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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

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sexta-feira, 31 de maio de 2024

Portal da Crônica reproduz antigas crônicas literárias de Paulo Mendes Campos: suas listas

As listas de Paulo Mendes Campos

Guilherme Tauil

Portal da Crônica Brasileira

Caderno de notas de Paulo Mendes Campos

Instituto Moreira Salles

Eis o que foi por ele selecionado:  

130 coisas que adiamos sempre
Diário Carioca, 1954

2Coisas que Vinicius de Moraes gostou e não gostou
O mais estranho dos países, 1952

3Nomes de lugares: histórias do Brasil
Manchete, 1974

4Lista de pequenas ternuras
Manchete, 1966

5Coisas deleitáveis
Manchete, 1962


Ler a íntegra neste link.

Dimitri Medvedev ataca outra vez, o fanfarrão habitual do militarismo russo

 “Dmitri Medvedev no Twitter:

“Os países ocidentais, que alegadamente “aprovaram o uso” das suas armas de longo alcance em território russo (independentemente de se tratar de partes antigas ou novas do nosso país), devem compreender o seguinte:

1. Todo o seu equipamento militar e pessoal que luta contra nós será destruído tanto no território da antiga Ucrânia como nos territórios de outros países se forem lançados ataques a partir daí contra o território russo.

2. A Rússia assume que todas as armas de ataque de longo alcance utilizadas pela antiga Ucrânia são actualmente controladas directamente por militares da NATO. Isto não é “assistência militar”, mas sim participação numa guerra contra nós. Tais ações poderiam muito bem tornar-se um casus belli.

3. A OTAN terá de decidir como classificar as consequências de possíveis ataques retaliatórios contra o equipamento/objectos/pessoal de cada país do bloco no contexto dos Artigos 4.º e 5.º do Tratado de Washington.

Muito provavelmente, a liderança da NATO quer fingir que se trata de decisões soberanas de países individuais da Aliança do Atlântico Norte para apoiar o regime de Kiev, e actualmente não há motivos para aplicar a regra do Tratado de Defesa Colectiva de 1949.

Esses são equívocos perigosos e prejudiciais. Esta “assistência individual” dos países da NATO contra a Rússia, seja controlando os seus mísseis de cruzeiro de longo alcance ou enviando tropas para a Ucrânia, é uma grave escalada do conflito. A antiga Ucrânia e os seus aliados entre os países da NATO enfrentarão uma resposta de tal força destrutiva que a própria Aliança não será capaz de se abster de se envolver no conflito.

E não importa o quanto os fanfarrões reformados da NATO digam que a Rússia nunca utilizará armas nucleares não estratégicas contra a ex-Ucrânia, muito menos contra países individuais da NATO, a vida é muito mais assustadora do que o seu raciocínio frívolo.

Há apenas alguns anos, insistiram que a Rússia não se envolveria num conflito militar aberto com o regime Bandera para evitar desentendimentos com o Ocidente. Eles estavam errados. A guerra está em andamento.

Eles também podem calcular mal com o uso de TNWs. Embora isso fosse um erro fatal. Afinal, como bem observou o Presidente da Rússia, os países europeus têm densidades populacionais muito elevadas. E para os países inimigos cujas terras estão fora da zona de cobertura dos TNW, existe finalmente um potencial estratégico.

E isso, infelizmente, não é intimidação nem blefe nuclear. O actual conflito militar com o Ocidente desenrola-se de acordo com o pior cenário possível. Há uma escalada constante no poder das armas da NATO que estão a ser utilizadas. Portanto, ninguém pode excluir que o conflito chegue hoje à sua fase final.”

PRA: Grato a Cesario alelantonio pela transcrição.

Fatores do crescimento e expansão da Direita em sociedades contemporâneas- Paulo Roberto de Almeida

Fatores do crescimento e expansão da Direita em sociedades contemporâneas

Paulo Roberto de Almeida 


O movimento para a direita concerne sobretudo as gerações mais velhas, embora possa tocar igualmente certas faixas mais jovens, afligidas por problemas sociais que concernem a todos: crises econômicas— desemprego, visto como ameaça externa ou concorrência imigratória, queda do padrão de vida por eventual defasagem cambial, rebaixamento de estruturas de apoios sociais, deterioração e envelhecimento de equipamentos coletivos, como escolas, transportes públicos e hospitais — além de uma percepção geral de malaise na governança tradicional, por corrupção do estamento político, distanciamento da administração dos núcleos habitacionais suburbanos, assim como percepção da indiferença das elites afluentes com respeito a setores da classe média inferior e estratos mais pobres, subproletarizados. 

Cabe acrescentar, nos países ricos, o afluxo crescente de imigrantes ilegais, fazendo pressão sobre equipamentos e estruturas de apoio social, sensação de maior insegurança coletiva e de desconforto com a alteridade racial ou religiosa, e sentimento difuso de perda de exclusividade e homogeneidade grupal nacional. Ameaça de terrorismo estrangeiro pode ser outro fator, aliás já manifestado desde longo tempo, sobretudo a partir do Oriente Médio.

Movimentos conspiratórios extremistas nativos, crescimento do nacionalismo simplório e ativismo acrescido de movimentos deliberadamente radicais nos extremos do leque político-ideológico também podem ser influentes nesses processos. O aumento do populismo político tem sido exercido sobretudo a partir de correntes de direita, mobilizando o espectro conservador, geralmente de idades mais avançadas.

No caso da Europa ocidental, a ação clandestina, especificamente administrada por Putin junto a movimentos políticos e sociais aproximados à Direita, teve certo papel no reforço de tendências existentes nas nações democráticas liberais, inclusive com interferência em processos eleitorais (até mesmo nos EUA). 

Existem, portanto, diferentes fatores em jogo no impulso à direitização das sociedades democráticas e de reforço do autoritarismo naquelas menos liberais. No caso do Brasil, a direitizaçâo incluiu até liberais presumidos e reacionários conhecidos não só pela ignorância manifesta como por vínculos com milicianos criminosos, como já foi amplamente revelado em investigações envolvendo a escória da sociedade, sem excluir negacionismo imbecil e indústria religiosa.

Paulo Roberto de Almeida 

Brasília, 31/05/2024


Finanças internacionais do Brasil: uma perspectiva de meio século (1954-2004); capítulo de livro - Paulo Roberto de Almeida

Versão completa do trabalho seguinte:  

1338. “Finanças internacionais do Brasil: uma perspectiva de meio século (1954-2004)”, Brasília, 10 out. 2004, 34 p. Ensaio preparado para livro comemorativo dos 50 anos do IBRI; versão reduzida, revista, do trabalho n. 1329, para livro comemorativo dos 50 anos do IBRI. Publicado in José Flavio Sombra Saraiva e Amado Luiz Cervo (orgs.), O crescimento das relações internacionais no Brasil (Brasília: Instituto Brasileiro de Relações Internacionais, 2005, 308 p.; ISBN: 85-88270-15-3; p. 231-270; link do livro: https://funag.gov.br/biblioteca-nova/produto/loc_pdf/1073/1/crescimento_das_relacoes_internacionais_no_brasil_o; link para o artigo: https://www.academia.edu/120301206/1338_Finanças_internacionais_do_Brasil_uma_perspectiva_de_meio_século_1954_2004_2005_). Relação de Publicados n. 574.


