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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

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sábado, 26 de outubro de 2024

Pequeno Diretório de Autodestruição: Cuba e Venezuela

 Se vcs querem saber de dois exemplos concretos, de 2 paises que foram completamente destruídos pelo socialismo, não precisa ir muito longe: basta olhar para Cuba (70 anos) e para a Venezuela (22 anos); nada a ver com bloqueio ou sanções do imperialismo americano. 

A auto-destruição é própria; daí a emigração maciça, à exaustão. 

Os paises demorarão anos para se recompor, sobretudo no capital humano.

terça-feira, 1 de outubro de 2024

Argentina e Venezuela, à frente da história latino-americana de fracassos - Paulo Roberto de Almeida

Argentina e Venezuela, à frente da história latino-americana de fracassos

 

Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor.

Nota de caráter histórico sobre retrocessos ocorridos na América Latina, com destaque para Argentina e Venezuela, na economia, na educação, na política, no social.

Fazem muitos anos que o Brasil é ultrapassado pela Argentina nos exames do PISA-OCDE, o que para mim constitui talvez o sinal mais eloquente e dramático dos retrocessos do país em décadas, destruindo tudo o que Sarmiento e Alberdi haviam legado de positivo para o único pais no mundo capaz de andar para trás por seus próprios meios e decisões soberanas. 

Mas antes da Argentina, a Venezuela ganha a Palma de Ouro de uma destruição completa de um país pelos seus próprios dirigentes. São coisas surpreendentes na história do mundo: na Argentina foram os peronistas os principais responsáveis, na Venezuela os chavistas, duas tropas organizadas para dois retrocessos exemplares. 

Fenômenos como esses me deixam estupefato sobre como determinados países se deixam conduzir para o abismo. Em ambos, qualquer recuperação, quando começar, vai levar décadas para recompor o país, na Venezuela de forma ainda mais determinada, pela “exportação” de um quarto de sua população, algo extraordinário e devastador, incluindo quadros qualificados, não apenas refugiados econômicos. 

Certos países africanos talvez superem os dois “campeões latino-americanos” em decadência, pois convivem ademais com guerras civis, inter-étnicas e religiosas.

O caso do Brasil é muito diferente, pois se trata apenas de um país lentíssimo em se desenvolver, com pequenos retrocessos apenas pontuais na esfera das políticas econômicas. Em todos os casos registrados sobre esse tipo de processo exasperante em sua lentidão as causas nunca são choques externos; sempre se trata de populismo e incompetência nas políticas públicas. O que mais uma vez remete à má qualidade da educação para explicar a baixa qualidade da governança. 

Pessoas, povos inteiros podem sim se tornar deseducados. Basta piorar na qualidade da educação, o que resulta de má formação de capital humano dedicado ao setor. O Brasil é um exemplo disso, mas num processo geral de incorporação progressiva dos mais pobres (um grande estoque) aos benefícios democratizantes da inserção social. Somos lentos nesse processo, por falta de prioridades claras na casta dos políticos, sempre selecionados entre os piores e mais oportunistas. Mas o que mais me tem impressionado nos últimos tempos é o crescimento da estupidez entre segmentos outrora aparentemente bem educados da população branca majoritária mos EUA: senão como explicar a resiliência e a extensão do trumpismo ignaro? 

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4745, 1 outubro 2024, 2 p.

 

 

 

segunda-feira, 23 de setembro de 2024

ONU adota 'Pacto para o Futuro' com 56 medidas para enfrentar desafios da atualidade (Oposição da Rússia da Venezuela e Nicarágua)

ONU adota 'Pacto para o Futuro' com 56 medidas para enfrentar desafios da atualidade

Críticos alegam que, apesar de conter boas ideias, documento fica aquém das necessidades para mudanças reais.

