O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

sábado, 31 de maio de 2014

Radiografia implacavel da decada lulo-petista: Jose Gobbo Ferreira

Estudo de caso, José Gobbo Ferreira - Dez Anos de PT e a Desconstrução do Brasil

O trabalho de 108 páginas que vai no link a seguir, intitulado “Dez Anos de PT e a Desconstrução do Brasil”, é um denso estudo, com gráficos e tabelas, que demonstra de que modo os governos Lula e Dilma Roussef desconstroem os fundamentos da política de estabilização e crescimento sustentada implementada pelo ex-presidente FHC, o Plano Real.

. A economia brasileira segue em marcha batida para o precipício da estagnação econômica e da inflação descontrolada, dragões que durante décadas infernizaram a vida dos brasileiros.

. O autor, José Gobbo Ferreira, possui um currículo extraordinário no exterior e no Brasil, que vai todo detalhado logo na abertura do trabalho.

. Vale a pena ler, estudar e passar adiante.

CLIQUE AQUI para baixar tudo e ler. O editor aconselha imprimir e estudar em casa, aos poucos. Baixar o arquivo pode demorar, porque ele é pesado. 

BRICS: vc acredita nesse grupo? Entao escreva algo a respeito... - Moscou, 30/10/2014

Peoples’ Friendship University of Russia
International Conference, October 30-31, Moscow, Russia

Call for Papers
The BRICS Countries: International Unstability, Growth Trajectories and Structural Transformations ?

In the framework of the international conference organized by the Peoples’ Friendship University of Russia (RUDN), Mosco in cooperation with CEMAFI International (France), the BRIC Seminar (EHESS-Fondation Maison des Sciences de l'Homme, Paris) and the Department of International Economy (RUDN) organize a two sessions-panel on the following topic: " BRICs Countries: International unstability, growth trajectories and structural transformations."
Since 2010, when the concept of BRICS has given birth to a new geopolitical group, emerging economies have continued to grow and now account for a larger share of the world GDP than before. At the same time, the international financial crisis and its consequences have hit developed market economies and BRICS countries in a different manner. Advanced countries have stagnated in relative terms, applying diverging policies (quantitative easing in the US and Japan, deflationary budgetary policies in the vast majority of the Eurozone countries) in an attempt to relaunch their economic growth. The BRICS countries and other emerging economies have also reported diverging results both in terms of growth path and external accounts dynamics. For instance, the rate of growth is rapidly declining in Brazil and Russia, India and Russia proved to be very sensitive to interest rates fluctuations and international capital outflows, and China, in spite of a still high GDP growth rate and large current account surpluses, is showing signs of vulnerability, prompting some observers to diagnose the so-called "middle income trap".
Beyond these recent economic fluctuations, we believe that the problems that these economies are currently facing are of a structural nature: they lie in their productive specialization, in the nature (or the lack) of structural and innovations policies implemented, but also in institutional peculiarities that characterize most emerging economies. To discuss this hypothesis, we propose that the 2-sessions panel of the RUDN Moscow Conference could address the following themes :
- Growth trajectories of BRICs and emerging economies: where do we stand?
- International trade, international value chains and the BRICs
- How big is the productive gap between developed market economies and the BRICs?
- Contents, nature, implementation of industrial and innovation policies
- Are domestic-led growth models more desirable than export-led models?
- Commodities exporting countries: how to avoid the "dutch disease"?
- Whither role for the State: reducing inequalities, improving infrastructures, stimulating high value added industrial growth, attracting FDI?

Number of papers discussed: 16
Deadline for submission: July 15, 2014

Send abstract (in english, french, russian) to :
Vladimir Matyushok, RUDN, Moscow, vmatyushok@mail.ru
Julien Vercueil, INALCO, Paris, julien.vercueil@inalco.fr

Information about the conference :

Pausa para... uma querela religiosa: o pastor e a cafetina (este Brasil inzoneiro...)

Da coluna sempre finamente irônica do jornalista Carlos Brickmann, 30/05/2014:


Deus e o diabo

Em Aquiraz, pertinho de Fortaleza, CE, Tarcília Bezerra começou a construir um anexo em seu cabaré; e a igreja neopentecostal fez forte campanha contra a construção, com orações contínuas. Uma semana antes da inauguração, um raio incendiou o cabaré. Tarcília processou a igreja e o pastor, responsabilizando-os pela "intervenção divina" que destruiu a obra. A igreja alegou que não houve prova de intervenção divina a partir das orações.

Comentário do juiz, na audiência de abertura: "Pelo que li até agora, temos de um lado a proprietária de um prostíbulo que acredita firmemente no poder das orações e do outro lado uma igreja inteira que afirma que as orações não valem nada".