Finanças internacionais do Brasil:

uma perspectiva de meio século (1954-2004)

 

Paulo Roberto de Almeida

in: José Flavio Sombra Saraiva e Amado Luiz Cervo (orgs.), O crescimento das relações internacionais no Brasil (Brasília: Instituto Brasileiro de Relações Internacionais, 2005, 308 p.; ISBN: 85-88270-15-3; p. 231-270). Relação de Publicados n. 574. link: https://funag.gov.br/biblioteca-nova/produto/loc_pdf/1073/1/crescimento_das_relacoes_internacionais_no_brasil_o

 

Sumário:

1. Introdução: meio século de história financeira do Brasil

2. Multiplicidade cambial e estrangulamento financeiro: 1954-1964

3. Estabilização econômica, indexação e abertura financeira: 1964-1973

4. A desordem monetária internacional e o desequilíbrio financeiro: 1973-1982

5. Crise e castigo numa era de transformações financeiras: 1982-1987

6. Ensaios de estabilização na era da globalização financeira: 1987-1994

7. De novo no turbilhão financeiro internacional: 1994-2004

8. A inserção financeira internacional do Brasil: uma perspectiva de meio século

 

 

1. Introdução: meio século de história financeira do Brasil

Este ensaio tem a intenção de examinar as grandes tendências e discutir os principais problemas da inserção financeira externa do Brasil no período que cobre o último meio século, isto é, entre o suicídio de Getúlio Vargas em 1954, até meados da presidência Luiz Inácio Lula da Silva, no segundo semestre de 2004, cujo governo comprometeu-se a reduzir a “fragilidade financeira externa” do Brasil. Ele segue a evolução das relações financeiras internacionais do país, destacando seus elementos estruturais, seus componentes institucionais – os de origem doméstica e os relativos ao contexto internacional, isto é, relações com o Fundo Monetário Internacional –, bem como os debates em torno da “fragilidade financeira internacional” do Brasil, isto é, sua dependência financeira externa.

(...)


Ler a íntegra do livro e do capítulo nestes links:

link do livro: 

https://funag.gov.br/biblioteca-nova/produto/loc_pdf/1073/1/crescimento_das_relacoes_internacionais_no_brasil_o

link para o artigo:

https://www.academia.edu/120301206/1338_Finanças_internacionais_do_Brasil_uma_perspectiva_de_meio_século_1954_2004_2005_). 


Carta tocante de Arthur Virgilio Neto a seu filho, que se foi…

Transcrevo do Arthur Virgilio Neto, a quem abraço afetuosamente, com meu mais profundo sentimento de solidariedade na dor:

“Acordei, hoje, bem cedo e não podia telefonar para o meu filho, Arthur Virgílio Bisneto. Afinal, ele está morto. 

Ele não pode marcar uma conversa comigo, pela forte razão de estar morto. 

Não posso mais conversar com ele, porque, todos sabem, ele faleceu. 

Não podemos mais discutir política, porque ele não está mais entre nós.

Não podemos ver jogos do Flamengo e da Seleção, juntos, porque, ao fim e ao cabo, ele viajou, nas mãos de um destino áspero para um lugar bem distante.

Não podemos nem discordar um do outro, coisa que, volta e meia  ocorria, porque ele não tem como vir à minha casa e nem posso ir à dele, porque eu não posso chegar perto do Bisneto e nem ele pode se aproximar do Arthur, pai!

Eu queria beija-lo hoje, agora, muito, mil vezes, porém não tenho a menor possibilidade de fazer isso. É bem explicável: meu filho morreu, seu corpo imponente está embaixo da terra, ao lado de sua avó, Isabel Victória, do senador Arthur Virgílio Filho, de sua avó Luíza e do seu avô, desembargador Arthur Virgílio. 

Sua alma e seu espírito, estão voando, na direção do mundo espiritual. Longe, muito distante, do beijo que queria lhe dar, do seu belo sorriso, que eu queria acolher.

Queria fazê-lo nascer de novo, mas sei que isso é impossível de acontecer!

Perdi meu filhão, companheiro de luta, confidente, tão apaixonado por mim, quanto eu por ele.

Estou em pedaços e desfalcado de metade do meu coração, que encontrou um lugarzinho no caixão que enterrou meu Arthurzinho. 

Saudades insuportáveis, “Turuca”. Só penso em você!

Quase não durmo…e, logo que acordo, penso que sua morte é uma mentira de péssimo gosto. 

Logo a seguir, lembro que vocé morreu, faleceu, partiu, seja lá o nome que queiram dar a essa punição que o destino aplicou em nossa família…e em mim!

Paz para sua alma, filhão, porque a minha está em maremoto, tsunami, tumulto torturante. E você não pode me ajudar,como fez tantas vezes. 

Sinto-me impotente para fazer você retornar da viagem, que dizem ser a última e voltar para sua aflita mãe, para sua irmãos, para seus amigos e amigas…para mim. 

Não se preocupe, porque sou um guerreiro, gravemente ferido, que mergulhará em suas águas mais profundas e haverá de emergir, como você sempre gostou de me ver: de escudo e lança nas mãos.

Hoje, confesso, esqueço tudo, nada me interessa, o sorriso é raríssimo. Hoje, sinceramente, não sou nada. Nada mesmo!

Até breve, meu xará amado!”


Carta de um professor escocês aos universitários que condenaram Israel por Apartheid e genocidio - Denis MacEoin (via Roberto Freire)

Roberto Freire postou em sua ferramenta social esta carta, que considero primorosa, simplesmente por sua honestidade intelectual, uma qualidade que deveria ser a regra entre universitários:

PRA 

Uma carta incrível escrita por um professor escocês não judeu aos seus alunos que votaram pelo boicote a Israel.

É uma resposta do Dr. Denis MacEoin à moção apresentada pela Associação de Estudantes de Edimburgo -EUSA  para boicotar todas as coisas israelenses, na qual eles afirmam que Israel está sob um regime de apartheid.

Roberto Freire

Aqui está sua carta :

"Posso dizer algumas palavras aos membros da EUSA? 