Em um mundo ameaçado por "riscos catastróficos crescentes" como guerras, mudanças climáticas e pobreza, os líderes dos 193 países da ONU adotaram neste domingo um "Pacto para o Futuro" da Humanidade, apesar da oposição de alguns países como RússiaVenezuela Nicarágua. A iniciativa foi lançada na Cúpula para o Futuro, evento paralelo à Assembleia Geral das Nações Unidas, que se desenrola na próxima semana em Nova York.

— Convoquei esta cúpula porque os desafios do século XXI devem ser resolvidos com soluções do século XXI — firmou o secretário-geral da ONU, António Guterres, após a adoção deste texto com 56 medidas para enfrentar os "maiores desafios do nosso tempo". 

Estes desafios vão desde a reforma do Conselho de Segurança da ONU, a arquitetura financeira global, a manutenção da paz e as mudanças climáticas, até questões mais inovadoras, como a Inteligência Artificial.

Guterres lançou a ideia da chamada Cúpula do Futuro em 2021, mas nos últimos dias não escondeu sua frustração diante das dificuldades de chegar a um consenso para um texto ambicioso, para o qual pediu aos Estados que mostrassem "visão", "coragem " e "ambição".

 

"Acreditamos que existe um caminho para um futuro melhor para toda a Humanidade, incluindo para aqueles que vivem na pobreza e na exclusão", diz o texto, ao qual se opuseram Rússia, Venezuela, Nicarágua, Coreia do Norte e Bielorrússia. 

Apesar da oposição dos países liderados pela Rússia, o pacto e os seus anexos (Pacto Global Digital e Declaração para Gerações Futuras) foram adotados por consenso, mas não são vinculantes.

 

Esta nova "caixa de ferramentas" define novos compromissos, abre "novos caminhos para novas possibilidades e oportunidades”, lembrou Guterres, que prometeu trabalhar "para sua concretização até ao último dia" de seu mandato.

 

— Abrimos a porta, agora todos nós devemos passar por ela, pois não se trata apenas de nos entender, mas de agir. E hoje os desafio a agir — disse Guterres. 

Presente na cúpula, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu, na manhã deste domingo, o maior engajamento dos líderes mundiais em termas da agenda global considerados críticos. Ao discursar na sessão de abertura da Cúpula do Futuro, Lula afirmou que "faltam ambição e ousadia" no cenário atual. 

— Vamos recolocar a ONU no centro do debate econômico mundial — afirmou, reconhecendo que houve alguns avanços, como as negociações para um Pacto Digital. 

— Todos esses avanços serão louváveis e significativos. Mas, ainda assim, nos faltam ambição e ousadia. 

Lula criticou a falta de dinheiro dos países desenvolvidos para mitigar os efeitos do aquecimento global. Disse que os recursos para financiar projetos ambientais são insuficientes e alertou que os chamados Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) podem se transformar em um grande fracasso coletivo.

 

As críticas também foram feitas por outros participantes e observadores. Embora existam algumas "boas ideias", "não é o tipo de documento revolucionário" para reformar o multilateralismo que Guterres gostaria, disse à AFP Richard Gowan, pesquisador do International Crisis Group, um dos mais importantes centros de estudos internacionais e avaliação de riscos. 

A opinião é compartilhada entre diplomatas dos Estados-Membros: "morno", "o menor denominador comum", "decepcionante" são os adjetivos mais frequentes. 

O combate ao aquecimento global foi um dos pontos mais sensíveis da negociação, em particular a "transição" das energias fósseis para as mais limpas. Os países em desenvolvimento exigem compromissos concretos relacionados às instituições financeiras internacionais, para facilitar o acesso preferencial ao financiamento de medidas para enfrentar as mudanças climáticas. 

 

Para a ONG Human Rights Watch, o projeto inclui alguns "compromissos importantes" nessa área, e também acolhe os elementos importantes sobre "direitos humanos". Mas "os líderes mundiais devem demonstrar que estão dispostos a agir para garantir o respeito pelos direitos humanos", insiste Louis Charbonneau, especialista da ONG na ONU. 

