A Argentina estava aplicando (ainda está) medidas restritivas ao comércio bilateral com o Brasil de maneira ilegal, abusiva, arbitrária. O Brasil deveria ter entrado, há muito tempo (desde 2003 pelo menos), com uma petição junto aos mecanismos de solução de controvérsias do Mercosul -- protocolos de Brasília e de Olivos -- para fazer cessar essas medidas contrárias ao espírito e a letra do Tratado de Assunção.
Escolheu não fazer e foi leniente com esses abusos e arbitrariedades durante todo o governo Lula, a pretexto de "reforçar o Mercosul", negligenciando que estava na verdade fragilizando o bloco e contribuindo para torná-lo essa desunião esquizofrênica que é.
Agora, em demonstrações explícitas de machismo comercial, o governo da presidente Dilma Roussef resolveu retaliar, e o fez da pior forma possível. Já que o vizinho aplicou medidas arbitrárias, ele também o fez, num estilo típico do partido no poder: "Todo mundo faz, eu também faço...", ou então: "Eu sou, mas quem não é...". Ou seja, já que alguém comete contravenções, eu também me julgo autorizado a fazê-lo.
E para deixar claro de que o argumento de defesa comercial erga omnes não era para valer -- que foi o motivo invocado para as salvaguardas sob a forma de licenciamento não automático de importações, que estariam, supostamente, prejudicando a indústria nacional -- se declarou logo disposto a suspender as restrições em negociações bilaterais com a Argentina, ou seja, se oferecendo para desfazer imediatamente o que tinha acabado de fazer.
Qual a validade e legitimidade da medida, então?
Mas como nada na vida é simples, parece que los hermanos não estão dispostos a levantar as suas barreiras.
Tudo segue igual, e os únicos prejudicados nessas demonstrações explícitas de machismo comercial são os produtores, comerciantes e consumidores de ambos oa países. Ou seja, todo mundo, para sustentar o ego de governantes protecionistas e amadores em política comercial.
Paulo Roberto de Almeida
Fracassa tentativa de acordo entre Brasil e Argentina
Ariel Palacios (Buenos Aires) e Raquel Landim
O Estado de São Paulo, 25 Maio 2011
Após dois dias de reuniões, técnicos não conseguem superar conflito comercial que paralisa produtos na fronteira entre os dois países
Fracassaram as negociações entre Brasil e Argentina para pôr fim ao conflito comercial. Após dois dias de reunião em Buenos Aires, os técnicos não conseguiram chegar a um acordo para acelerar a entrada de produtos brasileiros e argentinos que estão parados na fronteira. As conversas devem prosseguir no Brasil, mas não há data definida.
"A reunião foi boa do ponto de vista técnico, mas não foi estabelecida nenhuma mudança em relação ao que temos hoje", disse ao Estado o ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel. Em Buenos Aires, o secretário executivo do ministério, Alessandro Teixeira, admitiu que "não houve avanços práticos de curto prazo".
Segundo uma fonte do governo brasileiro, "não houve avanço, nem retrocesso". Na prática, significa que os carros argentinos continuarão parados na fronteira, aguardando as licenças de importação, que podem demorar até 60 dias. Produtos brasileiros com dificuldades para entrar e/ou circular na Argentina seguem na mesma situação.
No comunicado conjunto, os governos disseram que, "no que diz respeito ao licenciamento não automático de importações, as partes avançaram nas negociações visando a liberar gradualmente as licenças". Mas técnicos explicaram que o comprometimento é apenas genérico.
No fim da semana passada, alguns produtos foram liberados de ambos os lados como "gestos de boa vontade". Agora, volta a valer a situação anterior. O clima entre os dois países esquentou depois que o Brasil retaliou a Argentina e impôs licenças para a importação de carros.
Cotas. Segundo um negociador, os argentinos pediram para impor cotas em quase todos os produtos envolvidos no conflito. A lista inclui chocolates, geladeiras, calçados e máquinas agrícolas. "Fere o espírito do Mercosul, mas se formos avançar nessa linha não pode ser unilateral", disse a fonte. Alguns produtos já estão sujeitos a acordos de restrição "voluntária" de exportações à Argentina. O Brasil pediu tempo para consultar seus setores produtivos.
As discussões foram tensas em Buenos Aires. "Não está nada fácil", admitiu um dos negociadores, em conversa durante intervalo nas reuniões. "O outro lado (os argentinos) não quer liberar (os produtos) de forma proporcional. Teremos um segundo round daqui a uns dias."
Os argentinos esperavam que o Brasil oferecesse um mecanismo "fast track" para a entrada de seus carros - as licenças de importação valem para todos os países. Mas o governo brasileiro não aceita fazer isso se não houver contrapartidas.
Em entrevista coletiva, Teixeira atenuou as dificuldades. Ele sustentou que "não há crise" com a Argentina, já que "o comércio entre os dois países está crescendo de forma substancial". E descartou definir as negociações como um "fracasso". "Saímos satisfeitos daqui."
Ele insistiu que a Argentina "não coloca restrições à entrada de produtos brasileiros" e que o problema está nos sistemas aduaneiros. "Como o sistema argentino não é informatizado, demora mais do que gostaríamos."
Argentina. Fontes do Ministério da Indústria argentino indicaram que o Brasil se comprometeu a responder "em prazos relativamente curtos, no caso de existirem soluções" sobre a entrada de azeite de oliva, vinhos, cítricos e laticínios argentinos, assim como agroquímicos, fertilizantes e medicamentos.
Os representantes argentinos também sustentaram que na área de máquinas agrícolas e eletrodomésticos os negociadores brasileiros não aceitaram "regras particulares de comércio" (eufemismo para os acordos de autorrestrição de exportações brasileiras para a Argentina) que possam equilibrar o saldo negativo de US$ 450 milhões da Argentina com o Brasil.
As mesmas fontes sugeriram que as geladeiras fabricadas no Brasil poderão ser reféns de uma negociação que promete ser complicada, já que se exige reciprocidade em relação ao produto argentino. Já em referência às recentes licenças não automáticas sobre automóveis e autopeças, destacaram que "o Brasil utiliza o setor de veículos argentinos novamente para não ouvir as reclamações naturais de uma industrialização equilibrada".
Tudo igual
FERNANDO PIMENTEL, MINISTRO DO DESENVOLVIMENTO:
"A reunião foi boa do ponto de vista técnico, mas não foi estabelecida nenhuma mudança em relação ao que temos hoje."
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
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