que se distribuir esse dinheiro todo, essas pessoas vão consumir. Em consumindo, a indústria vende, o comércio vende, a economia gira, as empresas pagam impostos e no fim terá valido a pena, porque isso faz o PIB crescer. E quando o PIB cresce, a dívida/PIB não cresce. É um pensamento que deu errado, historicamente, em todos os lugares do mundo

Lá e em abril, maio, quando os agentes econômicos entendem isso, houve deterioração súbita dos ativos. Misteriosamente, mesmo antes da deterioração dos juros e do câmbio, a nossa bolsa já vinha mal. Os estrangeiros tiraram R$ 40 bilhões do Brasil até abril, maio.

Os brasileiros estavam otimistas e não entendendo por que o gringo estava tirando dinheiro. Mas era da bolsa. Em investimento direto, compra de participações de empresas, não é um dado dramático, está todo mundo feliz porque a conta corrente está boa, com o Brasil batendo recorde de exportações, com o pré-sal, a balança crescendo, são números bons. Então, de uma certa forma, essa situação cambial boa durante um bom tempo mitigou uma situação fiscal ruim, até o dia que não mais.

É um conceito muito simples, que é "quando a pasta de dente sai do tubo". Aí não adianta você falar, "não, mas eu vou contingenciar". Quando a pasta de dente sai do tubo, essa teoria da entropia, demora para ela voltar. Agora, se você me perguntar, o Brasil tem conserto? Tem. Mas você tem que modelar no preço dos ativos a equação: Qual a chance de o Lula ganhar a eleição em 2026? É no mínimo 50%. Então com esse tipo de política, por mais quatro anos, até 2030 o país vai piorar muito.

Eventualmente, neste ano, cumpre a meta. Mas a dívida/PIB não sobe só pelo arcabouço. As coisas fora do arcabouço não são pequenas. O que o mercado olha hoje? la bom, são R$ 15 bilhões [de contigenciamento], ok, mas a receita está superestimada, a despesa do ano que vem subestimada. Mesmo o governo fazendo com controle é um negócio que sobe R$ 200 bilhões por ano.

É claro que o governo quando se vê num "comer", dá um medo lá em Brasília. Se a bolsa cai, o juro sobe, eles não entendem muito bem; mas o dólar quando sobe é sério, porque pega a inflação na veia, vai afetar o preço de alimento, vai atingir a classe pobre. Estamos no meio disso e não vai melhorar muito.

Câmbio e efeito México

Quando se calcula o "fair value" [valor justo] do dólar no Brasil - vamos dizer que esteja por volta de R$ 5,20, R$ 5,25 -, entram várias coisas na conta: o CDS [prêmio de risco] do Brasil, o CRB [índice de commodities], a diferença da Selic para os Fed funds [juros dos EUA], Leva em conta o preço do dólar em relação ao euro, ao renminbi [chinês], e também a moedas de emergentes. E o México tem peso importante na cesta. A Claudia Scheinbaum [nova presidente do país] é uma pessoa surpreendentemente preparada, se comparar com o Lula. De esquerda, mas preparada. O problema é que fez um Congresso com dois terços de esquerda. Eu nem acho que a moeda [mexicana] tenha se depreciado muito. Mas isso pesou no real em 20 centavos. Se hoje o fair value é R$ 5,20, R$ 5,25, se não tivesse o efeito México, seria R$ 5,00.

Eu digo o México, mas o peso chileno também se depreciou, o colombiano, e agora com o [Donald] Trump [candidato republicano com chances de voltar à Casa Branca], há uma tendência negativa, com esse protecionismo, para as moedas da América Latina.

Esse dólar veio para ficar, a pasta de dente não vai voltar para o tubo. Na minha conta, está 6,5% acima do "fair value", se comparar o preço do dólar/real. No governo Dilma foi 20% acima, o que equivaleria hoje a R$ 6,10, R$ 6,20. Porém, por que isso não vai ocorrer? Porque naquela época a gente tinha um déficit em conta corrente muito alto, era 5%, hoje é 2%.

Eu diria que o Brasil é uma corrida bancária que ficou controlada, mas a atuarial não. Isso foi um fator de perda para os fundos brasileiros, multimercados e ações.

Juros

O mercado coloca um prêmio para o juro no Brasil de 2025 em relação à média da SOFR [a taxa do overnight publicada pelo Fed] de quase 750 pontos, enquanto hoje é 500. Quer dizer, está em 7,5%, tem um prêmio. Agora, você me pergunta: "Então o juro vai ficar em 10,5% até final deste ano e um Banco Central petista vai subir para 12%?" Não parece provável. Mas o mercado se equilibra nisso por uma razão de modelo. Então, você só vai ganhar essa diferença ficando até o fim.

A cada Copom que passa, sempre vai ter um prêmio grande. Eu fiquei muito surpreso quando isso aconteceu a partir de abril, porque imaginava que só ia aparecer no último ano de governo, quando poderia querer gastar mais e dar um pé no arcabouço. 