Eleicoes 2014: Joaquim Barbosa chanceler da Republica? De qual republica? - Carlos Brickmann

Da coluna do jornalista Carlos Brickmann, 30/05/2014:

Por que saiu?

Joaquim Barbosa diz que vai aposentar-se porque já tem 41 anos de serviço público. E também porque nada perde: mantém o salário integral e pode se dedicar a outros afazeres. Mas também diz que o motivo "sairá no momento oportuno". Não quer estar num tribunal dirigido por Ricardo Lewandowski, de quem não gosta (não gosta também dos demais ministros, no que é correspondido).

Não pode concorrer a eleições; mas pode fazer campanha, se quiser.

Saiu por que?

Há quem diga que ele quer apenas descansar, há quem diga tê-lo ouvido dizer que vai "entrar pesado" na campanha. Há quem sustente que apoiará Aécio Neves, do PSDB, e em caso de vitória iria para o Itamaraty. Barbosa acha que, quando trabalhou nas Relações Exteriores, foi vítima de racismo. Esta seria sua oportunidade de dar o troco.

Seu jeito truculento, arrogante, autoritário não casa bem com o Itamaraty. Mas, enfim, não existe mais Ministério da Guerra.

EUA vs China: de volta a bipolaridade? Que coisa mais aborrecida... - Gu Jinglu (WP blogs)

Obama says the U.S. will lead the world for the next 100 years. China disagrees.

The sun sets behind the Chinese national flag fluttering on top of the Great Hall of the People in where a plenary session of the Chinese People's Political Consultative Conference is held in Beijing Monday, March 11, 2013. China took another step toward completing its leadership handover Monday with the appointment of Yu Zhengsheng, an official best known for his communist pedigree, to head a top government advisory body. (AP Photo/Ng Han Guan)
The sun sets behind the Chinese national flag fluttering on top of the Great Hall of the People in March 12013.  (Ng Han Guan/AP)
This week, President  Obama said that the U.S. will remain the one indispensable nation in the century to come. One country who has its own dreams of leadership wasn't quite so sure, however.
On Thursday, at a regular briefing, Chinese Foreign Ministry spokesperson Qin Gangcommented with sarcasm. “It seems that the U.S. really enjoys being the leader of the world,” he said, before casting doubt on Obama's prediction by making reference to a World Cup-predicting sea creature. “However, in the field of international relations, I wonder if there exists a 'Paul the Octopus' who can predict the future.”
His comments were a direct response to remarks delivered by  Obama at the U.S. Military Academy at West Point, N.Y., commencement ceremony this Wednesday. In his speech,  Obama reflected on America’s foreign policy agenda and articulated his vision of America’s role in the world.
“America must always lead on the world stage," Obama declared. "If we don’t, no one else will.”
Qin's comments weren't the only sign of an official reaction. The Global Times, China’sstate-run nationalist-leaning newspaper, later published an editorial and challenged that view, asking, “America wants to lead the world for another 100 years, but with what?”
The editorial went on to say that America was not powerful enough to support its “luxurious dream” of leading the world, arguing that America was “greedy for all kinds of power” but lacks “a big heart,” which is “a key factor to be a leader.”
“The revival and rise of China and Russia makes America extremely anxious,” the editorial said. With volatile policies towards China and Russia, America will “be importing its anxiety to the world if it is to ‘lead the world.' ”
Another editorial published in Party mouthpiece People’s Daily said Obama’s remarks on the U.S. world leadership “once again revealed that America wanted to seek hegemony with the cold war thinking of a global alliances system.” The rapid development of technology, integration of world economy and people has never “changed America’s old weakness of seeing the new world with old thoughts and exceptionalism,” the editorial said.
Comments from the U.S. about foreign policy often stir discussion in China, and both leftists and rightists fiercely debate whether the Chinese adore the West too much. Even the self-reflection of a U.S. president on its own foreign policy has caused blatant criticism from state media.
Compared with direct criticism from state media, however, the comments from Qin Gang, the Foreign Ministry spokesperson, seemed to be more restrained and veiled. He resorted to ancient Chinese wisdom. “China once led the world for more than one hundred years in history. The rise and fall in history left us with both experience and lessons.
“Today, we still talk about the wisdom recorded over 2,000 years ago in a chronicle called Zuo Zhuan. It reads: Some rulers can lead their states to unstoppable prosperity because they examine themselves instead of blaming others, like Emperor Yu and Emperor Tang, while some bring their reigns to swift demise because they always criticize others, like Emperor Jie and Emperor Zhou.”