— Este é um sinal positivo para o caminho a seguir, mas o verdadeiro trabalho está na implementação, e os líderes políticos devem transformar esta promessa em ação — reagiu o diretor-executivo do Greenpeace Internacional, Mads Christensen.

 

— Este pacto deve realmente oferecer um futuro que as pessoas desejam: livre de combustíveis fósseis e um clima seguro.

 

 

quarta-feira, 18 de setembro de 2024

Por que o Brasil não se junta aos demais países latino-americanos na questão das eleições venezuelanas? O que está faltando?

Declaração da OEA:

 “Ao longo de todo este processo eleitoral, viu-se a aplicação por parte do regime venezuelano de seu esquema repressivo, complementado por ações destinadas a distorcer completamente o resultado eleitoral, fazendo com que esse resultado ficasse à disposição da manipulação mais aberrante. O regime de Maduro zombou de importantes atores da comunidade internacional durante esses anos e, novamente, entrou em um processo eleitoral sem garantias”.

Os governos da Argentina, Costa Rica, Equador, Guatemala, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana e Uruguai, em conjunto, aderiram a esta declaração da Organização dos Estados Americanos (OEA) . 

Por que o Brasil ainda não o fez? 

sexta-feira, 13 de setembro de 2024

Escalada de Maduro na Venezuela pressiona Lula a subir o tom com o ex-aliado - Henrique Lessa (Correio Braziliense)

 Escalada de Maduro na Venezuela pressiona Lula a subir o tom com o ex-aliado

Henrique Lessa
Correio Braziliense - Online | Política
11 de setembro de 2024



Oposição venezuelana organizou protestos em frente à representação brasileira em Caracas. Para especialistas, o Brasil perdeu oportunidade de se posicionar de forma adequada em relação à postura autocrática do regime de Maduro

Com as ameaças de invasão da embaixada da Argentina em Caracas, hoje sob a guarda do , e o aumento da pressão internacional contra Nicolás Maduro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva cada vez mais é pressionado para subir o tom com o regime bolivariano. Também a coalizão opositora ao governo atual protestou, nesta quarta-feira (11/9), em Caracas, em frente à embaixada brasileira no país, para pedir que Lula interceda pelos presos políticos do país.

"Nos mobilizamos, na Venezuela e no mundo, para a sede diplomática do governo brasileiro para solicitar sua mediação na libertação de todos os presos políticos e o fim da repressão", dizia uma das convocações nas redes sociais, atribuída a María Corina Machado, principal líder da oposição. O protesto ocorreu em uma praça do centro da cidade. Os manifestantes encerraram o protesto em frente da representação diplomática brasileira.

Com o recente cerco à embaixada da Argentina, sob responsabilidade do governo venezuelano, a situação do governo Lula fica ainda mais difícil, aponta o embaixador aposentado Paulo Roberto de Almeida. "O Lula tem a sua diplomacia personalista, diminuída sistematicamente desde que ele começou. Convocou uma reunião em maio de 2003, para refazer a Unasul, que foi um fracasso. O Celso Amorim e Lula têm uma postura dúbia em relação à , que se mantém até hoje", criticou o diplomata.



Itamaraty ressalta que o vem se posicionando contra os desmandos de Maduro, e alertam que a postura tem sido a do diálogo, e apontam como prioridade manter a inviolabilidade das instalações da embaixada da Argentina em Caracas. "O que nos cabe é manter a inviolabilidade das instalações e a integridade física de quem está ali dentro", disse ao Correio uma fonte da diplomacia, sob reserva.

Para a professora de relações internacionais da ESPM Denilde Holzhacker, a postura do governo é cautelosa, mas aponta que Lula falha em não cobrar de forma mais enfática a manutenção da democracia no país vizinho. "O governo brasileiro tem usado aí uma estratégia de manter uma certa cautela nas ações com relação a ao , para não ampliar ainda mais o conflito. Mas a gente já poderia ter, por exemplo, sinalizado um apoio maior para a oposição nos órgãos internacionais é ter feito uma nota mais contundente com relação a questão da embaixada", avalia a professora.

