Índice
Prólogo
1. A política externa e a diplomacia em tempos de revolução cultural
2. De uma diplomacia a outra no Itamaraty: conceitos e práticas
3. A destruição da inteligência no Itamaraty
4. A ideologia da diplomacia brasileira
5. Os desastres da política externa do olavo-bolsonarismo
6. Questões de diplomacia e de política externa do Brasil
7. Desafios da diplomacia no Brasil, do lulopetismo ao bolsonarismo
8. O espectro do globalismo: a emergência da irracionalidade oficial
9. Manifesto Globalista
10. Um ornitorrinco no Itamaraty
11. O Itamaraty e a diplomacia brasileira em debate
12. Política externa e diplomacia brasileira no século XXI
13. A diplomacia brasileira em tempos de olavo-bolsonarismo
14. A diplomacia brasileira na corda bamba, sem qualquer equilíbrio
15. Pandemia global e pandemia nacional: um futuro pior que o passado
16. A diplomacia e a negociação como fundamentos das relações internacionais
17. Meu ‘manifesto’ diplomático: em defesa do Itamaraty
18. O mundo pós-pandemia: contextos políticos e tendências internacionais
19. A política externa e a diplomacia brasileira em tempos de pandemia global
20. A diplomacia brasileira em uma fase de inédito declínio histórico
22. O Itamaraty no seu labirinto
Apêndices:
Uma pequena reflexão sobre o trabalho de resistência intelectual
Livros publicados pelo autor
Nota sobre o autor
Apêndice:
Uma pequena reflexão sobre o trabalho de resistência intelectual
A resistência puramente “literária”, conduzida solitariamente na reclusão reflexiva de uma quarentena, no isolamento de um limbo institucional, ou no contexto de uma longa travessia do deserto, pode ser a menos eficiente de todas: ela não pertence a nenhum movimento, não está ligada a nenhum partido, não tem vínculos organizacionais nem pretende ter seguidores próprios.
Ela se sustenta em si mesma, na convicção de defender uma causa legítima, a preservação das liberdades, a necessidade de pensar com sua própria cabeça, a vontade de não fazer parte de nenhum rebanho, a certeza de que não se pode jamais renunciar à reflexão independente, ao espírito crítico, à contestação eventual das idées reçues, das verdades estabelecidas.
Isolada no seu canto, ela pode ter de se instalar numa pequena fortaleza feita de cadernos e livros, de se refugiar num humilde e obscuro quilombo de resistência intelectual, tendo como “armas” unicamente a palavra e a escrita, raramente um megafone, simplesmente pequenas mensagens, em garrafas, lançadas em um mar desconhecido.
Dificilmente, essas “pílulas” de resistência obstinada alcançam repercussão. Elas se perdem, na voragem do entusiasmo pelos novos tempos, na promessa dos lendemains qui chantent, nas mentiras confortáveis que satisfazem os ingênuos e os espíritos incautos.
Mas é preciso persistir, por um simples dever de consciência, individual e, no mais das vezes, solitária, cidadã se for o caso. Não importa: o que se faz não tem intenção de criar nenhum movimento, de mobilizar nenhuma força organizada, apenas tem a pretensão de alertar os demais membros da comunidade, a partir do conhecimento do passado, de uma atenta observação do presente e de alguma percepção quanto ao que pode vir pela frente.
Tive essa percepção, precocemente, em 2003, adquiri plena certeza em 2004, e vi confirmados meus piores temores nos dois anos seguintes. Mas aí já era tarde: eu já estava no limbo. E permaneci na minha longa travessia do deserto pelos dez anos seguintes, só cercado de meus livros e cadernos, refugiado em meu quilombo de resistência intelectual, de onde eu eventualmente lançava uma garrafa ao mar.
Não foi suficiente: o problema cresceu, o câncer da inépcia e da corrupção se agigantou, e terminou por engolfar o país na Grande Destruição, a maior de toda a nossa história.
Tive novamente a mesma percepção em meados de 2018, antes mesmo que a possibilidade se confirmasse. Imaginei que o desastre pudesse ser contido em algum momento, pelo temor de um novo desastre, por alertas que pudessem ser feitos em apelo à consciência cidadã – abafada, porém, pela ignorância eleitoral –, pela ilusão de que, uma vez consumada a escolha, as necessidades práticas da administração corrigissem as piores perspectivas de gestão.
Não foi suficiente: adquiri a certeza de estávamos embarcando numa viagem para o desconhecido logo nos dois primeiros dias da nova aventura, e obtive todas as confirmações nas semanas seguintes. Desde então, as etapas e sinais construtores da nova caminhada ao precipício foram se acumulando.
Fui levado novamente ao ostracismo, ao que eu chamo de limbo de resistência intelectual, e iniciei nova jornada de uma penosa viagem pelo deserto de minha solidão, cujo percurso e duração são ainda indeterminados. Não importa, eu me disse: persistirei, como da outra vez, embora não deseje um novo desastre para a comunidade.
Recém adquiri a percepção de que essa é uma possibilidade real, um novo mergulho no desconhecido, tantas são as paixões desatadas. De novo sinto necessidade de lançar novas garrafas ao mar. Assim faço, assim farei...
O desastre agora pode ser inclusive maior, por externalidades que nada têm a ver com as inconsistências da dinâmica interna, própria à inépcia e à corrupção embutidas no pacote adquirido lá atrás.
Como disse, não tenho movimento, nem partido, nem seguidores. Apenas minha liberdade, minha consciência, minha pluma, de vez em quando a palavra, quase inaudível.
Não importa!
Persistirei...
Brasília, 27 de abril de 2020
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