O Barao do Rio Branco e Oliveira Lima: vidas paralelas - Paulo Roberto de Almeida

Reparei que um breve texto meramente comemorativo sobre o historiador e diplomata Manuel de Oliveira Lima, preparado pelo Itamaraty, conheceu um sucesso extraordinário ao ser postado neste blog, sendo acessado dezenas de vezes, o que me faz suspeitar que o personagem, o historiador, o diplomata Oliveira Lima ainda goza de certa notoriedade entre os estudantes universitários, ou simples curiosos.
Por isso vou postar aqui um grande texto que fiz sobre ele e suas relações sempre tempestuosas com Juca Paranhos, mais exatamente com o Barão do Rio Branco, preparado para um livro sobre os 100 anos da posse do Barão como chanceler brasileiro.
Transcrevo apenas o início desse meu texto, e depois remeto ao link onde ele pode ser descarregado em formato pdf.
Paulo Roberto de Almeida

O Barão do Rio Branco e Oliveira Lima
Vidas paralelas, itinerários divergentes


Paulo Roberto de Almeida
Doutor em Ciências Sociais, mestre em Planejamento Econômico
Publicado in:
Carlos Henrique Cardim e João Almino (orgs.).
Rio Branco, a América do Sul e a Modernização do Brasil
(Brasília: Comissão Organizadora das Comemorações do Primeiro Centenário da Posse do Barão do Rio Branco no Ministério das Relações Exteriores, IPRI-Funag, 2002, ISBN: 85-87933-06-X, pp. 233-278).

“Rio Branco was the greatest combination
of scholar and statesman I ever knew.”
Carta de John Basset Moore (julho de 1944) a
Aluizio Napoleão in Rio-Branco e as relações entre o Brasil e os
Estados Unidos (Rio de Janeiro: Ministério das Relações Exteriores, 1947), p. 8

Les délégués [syndicaux] abordent la question du programme économique et social:
“Mon général, comme nous l’avons déjà dit à l’un de vos prédécesseurs...”
Le secrétaire général des syndicats chrétiens ne va pas plus loin.
De Gaulle: “Le général de Gaulle n’a pas de prédécesseur.”
Temps d’arrêt dans la conversation.
De Gaulle: “Mais continuez, messieurs, je vous en prie...”
Jean-Raymond Tournoux: Secrets d’État (Paris: Plon, 1960), p. 351


O Barão do Rio Branco, antecipando-se historicamente ao General De Gaulle, tampouco teve predecessores. De resto, sua figura histórica paira sobre seus sucessores, quase como uma entidade mítica e, portanto, inatingível. Ele foi, em todo caso, único no panteão de nossas (raras) unanimidades nacionais, possuindo todas as condições de ombrear-se historicamente com Tiradentes, com…?
Bem, deixemos esse terreno comparativo com alguns dos “mitos fundadores” de nossa identidade nacional e vejamos um outro personagem, em carne e osso, que, toutes proportions gardées, poderia ter sido um êmulo intelectual e diplomático do Barão, não fosse pelo seu espírito provocador, suas imprudências e precipitações, sua “incontinência da pena”, justamente acusada por contemporâneos, sua vaidade (de certa forma legítima, em vista da importante obra realizada, desde muito jovem), seus repentes de sinceridade déroutante, quando não chocante, seu caráter, por fim, de “diplomata dissidente”, dentre algumas das características multifacéticas desse Dom Quixote Gordo que foi Manuel de Oliveira Lima, no dizer de Gilberto Freyre.
Este ensaio – inclusive pelo fato de ter sido preparado à distância dos arquivos do Barão, no Rio de Janeiro, e, inversamente, nas proximidades dos livros e papéis de Oliveira Lima, depositados na biblioteca que leva o seu nome, junto à Universidade Católica de Washington – deveria em verdade ter o título invertido, “Oliveira Lima e o Barão do Rio Branco”, e de certa forma é disso que se trata quando queremos, não comparar, mas “confrontar”, no bom sentido, um gigante como Rio Branco e qualquer outro personagem de nossa história política e diplomática do final do Império e do início do século XX. Vamos portanto descrever e analisar como essas duas vidas – essas duas inteligências – se cruzam e interagem, e como, do ponto de vista de Oliveira Lima, os resultados traduzem o mais notório sentimento de frustração, de fato uma sensação de trajetória interrompida, que perpassa e transcende as mais diferentes avaliações da vida e da obra do historiador pernambucano, de tão fugidia memória até um período ainda bem recente de nossa République des lettres.