Para especialistas ouvidos pelo Correio, o cenário mais provável é a permanência de Maduro no comando da e um agravamento da situação no país vizinho.

"O cenário é a permanência do Maduro e o aumento da repressão criando mais fissuras, mas são impactos na oposição. A oposição deve se enfraquecer, a saída de (Edmundo) González (candidato da oposição) já demonstra uma fragilidade para a manutenção do processo (de oposição). A oposição, ainda que bastante unida e com capacidade de mobilização, com, cada vez mais, apoio internacional, pode gerar mais pressão e repressão", aponta a professora Holzhacker.

Segundo a organização não governamental venezuelana Foro Penal, o país contabiliza quase 1,8 mil prisões políticas - 1.659 desde o final de julho, após o início dos protestos contra os resultados divulgados da eleição dando a vitória a Nicolás Maduro.

O não reconhece a vitória de Maduro nem da oposição, como já fizeram os Estados Unidos e outros países. Mesmo com o interesse da diplomacia brasileira em preservar os canais de comunicação com o governo de Caracas, analistas avaliam que falta ao governo Lula uma postura mais enérgica e alinhada aos compromissos brasileiros com a democracia.

"Está feio, e o vai sair feio. Qualquer coisa que o faça agora em relação ao Maduro, perdeu o tempo, vai ficar feio. Muito tarde e muito pouco", disse o embaixador Paulo Roberto Almeida. Para o diplomata, ninguém espera que  Lula venha a romper as relações com o país vizinho.

segunda-feira, 26 de agosto de 2024

Um transfuga da CNE da Venezuela, Rector Delpino, comprova a fraude da vitória de Maduro

 

«No tengo pruebas de que Maduro haya ganado»: 

Rector Delpino

Desde la clandestinidad, el rector del CNE, Juan Carlos Delpino, se fue lanza en ristre contra los resultados anunciados por Amoroso

domingo, 25 de agosto de 2024

Venezuela: o Brasil no labirinto de Maduro: “Estrada para a salvação”?!?! - Ricardo Seitenfus

Estrada para a salvação

Ricardo Seitenfus

25/08/2024

Um dos episódios mais aviltantes de nossa história diplomática se desenrola atualmente sob o nosso olhar. Não estamos enfrentando um poderoso inimigo, como no caso da Questão Christie no século XIX, mas sim o governo de uma Estado contíguo que nos é simpático e a quem supostamente pretendemos auxiliar. Recebemos como resposta das autoridades venezuelanas unicamente menosprezo e ironia. Nossa diplomacia, até então cantada em prosa e verso, é objeto de chacota internacional.

Abandonamos princípios fundamentais de nosso relacionamento externo e de maneira irresponsável avançamos três sinais perigosos:

1. somos fiadores de acertos cujo respeito independe de nossa vontade (Acordo de Barbados):

2. consideramos assunto doméstico venezuelano o fajuto referendo que pretende anexar grande parte de território pertencente a Guiana (Essequibo);

3. calamos frente a violência contra a oposição e o desrespeito aos Direitos Humanos por parte do governo Maduro.

Fomos longe demais e não vislumbro muito o que fazer a não ser esperar por uma hipotética e improvável reviravolta da posição golpista do governo venezuelano. No entanto, é indispensável extrair lições destes infaustos episódios, para que não repitamos tais desatinos que contrariam nossos interesses e afetam nossa respeitabilidade.

Minha sugestão é simples e objetiva; devemos respeitar de forma inflexível a Doutrina Estrada. Segundo ela, a política exterior dos Estados não deve julgar positiva ou negativamente os governos e as mudanças de governo dos demais países. Tais ações seriam atentatórias a soberania, ao princípio de não intervenção, a solução pacífica das controvérsias e a autodeterminação dos povos.

