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sábado, 30 de dezembro de 2006

676) Prefacio a um livro de Relacoes Internacionais

Um bem-vindo crescimento na oferta de relações internacionais

Apresentação ao livro Política Internacional, Política Externa e Relações Internacionais
Organizador: Leonardo Arquimimo de Carvalho
(Curitiba: Editora Juruá, 2003)

Que os processos contraditórios e complementares da globalização econômica e da regionalização comercial sejam os elementos característicos da ordem internacional contemporânea pouca gente ainda duvida, sobretudo nos meios universitários, ainda que as atitudes adotadas a respeito de cada um desses fenômenos sejam tão variadas quanto as ideologias políticas ou as crenças religiosas, indo da adesão inquestionável (ou mesmo a aceitação passiva) à avaliação crítica — mais própria dos economistas — e à recusa peremptória, como observado nas ruidosas manifestações contra o chamado “consenso de Washington” e as organizações econômicas multilaterais, a começar pelo FMI. Aspectos menos positivos da globalização são revelados pelos movimentos terroristas, pelos fluxos ilegais de toda sorte — do narcotráfico, à corrupção nos contratos internacionais e à lavagem de dinheiro ilegalmente obtido — ou ainda pelas dificuldades em conciliar os interesses nacionais e os imperativos da administração racional de recursos globais da humanidade, como nos casos da destruição ambiental dentro e fora das fronteiras dos estados, da poluição dos rios, florestas e atmosfera, assim como da regulação do uso de espaços comuns, como ocorre no caso dos mares internacionais.
O Brasil participa plenamente de todos esses fenômenos, processos, instrumentos e movimentos de nossa época, tanto pela sua crescente inserção econômica internacional, como pela vertente sub-regional do Mercosul e pelos esquemas hemisféricos de integração e de liberalização econômica (como exemplificado nas negociações da Alca), sem mencionar o lado mais vasto do sistema multilateral de comércio, hoje regido pela OMC. Ele é fundador e participante ativo de praticamente todos os organismos econômicos e políticos do sistema onusiano, discutiu intensamente a adoção dos principais tratados internacionais regulando espaços comuns — direito do mar, por exemplo —, é parte, ainda que não protagônica, dos instrumentos que regulam o desarmamento e o controle de armas de destruição em massa e sofre, infelizmente, o impacto dos fluxos de capitais voláteis que estiveram na origem do mais recente ciclo de crises financeiras mundiais.
Este livro trata, com saudável diversidade analítica e ampla perspectiva quanto aos temas e métodos, desses fenômenos e processos que passaram a integrar o cotidiano da maior parte dos brasileiros, como uma rápida consulta ao seu sumário poderá revelar. Nele comparecem os problemas da ordem internacional, da ONU, do terrorismo, dos direitos humanos, do direito do mar, da política externa brasileira e da de alguns vizinhos regionais, da globalização e da regionalização, com as questões associadas do Mercosul e da Alca, assim como do papel do capital e do trabalho no contexto da ordem mundial globalizada. Os autores convidados são tanto acadêmicos consagrados nas lides docentes, “escreventes” e investigativas desse campo relativamente novo dos cursos de graduação oferecidos nas universidades brasileiras, como jovens representantes de um terreno de estudos que vem crescendo exponencialmente nos últimos anos.
Com efeito, uma pesquisa perfunctória nas listas de cursos disponíveis nas instituições públicas e privadas nacionais confirmaria essa nova “economia da oferta” no campo das relações internacionais e disciplinas afins. As universidades brasileiras, tanto as públicas como as privadas, mas crescentemente estas últimas, passaram a desenvolver ou ampliar atividades e iniciativas de relações internacionais, desde o estabelecimento de acordos de cooperação com parceiros do exterior, até a criação, em bases relativamente uniformes, de cursos de graduação ou de pós-graduação nessa área, haja vista a enorme demanda despertada, justamente, pelos processos mencionados.
Essa tendência encontra, por sua vez, confirmação no plano editorial, onde as empresas privadas ou essas mesmas universidades, dotadas em grande parte de editoras próprias – já que o avanço da tecnologia e dos sistemas informáticos de editoração eletrônica barateou a montagem de “centrais de produção de livros” –, começaram a criar coleções de livros especializados em temas internacionais, o que representa um significativo avanço para o reforço das bibliografias e materiais didáticos que os professores desses cursos utilizarão em suas aulas. A “economia da oferta” encontra assim a sua própria demanda, numa saudável reedição da “lei de Say” aplicada aos nossos propósitos bibliográficos e universitários.
A bem da verdade, foi Keynes quem fabricou uma versão truncada dessa famosa “lei” com que o economista francês Jean-Baptiste Say intentou fundar, no início do século XIX, sua teoria do valor-utilidade — contra a opinião de Adam Smith e de David Ricardo, que se baseavam na teoria do valor-trabalho, depois retomada por Marx —, afirmando que “a oferta cria sua própria demanda”, quando Say na verdade pretendia dizer que é a utilidade que cria a demanda específica para um determinado produto. Podemos descontar esse pecado venial de Keynes — mais interessado, até por razões políticas, em insistir na demanda agregada e no papel do Estado — e ficar com as geniais intuições de Say sobre o papel dos empresários no sistema econômico, dispostos, segundo ele, a arriscar o seu dinheiro em setores nos quais as ofertas são relativamente raras e onde a taxa de retorno é portanto maior. Segundo Say, a oferta é decisiva e é ela que permite o enriquecimento dos indivíduos.
O presente livro constitui, justamente, um claro exemplo desse enriquecimento, uma vez que ele vem, não apenas, incrementar a qualidade da oferta bibliográfica nesse terreno, como também contribuir para os progressos da discussão acadêmica de bom nível em torno de velhos e novos problemas da inserção externa do Brasil. Constitui, aliás, para mim, especial motivo de satisfação o fato de estar apresentando uma coleção de ensaios de relações internacionais colocada sob o signo de alguns dos temas que têm freqüentado meus últimos livros nessa área: globalização e regionalização, Mercosul e Alca, política externa brasileira, em especial em sua vertente econômica. Ele me parece, pois, ter alcançado êxito no empreendimento, a partir de lentes analíticas tão múltiplas e da já apontada diversidade de perspectivas, como corresponderia, aliás, a um país tão diverso e complexo como o Brasil. Seus autores-colaboradores podem ser considerados como verdadeiros “empresários” da “indústria de relações internacionais” no Brasil, uma das mais prósperas nos últimos tempos de inserção necessária na globalização.
Satisfeita sua demanda com esta nova oferta em relações internacionais, cabe agora ao “consumidor” saborear o produto, tendo eu a certeza de que ele sairá, deste ato deliberado de “consumo conspícuo” — para retomar o famoso conceito do economista genial que era Thorsten Veblen —, muito mais enriquecido do que quando nele inicialmente se engajou. Bom apetite a todos!

Paulo Roberto de Almeida (www.pralmeida.org)
Washington, março de 2003

Sumário

Mensagem do Organizador
Leonardo Arquimimo de Carvalho
Apresentação
Paulo Roberto de Almeida

I – Política Internacional, Política Externa e Relações Internacionais
1. O sistema mundial e as Relações Internacionais na passagem do século
Paulo Vizentini
2. A Organização das Nações Unidas e a paz possível
Shiguenoli Miyamoto, Patrícia Nasser de Carvalho
3. Unipolaridade: terrorismo e vulnerabilidade latino-americana
Eduardo Viola, Hector Ricardo Leis
4. Limites à política externa brasileira: perspectivas para o governo Lula
Leonardo Arquimimo de Carvalho
5. A Diplomacia Venezuelana Frente aos Estados Unidos no Período Chavez
Rafael Duarte Villa

II – Política Internacional, Política Externa, Globalização e Direito
6. Globalização e regionalização: tendências contemporâneas mundiais
Sonia de Camargo
7. Política Externa, Política e Direito Internacional: a formação de um regime para o uso dos oceanos
Felipe Kern Moreira
8. Direitos Humanos e Globalização: breve leitura hermenêutica
Ivone F. Morcilo Lixa
9. Ética na relação entre capital e trabalho no contexto da globalização
Katie Arguello

III - Política Internacional, Política Externa e Integração Regional
10. Regionalização e Globalização: fenômenos simultâneos
Andrea Sabbaga de Melo
11. Constrangimentos brasileiros frente à ALCA
Tullo Vigevani
12. ALCA: o ‘Cavalo de Tróia’ da integração hemisférica
Francisco Quintanilha VerasNeto

675) Primeiro Emprego: um caso de diplomata

Primeiro Emprego – Depoimento Pessoal e Reflexões

Paulo Roberto de Almeida
Respostas a perguntas colocadas pela Editora Abril em 2003 (para elaboração do Guia do Primeiro Emprego)

1) Qual foi o seu primeiro emprego na vida? E na área (se não tiver começado nessa área)? Quantos anos tinha nas ocasiões citadas?
Comecei a trabalhar muito cedo na vida, em torno de 12 anos, em trabalhos informais de adolescente (clube de tenis e supermercado), nos quais não havia registro em carteira ou pagamento regular de salário. Entre os 16 e 20 anos, fui auxiliar de escritório em duas grandes empresas (brasileira e multinacional), ao mesmo tempo em que passei a estudar (segundo ciclo do secundário) pela noite. Após uma longa interrupção para estudos universitários de graduação e mestrado, entre 1971 e 1976 (que realizei no exterior, combinado ao exercício não regular de atividades remuneradas), retornei ao Brasil em 1977, passando a desempenhar-me como professor em faculdades de São Paulo.
Meu trabalho como servidor público federal, na carreira de diplomata, teve início em dezembro de 1977, já com 28 anos. Desde essa época (um quarto de século já), servi no exterior em diversas missões diplomáticas e no Brasil (Ministério das Relações Exteriores, em Brasília), geralmente na área econômica. Mais recentemente fui chefe da Divisão de Política Financeira e de Desenvolvimento do Itamaraty, de 1996 a 1999, e desde outubro daquele ano sou Ministro Conselheiro na Embaixada em Washington, o mais importante dos postos externos do Ministério das Relações Exteriores.

2) Como era seu relacionamento com o chefe (ou o superior)?
Tive vários chefes ao longo de uma carreira profissional que teve início muito jovem na iniciativa privada e depois se prolongou, no essencial, no governo. Sempre gozei da confiança de meus chefes, pela dedicação demonstrada no trabalho e pela boa disposição em cumprir sempre um pouco mais do que seria normalmente esperado. Com um desses chefes, trabalhei em diversas ocasiões na carreira diplomática, o atual representante diplomático do Brasil em Washington, Embaixador Rubens Antônio Barbosa. Com ele trabalhei ao ingressar na carreira diplomática e três vezes mais, sempre a seu convite e na base da confiança pessoal: desde 1977, portanto, venho desfrutando da confiança de um dos diplomatas mais distinguidos do serviços exterior brasileiro.

3) Analisando o passado, existe algum erro ou deslize - engraçado ou até constrangedor - que acredita ter cometido por conta da idade, da falta de experiência?
Sim, logo ao início da carreira diplomática, por ter ingressado por concurso direto e não mediante curso do Instituto Rio Branco, como costuma ser a norma, tinha pouca experiência com linguagem diplomática e procedimentos tícpicos da carreira. Meu primeiro telegrama escrito destoava totalmente do estilo habital empregado no serviço exterior, algo como se um “paisano” fosse chamado a exercer o comando de alguma tropa militar. Isso revela que uma boa preparação, com o conhecimento adequado de normas e procedimentos aplicados em qualquer profissão ou atividade, é absolutamente essencial para um bom desempenho profissional. A boa disciplina no exercício das funções também constitui requisito essencial quando se trabalha numa grande burocracia, pois a boa organização no trabalho depende de um certo número de regras de convivência.