Acesse o texto completo neste link: http://cl.ly/VpqC

sexta-feira, 30 de maio de 2014

Os neobolcheviques do PT querem dominar a sociedade brasileira... - Erick Vizolli

...de forma obviamente totalitária.
Os totalitários petistas pensam que estão em Petrogrado, em 1917, e se preparam para tomar o poder de assalto, o que já fizeram pela via eleitoral. Covardes como são, não tentarão um putsch, como fez Lênin, que pelo menos arriscou a vida dos seus companheiros (ele mesmo se escondeu nos momentos decisivos da tomada dos palácios), o que obviamente os poltrões neobolcheviques não pretendem fazer (inclusive porque sabem que a sociedade reagiria e os militares não deixariam).
Então, tentam implantar seu regime totalitário de modo gradual, gramscianamente, ao que parece, e esse é o sentido do decreto celerado assinado pela presidente que pretende deformar a democracia -- já tão conspurcada -- e submetê-la ao tacão dos novos totalitários
Vamos ver o que acontece agora.
Recomendo a consulta aos demais artigos de Liberzone.
Paulo Roberto de Almeida

POLÍTICA

Afinal, o que é esse tal Decreto 8.243?




Introdução
O maior problema do estado é que, tal qual um paciente de hospício, ele acredita possuir superpoderes, podendo violar as regras da natureza como bem entender. Dois exemplos bem conhecidos pelos liberais: ele considera ser capaz de ler mentes de milhares de pessoas ao mesmo tempo com uma precisão incrível e ter uma superinteligência capaz de fazer milhões de cálculos econômicos por segundo. Um roteirista de história em quadrinhos não faria melhor.
O estado brasileiro, no entanto, não está satisfeito com seus delírios atuais, e pretende aumentar o espectro dos seus poderes sobrenaturais para dois campos que a Física considera praticamente inalcançáveis. E parece estar conseguindo: a partir de 26/05/2014, viagem no tempo e teletransporte passaram a ser oferecidos de graça a todo e qualquer cidadão brasileiro.
Obviamente, a tecnologia está nos seus primórdios e ainda tem suas limitações, de tal modo que você, pretenso candidato a Marty McFly, pode escolher apenas um destino para suas aventuras: a Rússia de abril de 1917. Em compensação, prepare-se: graças ao estado brasileiro, você está prestes a enfrentar a experiência soviética em todo o seu esplendor.
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A “máquina do tempo” que nos leva de volta a 1917 tem um nome no mínimo inusitado: chama-se “Decreto nº 8.243, de 23 de maio de 2014”. Aqui a denominaremos apenas de “Decreto 8.243”, ou “Decreto”.
Este artigo se destina a investigar o seu funcionamento – ou, mais especificamente, quais as modificações que esse decreto introduz na administração pública. Também farei algumas breves considerações a respeito da analogia que se pode fazer entre o modelo por ele instituído e aquele que levou à instauração do socialismo na Rússia: trata-se, no entanto, apenas de uma introdução ao tema, que, pela importância que tem, com certeza ainda gerará discussões muito mais aprofundadas.

O Decreto 8.243/2014

Chamado por um editorial do Estadão de “um conjunto de barbaridades jurídicas” e porReinaldo Azevedo de “a instalação da ditadura petista por decreto”, o Decreto 8.243 foi editado pela Presidência da república em 23/05/14, tendo sido publicado no Diário Oficial no dia 26 e entrado em vigor na mesma data.
Entender qual o real significado do Decreto exige ler pacientemente todo o seu texto, tarefa relativamente ingrata. Como todo bom decreto governamental, trata-se de um emaranhado de regras cuja formulação chega a ser medonha de tão vaga, sendo complicado interpretá-lo sistematicamente e de uma forma coerente. Tentarei, aqui, fazê-lo da forma mais didática possível, sempre considerando que grande parte do público leitor dessa página não é especialista na área jurídica (a propósito: que sorte a de vocês.).
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Iniciemos do início, pois. Como o nome diz, trata-se de um “decreto”. “Decreto”, no mundo jurídico, é o nome que se dá a uma ordem emanada de uma autoridade – geralmente do Poder Executivo – que tem por objetivo dar detalhes a respeito do cumprimento de uma lei. Um decreto se limita a isso – detalhar uma lei já existente, ou, em latinório jurídico, ser “secundum legem”. Ao elaborá-lo, a autoridade não pode ir contra uma lei (“contra legem”) ou criar uma lei nova (“præter legem”). Se isso ocorrer, o Poder Executivo estará legislando por conta própria, o que é o exato conceito de “ditadura”. Ou seja: um decreto emitido em contrariedade a uma lei já existente deve ser considerado um ato ditatorial.
É exatamente esse o caso do Decreto 8.243. Logo no início, vemos que ele teria sido emitido com base no “art. 84, caput, incisos IV e VI, alínea “a”, da Constituição, e tendo em vista o disposto no art. 3º, caput, inciso I, e no art. 17 da Lei nº 10.683”. Traduzindo para o português, tratam-se de alguns artigos relacionados à organização da administração pública, dentre os quais o mais importante é o art. 84, VI da Constituição – o qual estabelece que o Presidente pode emitir decretos sobre a “organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos”.
Guarde essa última frase. Como veremos adiante, o que o Decreto 8.243 faz, na prática, é integrar à Administração Pública vários órgãos novos – às vezes implícita, às vezes explicitamente –, algo que é constitucionalmente vedado ao Presidente da República. Portanto, logo de cara percebe-se que se trata de algo inconstitucional – o Executivo está criando órgãos públicos mesmo sendo proibido a fazer tal coisa.
Os absurdos jurídicos, contudo, não param por aí.