Elaborada por Genaro Estrada, Ministro das relações exteriores do México (1930), a situação do reconhecimento de governo sugere situação radicalmente distinta ao do reconhecimento de Estado, pois, observando os princípios de soberania e independência, os Estados podem dotar-se livremente de variadas formas governamentais. Novos governos podem conquistar o poder através de quaisquer meios, inclusive os inconstitucionais, sem que tal fato venha ser pertinente para o Direito Internacional. Este exige tão-somente o respeito ao princípio de continuidade dos Estados e o atendimento dos compromissos internacionais.

Tal indiferença é contrariada pela percepção constitutiva. Esta defende o princípio de que um governo resultante de processo inconstitucional (golpe de Estado, revolução, fraude eleitoral) não pode ser reconhecido como representante do Estado, a não ser que tenha sido legitimado por uma assembleia livremente eleita (Doutrina Tobar, Equador, 1907).

A recente prática dos Estados e das organizações internacionais, como a União Europeia (cláusulas búlgara e báltica) e o MERCOSUL (Protocolo de Ushuaia), preocupa-se em atacar a ilegalidade de regimes inconstitucionais a montante, antes que eles se transformem em fatos. Assim, estas organizações possuem em seus estatutos cláusulas democráticas que preveem a suspensão de um país-membro em caso de ruptura do Estado de direito e da ordem constitucional. Estes dispositivos prévios e coletivos afastam a possibilidade de conceder reconhecimento a um governo inconstitucional.

Após vários séculos de prática de reconhecimento de governos, a Inglaterra aderiu, em 1980, à Doutrina Estrada. Ao constatar a inutilidade deste tipo de reconhecimento, Londres considera a origem do novo governo como um assunto interno. Trata-se, portanto, de um fato objetivo que não interroga os terceiros Estados.

Nesta ocasião o Foreign and Commonwealth Office (FCO) divulgou uma nota justificativa, na qual resume os inconvenientes do reconhecimento de governo:

Decidimos deixar de conceder o reconhecimento a governos. O governo britânico reconhece Estados em conformidade com a doutrina internacional comum. Quando ocorre uma mudança inconstitucional de regime num Estado reconhecido, os governos dos outros Estados devem necessariamente considerar que relações manterão com o novo regime e se este se qualifica para ser considerado como o governo do Estado em questão. Muitos dos nossos parceiros e aliados adotam a posição de não reconhecer governos e, portanto, não surge qualquer questão de reconhecimento em tais casos. Pelo contrário, a política seguida por sucessivos governos britânicos foi a de que se deve tomar e anunciar uma decisão “reconhecendo” formalmente o novo governo. Esta prática foi, por vezes, mal interpretada e, não obstante explicações em sentido contrário, o nosso “reconhecimento” foi interpretado como uma aprovação. Por exemplo, em circunstância em que possa haver uma preocupação pública legítima sobre a violação dos Direitos Humanos pelo novo regime, ou sobre a maneira pela qual este chegou ao poder, não tem bastado dizer que o anúncio do “reconhecimento” é simplesmente uma formalidade neutra.

Concluímos então que existem vantagens práticas em seguir a política de muitos outros países de não conceder reconhecimentos a governos. Como eles, continuaremos a decidir, à luz da nossa apreciação, a natureza das nossas relações com regimes que chegam ao poder de forma inconstitucional.

A Doutrina Estrada considera a prática do reconhecimento de governo como ofensiva à soberania dos Estados, além de perigosa à medida que politiza as relações internacionais, que deveriam manter-se no campo estritamente jurídico.

Para os puristas claro está que ela abre amplo leque para o exercício da hipocrisia. Todavia todos sabem que inexiste campo de atividade humana mais fértil à prática da hipocrisia e do engodo que as relações internacionais. Ao contrário do filme de Sam Mendes, Estrada para a perdição, a estratégia da Doutrina Estrada seria a salvação para uma diplomacia que perdeu o rumo.