4) Que lições tirou do primeiro emprego?
Nunca se deve chegar num primeiro emprego como se não se necessitasse de treinamento ou aperfeiçoamento técnico e profissional. Atitudes do tipo “eu sei fazer”, “eu sei tudo”, “deixa comigo”, geralmente conduzem a desastres, ou pelo menos a situações de constrangimento funcional. Um pouco de humidade e uma boa disposição para aprender e, antes de tudo, para perguntar são essenciais para um bom desempenho nas etapas iniciais da carreira.
Como regra geral, e não apenas no primeiro emprego, tenho por norma que o bom aprendizado se resume geralmente a duas fontes de conhecimento e de aprendizado: bons livros e convivência com gente mais esperta e experiente. Geralmente se aprende mais na leitura e no convívio com gente capacitada e com experiência do que nos estudos formais de escola, onde se perde tempo com matérias que pouco servirão na vida. Não estou recusando a ncessidade do diploma, ou da disciplina e sistemática que são próprios do ensino convencional, mas todos podem constatar a desadequação dos curriculos escolares – necessariamente tradicionais e defasados – em relação a aspectos práticos que serão úteis no desempenho profissional.
Repito: se aprende muito nos livros e no contato com gente mais esperta, o que de certa forma confirma uma velha constatação do senso comum: o verdadeiro aprendizado é auto-didata e a escola pode ensinar alguma coisa, mas educação mesmo é um processo necessariamente pessoal e derivado do esforço individual.

5) Para alguém que está procurando emprego na área, quais cuidados você recomenda para o candidato à vaga se sair bem (cuidados com aparência e roupas, comportamento social, somente preparo intelectual, maturidade, etc)?
A carreira diplomática é obviamente única nos seus requisitos de entrada, não apenas em termos de uma grande bagagem intelectual acumulada ao longo de anos de estudo e preparação dedicada, mas também no sentido em que o diplomata deve exibir algumas qualidades de convivência e de interação social que serão importantes no desempenho posterior. Por isso os exames de ingresso na carreira envolvem não apenas disciplinas tradicionais, mas também entrevistas diretas com banca examinadora que julga as aptidões do candidato para aquele tipo de exercício profissional (a maturidade entra em linha de conta nesse contexto, assim como o comportamento social). O cuidado com sua própria aparência (modo de vestir, portanto) também é avaliado.

6) Para finalizar, preciso de mais três informações: idade, local de nascimento e faculdade(s) que cursou.
Nasci em 19 de novembro de 1949, na cidade de São Paulo: estou portanto com 53 anos atualmente, praticamente a metade vividos no exterior.
Iniciei estudos de ciências sociais na Universidade de São Paulo em 1969, tendo interrompido porém os estudos no curso do segundo ano, após que medida arbitrária do regime militar então em vigor resultou na aposentadoria compulsória de vários professores (entre eles Fernando Henrique Cardoso, Florestan Fernandes, Octavio Ianni e vários outros). Retomei os estudos na Universidade de Bruxelas, onde me graduei em Ciências Sociais em 1974, com a apresentação de dissertação de licenciatura intitulada “Ideologia e Política no Desenvolvimento Brasileiro, 1945-1964”.
Completei mestrado em planejamento econômica na Universidade de Antuérpia em 1976, com tese de economia internacional intitulada “Problemas Atuais do Comércio Exterior Brasileiro: uma avaliação do período 1968-1974”.
Fiz inscrição para doutoramento em Ciências Sociais na Universidade de Bruxelas em 1976, mas retornei ao Brasil em 1977 interrompendo os estudos para ingresso na carreira diplomática; eles só seriam retomados em 1981, quando refiz meu projeto de tese e efetuei nova inscrição, sempre na Universidade de Bruxelas. Obtive o doutoramento por essa universidade em 1984, com defesa de tese que mereceu “grande distinção” sobre “Classes sociais e poder político no Brasil: uma avaliação dos fundamentos empíricos e metodológicos da revolução burguesa”.
Já fui professor de Sociologia e de Economia Internacional em diversos cursos de graduação e de pós-graduação em São Paulo e Brasília, desde 1985, assim como sou professor convidado em várias universidades estrangeiras. Atualmente sou orientador de mestrado do Instituto Rio Branco, a academia diplomática do Ministério das Relações Exteriores. Tenho diversos livros publicados no Brasil e no exterior, como pode ser constatado em minha página pessoal: www.pralmeida.org.

Paulo Roberto de Almeida, Washington: 22 de maio de 2003

674) Relacoes Internacionais: profissionalizacao e atividades

Relações Internacionais: profissionalização e atividades
Paulo Roberto de Almeida
(um texto de 2003)

Respostas a questões colocadas por estudantes de MG para subsidiar Mostra Profissional sobre relações internacionais.


1) Quais seriam as vantagens e desvantagens da grade curricular multidiciplinar do bacharelado em Relações Internacionais?
PRA: Como vantagem principal se coloca obviamente o fato de que o profissional em relações internacionais – chamemo-los de internacionalistas – é naturalmente chamado a tratar de matérias as mais diversas possíveis, atinentes aos terrenos econômico, político, jurídico, ou mesmo cultural e tecnológico, daí a ncessidade de uma formação abrangente de maneira a cobrir esses diversos campos. A própria disciplina de relações internacionais retira métodos e substância de várias áreas curriculares, notadamente história, ciência política, economia, direito, sociologia ou mesmo antropologia. Todas essas disciplinas, e possivelmente mais algumas outras (como línguas, metodologia científica, psicologia social, estatística ou sociografia), podem e devem figurar numa grade curricular de um curso desse tipo.
Eventuais desvantagens não estão propriamente vinculadas à estrutura curricular, mas à natureza do curso em si, que não conduz a uma especialização muito bem delimitada no padrão atual (tradicional) de classificação profissional, uma vez que o egresso desse tipo de curso não está exatamente habilitado para se desempenhar numa carreira de economista, de historiador, de cientista político ou ligado à área jurídica, por lhe faltar talvez alguns instrumentos e perícia em determinadas matérias técnicas ligadas a cada uma dessas especialidades individuais. Daí a preferência de alguns especialistas em fazer com o que o curso de relações internacionais seja na verdade uma pós-graduação, ou especialização estrito senso, e não como ocorre de maneira cada vez mais generalizada no Brasil, um curso de graduação.

2) O mercado se encontra mais receptivo a profissionais não especializados, como o bacharel em Relações Internacionais, ou àqueles preparados em cursos com habilidades específicas, como o caso do bacharel em Direito?
PRA: Tem havido uma boa recepção do profissional em relações internacionais, mas isso talvez se deva a uma espécie de “novidade do momento”, a uma percepção (talvez incorreta) de que os desafios dos processos de regionalização e de globalização possam ser melhor enfrentados pelos internacionalistas ou mesmo a uma demanda específica que ainda não foi “saturada” nesse nicho. Creio, contudo, que nas condições atuais do Brasil – país ainda insuficientemente “globalizado” e dotado, de todo modo, de poucas empresas verdadeiramente internacionais – o “excesso” de oferta que vem sendo verificado nessa vertente possa não se sustentar no futuro, daí minha preferência por uma abordagem ainda relativamente conservadora da profissionalização nessa área. Ou seja, seria preferível que os profissionais de graduação tivessem habilidades específicas (direito, economia, história etc.), para só a partir daí, então, encaminhar-se para a especialização em relações internacionais.
O mercado sempre estará preparado, por muito tempo ainda, para os profissinais tradicionais e muito pouco para o internacionalista, que precisará esforçar-se para encontrar seus nichos de trabalho no quadro de demanda ainda organizada segundo os padrões disciplinares e profissionais clássicos.

3) Sabemos que a boa relação com os países que nos cercam pode nos auxiliar em problemas internos. Qual seria o maior exemplo para comprovar tal situação?
PRA: Os países enfrentam ciclos econômicos ascendente e descendentes em suas atividades produtivas, tanto em função de problemas propriamente internos – esgotamento de determinados recursos naturais, por exemplo – como devido à própria dinâmica econômica internacional, daí a necessidade de determinadas válvulas de escape para dificuldades temporárias. Um exemplo óbvio é o da crise em determinados setores da economia ou em determinadas regiões, o que “obriga”, de certa forma, à “exportação” de “excedentes demográficos”. O Brasil, tradicional país recipiendários de imigrantes ao longo de toda a sua história, tornou-se moderadamente “exportador” de mão-de-obra (geralmente não especializada) para outros países, da própria região ou em outros continentes. A mobilidade profissional deve ser vista, aliás, como algo normal e mesmo desejável, diferentemente, talvez, da simples “expulsão econômica” de desempregados em momentos de crise. Boas relações gerais com vizinhos, e mesmo países distantes, ajuda, nesse sentido, a conduzir de maneira adequada esses movimentos de entrada e saída de pessoas ao longo de alguns anos.
Da mesma forma, a ocorrência de surtos epidêmicos na população humana ou animal impõe, necessariamente, a cooperação transfronteiriça, assim como problemas ambientais de uma certa dimensão, que não respeitam fronteiras políticas e limites geopolíticos. Cooperação em matéria de segurança – terrorismo, nacrotráfico – também são bons exemplos de que resultados efetivos são melhor alcançados quando as relações políticas entre Estados vizinhos são satisfatórias.

4) Como o senhor avalia o surgimento de inúmeros cursos de Relações Internacionais nos últimos anos? Esse fato traz desvantagens para os jovens recém-formados na profissão?
PRA: Difícil dizer, neste momento, pois se trata de um fenômeno que tem menos de dez anos, sendo resultado dos progressos da globalização e da regionalização nos anos 1990. As instituições privadas de ensino têm respondido de maneira dinâmica a essa demanda percebida, seguidas de longe por algumas insituições públicas, mas seria preciso esperar um processo natural de “decantação” nessa área para uma avaliação mais precisa. Não creio que se trata de desvantagem, pois do ponto de vista do mercado pode ser até uma vantagem, na medida em que a oferta ampliada provocará uma saudável concorrência entre as instituições, um “barateamento” das tarifas e uma progressiva melhoria de qualidade nos cursos mais competitivos.
Creio, todavia, que uma certa especialização nas orientações se torna de certo modo inevitável. Uma cidade como Brasilia, governamental e diplomática por excelência, apela naturalmente uma formação centrada nas disciplinas clássicas ligadas à diplomacia (direito, história, línguas, economia internacional). Já métropoles como São Paulo e Rio de Janeiro, onde se localizam a maior parte das empresas internacionais brasileiras e o grosso das multinacionais (em atividades diversas dos serviços e da indústria) requerem formações voltadas para “global business”, com matérias de comércio exterior, finanças internacionais etc. No sul do país, talvez, mais voltado para atividades do agribusiness e em contato direto com os demais parceiros do Mercosul, as especializações podem estar no comércio internacional (inclusive normas relativas ao Mercosul e à Aladi), questões fitossanitárias e diretamente o domínio da língua espanhola. Como se vê, as especializações se farão, inevitavelmente, nas diversas instituições de ensino situadas nessas regiões, quase que de forma natural.

5) Quais seriam, basicamente, suas funções como Ministro Conselheiro na Embaixada do Brasil em Washington?
Sou o “segundo” do Embaixador, e portanto o representante alterno, o que em linguagem diplomática costuma se chamar “Encarregado de Negócios” (na ausência do Embaixador titular). Ademais de supervisionar o trabalho de uma chancelaria, de modo geral, sou encarregado da assinatura de determinados papéis, de visar preliminarmente grande parte dos telegramas diários (antes de serem despachados pelo chefe do posto), de representá-lo eventualmente em determinadas cerimônias, reuniões de trabalho e na recepção a uma determinada categoria de visitantes na Embaixada, assim como ficar a disposição do Embaixador e da própria Secretaria de Estado para qualquer tarefa que se imponha fora da rotina normal de trabalho. Normalmente, numa grande embaixada como a de Washington, existe mais de um ministro-conselheiro, o que também implica uma certa especialização entre eles. Como somos três, fico encarregado dos temas econômicos e financeiros, havendo outro para os temas políticos e um terceiro para questões administrativas e consulares.