A “sociedade civil”

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Analisemos o texto do Decreto, para entender quais exatamente as modificações que ele introduz no sistema governamental brasileiro.
Em princípio, e para quem não está acostumado com a linguagem de textos legais, a coisa toda parece de uma inocência singular. Seu art. 1º esclarece tratar-se de uma nova política pública, “a Política Nacional de Participação Social”, que possui “o objetivo de fortalecer e articular os mecanismos e as instâncias democráticas de diálogo e a atuação conjunta entre a administração pública federal e a sociedade civil”. Ou seja: tratar-se-ia apenas de uma singela tentativa de aproximar a “administração pública federal” – leia-se, o estado – da “sociedade civil”.
O problema começa exatamente nesse ponto, ou seja, na expressão “sociedade civil”. Quando usado em linguagem corrente, não se trata de um termo de definição unívoca: prova disso é que sobre ele já se debruçaram inúmeros pensadores desde o século XVIII. Tais variações não são o tema deste artigo, mas, para quem se interessar, sugiro sobre o assunto a leiturdeste texto de Roberto Campos, ainda atualíssimo.
Para o Decreto, contudo, “sociedade civil” tem um sentido bem determinado, exposto em seu art. 2º, I: dá-se esse nome aos “cidadãos, coletivos, movimentos sociais institucionalizados ou não institucionalizados, suas redes e suas organizações”.
Muita atenção a esse ponto, que é de extrema importância. O Decreto tem um conceito preciso daquilo que é considerado como “sociedade civil”. Dela fazem parte não só o “cidadão” – eu e você, como pessoas físicas – mas também “coletivos, movimentos sociais institucionalizados ou não institucionalizados, suas redes e suas organizações”. Ou seja: todos aqueles que promovem manifestações, quebra-quebras, passeatas, protestos, e saem por aí reivindicando terra, “direitos” trabalhistas, passe livre, saúde e educação – MST, MTST, MPL, CUT, UNE, sindicatos… Pior: há uma brecha que permite a participação de movimentos “não institucionalizados” – conceito que, na prática, pode abranger absolutamente qualquer coisa.
Em resumo: “sociedade civil”, para o Decreto, significa “movimentos sociais”. Aqueles mesmos que, como todos sabemos, são controlados pelos partidos de esquerda – em especial, pelo próprio PT. Não se enganem: a intenção do Decreto 8.243 é justamente abrir espaço para a participação política de tais movimentos e “coletivos”. O “cidadão” em nada é beneficiado – em primeiro lugar, porque já tem e sempre teve direito de petição aos órgãos públicos (art. 5º, XXXIV, “a” da Constituição); em segundo lugar, porque o Decreto não traz nenhuma disposição a respeito da sua “participação popular” – aliás, a palavra “cidadão” nem é citada no restante do texto, excetuando-se um princípio extremamente genérico no art. 3º.
Podemos, então, reescrever o texto do art. 1º usando a própria definição legal: o Decreto, na verdade, tem “o objetivo de fortalecer e articular os mecanismos e as instâncias democráticas de diálogo e a atuação conjunta entre a administração pública federal e os movimentos sociais”.
Compreender o significado de “sociedade civil” no contexto do Decreto é essencial para se interpretar o resto do seu texto. Basta notar que a expressão é repetida 24 (vinte e quatro!) vezes ao longo do restante do texto, que se destina a detalhar os instrumentos a serem utilizados na tal “Política Nacional de Participação Social”.