Reforma tributária

Tem o Congresso e os seus lobbies empresariais. Você não consegue tributar algo do agronegócio. O governo tem razão, a carga tributária brasileira é enorme, mas é muito mal distribuída. Esse é um ponto. O Brasil é o país emergente com maior carga. Não é fácil ser ministro da Fazenda. Agora, muita coisa foi mal feita. Você fica discutindo dois anos e enfia um monte de coisa na última meia hora. Então, por exemplo, eu já vi que a tributação do setor de construção está mal feita. Vai precisar de ajuste no Senado, vai ser uma briga. Mas é uma coisa boa, acho que essa reforma do IVA, apesar de estar longe do ideal, vai ser bem melhor do que a situação atual. 

Sucessão no BC

Preocupa todo mundo. Do mesmo jeito que o Lula pensa quanto mais gasto, melhor, o Brasil é um país que por conta disso tem um juro real de equilíbrio muito alto. E o Lula pensa assim: "E se esse juro fosse 2, 3% menor? Imagina esse dinheiro quanto faz falta no social..." Os governos do PT, todos eles, Lula 1, Lula 2, Dilma, eles têm uma equação muito simples: para a economia funcionar com o mínimo de equilíbrio, o governo acelera e o Banco Centralbreca. O governo do PT quer sempre acelerar, vai no limite. Só que aí obriga o BC a brecar, e se tirar esse equilíbrio, que é o que a Dilma fez colocando o Tombini, aí há um estrago. Se isso acontecer, eu garanto que a coisa que você vai ter mais saudades é do tempo que conseguia comprar dólar a R$ 5,60, porque o dólar vai para R$ 7. Esse equilíbrio - o governo acelera e o Banco Central breca - não é bom, mas funcionou nos oito anos do governo Lula. O juro nos oito anos do governo era 15%, 16%, 17%. E o Brasil funcionava desse jeito.

Não acho que isso vá acontecer com o [Gabriel] Galípolo [diretor de política monetária, principal nome cotado para assumir o posto de Campos Neto]. As circunstâncias de mercado farão com que o Lula não coloque um novo Tombini, quando quem determinava taxa de juros supostamente era a Dilma.

Vai depender de quem vai estar no Banco Central, é muito sensível. Se cortar o juro de 10,50% para 9,50% num cenário desse, já é muita coisa. E o Lula, vamos dizer, ele fica possesso porque isso vai contra o bom senso econômico que entende que tem.

Eleições nos EUA 

Olhando para o futuro, acho que o que está em jogo é o que se chama de "Republican Sweep", que é o Tramp ganhar e levar o Senado e a Câmara. Ele vai ficar muito mais poderoso. E isso é muito importante. Tem coisas que o Trump pode fazer sozinho. Por exemplo, aumento de tarifas de importação. De fato, não acho que ele vá executar tudo que está falando, tipo, "vou expulsar 10 milhões de pessoas, vou deportar [imigrantes]". Isso não é viável, mas essa combinação de muito menos imigração com aumento de tarifas é muito inflacionária.

Tem uma dificuldade de dizer quanto isso está no preço, porque o que a gente chama de "rates" [juros], de Fed funds, para dezembro de 2025, está por volta de 3,70% e o juro de hoje está em 5,30%. Não acho isso suficiente para um Republican Sweep, vai ser mais que isso porque vai gerar uma inflação para 2025 de 1 % a 1,5% maior do que o mercado está marcando.

Essas coisas, às vezes, você não consegue fazer muito rápido. Então tem esse risco de o juro cair, depois eventualmente voltar a subir nos Estados Unidos. Esse risco está aí. A chance de o Trump fazer algo disso é razoável, é grande. Então isso vai gerar, pelo menos para os próximos meses, um fator de instabilidade para as moedas da América Latina.

A competição dos isentos 

Nem todos tiram dinheiro, especificamente do multimercado, mas falando de LCA, LCI, CRA, CRI, debênture incentivada, Fiagro, fundo imobiliário, HG, que são isentos [para a pessoa física], estamos falando de um estoque de quase R$ 1,8 trilhão. E tem aquela quantidade de CDBs de bancos muito pequenos que pagam lá 120% do CDI garantidos pelo FGC [Fundo Garantidor de Créditos], é também um competidor. Vai ter uma diminuição [dos incentivados] pelas medidas [de restrição de lastro] tomadas [pelo CMN], mas o estoque é imenso. No isento, tem risco de crédito privado e "duration". E tem muita coisa que tem risco de execução. Então, é aquela história do Brasil: tem o investimento que tem o come-cotas [o imposto semestral]. O multimercado [em fundo fechado exclusivo/restrito] pagava imposto quando resgatava. Mas era grande o estoque. 

Você pega uma performance sofrível, porque nenhum cliente tem um multimercado só, e junta com os isentos, aí tem uma tempestade perfeita.

Neste R$ 1,8 trilhão [em dívida], alguma coisa vai dar errado. Mas o atrativo da isenção é grande, porque você está falando de até 2% ao ano de vantagem. É óbvio que o principal problema da gente, nem vou dizer da "asset class", é performar melhor. Ano passado, a gente não foi mal, deu CDI mais 1,5% líquido e neste virou a chave de compreensão da complexidade séria do fiscal brasileiro. Não quero dar a impressão que a culpa é do Brasil, longe disso. A gente tem que melhorar, estamos trabalhando nisso.