Sou formado em Edimburgo (mestrado em 1975) e estudei história persa, árabe e islâmica em Buccleuch Place com William Montgomery Watt e Laurence Elwell Sutton, dois dos maiores especialistas britânicos em Oriente Médio na época. Mais tarde, fiz doutorado em Cambridge e lecionei Estudos Árabes e Islâmicos na Universidade de Newcastle. Naturalmente, sou autor de vários livros e centenas de artigos nesta área. Digo tudo isto para mostrar que estou bem informado sobre os assuntos do Médio Oriente e que, por essa razão, estou chocado e desanimado com a moção e votação da EUSA.  Estou chocado por uma razão simples: não existe e nunca existiu um sistema de apartheid em Israel.  Esta não é a minha opinião, é um facto que pode ser testado em comparação com a realidade por qualquer estudante de Edimburgo, caso decida visitar Israel para ver por si mesmo. Deixem-me explicar isto, pois tenho a impressão de que os membros da EUSA que votaram a favor desta moção são absolutamente ignorantes em assuntos relativos a Israel, e que são, com toda a probabilidade, vítimas de propaganda extremamente tendenciosa proveniente do grupo anti-Israel. salão.  Ser anti-Israel não é em si questionável. Mas não estou falando de críticas comuns a Israel. Estou falando de um ódio que não se permite limites nas mentiras e mitos que espalha. Assim, Israel é repetidamente referido como um estado “nazista”. Em que sentido é isso é verdade, mesmo como uma metáfora? Onde estão os campos de concentração israelenses? Os einzatsgruppen? A SS? As Leis de Nuremberg? A solução final? Nenhuma destas coisas nem qualquer coisa remotamente parecida com elas existe em Israel, precisamente porque os judeus, mais do que qualquer pessoa na terra, entendem o que o nazismo representava.  Alega-se que houve um Holocausto israelita em Gaza (ou noutro local). Onde? Quando? Nenhum historiador honesto trataria essa afirmação com outra coisa que não o desprezo que ela merece. Mas chamar os judeus de nazistas e dizer que eles cometeram um Holocausto é uma forma tão básica de subverter os fatos históricos quanto qualquer coisa que eu possa imaginar.  Da mesma forma, o apartheid. Para que o apartheid existisse, teria de haver uma situação que se assemelhasse muito à forma como as coisas eram na África do Sul sob o regime do apartheid. Infelizmente para aqueles que acreditam nisso, um fim de semana em qualquer parte de Israel seria suficiente para mostrar o quão ridícula é a afirmação.  O fato de um grupo de estudantes universitários ter realmente caído nessa e ter votado é um comentário triste sobre o estado da educação moderna. O foco mais óbvio para o apartheid seria a população árabe de 20% do país. Segundo a lei israelita, os árabes israelitas têm exactamente os mesmos direitos que os judeus ou qualquer outra pessoa; Os muçulmanos têm os mesmos direitos que os judeus ou cristãos; Os bahá'ís, severamente perseguidos no Irão, florescem em Israel, onde têm o seu centro mundial; Os muçulmanos Ahmadi, severamente perseguidos no Paquistão e noutros lugares, são mantidos em segurança por Israel; os locais sagrados de todas as religiões são protegidos por uma lei israelense específica. Os árabes constituem 20% da população universitária (um eco exacto da sua percentagem na população em geral).  No Irão, os Bahai (a maior minoria religiosa) estão proibidos de estudar em qualquer universidade ou de gerir as suas próprias universidades: porquê seus membros não estão boicotando o Irã? Os árabes em Israel podem ir aonde quiserem, ao contrário dos negros na África do Sul do apartheid. Utilizam transportes públicos, comem em restaurantes, vão a piscinas, usam bibliotecas, vão ao cinema ao lado de judeus - algo que nenhum negro foi capaz de fazer na África do Sul.  Os hospitais israelitas não tratam apenas de judeus e árabes, mas também de palestinianos de Gaza ou da Cisjordânia.  Nas mesmas enfermarias, nas mesmas salas de operações.  Em Israel, as mulheres têm os mesmos direitos que os homens: não existe apartheid de género.  Homens e mulheres gays não enfrentam restrições, e os gays palestinos muitas vezes fogem para Israel, sabendo que podem ser mortos em casa.  Parece-me bizarro que grupos LGBT apelem a um boicote a Israel e não digam nada sobre países como o Irão, onde homens gays são enforcados ou apedrejados até à morte. Isso ilustra uma mentalidade que é inacreditável.  Estudantes inteligentes pensando que é melhor calar sobre regimes que matam gays, mas é bom condenar o único país do Oriente Médio que resgata e protege os gays. Isso deveria ser uma piada de mau gosto?  A universidade deveria ser sobre aprender a usar o cérebro, a pensar racionalmente, a examinar evidências, a chegar a conclusões baseadas em evidências sólidas, a comparar fontes, a pesar um ponto de vista contra um ou mais outros. Se o melhor que Edimburgo pode produzir agora são estudantes que não têm ideia de como fazer nenhuma dessas coisas, então o futuro será sombrio.  Não me oponho a críticas bem documentadas a Israel. Oponho-me quando pessoas supostamente inteligentes destacam o Estado Judeu acima de Estados que são horríveis no tratamento que dispensam às suas populações. Estamos a atravessar a maior convulsão no Médio Oriente desde os séculos VII e VIII, e é claro que árabes e iranianos estão a rebelar-se contra regimes aterrorizantes que contra-atacam matando os seus próprios cidadãos.  Os cidadãos israelitas, tanto judeus como árabes, não se rebelam (embora sejam livres para protestar). Contudo, os estudantes de Edimburgo não organizam manifestações e não apelam a boicotes contra a Líbia, o Bahrein, a Arábia Saudita, o Iémen e o Irão. Preferem fazer acusações falsas contra um dos países mais livres do mundo, o único país do Médio Oriente que acolheu refugiados do Darfur, o único país do Médio Oriente que dá refúgio a homens e mulheres homossexuais, o único país do Médio Oriente Leste que protege os Bahá'ís... Preciso continuar?  O desequilíbrio é perceptível e não dá crédito a quem votou a favor deste boicote. Peço que você mostre algum bom senso. Obtenha informações da embaixada de Israel. Peça alguns palestrantes. Ouça mais de um lado.  Não se decida antes de ter dado uma audiência justa a ambas as partes. Você tem um dever para com seus alunos e isso é protegê-los de argumentos unilaterais.  Eles não estão na universidade para serem propagandeados. E certamente não estão lá para serem induzidos ao anti-semitismo, punindo um país entre todos os países do mundo, que é o único Estado judeu. Se tivesse existido um único Estado judeu na década de 1930 (o que, infelizmente, não existiu), não acha que Adolf Hitler teria decidido boicotá-lo?  A vossa geração tem o dever de garantir que o racismo perene do anti-semitismo nunca crie raízes entre vós. Hoje, porém, há sinais claros de que o fez e está a diminuir mais. Você tem a chance de evitar um mal muito grande, simplesmente usando a razão e o senso de justiça. Por favor, diga-me que isso faz sentido. Eu lhe dei algumas das evidências.  Cabe a você saber mais. 

