Inclusão econômica e transição energética são os desafios mais importantes desta era
Um conteúdo McKinsey
Dois meses atrás, países e empresas de todo o mundo assumiram compromissos para chegar à neutralidade nas emissões de carbono. Mas há outro desafio de enorme escala que também exige urgência: enfrentar a pobreza de forma decisiva. Esses dois objetivos estão interligados e precisam ser abordados em conjunto. Lideranças de algumas das maiores economias do globo – dos Estados Unidos ao Japão, passando por Brasil, países africanos e europeus até o Oriente Médio – concordam ao declararem recentemente que as mudanças climáticas e a inclusão econômica são objetivos “existenciais” e “convergentes.” Em 2024, o Brasil será palco das mais importantes discussões sobre crescimento sustentável e inclusivo, ao sediar o Business 20 – ou B20, fórum de diálogo mundial que conecta a comunidade empresarial aos governos do G20, as dezenove principais economias do mundo, União Europeia e União Africana. O tema: crescimento econômico para um futuro sustentável. O McKinsey Global Institute (MGI) buscou entender o tamanho de ambos os objetivos – e quanto custa enfrentá-los. Na entrevista abaixo, Tracy Francis, sócia sênior da McKinsey em São Paulo e coautora do estudo do MGI, fala sobre as principais conclusões dessa investigação e do papel fundamental do setor produtivo. Confira abaixo os trechos mais importantes dessa conversa.
Qual é a principal conclusão do relatório?
A inclusão econômica e a segurança ambiental do planeta são os desafios mais importantes desta era. São questões urgentes e simultâneas e, por isso, trouxemos uma visão holística de enfrentamento. O crescimento da economia, lado a lado com a inovação, aumenta a renda e os padrões de vida enquanto também destrava o financiamento necessário para a transição energética. Há, claro, tensões nesse processo. Aumentar os padrões de vida também implica uma maior procura por produtos e serviços e, com isso, cresce o consumo de energia e o volume de emissões. Por outro lado, uma transição energética desordenada pode aumentar os custos de vida e afetar o mercado de trabalho. Ao mesmo tempo, não agir diante das mudanças climáticas prejudica a economia e as populações mais pobres, que estão fortemente expostas a riscos ambientais. A equação não é simples, mas existem caminhos. O relatório propõe uma mudança de paradigma na questão da inclusão econômica. Que mudança é essa? Fizemos um enorme progresso social nas últimas décadas – no Brasil e no mundo – tirando bilhões de pessoas da pobreza. O próximo estágio do desenvolvimento é subir a barra. Por isso, propusemos expandir o conceito de ‘linha da pobreza’ para ‘linha do empoderamento’. Esse conceito define o que é preciso para que uma pessoa tenha acesso não apenas à subsistência, mas a toda uma gama de serviços essenciais, incluindo saúde, moradia, educação. A linha do empoderamento ainda implica viver em circunstâncias bastante modestas, mas os cidadãos passam a ter mais meios de se desenvolver e ascender social e economicamente, podendo pensar para além da próxima refeição e com condições de ter alguma economia e se engajar socialmente. Em 2020, cerca de 51% dos brasileiros, ou 110 milhões de pessoas, viviam abaixo da linha do empoderamento, segundo o nosso relatório. Na América Latina, eram 390 milhões de pessoas, ou 60% da população. O relatório coloca cifras nesses desafios. Qual é o investimento necessário? Primeiro, fizemos uma análise global: enfrentar de forma sistemática a inclusão econômica e a transição energética requer um investimento anual da ordem de 8% do PIB mundial ao longo da década (ou em torno de US$78 trilhões no total). Depois, entendemos que esse montante varia de acordo com o grau de desenvolvimento atual de cada país. Para o Brasil, chegamos à cifra de 10% do PIB (cerca de US$1,7 trilhão). De fato, uma enorme quantidade de investimento. Mas, quando olhamos mais a fundo, vemos que o crescimento e a inovação podem fechar, sozinhos, cerca de 50% desse gap. Isso mostra, então, que é impossível pensar na solução desses desafios sem refletir sobre o papel fundamental do setor produtivo. Que papel é esse que o setor produtivo deve desempenhar? Na solução desses grandes desafios, o crescimento econômico e a inovação liderada pelas empresas podem nos levar até a metade do caminho. Essas forças são especialmente importantes quando se trata de inclusão econômica e elevação dos padrões de vida. Mas é preciso um esforço intencional para maximizar esse efeito. O crescimento pode gerar empregos melhores e mais bem remunerados. E, num momento em que a tecnologia está mudando tão rapidamente, os empregadores desempenharão um papel fundamental no desenvolvimento de habilidades técnicas e na criação de carreiras mais amplas. Descobrimos que cerca de metade dos ganhos ao longo da vida dos trabalhadores vêm do desenvolvimento de capacidades por meio da experiência e da aprendizagem no trabalho, especialmente para aqueles que ingressam no mercado sem educação formal e em empregos de baixa remuneração. Você vê as lideranças empresariais comprometidas com esses objetivos? Participo de muitos fóruns e vejo um entusiasmo em relação a esses temas. A pauta da transição energética está mais avançada e é um exemplo de como podemos amadurecer discussões dessa natureza. Seja no Brasil, em Davos ou no B20, vejo o interesse crescer, mas precisamos aumentar o foco em direção ao crescimento sustentável e inclusivo que almejamos. Reconhecemos a dimensão desses desafios e a força gravitacional do status quo. É extremamente complexo chegarmos a um consenso para implementar as mudanças necessárias, mas não assumir esse compromisso significa comprometer o futuro de uma geração inteira e, em última instância, de todo o planeta. O desafio é enorme, nós sabemos disso, mas o apelo é para que todos arregacem as mangas e façam ainda mais.
(Para se aprofundar no tema, acesse o relatório completo ‘Da Pobreza ao Empoderamento: subindo a barra para o crescimento sustentável e inclusivo’ (disponível em inglês).
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