6) O avanço da globalização tem aumentado a importância do diplomata no cenário internacional. Que peculiaridades podem ser destacadas na carreira diplomática?
A carreira continua similar ao que sempre foi, constituída basicamente pelas tarefas de: informação, representação, negociação. A globalização impõe talvez uma certa redefinição da primeira função, pois não mais se considera necessário informar sobre o cotidiano ou o corriqueiro do país, como talvez fosse o caso na era dos ofícios a bico de pena. A informação deve ser seletiva, limitado aos temas que interessam diretamente ao serviço diplomático ou às relações com o país de origem.
Por outro lado, a intensificação dos contatos humanos, dos intercâmbios comerciais e tecnológicos determinam que se procure aproveitar as novas oportunidades oferecidas pela cooperação internacional, em novas áreas ou de formas inéditas até então. Permanece, no entanto, a peculiaridade do contato direto com representantes do governo junto ao qual se está acreditado, o bom conhecimento das características locais e um certo sentido de oportunidade na construção de laços mais duradouros do que os simples contatos burocráticos de trabalho. Uma boa relação pessoal entre chefes de estado ou de governo é por vezes importante no acompanhamento e solução de determinados problemas internacionais – uma crise financeira, por exemplo – e quem deve preparar o terreno é o diplomata. Nisso, sua função ainda é insubstituível, pois ele não pode ser “representado” por nenhum sistema informático ou tecnologia high tech. O chamado “fator humano” ainda é uma alavanca indispensável nos assuntos sociais e, por extensão, internacionais.

7) O senhor ingressou muito cedo no mercado de trabalho, mesmo que de forma informal. Que experiências foram importantes nesta etapa de sua vida e em que isso colaborou para que o senhor alcançasse a realização profissional?
O sentido do esforço individual, o desejo de aprender por mim mesmo, um certo auto-didatismo e, de modo geral, a persistência nos esforços pessoais, como forma de alcançar objetivos relevantes ou metas desejáveis. Aprendi a valorizar a conquista de aspirações significativas, em lugar de esperar que me fossem oferecidos oportunidades ou favores. De certa forma, posso dizer, hoje em dia, que, vindo de família modesta e desprovido quase que completamente de mecanismos sociais ou familiares de sustentação, pude ascender profissionalmente e socialmente graças a meu próprio esforço, um pouco como os “self-made men”, com a diferença de que no meu caso não estava aspirando poder ou riqueza, mas tão simplesmente bem desempenhar minhas tarefas profissionais e lograr manter, ao mesmo tempo ou paralelamente, atividades acadêmicas que são demonstradas, atualmente, nos muitos livros publicados por mim.

8) Que conselho o senhor daria aos jovens que desejam ingressar em um curso superior de Relações Internacionais?
Apenas um: não dependam do curso para sua própria formação, não considerem suficiente ou adequado o que for “aprendido” nas salas de aula, mas construam vocês mesmos o “seu” curso, pela leitura e estudo intensos, pelo questionamento constante do “saber adquirido” e pelo exercício regular e sadio da “inquirição” bem orientada. Não se contentem com os jornais diários, nem com as revistas, procurem livros, manuais, enciclopédias, sistemas de informação online, não esperem que o professor “transmita” a vocês aquilo que pensam dever aprender no curso, mas façam dele um orientador de novas leituras, um conselheiro de métodos, mais do que um simples “educador” (o que ele de certa forma nunca será, pois professores em geral apenas transmitem técnicas, que educa é a própria vontade individual de aprender cada vez mais).
Em uma palavra: entrem no curso como se já estivessem preparados para dele sair para o exercício de alguma atividade profissional, ou seja, com um certo propósito-guia, que os vai orientar durante todo o curso, e que os fará buscar sempre mais, além das simples obrigações acadêmicas do dever de casa e das leituras obrigatórias. Construam o seu próprio saber.

9) O que pode se afirmar das relações exteriores do Brasil hoje, em relação aos demais países e ao passado do próprio país?
As relações exteriores do Brasil, stricto sensu, não são diferentes das de outros países em desenvolvimento, ou seja um esforço constante de inserção nos circuitos mais dinâmicos da economia internacional, a busca do rompimento com certas fragilidades e dependências – financeira, tecnológica, educacional e científica – que sempre marcaram o país e a intensificação da participação nos negócios internacionais, num sentido positivo, ou seja, da promoção da paz, da cooperação internacional e o progressos dos direitos humanos e da democracia nos planos global e regional.
No que se refere especificamente à sua diplomacia, caberia registrar, sem qualquer falsa modéstia, as qualidades excelentes de profissionalismo, preparação e dedicação, fruto de praticamente dois séculos de exercício constante das relações diplomáticas a partir do próprio país. Nossa diplomacia é certamente mais eficiente do que a de muitos outros países emergentes e mesmo do que a de vários países ditos avançados.

10) Quais são, na sua visão, os momentos históricos mais marcantes nos quais a diplomacia entre os povos foi decisiva?
Nos momentos de crise internacional, ela se torna relevante. As guerras são de certo modo o fracasso da diplomacia, mas não são sempre evitáveis, em face de algum ditador expansionista, como Hitler, por exemplo. Em outros momentos, se conseguiu evitar a guerra, como na crise dos foguetes em Cuba (1962), quando o mundo viveu praticamente a situação limite de um conflito nuclear, nunca ocorrido na história da humanidade. O próprio Brasil contribuiu para alguns episódios de pacificação entre países vizinhos, como na Guerra do Chaco entre Bolívia e Paraguai (1936) ou nos conflitos fronteiriços entre Peru e Equador (1942 e novamente em 1997).
Mas, a diplomacia não precisa atuar apenas nos momentos de crise. Ela deve exercer-se de modo constante, em qualquer época e lugar, contribuindo para a expansão do direito internacional e a promoção dos direitos humanos. Considere-se, por exemplo, a noção de soberania estatal: ela não pode ser absoluta, a ponto de se permitir que um ditador coloque em risco a vida de seu próprio povo, ou que cometa atentados pesistentes contra a dignidade da pessoa humana ou os direitos civis e religiosos das minorias. A próxima etapa do direito internacional talvez se situe na regulação do chamado “direito de intervenção” (muito vinculado ao direito humanitário), de maneira a evitar aspectos bastante constrangedores, como os vividos recentemente pela intervenção unilateral dos Estados Unidos no Iraque.

11) Quais os desgastes, nas relações exteriores, causados por medidas protecionistas adotadas por determinados países, como a imposta recentemente pelos EUA que reduziam as exportações de aço brasileiro para tal país?
Uma visível diminuição na confiança bilateral, na medida em que se tem, de modo claro, consciência da ilegalidade das medidas (como determinado pela OMC em relação às salvaguardas aplicadas pelos EUA ao arrepio das normas internacionais). Ocorre também um sentimento de frustração pelas perdas econômicas ocasionadas e uma desconfiança de que eventuais acordos de liberalização comercial serão efetivamente cumpridos, na letra e no espírito das regras acordas bilateralmente ou multilateralmente. Por isso mesmo, o Brasil vem insistindo para que, ao lado das medidas de acesso a mercado (redução de barreiras tarifárias), sejam contemplados também nos futuros acordos da Alca ou da OMC regras claras no que ser refere a medidas de defesa comercial (antidumping e salvaguardas), ademais da redução de todas as demais barreiras protecionistas existentes (como podem ser os subsídios à produção interna, notadamente em agricultura, e as subvenções às exportações).

Paulo Roberto de Almeida
Washington, 15 de julho de 2003

673) A formacao e a carreira do diplomata

Uma preparação de longo curso e uma vida nômade

Paulo Roberto de Almeida

A carreira diplomática tem atraído número crescente de jovens, em decorrência da maior inserção internacional do Brasil e dos avanços da globalização e da regionalização. Os candidatos têm em geral procurado os cursos de graduação em relações internacionais. Cabe indagar se esses cursos fornecem a preparação adequada para o concurso do Itamaraty e, alternativamente, considerando que apenas um número restrito será admitido na carreira, se eles fornecem os instrumentos necessários para lograr uma boa colocação no setor privado, que é ainda o grande “absorvedor” da oferta universitária.
Não é tampouco certo que um curso de graduação em relações internacionais seja a melhor via de acesso à carreira diplomática, uma vez que os requerimentos de entrada são mais amplos, ou mais específicos, do que a grade curricular desses cursos, ainda desiguais e com ênfases distintas nos vários estados: alguns são teóricos, voltados para a pesquisa em política mundial, outros colocam ênfase no comércio internacional e no chamado global business (o que pode ser uma orientação correta, se pensarmos que as relações econômicas internacionais compõem o essencial da agenda contemporânea). Os cursos tradicionais — direito, economia ou administração, com um complemento em línguas — podem ser mais útil ao aspirante à carreira, já que ele poderá se exercer também nas profissões pertinentes. Ele pode, depois, buscar uma especialização em relações internacionais, familiarizando-se com os debates teóricos e com a agenda da política mundial.
Em todo caso, o candidato à carreira pode não receber num curso de graduação, ou num preparatório de seis ou doze meses, o conhecimento de que necessita para atender aos requisitos do concurso do Instituto Rio Branco. Ele precisa ter sólida formação, feita geralmente de anos de acumulação de cultura humanista e de incontáveis leituras. Mais do que qualquer curso ex-catedra, o importante é o esforço individual do candidato, que será idealmente um auto-didata. Um curso de preparação à carreira pode ajudar, ao transmitir um “conhecimento mastigado” e alguma “segurança psicológica”. Mesmo vindo de família modesta e carente de aperfeiçoamentos no exterior ou em cursos de línguas, o candidato motivado pode suprir lacunas pessoais ou de ambiente social ao construir o seu próprio curso, mediante um sério programa de estudos sistemáticos, feito da bibliografia sugerida pelo IRBr, da leitura diária de um jornal econômico e do acesso constante à Internet (como The Economist, Financial Times, Foreign Affairs e outros).
Nos últimos anos, o Instituto Rio Branco tem selecionado um em cada oitenta ou cem candidatos: a seleção é portanto rigorosa e a grande maioria deverá buscar uma outra profissão dentro da área, na espera de poder um dia ingressar na carreira. O mercado é basicamente constituído pelo setor privado, e cabe ao jovem ter consciência disso desde o início. Algumas faculdades mantêm cursos com perfil excessivamente acadêmico, feito de matérias teóricas ou de disciplinas voltadas para os grandes equilíbrios geopolíticos do cenário internacional, como se todos os seus egressos fossem passar a vida discutindo as teorias realista ou racionalista de relações internacionais ou resolvendo algum problema no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Essa não é a realidade da agenda mundial, que, mesmo em sua vertente negocial, é feita mais de questões de comércio internacional do que de problemas relativos ao poder mundial.
Algumas especializações podem responder melhor ao perfil específico para uma inserção nos mercados regionais de trabalho. Uma cidade como Brasilia, governamental e diplomática por excelência, chama naturalmente uma formação centrada nas disciplinas diretamente ligadas à diplomacia (direito, história, línguas, economia internacional), para um trabalho no governo, nas organizações internacionais ou no meio acadêmico. Métropoles como São Paulo e Rio de Janeiro, onde se localizam a maior parte das empresas internacionais brasileiras e o grosso das multinacionais (em atividades diversas dos serviços e da indústria), requerem formações voltadas para o chamado global business, com matérias de comércio exterior, finanças internacionais etc. No sul do país, mais voltado para atividades do agribusiness e em contato direto com os parceiros do Mercosul, as especializações podem estar no comércio internacional (inclusive normas relativas ao Mercosul), em questões fitossanitárias e no domínio da língua espanhola.
Alguém dotado de conhecimento acadêmico, de uma boa disposição para o auto-aprendizado e de senso prático em algumas das áreas mencionadas tem chances de subir em qualquer profissão, à medida em que sua experiência de vida o colocar em contato com pessoas dotadas de densidade nessas áreas. Nunca se deve chegar num primeiro emprego como se não se necessitasse de treinamento ou de aperfeiçoamento técnico e profissional. Atitudes do tipo “eu sei fazer”, “eu sei tudo”, “deixa comigo”, geralmente conduzem a desastres, ou pelo menos a situações de constrangimento funcional.
A carreira diplomática é única nos seus requisitos de entrada, não apenas em termos da bagagem intelectual acumulada ao longo de anos de estudo, mas também no sentido em que o diplomata deve exibir algumas qualidades de convivência e de interação social que serão importantes no desempenho ulterior. Por isso os exames de ingresso na carreira envolvem disciplinas tradicionais, mas também entrevistas com banca examinadora que julga as aptidões do candidato para aquele tipo de profissão: a maturidade entra em linha de conta nesse contexto, o comportamento social, assim como a própria aparência pessoal.
Meu trabalho como servidor público federal, na carreira de diplomata, teve início em dezembro de 1977, por meio de um concurso direto, o que, aliado ao fato de já possuir mestrado, dispensou-me de frequentar o curso de preparação mantido pelo Instituto Rio Branco. Desde essa época (um quarto de século já), servi no exterior em diversas missões diplomáticas e no Brasil (Ministério das Relações Exteriores, em Brasília), geralmente na área econômica. Em postos, estive nas embaixadas em Berna, Belgrado e Paris, ademais das delegações do Brsil em Genebra e Montevidéu (Aladi). Mais recentemente fui chefe da Divisão de Política Financeira e de Desenvolvimento do Itamaraty, de 1996 a 1999, e desde outubro daquele ano até outubro de 2003 fui Ministro Conselheiro na Embaixada em Washington, o mais importante dos postos externos do Ministério das Relações Exteriores. Paralelamente ao exercício regular das atividades profissionais, pude manter, ainda que de maneira alternada, minha carreira acadêmica, o que me habilitou não apenas a ministrar cursos em universidades do Brasil e do exterior, como também a fazer pesquisas e manter uma produção de livros e artigos que hoje compõe a bibliografia especializada no campo das relações internacionais. Uma amostra dessa produção pode ser vista em minha página pessoal: www.pralmeida.org.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 15 de janeiro de 2004