Com os melhores cumprimentos, 

Denis MacEoin”

quinta-feira, 30 de maio de 2024

A New Yorker já colocou Trump na prisão; pena que não vai acontecer

 A revista preparou uma capa para o seu número de 10 de junho. Improvável que a prisão se realize, mas nada é impossível nos EUA atuais.



Número corrente da revista História Econômica & História de Empresas (2024)

 Novo número da revista História Econômica & História de Empresas


Nota informativa 
Declaramos que a partir de novembro de 2021, História Econômica & História de Empresas (ISSN 1519-3314) passará a adotar a licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional (CC BY) para os artigos publicados a partir de 2022

 

Edição Atual

v. 27 n. 1 (2024)
Publicado: 2024-05-30

Artigos

Resenhas


María Corina, una líder formidable - Andrés Hoyos (El Mal Pensante)

Artigo publicado sobre a principal líder de oposição à ditadura chavista na Venezuela 

María Corina, una líder formidable


Andrés Hoyos 

El Mal Pensante

 

Una característica típica de los líderes políticos, en su mayoría hombres todavía, es el narcisismo intransigente. La flexibilidad se suele interpretar como debilidad. La lógica parece ser: yo pienso lo que pienso y no voy a cambiarlo, a menos, supone uno, que sufra un gran varapalo en los resultados políticos. Para ver una actitud del todo distinta, basta con echar un vistazo a la vecina Venezuela. No hay en todo el vecindario una líder o un líder con el perrenque de María Corina Machado, quien arrastra multitudes a lo largo y ancho del país, además de que ha cambiado de opinión varias veces de forma muy acertada.

Pese a que está muy lejos de ser modesta, sí queda claro que lo primero que María Corina busca es entender con cuidado la situación y tomar en cuenta los detalles, para después lanzarse con todo. No por otra razón Edmundo González Urrutia encabeza hoy todas las encuestas, mientras que hasta hace un par de meses este candidato de la Mesa de Unidad Democrática (MUD) era un completo desconocido. Él es él, sí, aunque también encarna la continuidad del proyecto de su promotora.

María Corina entendió que el problema consiste antes que nada en salir de Maduro. Tiro por tiro, ella ha ido varios pasos adelante del confiado dictador, al punto de que en últimas lo cogió con los pantalones abajo. Debe quedar claro que el hombre de demócrata no tiene ni el barniz, hasta el punto de que todavía es posible que su régimen se saque un sapo de la manga y trate de descarrilar las elecciones del 28 de julio. Ok, pero vaya que se les ha hecho cada vez más tarde. Si por alguna razón las votaciones no se llevan a cabo, el camino ofrecerá varias salidas importantes para la oposición. No es lo mismo luchar contra una dictadura que “gana” unas elecciones más o menos funcionales, a hacerlo contra otra que intenta derrumbar el tinglado o que recurre de forma masiva al fraude.

Existen incertidumbres grandes porque la transmisión de mando será en enero de 2025, casi seis meses después de ir a las urnas. Igual, si el régimen pierde los recursos para quedarse en el poder se recortan de forma drástica. Y en caso de que el chavismo quiera usar las instituciones que controla para obstaculizar a González Urrutia una vez este asuma el poder, quedan los diversos recursos plebiscitarios, pues el nuevo régimen tendría unas mayorías muy amplias.

Quizá el antecedente más interesante de lo que hoy pasa en Venezuela sea lo que pasó en 1986 en Filipinas, donde justamente una mujer logró derrocar sin derramamiento de sangre a un dictador no muy distinto de Maduro, Ferdinand Marcos, casado con doña Imelda, la dueña de los mil pares de zapatos. Claro, las situaciones no son iguales y los países están a medio mundo de distancia, pero según se ve, la democracia puede incluso tener más fuerza en la actual Venezuela que en las Filipinas de entonces, donde al final triunfó Corazón Aquino, viuda de Benigno Aquino, el líder asesinado por el régimen.

Se trató de la llamada Revolución EDSA, que culminó en 1986. Entonces Marcos se proclamó vencedor de las elecciones, tras realizar un inmenso fraude, y la gente salió a la calle por millones a gritarle ¡No! El dictador pidió el aplastamiento de la resistencia y los militares no le obedecieron. ¿A algo similar se podría suceder en Venezuela? Al menos yo sospecho que allí los militares tampoco van a disparar contra la multitud.

¿Ya tiene Maduro listo su plan B? Porque cada vez luce más probable que lo necesite.


andreshoyos@elmalpensante.com



America’s First (Former) Felon-in-Chief - Foreign Policy

 America’s First (Former) Felon-in-Chief

Former U.S. President Donald Trump appears for his hush money trial in New York City.

Former U.S. President Donald Trump appears for his hush money trial at Manhattan Criminal Court in New York City on May 30.Seth Wenig/Getty Images

A New York City court found former U.S. President Donald Trump guilty on Thursday on all 34 counts of falsifying business recordsrelated to hush money payments made to adult film star Stormy Daniels. The payments, disguised as legal fees to lawyer Michael Cohen and totaling $130,000, were made to conceal actions that Trump believed could have hurt his chances in the 2016 presidential election. Trump is the first U.S. president—former or current—to be convicted on criminal charges.

“This was a disgrace,” Trump said upon leaving the courthouse. “This was a rigged trial by a conflicted judge who was corrupt.” Trump repeatedly violated a gag order barring him from speaking publicly about the trial during the case, with Justice Juan Merchan eventually finding him in contempt of court and fining Trump $10,000 for 10 such remarks.

Merchan announced that Trump can remain at liberty without bail. His sentencing is scheduled for July 11, in which the former president could face years in prison or another form of private incarceration, house arrest, or probation. July 11 is just four days before the Republican National Convention is set to begin, at which Trump will likely receive the party’s presidential nomination. Constitutional experts say a conviction does not disqualify Trump from running for reelection in November.

Trump’s legal team is expected to appeal the guilty verdicts, which could postpone Trump fulfilling his sentence, potentially even until after Election Day passes.

Trump is also facing three other criminal cases. In federal court, he stands accused of conspiracy to overturn the 2020 presidential election, including his support of Capitol rioters on Jan. 6, 2021, and the mishandling of classified documents at his Mar-a-Lago residence after he left office. He is also facing a state case accusing him of conspiracy to overturn the 2020 election results in Georgia, in which he lost by a slim margin.


Venezuela: Eleições de araque - Opinião da Folha de S. Paulo

Venezuela: Eleições de araque

Folha de S. Paulo | Opinião o Folha de S. Paulo
30 de maio de 2024

Ao desconvidar observadores da UE para o pleito, Maduro reitera que comanda uma ditadura

A Venezuela é uma ditadura que infringe direitos humanos e destruiu a economia do país a ponto de instalar uma crise humanitária que gerou cerca de 7,7 milhões de refugiados. Mas o déspota Nicolás Maduro finge que está numa democracia e ainda tem a petulância de pretender que a comunidade internacional acredite nessa farsa.