“Mecanismos de participação social”

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Ok, então: há uma política que visa a aproximar estado e “movimentos sociais”. Mas no que exatamente ela consiste? Para responder a essa questão, comecemos pelo art. 5º, segundo o qual “os órgãos e entidades da administração pública federal direta e indireta deverão, respeitadas as especificidades de cada caso, considerar as instâncias e os mecanismos de participação social, previstos neste Decreto, para a formulação, a execução, o monitoramento e a avaliação de seus programas e políticas públicas”.
Traduzindo o juridiquês: a partir de agora, todos os “os órgãos e entidades da administração pública federal direta e indireta” (ou seja, tudo o que se relaciona com o governo federal: gabinete da Presidência, ministérios, universidades públicas…) deverão formular seus programas em atenção ao que os tais “mecanismos de participação social” demandarem. Na prática, o Decreto obriga órgãos da administração direta e indireta a ter a participação desses “mecanismos”. Uma decisão de qualquer um deles só se torna legítima quando houver essa consulta – do contrário, será juridicamente inválida. E, como informam os parágrafos do art. 5º, essa participação deverá ser constantemente controlada, a partir de “relatórios” e “avaliações”.
Os “mecanismos de participação social” são apresentados no art. 2º e no art. 6º, que fornecem uma lista com nove exemplos: conselhos e comissões de políticas públicas, conferências nacionais, ouvidorias federais, mesas de diálogo, fóruns interconselhos, audiências e consultas públicas e “ambientes virtuais de participação social” (pelo visto, nossos amigos da MAV-PT acabam de ganhar mais uma função…).
A rigor, todas essas figuras não representam nada de novo, pois já existem no direito brasileiro. Para ficar em alguns exemplos: “audiências públicas” são realizadas a todo momento, a expressão “conferência nacional” retorna 2.500.000 hits no Google e há vários exemplos já operantes de “conselhos de políticas públicas”, como informa este breve relatório da Câmara dos Deputadossobre o tema. Qual seria o problema, então?
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A questão está, novamente, nos detalhes. Grande parte do restante do Decreto – mais especificamente, os arts. 10 a 18 – destinam-se a dar diretrizes, até hoje inexistentes (ao menos de uma forma sistemática), a respeito do funcionamento desses órgãos de participação. E nessas diretrizes mora o grande problema. Uma rápida leitura dos artigos que acabei de mencionar revela que várias delas estão impregnadas de mecanismos que, na prática, têm o objetivo de inserir os “movimentos sociais” a que me referi acima na máquina administrativa brasileira.
Vamos dar um exemplo, analisando o art. 10, que disciplina os “conselhos de políticas públicas”. Em seus incisos, estão presentes várias disposições que condicionam sua atividade à da “sociedade civil” – leia-se, aos “movimentos sociais”, como demonstrado acima. Por exemplo: o inciso I determina que os representantes de tais conselhos devem ser “eleitos ou indicados pela sociedade civil”, o inciso II, que suas atribuições serão definidas “com consulta prévia à sociedade civil”. E assim por diante. Essas brechas estão espalhadas ao longo do texto do Decreto, e, na prática, permitem que “coletivos, movimentos sociais institucionalizados ou não institucionalizados, suas redes e suas organizações” imiscuam-se na própria Administração Pública.
O art. 19, por sua vez, cria um órgão administrativo novo (lembram do que falei sobre a inconstitucionalidade, lá em cima?): “a Mesa de Monitoramento das Demandas Sociais, instância colegiada interministerial responsável pela coordenação e encaminhamento de pautas dos movimentos sociais e pelo monitoramento de suas respostas”. Ou seja: uma bancada pública feita sob medida para atender “pautas dos movimentos sociais”, feito balcão de padaria. Para quem duvidava das reais intenções do Decreto, está aí uma prova: esse artigo sequer tem o pudor de mencionar a “sociedade civil”. Aqui já é MST, MPL e similares mesmo, sem intermediários.
Enfim, para resumir tudo o que foi dito até aqui: com o Decreto 8.243, (i) os “movimentos sociais” passam a controlar determinados “mecanismos de participação social”(ii) toda a Administração Pública passa a ser obrigada a considerar tais “mecanismos” na formulação de suas políticas. Isto é: o MST passa a dever ser ouvido na formulação de políticas agrárias; o MPL, na de transporte; aquele sindicato que tinge a cidade de vermelho de quando em quando passa a opinar sobre leis trabalhistas. “Coletivos, movimentos sociais, suas redes e suas organizações” se inserem no sistema político, tornando-se órgãos de consulta: na prática, uma extensão do Legislativo.

“Back in the U.S.S.R.”!