672) A evolucao das especies diplomaticas...

(um pouco de humor, sob a forma de exercício de quantificação, na série: “Macro e microeconomia da diplomacia”).

Dando continuidade à minha série de artigos bissextos, enfeixados sob o título geral de “Macro e microeconomia da diplomacia” – e já representados por um primeiro ensaio de levantamento das principais “questões de economia diplomática” e um segundo texto relativo à questão específica da “produtividade diplomática”, ambos disponíveis neste link: www.pralmeida.org/07CousasDiplomaticas/01MacroMicroDiplom.html –, permito-me tratar agora de uma das externalidades que influenciam a carreira e o desempenho do diplomata: aquela que se ocupa de sua exata caracterização quanto ao gênero, o que nem sempre tem a ver com a sua orientação sexual. Faço-o apenas para responder a uma indagação de um colega de trabalho que, como eu, é sociólogo de formação, mas que, também como eu, costuma dar palpites em assuntos econômicos. Pois não é que ele vem repetidamente indagando, de forma aparentemente séria, sobre o “índice de boiolagem explícita” no Itamaraty, e eu nem sempre disponho dos dados empíricos para responder?
Questão grave, e importante, que ainda não foi objeto, salvo engano meu, de algum estudo de sociografia diplomática, dentre tantos outros que se ocupam de questões relevantes de política externa e das relações internacionais do Brasil. Ainda que esta série se ocupe, primordialmente, da macro e da microeconomia da diplomacia, ela não poderia ignorar uma questão que afeta, talvez com intensidade insuspeita, aqueles que se ocupam, funcionalmente, de diplomacia, isto é, os diplomatas, as diplomatas, além de todos os “outros” que, por uma ou outra razão, também exercem essa função nobre no Estado. Estes “outros” parecem constituir uma proporção razoável dos funcionários da Casa, não considerando aqui, obviamente, aqueles curiosos que estão exercendo, temporariamente, funções diplomáticas mas que não são diplomatas de carreira (como os políticos no exílio, os amigos do rei e outros apaniguados de qualquer tipo que, a despeito de tudo, toda corte sempre carrega como um fardo). Na acepção aqui retida, por “outros” podem ser classificados todos aqueles que, com a ajuda do superego freudiano, preenchem com uma pontada no coração o item “gênero” nos formulários padronizados.
Quanto são eles, exatamente?: mistério. Como se distribuem entre as classes de diplomatas?: ignoramos totalmente. Qual o coeficiente de abertura externa?: igualmente não sabido. Qual sua incidência nas diversas gerações?: outro imponderável. Foram perseguidos em outras eras, estão mais à vontade nesta nossa época de uniões livres e de abertura de armários?: certamente, mas muitos ainda se escondem atrás de uma vida dupla e de um comportamento reservoso, tão desnecessário, hoje em dia, quão nefasto ao equilíbrio mental de funcionários que, no que se sabe, são tão ou mais dedicados à carreira do que quaisquer outros, por vezes até mais.
Seria possível construir um índice confiável da presença efetiva desses detentores de um charme discreto que tende a ser confundido com o da própria diplomacia? Difícil dizer pois que, à diferença dos conhecidos índices de Laspeyres ou de Paasche, não se pode determinar com rigor a média aritmética ou a média harmônica (esta ainda mais problemática) da evolução desse “produto” – com perdão pelo uso do conceito – ao longo do tempo ou no espaço. Talvez tenhamos de nos contentar com uma aproximação que, ignorando voluntariamente os valores no atacado, se concentre sobre os mesmos no varejo. O coeficiente de variação desses “produtos” na cesta da carreira será sempre algo ambíguo e indeterminado, pois que as estatísticas não sabem como estimar o quantum de população economicamente ativa não revelada, pelo menos não de modo explícito.
O fato é que, impossibilitado de responder precisamente a tão importante questão do supracitado colega – ele chegou a aventar a hipótese de 90%, o que, francamente, eu considero algo exagerado –, decidi, se não oferecer um cálculo, ou sequer uma estimativa grosseira, pelo menos propor um método um pouco mais científico de determinação da incidência relativa dessa fauna peculiar no conjunto da classe (atenção taxonomistas: não confundir a espécie e o gênero com a família e esta com a classe, pois se trata de graus diversos de aproximação filogenética). A investigação compreende obviamente aspectos macro e outros microeconômicos, sendo estes provavelmente mais relevantes em vista da dimensão reconhecidamente privada da matéria.
Uma interpretação de tipo keynesiana a esse problema, tenderia a identificar, historicamente, as grandes tendências das curvas de oferta e procura para o fenômeno em questão, o que revelaria, claramente, um nítida inflexão para cima da curva de oferta e uma estabilização relativa da curva de demanda, com uma certa depreciação, portanto, do valor do produto ao longo do tempo. Esse comportamento pode ser explicado pela existência daquilo que os economistas do século XIX chamavam de “abstinência”, isto é, uma abstenção voluntária ao consumo deliberado desse produto, e que os economistas modernos passaram a denominar sob o conceito de poupança (não confundir, porém, com o vulgar epíteto). Em virtude, todavia, do princípio da “aceleração”, fenômeno colocado em evidência pela primeira vez pelo economista francês Aftalion em 1913, o produto foi sendo incorporado aos gostos da demanda. Atenção: não se trata ainda do “multiplicador keynesiano”, mas tão simplesmente do crescimento proporcionalmente mais forte da demanda por bens de capital – sim: existe um capital intrínseco à espécie – do que a expansão da demanda final da qual ela deriva.
O rendimento marginal do capital fixo investido em equipamentos próprios (que fazem parte do capital no nível microeconômico) redunda, em última instância, naquele tipo de demanda que Keynes, ele mesmo um representante da espécie, chamou de agregada, mas que para todos os efeitos práticos de um serviço gozando do monopólio da reprodução da espécie, tende a ser confundida com a demanda efetiva. Em qualquer hipótese, o ciclo econômico conduz a uma expansão ainda mais desproporcional da oferta do produto em questão, o que pode ter resultado, em várias épocas, naquilo que Marx chamou de “crise de superprodução”. Esse fenômeno era visível no Brasil de meados dos anos 1950 ao início dos 60.
Esse deslocamento para cima da curva da oferta no Brasil – alguns estimaram um crescimento anual da ordem de 7% no período 1956-64, que por acaso se confunde com a variação do PIB na mesma fase – foi temporariamente interrompido pela “Redentora” de 1964, que foi tudo menos liberadora para a subespécie em questão. A forte contração da demanda correspondeu a uma queda ainda mais brutal da oferta, reprimida a ponto de se temer pelo seu desaparecimento.
Como naquele tempo não tinha sido ainda negociada a convenção CITES (isto é, a das espécies ameaçadas de extinção) temeu-se pelo desaparecimento do produto do mercado. Alguns representantes da subespécie, já sem marca registrada, chegaram a ser descartados de maneira vil pelo controle de qualidade dos serviços de inspeção, o que só foi evitado graças a uma estratégia sutil de marketing, consistindo numa gestão discreta da rede de fornecedores e clientes e num serviço quase personalizado de entrega.
Tempos negros para a subespécie, esses das restrições impostas pela corporação viril, levando a uma redução forçada nos níveis de demanda e de oferta, sobretudo esta última, atingida por um recolhimento compulsório que jamais foi igualado por qualquer banco central, em qualquer outra época. O enxugamento de liquidez foi geral, só não chegando a uma balança negativa porque alguns, por interesse próprio ou por espírito humanitário, se dedicaram a manter um cash flow mínimo. Dizem até que um secretário-geral especialmente zeloso chegou a responder a um general mais afoito: “eles podem ser boiolas, mas são os meus boiolas”. E não permitiu que tocasse mais na fauna da Casa. Com isso, se logrou preservar a espécie e se manteve razoavelmente intacto o capital genético, permitindo a reconstituição do plantel uma vez asseguradas as condições de mercado e o adequado equilíbrio entre capital fixo e ativos convertíveis.
Observou-se, em seguida, uma evolução moderada desse exército especial de reserva, ciclo no qual a forte demanda reprimida foi contida por um controle igualmente severo do lado da oferta, limitada na entrada por um chefe da Divisão do Pessoal que ficou conhecido como “Deer Hunter”. O fato é que ele abatia todos os candidatos da categoria que ousavam passar impunes pelos exames da primeira fase, obrigando alguns a adotar uma estratégia de diversificação do produto, envolvendo inclusive matrimônio exogâmico (o que contraria os hábitos endogâmicos do grupo). Passada porém essa fase, com o deslocamento, para fora da abcissa, do atirador contumaz, a linha da coordenada voltou a experimentar um deslocamento para a direita e para cima.
Mas o produto bruto diplomático relativo à subespécie só voltou a conhecer níveis exponenciais de crescimento com o fim do autoritarismo político, período que também corresponde a uma forte injeção fiscal na Secretaria de Estado, com novos expoentes que não mais tiveram de se restringir aos circuitos especializados – e necessariamente discretos – nesse tipo de mão-de-obra. Beneficiando-se então de vantagens comparativas ricardianas – que tendiam a promover, nos trópicos, um produto mais sensual –, os fluxos de capital diplomático customized se expandem a uma velocidade nunca vista, chegando a ameaçar as redes já estabelecidas de serviços tradicionais e ortodoxos. Depois de uma certa confusão inicial no plano regulatório, ocorreu uma acomodação natural segundo as especializações comportamentais, o que confirmou linhas e setores específicos na divisão funcional de trabalho entre os membros das várias castas existentes.
Alguns intercâmbios continuaram a ocorrer, tanto mais importantes quanto o nível observado de demanda reprimida no ciclo anterior de negócios, mas registrou-se em geral uma segmentação de mercados, que progressivamente beneficiou as minorias mais ativas e engajadas na transformação produtiva dessa empresa verdadeiramente multinacional. Com a prática de subsídios cruzados, por parte daqueles situados estrategicamente na administração em favor de outros posicionados na ponta dos determinados serviços de consumo especializado – cerimonial ou mesmo intendência geral –, ocorreu valorização de alguns ativos e desvalorização de outros, mas sempre com uma ascensão gradativa da nova classe a funções cada vez mais bem localizados na escala de comando.
Fatores de produção anteriormente dotados de externalidades negativas – como as colunas sociais e as recepções seletivas – passaram a ser mobilizados pelas novas teorias sobre o comércio estratégico de iniciados, que logicamente se beneficiaram enquanto puderam de importantes transferências fiscais, até a prática ser regulada e fortemente restringida pela Rodada Uruguai do GATT. Mas, os serviços continuaram ser oferecidos segundo listas positivas, o que permitia isolar os simples curiosos ou os pouco dotados de talentos para essas lides alternativas de intercâmbio diplomático.
O fato é que, sem a intervenção moralista dos governos, as relações de mercado entre as novas espécies se expandiram de modo exponencial, a ponto de elas dominarem alguns serviços colocados em regime de concorrência imperfeita (e alguns diriam até mesmo desleal). Nem todos as esferas de administração foram objetos de oligopolização pela subespécie em questão, mas operando num serviço que já ostenta uma situação de monopólio “natural”, a combinação da preferência pelo similar e circuitos fechados de distribuição – onde vale não necessariamente a eficiência alocativa, mas o compadrio e o nepotismo – redundou numa curva de regressão altamente desfavorável para as demais categorias. O tratamento preferencial e mais favorável para os diplomatas do grupo em causa se fez em detrimento do antigo grupo majoritário, que não dispunha do mesmo poder de fogo concentrado e de estratégias de mercado adaptadas a seu status de maioria silenciosa.
Não se dispõe, ainda, de modelos econométricos que permitam medir com precisão, e avaliar a partir de dados empíricos verificáveis, a base instalada e a extensão da população aqui referenciada no conjunto do serviço diplomático, que agora também passou a fornecer mão-de-obra especializada, e relativamente competitiva, para outros serviços da burocracia federal. Não se sabe se um survey discretamente conduzido seria capaz de medir a extensão do fenômeno, já que persistem setores reprimidos nas duas pontas e que os novos tipos de uniões legais não estão ainda plenamente consagrados, ou sequer legalizados.
Alguns tiques comportamentais e verbais são, entretanto, facilmente detectáveis, o que permitira construir um modelo formal de análise, pronto a ser testado num survey dotado de variáveis conhecidas e identificadas ao longo do tempo. Pesquisas de campo conduzidas com técnicas ainda rudimentares de medição permitiram, em todo caso, quantificar o exército especial já referido – que não é mais “de reserva”, nota bene – em pelo menos 50% da população economicamente ativa do serviço exterior, tomado em seu conjunto (isto é, os da ativa e os desativados). Talvez uma enquête provista de todos os requisitos científicos da sociografia contemporânea resultasse numa elevação desse percentual a pelo menos um quarto mais da amostra total. Como se vê, ainda não se chegou ao total estimado, com forte dose de arbitrariedade, por aquele colega de trabalho visivelmente mal intencionado. Em todo caso, o assunto permanece em aberto até que estudos mais abalizados venham revelar todo o potencial de mercado suscetível de ser encontrado em novas fórmulas de um velho produto.