Na terça-feira (28), seu Conselho Nacional Eleitoral informou que o convite para que observadores da União Europeia (UE) monitorem a eleição presidencial, marcada para o dia 28 de julho, foi cancelado.

O órgão justificou-se com discurso rançoso sobre um fantasioso imperialismo: "Seria imoral permitir sua participação, conhecendo suas práticas neocolonialistas e intervencionistas contra a Venezuela".

De fato, a UE mantém sanções contra a nação sul-americana, do mesmo modo que os EUA, mas como mecanismo de pressão contra atrocidades notórias cometidas pelo regime, notadamente a partir da onda de protestos de 2017.

Investigação conduzida pelo Tribunal Penal Internacional em curso desde 2021 já levantou 1.746 denúncias de abusos contra os os direitos humanos. Em 2022, gabinete da ONU instalado na Venezuela divulgou um relatório com 122 casos de tortura e de violência sexual. Desde 2017, ao menos 125 pessoas foram mortas.

Em fevereiro deste ano, Maduro expulsou do país os funcionários da repartição das Nações Unidas.

A proibição de observadores da UE no pleito é mais uma infração ao Acordo de Barbados, pelo qual a Venezuela se comprometia a realizar eleições justas, livres e abertas ao escrutínio externo.

O Judiciário cooptado pela ditadura já havia interditado as candidaturas dos principais oponentes do caudilho. Esse movimento gerou a primeira crítica do Itamaraty ao regime ?não de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que em suas falas ainda coloca panos quentes sobre a barbárie venezuelana.

Em 28 de julho, a população do país irá às urnas numa pantomima. Sem oposição política, liberdade de expressão e direitos humanos, não se pode considerar que tal evento seja a expressão de um regime democrático.

editoriais@grupofolha.com.br

Robert De Niro sobre Trump

 O ator Robert De Niro fez uma declaração sobre o estado das coisas politicas nos EUA:


“Eu amo essa cidade, eu amo essa cidade, eu não quero destruí-la. Donald Trump quer destruir não só a cidade, mas o país e eventualmente ele poderia destruir o mundo. Eu devo muito à cidade e é por isso que é tão estranho que Donald Trump esteja bem do outro lado da rua porque ele não pertence à minha cidade. Eu não sei a onde ele pertence, mas certamente ele não pertence a esta cidade. Nós, nova-iorquinos, costumávamos tolerá-lo quando ele era apenas mais um negociante imobiliário sujo fingindo ser importante, um playboy barato mentindo para entrar nos tabloides, fingindo ser um porta-voz, um porta-voz para ele mesmo. 

Ele estava se fazendo passar por outra pessoa para enganar a imprensa e inflando seu patrimônio líquido, um palhaço. Mas esta cidade é bem tolerante. Nós abrimos espaço para palhaços. Nós os temos por toda a cidade, pessoas que fazem coisas loucas na rua, nós toleramos isso. Faz parte da cidade, faz parte. 

Mas não alguém como Trump, que eventualmente poderá governar o país. Isso não funciona e todos nós sabemos disso. De alguma forma, ele conseguiu até que supostos patriotas o apoiassem, um homem que clamou por liquidar a Constituição e em 6 de janeiro liderou uma multidão enfurecida para ameaçar a democracia, deixando morte e destruição em seu rastro. 

É por isso que eu preciso estar envolvido e queria estar envolvido no novo comercial de campanha de Biden/Harris porque mostra a violência de Trump e nos lembra que ele usará violência contra qualquer um que fique em seu caminho em sua megalomania e ganância. 

Quando Trump concorreu em 2016, foi como uma piada, esse palhaço concorrendo à presidência, não, nunca poderia acontecer. Tínhamos esquecido as lições da história que nos mostraram outros palhaços que não foram levados a sério até tornarem-se ditadores vis. 

Com Trump, temos uma segunda chance e ninguém está rindo agora. Este é o momento de detê-lo votando para tirá-lo de uma vez por todas. Não queremos acordar após a eleição dizendo o que novamente, meu Deus, o que diabos nós fizemos. Não podemos deixar isso acontecer de novo. 

Ontem foi o Memorial Day, é um bom momento para refletir sobre como os americanos lutaram e morreram para que pudéssemos desfrutar das liberdades garantidas a nós por um governo democrático, um governo que como o presidente Lincoln disse do povo, pelo povo para o povo não perecerá da face da terra. 

Sob Trump, esse tipo de governo perecerá…”

Prefácio de Rubens Ricupero ao livro de Synesio de Sampaio Goes sobre Alexandre de Gusmão

Publicado em 2019 pelo Vermelho, um órgão de  esquerda:

https://vermelho.org.br/2019/08/03/leia-o-prefacio-de-rubens-ricupero-que-foi-censurado-pelo-itamaraty/

Leia o prefácio de Rubens Ricupero que foi censurado pelo Itamaraty 

O embaixador aposentado Rubens Ricupero, crítico da política externa do governo Bolsonaro, considerou “infantilidade” o veto do chanceler Ernesto Araújo a um livro do Itamaraty por questões pessoais. Ricupero fez o prefácio da biografia de Alexandre de Gusmão, escrita pelo embaixador Synesio Sampaio Goes Filho, por encomenda da Fundação Alexandre de Gusmão, vinculada ao ministério. Em julho, ao entregar os originais, Goes Filho foi avisado de que o livro só seria publicado sem o prefácio.

Ricupero

Com o título Alexandre de Gusmão (1695-1753): O Estadista que Desenhou o Mapa do Brasil, o livro deveria ser publicado neste segundo semestre. “É um texto dirigido, sobretudo, a interessados em história diplomática. Uma razão a mais para concluir que a atitude de vetar o prefácio é, no fundo, uma infantilidade de efeitos contraproducentes para os que a adotaram”, afirmou Ricupero, que também é historiador e foi embaixador em Washington.

Autor do ensaio sobre Gusmão – que é considerado o “avô” da diplomacia brasileira –, Goes Filho também protestou. “Isso é censura, obscurantismo. Desse jeito, nenhum embaixador de prestígio vai poder publicar”, afirmou ele à Folha de S.Paulo. “É um assunto do século 18, e o autor foi vetado porque critica o ministro – não pelo que escreveu.”

Ao lado de outros veículos e em solidariedade a Goes Filho e Ricupero, o Vermelho divulga abaixo a íntegra do texto censurado pelo Itamaraty.

Alexandre de Gusmão (1695-1753): O Estadista que Desenhou o Mapa do Brasil

PREFÁCIO 

Por Rubens Ricupero


Synesio Sampaio Goes Filho realizou neste livro em relação ao principal autor do Tratado de Madri o que havia feito para a formação das fronteiras do Brasil: tornou acessível ao leitor de hoje a compreensão de uma história que se convertera em algo de remoto e abstruso.

