Trechos da crônica de uma colunista catastrofista (e anticapitalista), que prevê, a partir das profecias de uma economista conhecida, o fim do capitalismo, as we know it...
Vou me preparar: não só vou fazer meu testamento, doando todos os meus livros para o Asilo dos Velhinhos Socialistas, como vou antes tirar a poeira do meu Marx, para reler previsões ainda mais apocalípticas sobre o futuro do capitalismo (que só tem passado, a julgar pelas duas declinistas).
Nem vale a pena citar nome e endereço da colunista em questão. Más ideias não precisam ter copyright...
Paulo Roberto de Almeida
O colapso neoliberal
por "X", em "Y", 22/09/2011
(...)
...o fato é que nenhuma economia sobrevive eternamente apenas com os
truques da financeirização, com papéis girando no vazio, sem lastro nem
produção material que a sustente.
Crise que, aliás, já está começando. Porque é isso que o mundo está fazendo há alguns meses: financeiramente despencando.
Como previu a economista Maria da Conceição Tavares, a extrema
direita republicana pautou Obama; asfixiou a política fiscal da maior
economia do planeta. O anúncio de cortes de gastos públicos da ordem de
US$ 2,4 trilhões de dólares sobre um metabolismo econômico já terminal,
equivale a uma espécie de suicídio. Só a convicção autista (e o
oportunismo) do Tea Party no laissez-faire – cujo
equivalente nativo é a mídia e seus luminares – poderia inspirar-se em
lorotas para pautar os destinos da economia e da sociedade. Porque a
maioria das pessoas continua acreditando nisso, eis a realidade.
Contudo, os mercados sabem que a coisa não funciona assim.
Investidores e especuladores há muito farejaram o desastre e se
anteciparam fugindo em massa de ações e títulos, candidatos a perder o
valor de face na recessão em curso. Algumas fontes têm reforçado que os
atuais arrochos, ajustes e cortes públicos são uma espécie de canto de
sereia, de liquidação final antes da Queda irreversível, prevista para a
segunda metade de 2000.
Segundo Conceição, não é um quadro como o de 1929: “ Aquele teve um
ápice, com recidivas, mas ensejou um desdobramento político que
inauguraria um outro ciclo, com Roosevelt e o New Deal. O que passamos
agora é diferente de tudo isso.Este é um colapso enrustido, arrastado,
latejante. Sim, você tem a comprovação empírica do fracasso neoliberal,
mas e daí? São eles que estão no comando, ou será o quê esse arrocho
fiscal nos EUA enfiado pelo Tea Party na goela do Obama?
Vivemos um colapso do neoliberalismo sob o tacão dos ultra-neoliberais:
isso é a treva! Não é um fascismo explícito, como se viu na Europa, em
30. Até porque o nazismo, por exemplo – e isso não abona em nada aquela
catástrofe genocida – postulava o crescimento com forte indução
estatal. O que se tem hoje é o horror de um vazio político de onde
emergem as criaturas do Tea Party e coisas assemelhadas na Europa. Não há ruptura na crise, mas sim, permanência e aprofundamento.”
Em entrevista recente à Carta Maior, ela comenta que em 2008
tivemos um efeito oposto: “Capitais em fuga migraram de várias partes
do mundo, de filiais de bancos e multinacionais, para socorrer a quebra
das matrizes na Europa e nos EUA. Então, o que houve foi uma
desvalorização cambial; o Real ficou mais fraco. Isso facilitou as
coisas pelo lado das exportações e da contenção de importações, ainda
que quase tenham levado à breca aqueles que especulavam contra a moeda
brasileira, fazendo hedge fictício para ganhar na desvalorização. Mas do ponto de vista macroeconômico, foi um quadro mais favorável. Hoje é o inverso.”