Paulo Roberto de Almeida
(pralmeida@mac.com; www.pralmeida.org)
Brasília, 1230: 21 de março de 2004

671) Profissão Internacionalista

Entrevista concedida a jornalista da Facamp (Campinas, SP), em abril de 2005, para inserção no site da Faculdade, seção vinculada ao curso de relações internacionais, voltada para orientação profissional dos alunos candidatos ao curso.

A negociação como rotina de trabalho
A carreira diplomática exige um conhecimento amplo, e não apenas teórico, das Relações Internacionais

Os diplomatas são responsáveis por formular técnicamente, representar e defender as posições do Brasil no plano das relações internacionais. Têm como rotina negociar acordos comerciais, de meio ambiente ou relacionados aos direitos humanos, entre outros, e identificar o interesse nacional no problema, levando em conta desde a relação do Itamaraty com outros ministérios até as negociações políticas no âmbito da ONU ou da OMC, por exemplo.
Também têm a tarefa de promover diálogo entre os agentes dos mercados e os governos, bem como antecipar e avaliar o impacto para o país de problemas internacionais, entre outros. O interesse nacional depende do governo e sua definição pode caber, setorialmente, à área econômica, à saúde ou ao trabalho.
A carreira diplomática exige um conhecimento amplo, e não apenas teórico, das relações internacionais. O papel dos subsídios numa economia, por exemplo, não se explica pelas teorias de Ricardo, mas pelo lobby agrícola. Portanto, é preciso conhecer, na prática, a instituição do subsidio, seu funcionamento.
Os especialistas em relações internacionais e os diplomatas têm que ter habilidade para negociar. Não basta ser um intelectual brilhante, é preciso saber conversar com aliados e adversários.
As oportunidades de trabalho no governo são restritas. O Itamaraty seleciona cerca de 30 diplomatas por ano. Eles ingressam como terceiro secretário e percorrem um longo caminho até chegar a ministro de 1ª classe.
No concurso de 2005, fizeram as provas iniciais mais de 6 mil candidatos. Alguns órgãos de governo já contam com assessores internacionais como o MDIC ou o Banco Central. Na área de ensino, a maior parte das vagas está nas faculdades privadas. As empresas são as que mais contratam; porém, são mais seletivas. O mercado exige formação consistente e bom conhecimento de inglês; francês e espanhol são dois acréscimos úteis.

Paulo Roberto de Almeida
(pralmeida@mac.com; www.pralmeida.org)

670) Postura Diplomatica

Comentários de Paulo Roberto de Almeida a questão colocada por um médico de BH (MG)


Questão: Qual a situação mais difícil que você já passou na diplomacia e como lidou com ela? No momento de suas reflexões, quais recursos mentais (memória, discernimento, agressividade, paciência, estudo, etc.) você precisou utilizar?

Resposta PRA:
Em diplomacia, existem vários momentos delicados quando se está negociando em nome do País. Uma situação complicada pode se apresentar numa destas duas hipóteses: ou não se dispõe de instruções suficientes para sustentar os interesses nacionais, ou as instruções dadas são inadequadas, na situção concreta da barganha negociadora. Nesse caso, o diplomata precisa agir segundo a sua melhor percepção de quais seriam os interesses nacionais, com base num estudo acurado da situção concreta e dos interesses em jogo.
Normalmente, o negociador que está na “frente de combate”, em oposição ao “burocrata” da capital, pode acabar tendo uma visão ampla dos processos em jogo e dos diferentes aspectos do interesse nacional, segundo uma percepção de mais longo prazo. Sua visão daquele problema – eventualmente fundamentada num estudo detido da questão e colocada em perspectiva comparada com as experiências e posições de outros atores – pode eventualmente se contrapor às instruções recebidas da capital, que podem estar baseadas numa visão meramente teórica ou burocrática do processo em causa.
Nesse momento, o diplomata em causa pode ficar numa situação muito difícil, pois que dominando o tema, e conhecendo o jogo de interesses dos diversos atores participantes (países ou grupos de paises), ele pode ter um melhor julgamento de qual seria a direção mais indicada a ser seguida, do ponto de vista do interesse nacional. Mas, aqui se coloca o dilema: as instruções recebidas vão num sentido contrário ou bastante diferente daquilo que o diplomata encarregado do tema na frente negociadora percebe como sendo a melhor postura a ser adotada. Ele quer acreditar ou sabe concretamente que uma posição diferente seria melhor indicada para defender o interesse nacional (este é um conceito e uma situação sempre difusos e muito difíceis de serem definidos na prática). Em todo caso, existe aqui um problema real de consciência e de postura, já que o diplomata não poderia, teórica e praticamente, opor-se às instruções recebidas da capital, mas sabe, concretamente, que nem sempre a burocracia institucional funciona da melhor forma possivel, pois que ninguém é onisciente.
Pessoalmente, já passei por esse tipo de situação, envolvendo uma negociação internacional de um tratado sobre circuitos integrados no âmbito da OMPI. Tendo me ocupado do tema durante meses e meses, eu literalmente dominava o assunto, técnica e diplomaticamente, e as instruções formuladas em Brasília, de nítido corte tradicional, eram claramente inadequadas. Os argumentos que podem ser mobilizados em favor de suas teses, por mais racionais ou “probatórios” que sejam (com base numa análise histórica, nos dados da economia, numa visão de longo prazo), nem sempre são convincentes ou suficientes para “dobrar” o burocrata na outra ponta do processo ou até fazer com que a instituição como um todo se mova em outra direção. Esse tipo de situação pode ser terrível, pois aparentemente (ou concretamente) o diplomata em causa pode estar se colocando contra as instruções da sua instituição.
Eu não tive medo de fazê-lo, naquele momento preciso, assim como em outras circunstâncias posteriores. De certa forma, esse tipo de atitude me prejudicou, pois fiquei com fama de rebelde, de dissidente, de arrogante, de pretencioso “sabe-tudo” e outros qualificativos mais, que nem são do meu conhecimento. Se insisto em certas teses é, contudo, com base num estudo profundo das problemáticas das quais me é dado ocupar. Sou um por excelência um estudioso compulsivo, e não costumo me dobrar a nenhum argumento de autoridade, e sim à autoridade do argumento. Numa casa “feudal” como é o Itamaraty, isso é quase um crime de lesa-majestade.
De certa forma, ainda pago até hoje minha “ousadia”.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 8 de novembro de 2005

quinta-feira, 28 de dezembro de 2006

669) Carreira Diplomatica: dicas

Carreira Diplomática
Dicas e argumentos sobre uma profissão desafiadora

Paulo Roberto de Almeida
(pralmeida@mac.com; www.pralmeida.org)

Apresentação de minha seção sobre a carreira diplomática no site pessoal:
Link: http://www.pralmeida.org/04Temas/04AcademiaDiplom/02DiplomaciaGeral.html

Diplomacia
Instrumentos, preparação à carreira, subsídios para estudos


(Texto elaborado em 2005)