Nem sempre fora assim. Até sessenta ou setenta anos atrás, a história diplomática do Brasil parecia às vezes dominada pela história das fronteiras. Na atmosfera de justa satisfação pela solução definitiva dos problemas territoriais do país levada a cabo pelo barão do Rio Branco, multiplicaram-se os estudos das questões fronteiriças, frequentemente escritos por diplomatas de carreira com vocação de historiadores.

Um dos mais produtivos entre esses autores, o embaixador Álvaro Teixeira Soares, resumiu com felicidade o sentimento que animava tais estudos. A solução sistemática dos problemas fronteiriços iniciada sob a monarquia e concluída por Rio Branco, escreveu Teixeira Soares, merecia ser considerada como uma das maiores obras diplomáticas realizadas por qualquer país em qualquer época. Não havia exagero em descrever desse modo o processo pacífico de negociação ou arbitragem pelo qual se resolveu metodicamente cada um dos problemas de limites com nada menos de onze vizinhos contíguos e heterogêneos (na época do Barão, o Equador ainda invocava direitos de fronteira com o Brasil, em disputa resolvida com o Peru somente muito mais tarde).

Passada a fase em que era moda escrever livros sobre fronteiras, o assunto perdeu grande parte do atrativo. Julgava-se que nada mais havia a dizer a respeito de problema já resolvido. Desconfiava-se de obras assinadas por funcionários diplomáticos, confundidas com a modalidade de publicações destinadas a engrandecer a própria instituição. Livros sobre discussões limítrofes, antes tão populares, tornaram-se difíceis de encontrar e mais difíceis de ler. O estilo envelhecera, os métodos da historiografia passada davam a impressão de obsoletos, a narrativa soava monótona, demasiado descritiva, apologética, pouco crítica, cansativa na enumeração de intermináveis acidentes geográficos.

Foi nesse panorama estagnado que Synesio teve a coragem de escolher para sua tese no Curso de Altos Estudos do Instituto Rio Branco em 1982 o tema enganosamente escondido sob o modesto título de Aspectos da ocupação da Amazônia: de Tordesilhas ao Tratado de Cooperação Amazônica . Lembro bem da surpresa positiva que causou a dissertação, pois fazia parte na época da banca examinadora do exame. Fui assim testemunha do surgimento de uma vocação singular de historiador voltado para recuperar a desgastada tradição de estudos fronteiriços.

Estimulado pela recomendação de publicação da banca, o autor ampliou e enriqueceu o trabalho, editado pelo Instituto de Pesquisa em Relações Internacionais (IPRI), em 1991, sob o título de Navegantes, Bandeirantes, Diplomatas: Um ensaio sobre a formação das fronteiras do Brasil. O livro teve o efeito de uma janela que se abria na atmosfera bolorenta da antiquada história das fronteiras, fazendo entrar o ar fresco da renovação modernizadora.

Redigida em linguagem límpida, objetiva, expressiva na sóbria elegância, a narrativa envolve o leitor em viagem sem esforço pela fascinante evolução do território brasileiro na sua fase de expansão, de avanços e recuos na Amazônia, no Extremo Oeste, na região da Bacia do Prata. Demonstra como se revelou constante em toda essa história a articulação do impulso pioneiro de exploradores, homens práticos determinados na busca de compensações materiais, com o trabalho cuidadoso de diplomatas e estadistas que legitimaram em instrumentos jurídicos o que não passava no início de ocupação precária de terras duvidosas.

Um dos méritos originais do livro consistiu em resolutamente colocar de lado a mitologia criada em torno de uma suposta linha que teria sido invariavelmente seguida por todos os governos brasileiros, refletindo uma doutrina inabalável ao longo dos séculos. Segundo tal linha de argumentação, desde os primórdios os políticos e diplomatas do Império teriam sustentado que o Tratado de Santo Ildefonso (1777) havia perdido a validez ao não ser explicitamente revalidado depois da fugaz Guerra das Laranjas (1801) no Tratado de Badajoz. Não existindo, portanto, direito escrito para definir as fronteiras, estas deveriam ser estabelecidas – seria o segundo postulado pretensamente imutável – de acordo com o princípio do uti possidetis , isto é, obedecendo à posse efetiva no terreno. O Tratado de Santo Ildefonso serviria apenas de maneira subsidiária para ajudar a dirimir dúvidas onde não se verificasse a ocorrência de posse ou não houvesse contradição entre o tratado e a posse.

O argumento apresentava alguma utilidade para comprovar a antiguidade e constância das pretensões brasileiras. Não passava, no entanto, de artifício de negociação, sem amparo real na realidade histórica. Synesio Sampaio Goes não se intimidou com a longa sequência de respeitados estadistas e estudiosos que haviam cercado essas afirmações com a proteção de sua autoridade e de seu prestígio. Mostrou com exemplos irrefutáveis que nenhum dos postulados havia sido verdade absoluta adotada em todos os casos. Não faltavam decisões e pareceres do Conselho de Estado advogando em favor da adoção de Santo Ildefonso como orientação para fixar fronteiras. Nem de episódios em que o Conselho ou o governo tinham recusado recorrer ao uti possidetis como critério para traçar limites.

Longe de enfraquecer a tradição brasileira em matéria de negociação de fronteiras, o trabalho de reconstituição da verdade efetuado pela obra conferiu historicidade e verossimilhança às doutrinas defendidas pelo Itamaraty, voltando a situá-las no contexto próprio do tempo em que foram definidas e no das circunstâncias que as modificaram. O desmonte da retórica apologética permitiu que aparecesse a verdade de uma evolução gradual, de tentativas e erros, de afirmação progressiva das teses mais convenientes. A narrativa fiel aos fatos fez emergir do passado uma diplomacia conscienciosa de estudo de mapas, de exploração de velhos arquivos, de construção paciente de doutrinas jurídicas adaptadas à situação de país cujos títulos originais a boa parte de seu futuro território eram pobres ou inexistentes. O resultado final, além de verdadeiro, valorizava em vez de empobrecer os méritos dos diplomatas que construíram a história do mapa do Brasil.

Na origem de toda essa história encontrava-se o alto funcionário da Corte portuguesa a quem se devia, mais que a qualquer outro, a definição do perfil territorial do Brasil, Alexandre de Gusmão. Brasílico, como se dizia na época, nascido obscuramente na humilde, insignificante Vila do Porto de Santos, tratava-se de personagem que atuara de modo discreto nos bastidores do poder. Permanecera quase anônimo por longo tempo, mais de um século, apesar de um ou outro estudioso mais arguto como o barão do Rio Branco ter reconhecido o papel que desempenhara.