Professor Universitário, publicou juntamente com José Honório Rodrigues, o livro Uma História Diplomática do Brasil, 1531-1945 (Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1995). É Autor do Direito Internacional Público, Editora Livraria do Advogado, Porto Alegre, quinta edição. Foi Vice-Presidente do Comitê Jurídico Interamericano da OEA.

 

sexta-feira, 23 de agosto de 2024

Governo brasileiro caiu em mais uma de suas armadilhas com posição sobre Venezuela, diz Rubens Barbosa (CNN)

Governo brasileiro caiu em mais uma de suas armadilhas com posição sobre Venezuela, diz ex-embaixador à CNN 

Ex-embaixador Rubens Barbosa diz que o governo brasileiro se encontra em uma posição difícil diante da decisão do Supremo Tribunal da Venezuela de reconhecer a vitória de Maduro 

Da CNN22/08/2024 às 23:03

https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/o-governo-brasileiro-caiu-em-mais-uma-de-sua-armadilhas-diz-ex-embaixador-a-cnn/

O ex-embaixador Rubens Barbosa criticou duramente a posição do governo brasileiro em relação às recentes eleições na Venezuela.

Segundo o diplomata, o Brasil “caiu em mais uma de suas armadilhas” ao afirmar que a Justiça venezuelana seria responsável por solucionar a crise política no país.

Durante sua participação no programa WW da CNN Brasil, Barbosa comentou a decisão do Supremo Tribunal da Venezuela de declarar a vitória do presidente Nicolás Maduro nas últimas eleições.

O ex-embaixador destacou que o presidente Lula (PT) havia anteriormente declarado que era normal haver divergências e que a oposição poderia contestar o resultado da eleição.

Coerência política em xeque

Rubens Barbosa argumentou que o governo brasileiro se encontra agora em uma posição difícil.

“Como ele propôs que ocorresse o que ocorreu e que deveria ser a decisão da Suprema Corte, o que ele vai fazer agora? Vai reconhecer o resultado ou vai ficar calado sem fazer nada?”, questionou o diplomata.

Na opinião do ex-embaixador, o presidente Lula provavelmente não reconhecerá o resultado das eleições venezuelanas por questões de política interna e optará por permanecer em silêncio.

No entanto, Barbosa enfatizou que, para ser coerente com suas declarações anteriores, Lula deveria reconhecer o resultado da eleição.

A situação coloca em evidência os desafios enfrentados pela diplomacia brasileira na região, especialmente em relação a governos controversos como o de Nicolás Maduro.

O posicionamento do Brasil neste caso pode ter implicações significativas para as relações do país com a Venezuela e outros parceiros internacionais.


terça-feira, 20 de agosto de 2024

Venezuela: Luzes e Sombras - Ricardo Seitenfus

 Luzes e sombras

Ricardo Seitenfus

(Recebido: 19/08/2924)

Na atual tragicomédia venezuelana sobressaem-se dois atores. O primeiro, Nicolás Maduro Moros, iluminado sob as luzes da ribalta, brilha intensamente. O segundo, o governo cubano, sabe que seu futuro depende do desenlace da crise, escolheu as sombras dos bastidores e o silencio como tática de guerra.

Embora fraudadas, Maduro sofre derrota eleitoral acachapante cujos resultados incontestes foram tornados públicos pela sociedade civil organizada. Inclusive governos, como o brasileiro, que não reconhecem publicamente os resultados, estão cientes de que a oposição venceu.

Para Maduro a equação é simples. Para conservar o poder ele poupa o seu Conselho Eleitoral e ataca seus adversários. Tanto os internos quantos os externos. Se trata de uma típica manobra diversionista para desviar, com efeitos de cena secundários, a atenção sobre o principal. Até o momento esse espichar da corda deu excelentes resultados e já aparecem vozes preconizando que ninguém deve se intrometer no domínio reservado venezuelano.