A carreira diplomática tem atraído número crescente de jovens, em decorrência da maior inserção internacional do Brasil e dos avanços da globalização e da regionalização. Os candidatos têm em geral procurado os cursos de graduação em relações internacionais. Muitos já ostentam inclusive mestrado ou doutoramento. Em todo caso, o concurso à carreira diplomática possui especificidades que fazem dele um processo altamente seletivo e bastante rigoroso, ainda que aberto unicamente aos talentos e méritos individuais.
Os candidatos devem, em primeiro lugar, verificar na página do Instituto Rio Branco, no site do Ministério das Relações Exteriores, as últimas informações sobre o concurso, programa de estudos, bibliografia, etc.A Funag anunciou, em março de 2006, estar colocando à disposição do público em geral toda a sua coleção de livros que se referem aos trabalhos do Instituto Rio Branco já publicados, bem como todos os volumes resultantes dos seminários do IPRI, nos últimos anos. Veja a relação completa e o endereço do site neste link do meu blog, onde apresento o material: http://diplomaticas.blogspot.com/2006/03/272-livros-sobre-diplomacia.html#links.
Consoante o papel didático exercido por esta página, pretendo colocar a partir deste espaço uma série de textos que poderão guiar, ajudar, esclarecer, consolar ou, quem sabe até, divertir os candidatos à carreira diplomática. Começo por oferecer uma bibliografia resumida, que nada mais é senão o conjunto das leituras recomendadas no programa oficial do Instituto Rio Branco, mas reduzidas ao que eu considero, pessoalmente, como sendo o essencial, isto é, uma lista de primeiras leituras, para que cada candidato dê início a seu próprio programa de estudos. Veja aqui a bibliografia: http://www.pralmeida.org/05DocsPRA/1481BiblioResumIRBr2005.doc.
Procurarei estabelecer uma forma de organização racional e uma estrutura clara para os vários textos aqui disponíveis, mas nem sempre isso será possível. A página também será alimentada gradualmente, à medida em que faça a seleção dos textos pertinentes e sua transposição para esta base. Sou colaborador regular da revista Espaço Acadêmico; veer meus meus artigos no link: http://www.espacoacademico.com.br/arquivo/almeida.htm.
Como atendo a muitas demandas colocadas sobre a carreira diplomática e a própria preparação para o concurso que habilita a ingressar na carreira – seja sob a forma de cursos de graduação de relações internacionais, seja sob o formato de cursinhos preparatórios – tenho uma série de outros textos que procuram responder a essas questões repetidamente a mim feitas. Algumas reflexões que tenho feito, seja individualmente, seja a convite de responsáveis por esses cursos de relações internacionais, ou pelos próprios alunos, foi inserida nesta seção deste site: Internacionalistas: uma carreira, uma profissão? (em curso de atualização).
Um exemplo pode ser visto neste meu texto: “O que faz um diplomata, exatamente?”, que responde a indagações efetuadas sobre a natureza do trabalho diplomático, contendo uma remissão a meu trabalho sobre as “dez regras modernas de diplomacia”; está em meu blog nr. 153, link: http://paulomre.blogspot.com/2006/01/153-o-que-faz-um-diplomata-exatamente.html.
Por outro lado, você também deve ter pensado em tudo o que você sempre quis saber sobre a carreira diplomática...
...e nunca teve a quem perguntar... Pois, agora já tem! Ao meu colega Renato Godinho, que preparou um excelente "FAQ", ou questões mais perguntadas, sobre a carreira, o concurso do Instituto Rio Branco e outros aspectos curiosos (como salário, por exemplo, que falta completar, para traduzir toda a nossa miséria salarial no Brasil). Eu coloquei um link para o seu excelente "questions and answers" como post 266 de meu Blog "Cousas Diplomáticas", mas você pode ir direto à fonte, neste link: http://web.mac.com/rgodinho/iWeb/Renato/FAQItamaraty.html#C.
Esta página ainda está em construção e se algum texto não estiver disponível, atenderei as solicitações individualmente, sempre com a menção ao número sequencial de cada trabalho. Aos poucos, a seção vai ser ampliada.


Compilação de textos do autor sobre o tema:
(em ordem cronológica inversa)

(Compilação efetuada em dezembro de 2006)

1701. “Um autodidata na carreira diplomática”, Brasília, 26 dezembro 2006, 4 p. Respostas a questões colocadas por jovem candidato à carreira diplomática. Colocada no blog Diplomatizzando; Link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2006/12/667-um-autodidata-na-carreira.html#links.

1668. “Dez obras fundamentais para um diplomata”, Brasília , 29 setembro 2006, 2 p. Lista elaborada a pedido de aluno interessado na carreira diplomática: obras de Heródoto, Maquiavel, Tocqueville, Pierre Renouvin, Henry Kissinger, Manuel de Oliveria lima, Pandiá Calógeras, Delgado de Carvalho, Marcelo de Paiva Abreu e Paulo Roberto de Almeida, para uma boa cultura clássica e instrumental, no plano do conhecimento geral e especializado. Colocada no blog Diplomatizzando (link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2006/09/625-dez-obras-fundamentais-para-um.html). Revisto e ampliado, com explicações e links para cada uma das obras, em 14 de outubro de 2006 (6 p.) e publicado em Via Política em 15/10/2006 (link: http://www.viapolitica.com.br/diplomatizando_view.php?id_diplomatizando=13).

1607. “O Internacionalista e as Oportunidades de Trabalho: desafios”, Brasília, 22 maio 2006, 4 p. Transcrição de apresentação em PowerPoint para o Forum de Relações internacionais do curso de RI da USP (FEA, 29 maio 2006, 17h30). Disponível no site (link: http://www.pralmeida.org/05DocsPRA/1607semanariusp.ppt).

1604. “O estudo de relações internacionais no Brasil: respostas a um questionário”, Brasília, 19 maio 2006, 2 p. Respostas a questões colocadas por Barbara Teresa Coutinho de Almeida Sá (aluna de RI da UNIFAI-SP). Postado no blog sob nº 431 (link: http://diplomatizando.blogspot.com/2006/05/431-cursos-de-ri-no-brasil-algumas.html#links).

1591. “O Ser Diplomata: Reflexões anárquicas sobre uma indefinível condição profissional”, Brasília, 2 maio 2006, 3 p. Reflexões sobre a profissionalizção em relações internacionais, na vertente diplomacia. Palestra organizada pela Pacta Consultoria em Relações internacionais, em cooperação com o Instituto Camões, realizada na Embaixada de Portugal, em 4/05/2006. Disponível no site pessoal (link: http://www.pralmeida.org/05DocsPRA/1591serdiplomata.doc).

1563. “As relações internacionais como oportunidade profissional”, Brasília, 23 março 2006, 9 p. Respostas a algumas das questões mais colocadas pelos jovens que se voltam para as carreiras de relações internacionais. Contribuição a matéria da FSP, suplemento Folhateen, matéria “Os internacionalistas”, por Leandro Fortino (Folha de São Paulo, 27 março 2006, p. 6-8; divulgado no blog Diplomaticas, link: http://diplomaticas.blogspot.com/2006/03/303-os-novos-internacionalistas.html#links); divulgado em sua integralidade no boletim de relações internacionais Relnet e, em cinco partes, no blog Cousas Diplomáticas, do post 282 ao 286 (link inicial: http://diplomaticas.blogspot.com/2006/03/282-as-relaes-internacionais-como.html#links). Publicado no boletim Meridiano 47 - Boletim de Análise da Conjuntura em Relações Internacionais (Brasília: Instituto Brasileiro de Relações Internacionais, ISSN 1518-1219, nº 67, fevereiro 2006, p. 5-10); site (link: http://www.pralmeida.org/05DocsPRA/1563respostasjovens.doc).

1529. “O que faz um diplomata, exatamente?”, Brasília, 11 janeiro 2006, 4 p. Resposta a indagações efetuadas sobre a natureza do trabalho diplomático, como remissão a meu trabalho sobre as “dez regras modernas de diplomacia”; Blog nr. 153, link: http://paulomre.blogspot.com/2006/01/153-o-que-faz-um-diplomata-exatamente.html

1558. “Ser um bom internacionalista, nas condições atuais do Brasil, significa, antes de mais nada, ser um bom intérprete dos problemas do nosso próprio País”, Brasília, 8 março 2006, 6 p. Alocução de paraninfo na turma de formandos do 2º Semestre de 2005 do curso de Relações internacionais do Uniceub, Brasília (16 de março de 2006, 20hs, Memorial Juscelino Kubitschehk). Colocado à disposição no site pessoal (link: http://www.pralmeida.org/05DocsPRA/1558uniceub16mar2006.doc).

1507. “Por que leio tanto? e Meus ‘métodos’ de leitura...”, Brasília, 18 dezembro 2005, 3 p. Dois textos seqüenciais sobre leituras e métodos, para postagem no meu blog (http://paulomre.blogspot.com). Apresentação ao novo Blog “Textos PRA” (1 p.).

1492. “Postura diplomática”, Brasília, 8 e 12 novembro 2005, 2 p. Comentários a questão colocada pelo médico cardiologista de BH Eduardo Martins, a propósito de situações difíceis enfrentadas no trabalho diplomático.

1491. “O profissional de relações internacionais: visão de um diplomata”, Brasília, 10 novembro 2005, 10 slides. Apresentação em PowerPoint para apoiar palestra feita na Semana Acadêmica da UFRGS-2005 dos programas de graduação e de mestrado em Relações Internacionais da UFRGS (Auditório da Faculdade de Ciências Econômicas, Porto Alegre, 11/11/2005, 20h30; disponível neste link: http://www.pralmeida.org/05DocsPRA/1491UFRGS11Nov05.ppt; vídeo disponível neste link: http://www6.ufrgs.br/intrel/Videos/Paulo Roberto/pr_video_2.htm).

1481. “Recomendações Bibliográficas para o concurso do Itamaraty”, Brasília, 13 outubro 2005, 6 p. Indicações resumidas a partir do Guia de Estudos do Concurso de Admissão à Carreira Diplomática, versão 2005, para atender às demandas de candidatos à carreira diplomática. Circulada em listas de estudos internacionais.

1421. “Profissão Internacionalista”, Brasília, 19 abril 2005, 4 p. Entrevista concedida à jornalista Claudia Izique, da Facamp (Unicamp) para publicação especializada em orientação profissional. Postada de forma resumida no site da Facamp (www.facamp.br).

1416. “As relações internacionais do Brasil no atual contexto internacional e a formação dos novos internacionalistas”, Brasília, 5 abril 2005, 1 p. Roteiro de palestra no curso de Relações Internacionais da Universidade do Sul de Santa Catarina – Tubarão, SC., dia 7 de Abril de 2005, 20hs, quinta-feira.

1403. “Conselhos de um contrarianista a jovens internacionalistas”, Brasília, 5 março 2005, 6 p. Alocução de patrono na XI turma (2º semestre de 2004) de Relações internacionais da Universidade Católica de Brasília (10 de março de 2005, 20hs, Auditório S. João Batista de La Salle). Mensagem de formatura incluída no site (http://www.pralmeida.org/05DocsPRA/1403Contrarianista.html).

1377. “História Mundial Contemporânea”, Brasília, 23 janeiro 2005, 6 p. Nota de revisão e comentários ao programa de preparação ao consurso à carreira diplomática, encaminhada ao Diretor do IRBr, Emb. Fernando Guimarães Reis.

1374. “Concurso de Admissão à Carreira Diplomática: Comentários ao Guia de Estudos”, Brasília, 20 janeiro 2005, 8 p. Comentários ao programa do concurso do IRBr, para atender solicitação do Diretor do IRBr, Emb. Fernando Guimarães Reis.

1230. “A evolução das espécies diplomáticas: exercício de quantificação (da série Macro e microeconomia da diplomacia)”, Brasília, 21 março 2004, 6 pp. Continuidade do exercício anterior (trabalhos nºs 1061 e 839, sobre questões gerais e de produtividade diplomática), enfocando o problema dos gêneros do diplomata. Para o livro Cousas Diplomáticas.

1180. “A formação e a carreira do diplomata: uma preparação de longo curso e uma vida nômade”, Brasília, 14 janeiro 2004, 3 pp. Reelaboração ampliada do trabalho 1151 para o jornal acadêmico da Faculdade de Direito da PUC-Campinas, por solicitação do aluno Marcio Vitorelli.

1155. “A formação do diplomata: uma preparação de longo curso”, Brasília, 13 dezembro 2003, 3 pp. Texto preparado para o Guia para a Formação de Profissionais do Comércio Exterior, das Edições Aduaneiras. Encaminhada igualmente para jornal do Diretório Acadêmico da Faculdade de Direito da PUC-Campinas, aos cuidados de Marcio Vitorelli. Publicado no site Feranet 21, item “Diplomacia”, Link: http://www.feranet21.com.br/profissoes/onde_tem_curso/perfil/perfil_diplomacia.htm.

1079. “Relações Internacionais: profissionalização e atividades”, Washington, 15 julho 2003, 6 pp. Respostas a questões colocadas por: Guilherme Freitas Araújo (Timóteo, MG) e Fernanda da Silva Gomes, para subsidiar Mostra Profissional sobre relações internacionais.

1061. “Macro e microeconomia aplicadas à diplomacia: a questão da produtividade diplomática”, Washington, 15 junho 2003, 3 pp. Continuidade do exercício anterior (trabalho nº 839), de fazer uma economia política da carreira diplomática, em tom semi-jocoso, enfocando questões de desempenho funcional e de comportamento pessoal do diplomata. Para o livro Cousas Diplomáticas.

1051. “Primeiro Emprego: depoimento pessoal e reflexões”, Washington: 22 maio 2003, 4 pp. Respostas a perguntas sobre formação e profissionalização, colocadas pela Editora Abril, para elaboração do Guia do Primeiro Emprego, enviadas à jornalista Maria Cláudia Zucare.