Coube a um exilado político no Brasil do regime salazarista, o historiador português Jaime Cortesão, a tarefa de resgatar da penumbra da história a figura de Gusmão, desentranhando do silêncio dos arquivos os documentos que praticamente revelaram ao mundo a história real que se escondia por trás da negociação do Tratado de Madri (1750). Synesio Sampaio Goes, que já produzira o moderno clássico do estudo e da análise da história geral das fronteiras brasileiras, retrocede agora ao ponto de partida de onde tudo começou a fim de examinar como se chegou a pacientemente preparar a maior de todas as vitórias da diplomacia luso-brasileira na consolidação da expansão territorial do Brasil, o Tratado de Madri.

Conforme afirmei lá no início do prefácio, as duas realizações de Synesio, a da história completa, abrangente das fronteiras, e hoje a do Tratado de Madri e de seu autor mais importante, possuem uma característica definidora comum. Ambas reexaminam com olhar crítico o volumoso material existente, desbastam esse acervo daquilo que apresenta relevância menor para o leitor culto de nossos dias, reconstruindo com estilo contemporâneo, metodologia e linguagem atualizadas, narrativas que corriam o risco de não mais serem lidas a não ser por raríssimos especialistas.

Tome-se, por exemplo, o caso da obra magna de Jaime Cortesão, Alexandre de Gusmão e o Tratado de Madri, publicada nos anos 1950 pelo Instituto Rio Branco em nove alentados volumes com milhares de páginas de reprodução de documentos e mapas. Quem hoje em dia se disporia a ler a obra inteira? Mesmo a edição compacta em dois tomos restritos à vida e realizações de Alexandre de Gusmão, editada em 2016 pela Fundação Alexandre de Gusmão (Funag) e a Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, estende-se por mais de oitocentas páginas de letra miúda, recheadas de longas discussões de erudição de interesse relativamente menor para o leitor médio.

Synesio não só torna a história dos limites e a de Alexandre de Gusmão acessíveis e atrativas aos leitores e estudiosos atuais. Ao modernizar e submeter a rigoroso crivo crítico tais narrativas, realiza obra original de mérito indiscutível. Ao discutir as hipóteses mais especulativas a respeito de incidentes da biografia de Gusmão, a autoria pessoal das instruções que orientaram o negociador português do Tratado, concepções intelectuais que teriam inspirado as ações lusitanas, o autor pesa com cuidado os argumentos e chega a conclusões que comandam o consenso pelo realismo, prudência historiográfica e bom senso.

Essas qualidades se destacam, entre outras passagens, nas que relativizam e moderam o entusiasmo raiando ao misticismo de Jaime Cortesão ao tratar de alguns mitos da história colonial como o da célebre “ilha Brasil”, a existência de um território delimitado de um lado pelo oceano Atlântico e no oeste por dois grandes rios que confluiriam para um mítica lagoa no interior das terras sul-americanas. A sobriedade nas avaliações e juízos confere veracidade digna de fé às afirmações amparadas, na falta de documentos conclusivos, por critérios de probabilidade e verossimilhança.

O autor faz bem de chamar ensaio biográfico o estudo da vida e ação de um personagem que viveu na primeira metade dos Setecentos. Faltariam elementos probatórios para tentar reconstruir a respeito da figura de Gusmão aspectos minuciosos da infância, da formação da personalidade na adolescência e juventude, das leituras e experiências definidoras como pretendem às vezes realizar exaustivas biografias de personalidades mais perto de nós. Uma técnica de narrar que funcionou de modo eficaz na construção da obra foi a de alternar o tempo todo a vida de Alexandre de Gusmão e a evolução dos acontecimentos que criariam as oportunidades para suas realizações. Basta passar os olhos pelo índice para perceber a dosagem alternada de matérias de contextualização — o Brasil, Portugal na época — com os capítulos biográficos — começos de vida, diplomata aprendiz, secretário real — voltando à colônia no apogeu do ouro, mas sem fronteiras, a relação do brasílico com sua distante pátria, os problemas do contrabando.

O estudo se revela particularmente útil no exame minucioso do que viria a ser presumivelmente a mais importante negociação territorial da história brasileira, culminando num tratado que de certa forma equivaleria a uma espécie de “escritura de propriedade” do território que forma o Brasil de hoje. Já se disse outras vezes e ressalta bastante deste livro a originalidade múltipla do Tratado de Madri. Num período em que quase todos os tratados de limites se originavam de guerras e refletiam a correlação de forças no campo de batalha, o acordo de 1750 foi exceção, negociado e concluído depois de longos anos de paz entre Portugal e Espanha.

Em contraste com a maioria dos inúmeros acordos limítrofes que o Brasil independente assinaria no futuro, o de Madri se salientou por desenhar a linha completa do mapa do Brasil ao longo de milhares de quilômetros de fronteiras terrestre. Não era o que desejavam os espanhóis, mais uma vez empenhados em somente limitar o ajuste a alguns setores de seu particular interesse, sobretudo na região da permuta da Colônia do Sacramento pelos Sete Povos das Missões do Alto Uruguai. Graças à firme insistência dos negociadores lusos é que se conseguiu definir o que, com ajustes relativamente menores, haveria de ser na prática o perfil territorial do Brasil moderno.

O Tratado de Madri tornou possível outra originalidade da história da formação territorial brasileira: a de que ela se encontrava virtualmente terminada antes da Independência. Em termos gerais, o chamado expansionismo, que foi a rigor muito mais português que brasileiro, alcançava quase seu limite máximo na véspera da Independência. Compare-se com a expansão norte-americana, que tem início a partir da Independência de 1776, para perceber a diferença das implicações que esse fato acarretaria para o relacionamento do país independente — Estados Unidos da América ou Brasil — com seus vizinhos igualmente independentes, México, no exemplo norte-americano, os dez vizinhos brasileiros, com o enorme contraste em termos de herança de ressentimentos históricos.

Vários dos estudiosos do Tratado de Madri fizeram questão de destacar que ele se adiantou a seu tempo na razoabilidade e no equilíbrio das concessões, no seu legado central, que consistiu em reconhecer de direito o que já ocorrera no terreno da prática: a supremacia da expansão luso-brasileira na Amazônia e no centro-oeste da América do Sul em câmbio do prevalecimento dos interesses castelhanos na Região da Bacia do Prata. Talvez se deva, em última instância, a esse espírito avançado em relação à época que o tratado tenha sido tão fugaz na duração formal: pouco mais de dez anos até a anulação pelo Tratado de El Pardo (1761).

Um dos enigmas da história luso-brasileira é entender por que o governo português, principal beneficiário dessa obra-prima de sua diplomacia, se converteu, em poucos anos, num dos mais ativos fatores de sua destruição. Os historiadores, entre eles Jaime Cortesão, alinham, é claro, argumentos e razões, que soam desproporcionalmente fracos para explicar erro tão grave de avaliação. Não é este o lugar para examinar a questão, de que procurei tratar em livro recente. De todo modo, o que conta é que, depois de vicissitudes e revezes sem conta perfeitamente possíveis de evitar, o espírito do Tratado de Madri acabaria por prevalecer. Esta constatação é seguramente a maior demonstração do gênio criador de Alexandre de Gusmão, capaz de sobreviver até à maligna inveja do marquês de Pombal, seu poderoso e overrated rival.