O Brasil busca uma saída para a enrascada em que se meteu. Entre idas e vindas caóticas e dos erros de uma falida estratégia, Lula declarou, em 20 de julho passado, que não cabe interferência externa no processo eleitoral de outros países. Apesar de fiador dos Acordos de Barbados, Lula abre uma fresta para o Brasil tentar escapulir do imbróglio.

Contrastando com uma crise exposta em praça pública, com uma esquerda dividida entre democratas e golpistas, e um Maduro malandro e, segundo um ditado gaúcho, mais liso que muçum ensaboado, escondido nos recônditos mais sombrios do cenário deste drama kafkiano, está o ator cubano.

Maduro se beneficia da proteção brasileira e cubana. A nossa decorre de fronteiras comuns, da migração venezuelana e de interesses econômicos. Outra é a natureza do interesse cubano.

A lenta agonia de Hugo Chávez, escondida de todos pelos médicos cubanos, demonstrou aos olhos do mundo a profundidade dos laços entre os dois regimes.

Ao escolher Maduro em 2013 para substituir Chávez, Cuba reforça sua presença na estrutura do Estado bolivariano. Do apoio de Maduro depende a sobrevivência da própria revolução castrista que enviou a Venezuela aproximadamente 30.000 colaboradores. Serviços de inteligência, policial e de segurança, de informática, programas sociais, cooperação militar, fornecimento de petróleo e concessão de empréstimos e a fundo perdido.

Portanto, os que se esforçam em salvar Maduro estão, por ricochete, fornecendo oxigênio e sobrevida a revolução cubana. Sob a bota do casal Ortega-Murillo, não é outro o significado da advertência nicaraguense quando ousa expulsar o embaixador brasileiro de Manágua. Nenhuma mediação será bem-vinda caso resulte na queda de Maduro.

O atual governo brasileiro é resultado de uma frente republicana formada para impedir a recondução de um desqualificado. Os setores que permitiram a vitória de Lula são sensíveis ao respeito das regras democráticas. O que, comprovadamente, não ocorre na Venezuela. Produto da malandragem de alguns, da incompetência de outros e da prepotência de muitos, não há margem de erro. Lula e seu todo-poderoso assessor internacional estão frente ao dilema da quadratura do círculo. Quem viver, verá.

                  

  Ricardo Seitenfus, Doutor em Relações Internacionais pela Universidade de Genebra, autor de vários livros, foi Vice-Presidente da Comissão Jurídica Interamericana, representante da OEA no Haiti (2009-2011) e na Nicarágua (2011-2013).

quarta-feira, 7 de agosto de 2024

Venezuela: a vitória da oposição e a fraude da ditadura chavista - manifesto acadêmico (Inteligência Democrática)

Reconhecer a vitória de González

Carta de teóricos da democracia reconhecendo a vitória da oposição na Venezuela

Alguns dos principais teóricos da democracia assinaram a carta revelando a fraude de Maduro. Entre eles Larry Diamond, Francis Fukuyama 

Leia abaixo a íntegra da carta aberta assinada pelos acadêmicos dedicados ao estudo da democracia.

CARTA ABERTA SOBRE A ELEIÇÃO NA VENEZUELA

“A eleição presidencial na Venezuela em 28 de julho aumentou as preocupações existentes sobre a integridade dos processos democráticos do país, há muito tempo ameaçados. Os resultados oficiais declararam Nicolás Maduro como vencedor, mas as autoridades eleitorais não divulgaram dados detalhados de votação, enquanto observadores independentes e projeções independentes confiáveis contam uma história muito diferente, indicando uma fraude massiva.

