Herança maldita
O Estado de S.Paulo, 29 de novembro de 2013
Mercado = intervenção + populismo. É com essa definição que o governo elabora as políticas públicas para o setor de energia. A consequência são o caos e a total desordem pelos quais passa o setor no país.
No petróleo, o governo insiste numa política de preço para a gasolina e o diesel baseada no viés do controle da inflação. Não deixa os preços seguirem a tendência do mercado internacional e, como consequência, a Petrobrás é a única petroleira de capital aberto no mundo que, quanto mais vende gasolina e diesel, mais tem prejuízo. Faz um leilão da maior reserva do pré-sal e só aparece um consórcio. O governo, com seu olhar exclusivamente de curtíssimo prazo e sem nenhuma sensibilidade sobre temas globais como o meio ambiente, prefere desonerar combustíveis poluidores como a gasolina e o óleo combustível em detrimento do etanol e do gás natural.
No gás natural a política não é diferente. A Petrobrás vende gás natural para as térmicas, que são clientes flexíveis – ou seja, não compram o tempo todo -, pela metade do preço pago pelos clientes firmes, no caso as distribuidoras. Com muita intervenção e uma alta dose de populismo, o governo só cria incertezas regulatórias e insegurança jurídica. Isso diminui a atratividade dos investidores privados e a Petrobrás é obrigada a assumir as taxas de retorno patrióticas. Exemplo são as refinarias. Todas as 12 refinarias existentes no Brasil pertencem à Petrobrás e a estatal ainda é obrigada a construir mais 4. Enquanto isso, nos EUA, onde mercado é mercado, existem 144 refinarias, todas privadas, inclusive a famosa Pasadena, da Petrobrás. Faz sentido transportar de caminhão, de São Paulo, a gasolina e o diesel consumidos no Centro-Oeste? Faltam sinais econômicos que atraiam o privado para a construção de dutos.
No setor elétrico, com a publicação da Medida Provisória (MP) 579, em setembro de 2012, o governo tentou revogar a famosa lei da oferta e da procura, e com isso criou enorme bagunça regulatória e jurídica no setor. No que ficou conhecido como o 11 de Setembro do setor elétrico do país, o governo, na hora de renovar as concessões, resolveu, de forma autoritária e populista, reduzir os preços justamente num momento de escassez de energia.
Ao desafiar as regras de mercado, tentando subvertê-las para controlar a inflação e, ao mesmo tempo, ser um ingrediente para ganhar eleições, o governo transformou as ações da Petrobrás e da Eletrobrás em ações preferenciais de especuladores. As ações das duas principais estatais brasileiras passaram a subir e descer impulsionadas por boatos e suposições, e não pelos seus fundamentos. Ao fim e ao cabo, mercado = intervenção + populismo gera incerteza regulatória, insegurança jurídica e transforma país rico em energia em país dos apagões e dos especuladores. Isso, sim, é herança maldita.
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