Em vida, Gusmão não alcançou recompensa nem reconhecimento pelo que fizera. Morreu no ostracismo, sem poder, com dificuldades financeiras. A Representação que dirigiu ao rei D. João V em fins de 1749, pouco antes do desaparecimento do monarca, ficou sem resposta. Permaneceria no limbo da história até meados do século XX, quando, graças a Jaime Cortesão, viu finalmente apreciada e valorizada sua contribuição com as seguintes palavras:

“Precursor da geopolítica americana; definidor de novos princípios jurídicos; mestre inexcedível da ciência e da arte diplomática, Alexandre de Gusmão tem direito a figurar na história como um construtor genial da nação brasileira, pela clarividência e firmeza de uma política de unidade geográfica e defesa da soberania, que antecipam, preparam e igualam a do Barão do Rio Branco”.

O primoroso ensaio biográfico que Synesio Sampaio Goes Filho dedica a sua memória reexamina, atualiza e ratifica, ponto por ponto, a justiça e exatidão do julgamento tardio da posteridade.

Rubens Ricupero, São Paulo, 16 de junho de 2019.

'Memórias', de Rubens Ricupero, é um testemunho da história recente do Brasil

 Dica de leitura imperdível para quem ama o Brasil : ""Memórias", do embaixador Rubens Ricupero, lançamento em junho de 2024, Mauricio David

 

 

'Memórias', de Rubens Ricupero, é um testemunho da história recente do Brasil

Quarta-feira, 29 de maio de 2024

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Ex-ministro da Fazenda e diplomata revela os bastidores do Plano Real e os momentos críticos que viveu no curso da história brasileira e mundial por mais de sete décadas

Rubens Ricupero inspirou-se nos cadernos em que sua mãe escreveu durante toda sua vida, as histórias da própria família, de imigrantes italianos, para evocar o bairro do Brás de sua infância, durante o Estado Novo e a Segunda Guerra. Entre suas primeiras lembranças, agosto de 1944, a comemoração no grupo escolar da Libertação de Paris. Agora, quando o Real completa 30 anos, Ricupero descreve – na condição privilegiada de ter sido ministro da Fazenda nesse período –, as pressões políticas e sociais que poderiam ter provocado o fracasso da moeda. Sua narrativa traz um novo dado – o da importância da comunicação com o público – por inúmeras mídias, rádio, televisão, entrevistas, as conversas que ocorreram junto ao homem comum, aos brasileiros nas ruas, com as donas de casa, para explicar o Plano Real, evidenciam que seu êxito se deu por essa profícua comunicação e não apenas pelos aspectos econômicos. São capítulos que se leem num crescendo de interesse e de tensão, com linguagem límpida e fluida, ritmada e bem articulada nas páginas de Memórias, de Rubens Ricupero, lançamento da Editora Unesp.

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“Itamar chamava [Ricupero] de ‘Apóstolo do Real’, por passar um bom tempo a peregrinar pelo país, buscando adesões à causa da estabilidade [...]. Sem ele, muito dificilmente o Real teria obtido o apreço popular com tanta rapidez, a ponto de surpreender os próprios economistas, que esperavam um processo mais gradual na conquista de credibilidade da nova moeda”, afirma Maria Clara R. M. do Prado, em A real história do Real. “Ricupero foi, para muitos brasileiros, a cara do plano, a personificação da ideia da estabilização, a promessa de inflação baixa e de uma vida melhor.”

Em 1961, foi um dos primeiros voluntários a morar em Brasília, ainda em obras, e assistiu de perto a renúncia de Jânio, viveu a angústia do Golpe de 1964, sobreviveu às perseguições do Ato Institucional nº 1. Trabalhou com os chanceleres Afonso Arinos e San Tiago Dantas. Foi pioneiro no estabelecimento das relações culturais com a África, impulsionando o estudo dos temas afro-brasileiros. Quando voltou à cena pública ao fim do regime militar, escreveu, enquanto assessor internacional do presidente-eleito, Tancredo Neves, o Diário de Bordo: a viagem presidencial de Tancredo, um dos livros basilares para a compreensão desse grave período da história do Brasil. Em 1985, foi nomeado subchefe da Casa Civil, permanecendo como conselheiro de Sarney até ser nomeado chefe de missão junto à ONU, em Genebra, e ao GATT, que antecedeu a Organização Mundial de Comércio. Quando embaixador em Washington, Itamar o convocou para assumir o Ministério do Meio Ambiente e da Amazônia Legal, tendo deixado esse posto para substituir FHC como ministro da Fazenda, assumindo a complexa condução da preparação e lançamento do Real. Em suas memórias, Ricupero encara com franqueza o episódio da parabólica, sem autocomiseração ou fuga de responsabilidade.

Chefiou a missão brasileira junto à ONU em Genebra e no Conselho dos Direitos Humanos. Durante nove anos dirigiu a UNCTAD, no esforço de ajudar o desenvolvimento dos países mais pobres do mundo, sobretudo na África. Teve oportunidade de viver a essência da vocação diplomática traduzida na paixão pela diversidade das culturas e na compaixão pelo sofrimento dos pobres e vulneráveis. No recente período obscurantista pelo qual passou o país, defendeu a democracia e a diplomacia brasileira, no momento em que um “antiministro” ameaçava a continuidade dessa tradição. Seus relatos de viagens pelo mundo e pelos livros, enlaçam conhecimentos de literatura, poesia, cinema, o estudo avançado da história antiga e recente, na busca permanente pelo auto aperfeiçoamento. "Memórias” mais dos outros que de si próprio, as evocações revivem as pessoas extraordinárias que conheceu ou o marcaram - João Cabral, San Tiago, Vinícius Maria Werneck, Wladimir Murtinho e Tuni, Merquior, Fábio Konder Comparato, Nilo Scalzo, Dante Moreira Leite - em seu caminho percorrido ao lado de Marisa, numa união de 60 anos, alicerçada por sua fé religiosa.

Sobre o autor – Rubens Ricupero, São Paulo, 1937. Diplomata, professor, ocupou cargos de destaque como embaixador do Brasil em Washington e Roma, secretário-geral da UNCTAD, presidente de diversos organismos do GATT, chefe de delegações e missões junto à ONU, ministro do Meio Ambiente e da Amazônia assim como da Fazenda durante o governo Itamar Franco, titular da Cátedra José Bonifácio na USP, é autor de livros diversos destacando-se A diplomacia na construção do Brasil: 1750-2016, que recebeu o prêmio Senador José Ermírio de Moraes da Academia Brasileira de Letras.  

Título: Memórias
Autor: Rubens Ricupero
Número de páginas: 712
Formato: 15,5 x 22 cm
Preço: R$ 144
ISBN: 978-65-5711-231-1