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Esse sistema de “poder paralelo” não é inédito na História – e entender as experiências pretéritas é uma excelente maneira de se compreender o que significam as atuais. É isso que, como antecipei no início do texto, nos leva de volta a 1917 e aos “sovietes” da Revolução Russa, possivelmente o exemplo mais conhecido e óbvio desse tipo de organização. Se é verdade que “aqueles que não podem lembrar o passado estão condenados a repeti-lo”, como diz o clássico aforismo de George Santayana, é essencial voltar os olhos para o passado e entender o que de fato se passou quando um modelo de organização social idêntico ao instituído pelo Decreto 8.243 foi adotado.
Essa análise nos leva ao momento imediatamente posterior à Revolução de Fevereiro, que derrubou Nicolau II. O clima de anarquia gerado após a abdicação do czar levou à formação de um Governo Provisório inicialmente desorganizado e pouco coeso, incapaz de governar qualquer coisa que fosse.
Paralelamente, formou-se na capital russa (Petrogrado) um conselho de trabalhadores – na verdade, uma repetição de experiências históricas anteriores similares, que na Rússia remontavam já à Revolução de 1905. Tal conselho – o Soviete de Petrogrado – consistia de “deputados” escolhidos aleatoriamente nas fábricas e quarteis. Em 15 dias de existência, o soviete conseguiu reunir mais de três mil membros, cujas sessões eram realizadas de forma caótica – na realidade, as decisões eram tomadas pelo seu comitê executivo, conhecido como Ispolkom. Nada diferente de um MST, por exemplo.
A ampla influência que o Soviete possuía sobre os trabalhadores fez com que os representantes do Governo Provisório se reunissem com seus representantes (1º-2 de março de 1917) em busca de apoio à formação de um novo gabinete. Isto é: o Governo Provisório foi buscar sua legitimação junto aos sovietes, ciente de que, sem esse apoio, jamais conseguiria firmar qualquer autoridade que fosse junto aos trabalhadores industriais e soldados. O resultado dessas negociações foi o surgimento de um regime de “poder dual” (dvoevlastie), que imperaria na Rússia de março/1917 até a Revolução de Outubro: nesse sistema, embora o Governo Provisório ocupasse o poder nominal, este na prática não passava de uma permissão dos sovietes, que detinham a influência majoritária sobre setores fundamentais da população russa. A Revolução de Outubro, que consolidou o socialismo no país, foi simplesmente a passagem de “todo o poder aos sovietes!” (“vsia vlast’ sovetam!”) – um poder que, na prática, eles já detinham.
Antes mesmo do Decreto 8.243, o modelo soviético já antecipava de forma clara o fenômeno dos “movimentos sociais” que ocorre no Brasil atualmente. Com o Decreto, a similaridade entre os modelos apenas se intensificou.
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Em primeiro lugar, e embora tais movimentos clamem ser a representação do “povo”, dos “trabalhadores”, do “proletariado” ou de qualquer outra expressão genérica, suas decisões são tomadas, na realidade, por poucos membros – exatamente como no Ispolkom soviético, a deliberação parte de um corpo diretor organizado e a aclamação é buscada em um segundo momento, como forma de legitimação. Qualquer assembleia de movimentos de esquerda em universidades é capaz de comprovar isso.
Além disso, a institucionalização de conselhos pelo Decreto 8.243 leva à ascensão política instantânea de “revolucionários profissionais” – pessoas que dedicam suas vidas inteiras à atividade partidária, em uma tática já antecipada por Lênin em seu panfleto “Que Fazer?”, de 1902 (capítulo 4c). Explico melhor. Vamos supor por um momento que o Decreto seja um texto bem intencionado, que de fato pretenda “inserir a sociedade civil” dentro de decisões políticas (como, aliás, afirma o diretor de Participação Social da Presidência da República neste artigo d’O Globo). Ora, quem exatamente teria tempo para participar de “conselhos”, “comissões”, “conferências” e “audiências”? Obviamente, não o cidadão comum, que gasta seu dia trabalhando, levando seus filhos para a escola e saindo com os amigos. Tempo é um fator escasso, e a maioria das pessoas simplesmente não possui horas de sobra para participar ativamente de decisões políticas – é exatamente por isso que representantes são eleitos para essas situações. Quem são as exceções? Não é difícil saber. Basta passar em qualquer sindicato ou diretório acadêmico: ele estará cheio de “revolucionários profissionais”, cuja atividade política extraoficial acabou de ser legitimada por decreto presidencial.
A questão foi bem resumida por Reinaldo Azevedo, no texto que citei no início deste artigo. Diz o articulista: “isso que a presidente está chamando de ‘sistema de participação’ é, na verdade, um sistema de tutela. Parte do princípio antidemocrático de que aqueles que participam dos ditos movimentos sociais são mais cidadãos do que os que não participam. Criam-se, com esse texto, duas categorias de brasileiros: os que têm direito de participar da vida púbica [sic] e os que não têm. Alguém dirá: ‘Ora, basta integrar um movimento social’. Mas isso implicará, necessariamente, ter de se vincular a um partido político”.
Exatamente por esses motivos, tal forma de organização confere a extremistas de esquerda possibilidades de participação política muito mais amplas do que eles teriam em uma lógica democrática “verdadeira” – na qual ela seria reduzida a praticamente zero. Basta ver que o Partido Bolchevique, que viria a ocupar o poder na Rússia em outubro de 1917, era uma força política praticamente irrelevante dentro do país: sua subida ao poder se deve, em grande parte, à influência que exercia sobre os demais partidos socialistas (mencheviques e socialistas-revolucionários) dentro do sistema dos sovietes. Algo análogo ocorre no Brasil atual: salvo exceções pontuais, PSOL, PSTU et caterva apresentam resultados pífios nas eleições, mas por meio da ação de “movimentos sociais” conseguem inserir as suas pautas na discussão política. As manifestações pelo “passe livre” – uma reivindicação extremamente minoritária, mas que após um quebra-quebra nacional ocupou grande parte da discussão política em junho/julho de 2013 – são um exemplo evidente disso.
O sistema introduzido pelo Decreto 8,243 apenas incentiva esse tipo de ação. O Legislativo “oficial” – aquele que contém representantes da sociedade eleitos voto a voto, representando proporcionalmente diversos setores – perde, de uma hora para outra, grande parte de seu poder. Decisões estatais só passam a valer quando legitimadas por órgãos paralelos, para os quais ninguém votou ou deu sua palavra de aprovação – e cujo único “mérito” é o fato de estarem alinhados com a ideologia do partido que ocupa o Executivo.
Pior: a administração pública é engessada, estagnada. Não no sentido definido no artigo d’O Globo que linkei acima (demora na tomada de decisões), mas em outro: os cargos decisórios desse “poder Legislativo paralelo” passam a ser ocupados sempre pelas mesmas pessoas. Suponhamos, em um esforço muito grande de imaginação, que o PT perca as eleições presidenciais de 2018 e seja substituído por, digamos, Levy Fidelix e sua turma. Com a reforma promovida pelo Decreto 8.243 e a ocupação de espaços de deliberação por órgãos não eletivos, seria impossível ao novo presidente implantar suas políticas aerotrênicas: toda decisão administrativa que ele viesse a tomar teria que, obrigatoriamente, passar pelo crivo de conselhos, comissões e conferências que não são eleitos por ninguém, não renovam seus quadros periodicamente e não têm transparência alguma. Ou seja: ainda que o titular do governo venha a mudar, esses órgãos (e, mais importante, os indivíduos a eles relacionados) permanecem dentro da máquina administrativa ad eternum, consolidando cada vez mais seu poder.

