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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Meus livros podem ser vistos nas páginas da Amazon. Outras opiniões rápidas podem ser encontradas no Facebook ou no Threads. Grande parte de meus ensaios e artigos, inclusive livros inteiros, estão disponíveis em Academia.edu: https://unb.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida

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domingo, 18 de maio de 2025

A busca insensata por protagonismo - Roberto Brant (Estado de Minas)

  BRASIL VISTO DE MINAS

A busca insensata por protagonismo

Entre o amadorismo, a presunção e a ideologia, nossa política externa está perdendo o sentido da realidade e da proporção

Roberto Brant

Estado de Minas, 16/05/2025

    

        Li em algum lugar que Joaquim Nabuco, quando embaixador do Brasil nos Estados Unidos, nos primeiros anos da República, teria dito que uma virtude essencial da política externa de um país seria o senso de realidade e de proporção, querendo certamente dizer com isso não se fazer maior nem menor do que a realidade. Seria fazer justiça à nossa diplomaciareconhecer que, na maior parte da nossa vida republicana, a política externa brasileira tem se mantido fiel àquela virtude, não se apequenando diante dos mais poderosos, nem cultivando a fantasia de um poder e de uma influência que naturalmente não temos.

        Por razões e modos diferentes, o governo passado e o atual têm imposto à nossa política externa um tipo de ativismo partidarizado, estranho à nossa tradição e prejudicial aos nossos interesses permanentes. Essa disposição torna-se particularmente imprudente em um momento de grande turbulência geopolítica, quando a “ordem internacional baseada em regras”, que vinha organizando a convivência entre os países desde o final da Segunda Guerra Mundial, está em processo de dissolução.

        O momento do mundo está marcado por três movimentos de ruptura que vão transformar a vida numa direção imprevisível. O primeiro foi a invasão da Ucrânia pela Rússia, rompendo quase 80 anos de paz na Europa. O segundo é a presidência Trump, que está pressionando os limites da democracia americana, desfazendo acordos e compromissos e afirmando o fim de princípios e valores na política externa americana. O terceiro, de caráter mais estrutural, é a emergência de uma nova ordem em que empresas de tecnologia com controle da inteligência artificial rivalizam com os estados soberanos na luta por influência e domínio geopolítico. É neste cenário de grande complexidade que deve atuar a política externa.

        O Brasil certamente não pode estar alheio a nenhum desses movimentos, mas sem deixar de reconhecer que não temos o poder necessário para moldar seus desenvolvimentos, cabendo-nos mover com inteligência e sobriedade para proteger da melhor maneira o interesse nacional. O voluntarismo ideológico de Bolsonaro e de Lula tem impedido o Itamaraty de agir como uma instituição profissional a serviço do interesse permanente do Estado brasileiro e nos exposto até a certas situações que beiram o ridículo.

        No caso exemplar da Ucrânia, Lula tem evitado que nossa política externa expresse sua longa fidelidade ao princípio da não intervenção, princípio especialmente imprescindível a países como o nosso que não tem os meios materiais para se defender em todas as situações. Nosso presidente nunca condenou com a ênfase necessária a Rússia invasora, prega uma paz sem condições e ainda por cima vai a Moscou para, na companhia exclusiva de trinta ditadores, levar a sua homenagem ao líder russo e à sua política, em um gesto que fere a nossa tradição e o próprio sentimento do povo brasileiro.

        No caso dos Estados Unidos, o ex-presidente Bolsonaro e seu círculo mais fiel demonstra uma vassalagem aos piores aspectos do governo Trump e ainda cultiva abertamente a fantasia de uma intervenção americana em nossas instituições. Do seu lado, o presidente Lula não se cansa de provocar desnecessariamente o líder americano que, malgrado o horror que possa nos causar, até o momento não provocou danos diretos ao nosso país, mesmo porque uma tarifa piso de 10% que nos foi aplicada é muito menor do que a tarifa média com que taxamos todas as nossas importações.

        Por fim, o presidente e sua mulher, de um modo aparentemente impróprio e desajeitado, buscaram no presidente chinês apoio para conter em nosso país.

Entre o amadorismo, a presunção e a ideologia, nossa política externa está perdendo o sentido da realidade e da proporção.