“Há uma conjunção de colapso do neoliberalismo com a desagregação
política que realimenta e reproduz o processo. Mas o poder que conta
está em outras mãos, as dos responsáveis pela crise. Vivemos um colapso
neoliberal sob o tacão dos ultra-neoliberais. Não estamos falando de
gente normal, é preciso entender isso. Não são neoliberais comuns. Isso é
a treva! E ela se espalha desagregando, corroendo. Será uma crise longa
por conta dessa dimensão autofágica que não enseja um desdobramento
político à altura, que inaugure um novo ciclo, como foi com Roosevelt e o
New Deal em 29.”
“Aliás, as bases sociais do New Deal não existem mais nos
EUA. Obama é o reflexo disso. É uma liderança intrinsecamente frouxa.
Não tem a impulsão trabalhista e progressista que sustentou o New Deal.
É frouxo. Seu eleitorado é difuso. Ele se comunica com os eleitores
pelo twitter e daí? É uma força difusa, desorganizada, estruturalmente à
margem do poder. Está fora do poder efetivo no Congresso, que é da
direita, dos ricos, dos grandes bancos e grandes corporações, como vimos
agora no desenho do pacote fiscal. Está fora da indústria também que
foi para a China. Esse limbo estrutural é o Obama. Ele pode até ser
reeleito e tomara que seja. Porque a alternativa a Obama é
amedrontadora.”
Para Conceição, é o declínio de um império, como foi o declínio do
poder da Inglaterra no final século XIX. O poder inglês foi sendo
confrontado por nações com industrialização mais moderna. Um arranjo com
estrutura de integração superior entre indústria e capital financeiro e
que, aos poucos, ultrapassaria a hegemonia inglesa. Foi uma quebra, uma
inflexão entre o capitalismo concorrencial e o capitalismo monopolista.
A Inglaterra, berço da Revolução Industrial, perdeu o posto para os
norte-americanos e alemães. Algo que se arrastou durante décadas. Foi
uma Depressão – a primeira que tivemos no capitalismo, que durou de 1873
a 1918. Levou à Primeira Guerra, que resultou na Segunda.
E o novo hegemon? Conceição é categórica: “As forças que se articularam
na sociedade norte-americana – basicamente forças conservadoras, de um
reacionarismo profundo – não têm condições de produzir uma nova
hegemonia propositiva. Claro, eles têm as armas de guerra. E vão se
impor através delas por mais algum tempo. Mas daí não sai um novo
hegemon. Vamos caminhar para um poder multilateral, negociado, sujeito a
contrapesos que nos livrarão de coisas desse tipo, como a ascendência
do Tea Party nos EUA. Uma minoria que irradia a treva para o mundo.”
Mas tocando na questão do próprio capitalismo, é preciso considerar
também a tensão intrínseca entre o capitalismo e seu próprio excesso.
Segundo as teorias de Zizek, ao longo do século XX, percebeu-se um
padrão: para esmagar o inimigo, o capitalismo começou a brincar com fogo
e mobilizou seu “excesso obsceno” disfarçado de fascismo, mas esse
excesso ganhou vida própria e tornou-se tão forte, que o capitalismo
“liberal” foi obrigado a unir forças com seu verdadeiro inimigo – o
comunismo – para derrotá-lo.
Significativamente, a guerra entre o capitalismo e o comunismo foi
uma guerra fria, ao passo que a grande guerra quente foi lutada contra o
fascismo. O caso do Talibã não é semelhante? Depois que criar um
monstro para combater o comunismo, eles o transformaram em seu principal
inimigo. Consequentemente, mesmo que o terrorismo mate todo mundo, a
guerra americana contra o terrorismo não é nossa, mas uma luta interna
dentro do universo capitalista.
Assim, o primeiro dever dum intelectual progressista (categoria na
qual me incluo) é apresentar os fatos, não lutar as lutas do seu
inimigo. Certo?
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(Fim da transcrição)
PRA: Pois é: o mundo vai ficar terrível com todas essas catástrofes anunciadas. Melhor abolir o capitalismo, certo? Façam seus testamentos...
Um comentário:
Não acredito que tem gente que pensa assim... É incrível como "cada cabeça é um mundo" é aplicável à política econômica!
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