Conclusão

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O Decreto 8.243 é, possivelmente, o passo mais ousado já tomado pelo PT na consecução do “socialismo democrático” – aquele sistema no qual você está autorizado a expressar a opinião que quiser, desde que alinhada com o marxismo. Sua real intenção é criar um “lado B” do Legislativo, não só deslegitimando as instituições já existentes como também criando um meio de “acesso facilitado” de movimentos sociais à política.
Boa parte dos leitores dessa página podem estar se perguntando: “e daí?”. Afinal, sabemos que a democracia representativa é um sistema imperfeito: suas falhas já foram expostas por um número enorme de autores, de Tocqueville a Hans-Hermann Hoppe. É verdade.
No entanto, a democracia representativa ainda é “menos pior” do que a alternativa que se propõe. Um sistema onde setores opostos da sociedade se digladiam em uma arena política, embora tenda necessariamente a favorecimentos, corrupção e má aplicação de recursos, ainda possui certo “controle” interno: leis e decisões administrativas que favoreçam demais a determinados grupos ou restrinjam demasiadamente os direitos de outros em geral tendem a ser rechaçadas. Isso de forma alguma ocorre em um sistema onde decisões oficiais são tomadas e “supervisionadas” por órgãos cujo único compromisso é o ideológico, como o que o Decreto 8.243 tenta implementar.
Esse segundo caso, na verdade, nada mais é do que uma pisada funda no acelerador na autoestrada para a servidão.

Erick Vizolli é advogado e anarco-monarquista de extremo centro. Defende a liberdade econômica e política pelo simples motivo de que, nesse sistema, a produção de zoeira é maximizada.