As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.







segunda-feira, 11 de março de 2024

O Brasil errou o caminho de volta - Roberto Brant (Correio Braziliense)

O Brasil errou o caminho de volta


Roberto Brant - Correio Braziliense | Política

11 de março de 2024 

"NÃO HA COMO DUViDAR DE QUE, SE AS AUTOCRACiAS SE ASSEGURAREM A HEGEMONiA NO MUNDO, NOSSO MODO DE ViDA, NOSSA CULTURA E NOSSA LiBERDADE CERTAMENTE ESTARÃO PERDiDAS. NÃO SE TRATA AQUI DAS FIGURAS EFÊMERAS DE LULA E BOLSONARO. TRATA-SE DE NOSSA PRÓPRIA EXISTÊNCIA QUE ESTARÁ EM JOGO."

Nestes primeiros dias de março, foi divulgada uma pesquisa da consultoria Quest sobre a avaliação do governo Lula. Os números mostram que 35% da população o avalia positivamente, enquanto 34% o avalia negativamente. Passado pouco mais de um ano de mandato, apenas um terço da população apoia sem reservas a ação do governo. O país está polarizado.

A polarização política, antes de ser uma enfermidade social, é uma prova de que vivemos em uma sociedade democrática. Nas autocracias, as divisões são eliminadas pela força, ostensiva ou disfarçada por artifícios institucionais. As diferenças de opinião política são a própria essência da vida democrática.

Havendo uma divisão tão clara na sociedade, é justo questionar se o governo tem legitimidade para impor a toda a nação políticas e posições francamente parciais e partidárias, especialmente quando elas têm manifestamente consequências de longo prazo.

O desprezo de nossa política externa pela democracia manifestase também na admiração e no apoio sem reservas à ditadura cubana e às manobras de Nicolas Maduro para perpetuar-se no poder. A defesa dessas ditaduras é um acinte e responde exclusivamente às posições ideológicas do partido do presidente, sem levar em conta o que pensa a maioria da sociedade brasileira.

Corremos o sério risco de nos isolarmos em nosso próprio continente e no mundo ocidental. E todos no mundo esperavam "o Brasil de volta", como prometera nosso presidente. Acontece que erramos o caminho.

O governo Lula, em algumas áreas, tem se atribuído um mandato muito mais amplo do que o que recebeu das urnas. Sua vitória, por margem muito estreita, foi o resultado de uma coalizão informal que reuniu parcelas da sociedade com uma visão do mundo e do país muito diversa das posições tradicionais dele e de seu partido. Se na gestão da economia até agora as políticas do governo são coerentes com a natureza daquela coalizão, na política externa o presidente tem extrapolado todos os limites, com alinhamentos geopolíticos e ideológicos que estão muito distantes do sentimento médio do país.

O mundo vive, hoje, uma nova realidade geopolítica, em que se confrontam de um lado as democracias e de outro, as autocracias. O desfecho desse confronto irá moldar toda a vida humana no futuro. Diante dele, todos as demais confrontações perdem significado, em especial a que deseja separar o Ocidente e o Sul Global, principalmente porque, neste universo do Sul Global, é evidente o domínio das autocracias, como se pode ver na composição do Brics.

O interesse nacional do Brasil recomenda que o país deve se manter numa distância prudente desses grandes confrontos, sem perder de vista que qualquer política externa trata de interesses, mas também de ideias. Não há como duvidar de que, se as autocracias se assegurarem à hegemonia no mundo, nosso modo de vida, nossa cultura e nossa liberdade certamente estarão perdidas. Não se trata aqui das figuras efêmeras de Lula e Bolsonaro. Trata-se de nossa própria existência que estará em jogo.

A atual orientação da política externa do Brasil procura ignorar a natureza desse confronto e se aproxima perigosamente das grandes autocracias, afastando-se dos países ocidentais democráticos. E, para tornar tudo ainda mais incompreensível, defende internamente a democracia ao mesmo tempo em que se alinha com todas as ditaduras do nosso continente.

Os exemplos estão aí. A invasão da Ucrânia pela Rússia é o mais audacioso ataque de uma autocracia contra um país democrático, tentando demolir a ordem internacional baseada em leis e em regras. O presidente Lula, na contramão de todos os países democráticos, negou-se a afirmar a responsabilidade russa no conflito e, no mais simbólico gesto 
de simpatia com a tirania de Putin, negou-se a condenar o assassinato do líder da oposição Alexei Navalny, apesar de todas as evidências. Na luta entre as democracias e as autocracias, nosso presidente já tomou partido, e numa direção completamente estranha ao sentimento da nossa população.

domingo, 26 de dezembro de 2021

O país das tristes certezas - Roberto Brant (Capital Politico)

 

O país das tristes certezas


Capital Politico, 22.12.2021