1016. “Um bem-vindo crescimento na oferta de relações internacionais”, Washington, 16 março 2003, 3 pp. Apresentação ao livro Política Internacional, Política Externa e Relações Internacionais (Curitiba: Editora Juruá, 2003; ISBN: 85-362-0486-9; pp. 9-11), Organizador: Leonardo Arquimimo de Carvalho. Relação de publicados n° 398.

915. “Profissionalização em relações internacionais: exigências e possibilidades”, Washington, 26 junho 2002, 6 p. Trecho retirado das “Leituras complementares”, do capítulo 11: “A diplomacia econômica brasileira no século XX: grandes linhas evolutivas” do livro Os primeiros anos do século XXI: o Brasil e as relações internacionais contemporâneas (pp. 244-248). Para divulgação no website do Centro de Serviços de Carreiras do Curso de Relações internacionais da PUC-Minas; link: http://www.sociologia.pucminas.br/relint/servicos/carreiras.php.

885. “As relações internacionais do Brasil e a profissionalização da carreira”, Washington, 29 março 2002, 17 pp. Palestra proferida no UniCeub, em 2 de abril de 2002, e na Universidade Católica de Brasília, em 3 de abril, elaborada com base em partes do meu livro: Os primeiros anos do século XXI.

839. “Macro e microeconomia da diplomacia”, Washington 14 dezembro 2001, 3 pp.; série “Cousas Diplomáticas, nº 4. Artigo introdutório, semi-cômico, de “interpretação econômica” da política externa, cobrindo questões diversas da carreira e das atividades diplomáticas, vistas sob a ótica da economia política (continuidade no trabalho nº 1061). Publicado em Espaço Acadêmico (Maringá: UEM, Ano I, nº 8, janeiro de 2002; http://www.espacoacademico.com.br/008/08almeida.htm). Relação de de Publicados nº 299.

802. “Novas Regras da Moderna Diplomacia: memorandum dialecticus per usum moderatus”, Washington, 25 agosto 2001, 1 p. Projeto de livro constante de inéditos, textos existentes adaptados e novos escritos especialmente preparados.

800. “Dez Regras Modernas de Diplomacia”, Chicago, 22 julho; São Paulo-Miami-Washington 12 agosto 2001, 6 p; série “Cousas Diplomáticas” (nº 1). Ensaio breve sobre novas regras da diplomacia, com inspiração dada a partir do livro de Frederico Francisco de la Figanière: Quatro regras de diplomacia (Lisboa: Livraria Ferreira, 1881, 239 p.). Para desenvolvimento posterior em formato de longo ensaio. Publicado na revista eletrônica Espaço Acadêmico (Maringá: UEM, Ano I, nº 4, Setembro de 2001 - ISSN: 1519.6186, http://www.espacoacademico.com.br/04almeida.htm; Seção “Cousas Diplomáticas”).

704. “Nosso homem no Itamaraty”, Brasília, 18 agosto 1999, 2 pp. Elementos de informação sobre os “intelectuais” do Itamaraty, como subsídio a matéria de Paulo Moreira Leite, então na revista Veja. Não aproveitado no momento, em virtude da transferência de PML para Washington, para trabalhar no jornal Gazeta Mercantil.

702. “Profissionalização em relações internacionais: exigências e possibilidades”, Brasília, 16 agosto 1999, 5 pp. Reelaboração do trabalho 691, em forma de palestra, para inauguração dos cursos de relações internacionais da PUC-MG (em 25.08.99) e do CEUB-DF (em 26.08.99). Feito lançamento de livros na ocasião.

691. “Profissionalização em relações internacionais: uma discussão inicial”, Brasília, 12 junho 1999, 5 pp. Texto sobre formação e perspectivas profissionais do formando em relações internacionais. Publicado no periódico do curso de relações internacionais da PUC-SP, Observatório de Relações internacionais (São Paulo: PUC-SP, nº 1, outubro/dezembro 1999, pp. 10-13). Revisto e integrado como “leitura complementar” ao livro Os primeiros anos do século XXI: o Brasil e as relações internacionais contemporâneas (SP: Paz e Terra, 2001).

Brasília, 27 dezembro 2006

668) U.S. 2007 Summer Institutes

From: "Galante, Vera V"
Date: 27 de dezembro de 2006 11h35min0s GMT-02:00
To: undisclosed-recipients
Subject: 2007 Summer Institutes

PLEASE DISTRIBUTE WIDELY
Dear all,
The Public Affairs Section of the U.S. Embassy in Brazil is pleased to announce another round of Study of the United States Summer Institutes. Please note that the deadline for application is February 9, 2007. For additional information, please contact:
Vera Galante
Cultural Affairs Specialist
Public Affairs Section – U.S. Embassy, Brazil
e-mail: GalanteVV@state.gov.
Tel: (61) 3312-7362
Fax: (61) 3321-2833

General Program Description
This message solicits candidate applications for six Summer Study of the United States Institutes for multinational groups of university faculty and other related scholars. Deadline for candidate applications to be received by the US Embassy in Brasília is February 9, 2007. A description of each individual institute can be below. Participants must be fluent in English.
Study of the United States Institutes are intensive post-graduate level academic programs with integrated study tours whose purpose is to provide foreign university faculty and other scholars the opportunity to deepen their understanding of American society, culture and institutions. The ultimate goal is to strengthen curricula and to improve the quality of teaching about the United States in academic institutions abroad.
The institutes will take place at various colleges and universities throughout the United States over the course of six weeks beginning in June 2007.

The Programs:
The Institute on American Civilization will provide a group of 18 people with a deeper understanding of U.S. society, culture, values and institutions. The program examines some of the critical historical epochs, movements, issues and conflicts that have influenced the development of the U.S. nation and its people and includes a strong contemporary component, particularly current political, social, and economic issues and debates. The complexity and heterogeneous nature of American society is highlighted as well as the institutions and values that have enabled the nation to accommodate that diversity.
Host Institution: to be determined

2. The Institute on American Politics and Political Thought will provide a group of 18 people with a deeper understanding of U.S. political institutions and major currents in American political thought. The institute provides an overview of the origins, development and current functioning of the American presidency, Congress and the federal judiciary. The institute also surveys important currents in the history of American political thought, including the Founding period, liberalism, republicanism, libertarianism, communitarianism, conservatism, neo-conservatism, etc.
Host Institution: University of Massachusetts, Amherst

3. The Institute on Contemporary American Literature will provide a group of 18 people a deeper understanding of recent American literature and criticism. Its purpose is twofold: first, to explore contemporary American writers and writing in a variety of genres; second, to suggest how the themes explored in those works reflect larger currents within contemporary American society and culture. The program explores the diversity of the American literary landscape, examining how major contemporary writers, schools and movements reflect the traditions of the American literary canon and, at the same time, represent a departure from that tradition, establishing new directions for American literature.
Host Institution: University of Louisville, Kentucky.

4. The Institute on Foreign Policy will provide a group of 18 people a deeper understanding of the domestic institutional foundations - political, social, economic and cultural - of U.S. foreign policy with particular attention to the post-Cold War era. Principal themes, critical policy debates, and contemporary issues in U.S. foreign policy will be examined in light of the history of U.S. international relations since World War II and in the larger framework of U.S. diplomatic history as a whole. The program will illuminate the relationships between U.S. policies and the political, social and economic forces in the United States that constitute the domestic institutional context in which such policies are formulated, debated, and executed.
Host Institution: University of South Carolina.

5. The Institute on Journalism and Media will provide a group of 18 journalism instructors and other related specialists with a deeper understanding of journalism's and the media's roles in U.S. society. It will examine major topics in journalism, including the concept of a "free press," First Amendment rights, and the media's relationship to the public interest. The legal and ethical questions posed by journalism will be incorporated into every aspect of the institute. The institute will cover strategies for teaching students of journalism the basics of the tradecraft: researching, reporting, writing, and editing. The program will also highlight technology's impact on journalism, addressing the influence of the Internet, the globalization of the news media, the growth of satellite television and radio networks, and other advances in media that are transforming the profession.
Host Institution: To be determined.

6. The Institute on Religious Pluralism will provide a group of 18 people with a more comprehensive understanding of U.S. society and culture, past and present, through an examination of religious pluralism in the United States. The program explores both the historical and contemporary relationship between church and state in the United States, exposes participants to the diversity of religious practices in the United States, and to tolerance of this diversity. Moreover, it examines the many ways that these different religious practices have influenced - and have been influenced by - the development of American democracy.
Host Institution: University of California, Santa Barbara.

Other Essential Program Information:
Program Funding: Through a grant to the host institutions, the US Department of State will cover all participant costs, including: program administration, domestic travel and ground transportation, book, cultural, mailing and incidental allowances, housing and subsistence.

B. Housing and Meal Arrangements: Typically, participants will have a private room with a shared bathroom during the residency portion (four weeks) of the institute, and will have to share a hotel room during the study tour (up to two weeks). Housing will typically be in college or university owned housing. Most meals will be provided at campus facilities, though participants may have access to a kitchen to cook some meals on their own. Full details will be provided once the grants have been approved. It is important that these arrangements be made clear to applicants and that they are comfortable with such housing arrangements, particularly sharing a hotel room with another participant for up to two weeks.

C. Health Insurance: All participants will receive the Department of State's coverage of $50,000 with a $25 deductible for the duration of the program. Pre-existing conditions are not covered.

D. Program Requirements and Restrictions: Participants are expected to participate fully in the program. They are expected to attend all lectures and organized activities, and complete assigned readings. Family members and/or friends cannot accompany participants on any part of the program. Please note that teaching methodology and pedagogical methods will not be addressed formally in the institute. Candidates should be aware that the institute is very intensive and that there will be little time for personal pursuits unrelated to the program. The institute should not be viewed as a research program. It is important that these requirements and restrictions be clear to all candidates before applications are submitted.

Candidate Description and Qualifications:
Candidates should be mid-career, highly-motivated and experienced professionals from institutions of higher education. While the educational level of participants will likely vary, most should have graduate degrees and have substantial knowledge of the thematic area of the Institute.

B. The ideal candidate will also be an experienced professional with little or no prior experience in the United States, whose home institution is seeking to introduce aspects of U.S. studies into its curricula, to develop new courses in the subject of the institute, to enhance and update existing courses on the United States, or to offer specialized seminars/workshops for professionals in U.S. studies areas related to the program theme. In this respect, while the applicant’s scholarly and professional credentials are an important consideration, an equally important factor is how participation in the institute will enhance course offerings in U.S. studies at the applicant’s home institution.

C. Candidates should be willing and able to fully take part in an intensive post-graduate level academic program and study tour. While senior faculty members are eligible applicants, the US Department of State will give first consideration to professionals who are likely to be comfortable with campus life and an active program schedule.

Other Factors for Consideration:
As a general rule, the US Department of State will not select more than one participant per country, per institute. Please be advised that the Study of the United States Institutes are highly competitive.

The following factors will be used in selecting: participants from among the nominations.
The clarity with which applicants address each of these factors strongly affects a candidate's chance of selection.

Justification: The justification statement is a critical portion of the application, as it offers the opportunity to provide specific reasons why the participation is particularly desirable in terms of enhancing the study of the United States at the home institution, or more broadly, in the home country. In the post/commission view, for example, would the nomination serve to strengthen an already established faculty, or is it intended to give a boost to a fledgling program? Is the applicant a leader within his or her field who is in a unique position to have a significant and immediate impact on curricular development, or is the applicant a younger professional with exceptional promise whose participation is likely to result in a substantial benefit to their home institution in the long run? Applicants are strongly encouraged to describe the role that their home institution plays. The justification statement need not be especially lengthy, but it should address these and other relevant issues noted in below.

Personal Statement: In order to get a better sense of potential participants' motivations and goals, the Department of State requests that each applicant provide a short personal statement (one page) indicating why he or she is interested in participating in the program and what he or she expects to get out of the experience.

English Language Ability: It is imperative that all candidates demonstrate English language fluency. Institutes are rigorous and demanding programs; participants will be expected to handle substantial reading assignments in English and to be full and active participants in all seminar and panel discussions. English fluency is vital to a successful experience in the Institute, both for your participant and participants from other countries.

Priority Consideration: Priority will be given to candidates who have firm plans to enhance, update or develop courses and/or educational materials with a U.S. studies focus or component, who have limited experience in the United States, and who have special interest in the program subject areas as demonstrated through past scholarship, accomplishments, and professional duties. In addition, the US Department of State makes every effort to have both a geographic and gender balance in the makeup of the participants in the Institute.

APPLICATION FORMAT:
Please submit applications by email by Friday, February 9, 2007 to galantevv@state.gov.

Applications must follow the format below. It is essential that items A-F are included and completely accurate.
A. Applicant’s full name, exactly as it appears on his/her passport. Clearly identify first, middle and surnames as they appear on passport.
B. Date of Birth (please spell out Month, Day, Year)
C. City of Birth
D. Country of Birth
E. Country of Residence
F. Country(ies) of Citizenship
G. Home Address, Telephone and E-mail
H. Gender
I. Medical, Physical, Dietary or other Personal Considerations: Please state any existing medical conditions or if you are currently taking any prescription medication. This will not affect selection, but will enable the host institution to make any necessary accommodations.
J. Current Position and Title
K. Current Institutional Affiliation and complete address
L. Work Experience, including previous positions and titles
M. Education, Academic and Professional Training, including degree earned and fields of specialization
N. Active Professional Memberships
O. Publications (please do not list any more than 10)
P. Previous Experience in the United States: Please list any and all trips to the United States and include approximate dates and the reason for travel.
Q. Family Residing in the United States: Please list any immediate family members who are currently residing in the United States, including city and state.
R. Evidence of English Fluency (e.g. personal interview, test score, etc.)
S. Statement justifying participation of nominee in the Institute: (please see above) (1) Current or projected extent of the U.S. Studies content of the course(s) and materials being taught or developed by the candidate; (2) Likely relevance of the program to the professional responsibilities of the candidate; (3) The potential impact of the candidate's participation on a greater understanding of American society and/or culture at his/her come institution (in terms of enhanced teaching and curricula, etc.);
T. Personal Statement (no more than one page) (see above)

Vera Galante
Assessora Cultural - Cultural Affairs Specialist
Seção de Imprensa, Educação e Cultura - Public Affairs Section
Embaixada dos Estados Unidos
Tel. (61) 3312-7362
Fax: (61) 3321-2833
E-mail GalanteVV@State.Gov

terça-feira, 26 de dezembro de 2006

667) Um autodidata na carreira diplomática

Respostas a questões colocadas por jovem candidato à carreira diplomática.

Frequentemente sou indagado por jovens candidatos à carreira diplomática sobre métodos de estudo, sobre indicações de leitura, sobre questões tópicas que têm a ver com deficiências localizadas de um ou outro aspirante e, de modo mais geral, sobre dicas para o sucesso nos exames de entrada. Em alguns casos, as questões se voltam para aspectos pessoais do meu ingresso nessa carreira, como é o caso das questões transcritas abaixo.
Como considero que minhas respostas podem vir a interessar mais de um desses jovens pretendentes à carreira diplomática – e para evitar duplicações ou repetições em respostas de caráter individual – sou levado a elaborar algumas respostas mais estruturadas e disponibilizá-las, de modo mais amplo, em um dos meus veículos de comunicação (site pessoal, ou um dos blogs que mantenho, com propósitos diversos). Será também o caso agora, como evidenciado a seguir.

1) Qual foi o motivo pelo qual o senhor ingressou no mundo da diplomacia e como foi sua trajetória até chegar lá, cursando a faculdade de ciências sociais?
Considero que apenas pessoas muito motivadas ingressam atualmente na diplomacia. No passado poderia haver, eventualmente, um ou outro caso de puro diletantismo, de busca de algum “dolce-far-niente” nas melhores capitais européias, de desejo de ocupar-se de literatura ou artes, ou simplesmente de viver “le grand monde” sem preocupações outras que não algum expediente rápido em dias alternados, com muitas recepções e “punhos de renda” a ocupar o seu tempo. Tudo isso, obviamente, é folclore, mas não é fácil desmantelar estereótipos. A realidade mais prosaica é feita de muito trabalho e de uma participação intensa e foros negociadores nos mais diversos formatos (bilateral, regional, multilateral), com uma enorme diversidade de temas a serem tratados, sucessiva ou simultaneamente.
Como a maior parte dos meus colegas, ingressei na diplomacia com uma forte motivação para conhcer, discutir e tratar de questões internacionais em conexão com os interesses nacionais do Brasil, ou seja, participando, de alguma forma, de processos decisórios que influenciam, de um modo ou de outro, os rumos não apenas externos, mas também internos que afetam o processo de desenvolvimento econômico e social do Brasil. Com poucas exceções – geralmente ligadas a fatores psicológicos que redundam numa opção pela diplomacia a partir de motivações de ordem essencialmente interna, ligadas a estilo de vida, desejo de viver no exterior pelo exterior e outros elementos do gênero – acredito que a maior parte dos meus colegas também ostente essa motivação de caráter funcional ou instrumental, qual seja, a busca de um trabalho que redunde numa expressão mais forte do Brasil enquanto nação no sistema internacional e a vontade pessoal de participar da construção de uma nova realidade no plano mundial.
São, de modo geral, motivações de ordem basicamente idealista, no melhor sentido da palavra: o interesse pelas questões internacionais (advindas de leituras, conhecimento de línguas, de contato com estrangeiros, de eventual estada prévia no exterior) combina-se a uma vocação de certo modo “nômade” ou fortemente “internacionalizada”, o que leva o jovem a orientar-se para a carreira diplomática. Essa orientação é geralmente despertada muito cedo, já na adolescência ou em seu final, contemporaneamente aos estudos universitários, fazendo com que a preparação para os exames de ingresso se dê em paralelo aos semestres finais dos estudos de graduação.
O ambiente geral da diplomacia é um pouco o das humanidades e das ciências sociais aplicadas, que constituem de forma preeminente o foco universitário de origem da maior parte dos candidatos à carreira. Eu ingressei em ciências sociais – na USP, em 1969 – pensando bem mais na transformação política e econômica do Brasil, enquanto nação, do que na defesa dos seus interesses enquanto Estado membro da ONU e ativo participante do sistema de relações internacionais. Uma estada no exterior, para o acabamento dos estudos universitários, facilitou, provavelmente, essa conversão de assuntos “internos” para “externos”, a partir de um certo momento, mas considero que nem os estudos de ciências sociais, nem a estada no exterior sejam indispensáveis para moldar vocações ou determinar o sucesso nos exames de entrada.
O ingresso na carreira depende de uma sólida cultura geral, de excelente conhecimento do Português, em primeiro lugar, e de uma outra língua também, de muito boa preparação nos demais temas setoriais – economia, direito, geografia, história – o que pode ser suprindo por intensas leituras da bibliografia recomendada (e mais além). Acredito que leituras de jornais internacionais sejam indispensáveis, assim como de revistas especializadas em temas nos quais incide o foco dos exames de entrada. Tudo isso pode ser suprido de forma bem mais fácil, atualmente, com o recurso intensivo dos materiais disponíveis na internet, algo inexistente no meu tempo de preparação. A seleção continua difícil, mas as possibilidade de acesso a materiais relevantes para o estudo ampliaram-se tremendamente em relação ao passado.

2) Seu tempo de estudante secundárista o influenciou de alguma maneira?
Provavelmente sim, mas isso depende muito das circunstância de vida de cada um e dos interesses intelectuais de cada candidato. Em função da trajetória política do Brasil em minha juventude – golpe militar em 1964, alinhamento da diplomacia com os EUA numa primeira fase, ambiente de Guerra Fria no cenário internacional –, a orientação para o estudos de problemas internacionais foi praticamente automática, tanto porque a América Latina em geral era agitada por golpes militares e por guerrilhas de orientação castrista, com experimentos diversos de nacionalismo ou de socialização em alguns dos países do continente. Os secundaristas e os universitários de minha época protestavam não apenas contra a ditadura militar, mas também contra o imperialismo americano, a dominação estrangeira na economia e tudo aquilo que nos parecia subordinação do Brasil ao capitalismo multinacional. Estávamos constantemente estudando as questões nacionais e internacionais que tivesse conexão com a situação do Brasil e tomando partido por uma ou outra orientação econômica, política ou ideológica – comunismo de tipo soviético ou chinês, guerrilhas de inspiração guevarista, nacionalização e planejamento de tipo socialista ou indiano, não-alinhamento etc. Tudo isso foi relevante para o que se chamava de “conscientização”, ou seja, a politização segundo linhas geralmente esquerdistas, ou mesmo totalmente comprometidas com soluções socialistas ou comunistas para o sistema a ser adotado no Brasil após a vitória da “revolução”.
Mesmo com as inevitáveis revisões posteriores de orientação político-econômica, toda a preparação alcançada nos debates de juventude – com intensa leitura dos “clássicos” brasileiros de interpretação de nossa trajetória nacional – foi extremamente funcional para os exames de ingresso na carreira diplomática, uma vez que a bibliografia recomendada recobre, de certa forma, a literatura já compulsada anteriormente. Todos nós (quase todos), jovens secundaristas ou universitários, líamos Celso Furtado, Caio Prado Júnior, Sérgio Buarque de Holanda, Florestan Fernandes, Fernando Henrique Cardoso, Octavio Ianni, com menor ênfase em autores considerados “reacionários” como Gilberto Freyre, José Maria Bello ou Hélio Vianna. Os livros esquerdistas eram lidos aberta ou clandestinamente, ademais de Marx, Engels e todos os clássicos do socialismo, obviamente. Em suma, já éramos “internacionalizados” muito tempo antes de pensar em ingressar na carreira diplomática.

3) Numa palestra o senhor comenta sobre o mercado de trabalho nesse ramo e coloca muita ênfase em ser um autodidata por inteiro; isso de ser um autodidata, o senhor emprega em sua vida desde os tempos do colegial?
Certamente, sempre fui autodidata, e considero, para qualquer jovem, motivado ou não para a carreira diplomática, ser esta uma atitude fundamental para o sucesso nos estudos e em qualquer profissão. Ser autodidata significa, antes de mais nada, não se contentar e não esperar pelas leituras orientadas em sala de aula, e buscar ativamente não apenas estar à frente dos demais colegas, mas em alguns casos à frente mesmo do próprio professor, contestando em aula algum aspecto que já foi objeto de leitura paralela. Ser autoditata significa construir o seu próprio conhecimento, aprofundá-lo pela pesquisa auto-induzida, conhecer sempre um pouco mais do que é demandado nos exames de rotina, do sistema escolar ou universitário.
Ser autodidata, numa palavra, significa ser livre, totalmente autônomo em relação ao conteúdo veiculado em classe, dotado de sua própria capacidade analítica e de julgamento, capaz de opiniões abalizadas e fundamentadas sobre uma grande variedade de assuntos. Ser informado é ser livre, e o autodidata alcança essa condição à frente e acima dos seus colegas, o que de certa forma é um privilégio e uma grande satisfação.
Praticamente, desde o colegial – ensino médio, na atual terminologia –, tornei-me um autodidata radical, isto é, completamente independente dos ensinamentos veiculados em sala de aula, e muitas vezes ausente da própria sala de aula. Não recomendaria essa atitude para os alunos em geral, mas recomendo, sim, ser autodidata, ou seja, cultivar o que eu chamo de “ceticismo sadio” em relação ao conteúdo das aulas e buscar complementar aquela informação mediante pesquisas próprias e leituras paralelas.
O conhecimento liberta, e ser autodidata, repito, é ser livre. Não pode haver melhor aspiração na vida do que esta.


Paulo Roberto de Almeida
(pralmeida@mac.com; www.pralmeida.org)
1701: Brasília, 26 dezembro 2006, 2 p.