Como acadêmicos e pesquisadores dedicados ao estudo da democracia e da integridade eleitoral, estamos profundamente preocupados com as implicações para o futuro da Venezuela, e com a repressão e violência generalizadas após a eleição. Condenamos a resposta brutal das forças de segurança, resultando em muitas mortes e centenas de prisões. Exigimos total transparência e responsabilidade na contagem dos votos.

De acordo com a Tabulação Paralela de Votos AltaVista, uma iniciativa independente da sociedade civil para estimar de forma verificável e cientificamente precisa a contagem nacional de votos, o candidato da oposição Edmundo González recebeu pouco mais de 66% dos votos, enquanto Maduro recebeu apenas 31%. A iniciativa foi validada por acadêmicos internacionalmente renomados e amplamente noticiada na mídia.

Os resultados da AltaVista estão alinhados com registros de urnas eleitorais analisados pela The Associated Press e pelo The Washington Post, bem como com os dados da pesquisa de boca de urna da Edison Research, e contrastam fortemente com o anúncio oficial do Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela, que afirma que Maduro venceu com 51% contra 44% de González. Isso traz questões fundamentais sobre a integridade do processo eleitoral e a legitimidade dos resultados.

As reações de organizações internacionais com vasta experiência em observação eleitoral foram inequívocas. Tanto a Organização dos Estados Americanos (OEA) quanto o Carter Center afirmaram que a eleição foi fraudulenta e não atendeu aos padrões internacionais de integridade eleitoral. O Secretário-Geral da ONU, António Guterres, pediu total transparência em relação ao resultado da eleição e demandou que o regime de Maduro publique os dados detalhados por seções eleitorais, um apelo compartilhado por muitos outros líderes mundiais.

A maioria dos países da região também condenou a falta de transparência, incluindo Chile, Guatemala, Costa Rica, Argentina, Uruguai e Peru, enquanto México, Brasil e Colômbia divulgaram uma declaração oficial pedindo às autoridades venezuelanas que tornem públicos os dados desagregados por mesa de votação.

A democracia na Venezuela está sob cerco há tempo demais, e a recente eleição levou a crise a um ponto crítico. A comunidade internacional deve apoiar o povo da Venezuela, reconhecer a vitória de González como um reflexo de sua verdadeira vontade, e fazer o máximo para promover uma transição pacífica e democrática.”

Quem assina o documento (entre os quais Larry Diamond, Francis Fukuyama e Steven Levitsky):

Alberto Diaz-Cayeros, pesquisador sênior do Centro para a Democracia, o Desenvolvimento e o Estado de Direito, da Universidade Stanford (EUA)

Beatriz Magaloni, professora de ciência política da Universidade Stanford (EUA)

Cristóbal Rovira Kaltwasser, professor da Pontifícia Universidade Católica do Chile

Francis Fukuyama, diretor do programa de mestrado em relações internacionais da Universidade Stanford (EUA)

Jennifer Cyr, professora e diretora da pós-graduação em ciência política da Universidad Torcuato Di Tella (Argentina)

Julieta Suarez-Cao, professora de política da Pontifícia Universidade Católica do Chile

Kati Martonex-diretora e atual integrante do conselho do Comitê de Proteção a Jornalistas

Kenneth Roberts, professor de sistemas de governo na Universidade Cornell (EUA)

Larry Diamond, pesquisador sênior da Instituição Hoover, think tank ligado à Universidade Stanford (EUA)

Laura Gamboa, professora da Universidade Notre Dame (EUA)

Maria Hermínia Tavares, professora emérita de ciência política da USP, a Universidade de São Paulo (Brasil)

Maria Victoria Murillo, diretora do Instituto para Estudos Latino-Americanos e professora de ciência política e relações internacionais na Universidade Columbia (EUA)

Matias Spektor, professor de política e de relações internacionais da Fundação Getulio Vargas (Brasil)

Michael Albertus, professor da Universidade de Chicago (EUA)

Pedro Telles, professor-adjunto da Fundação Getulio Vargas (Brasil) e pesquisador sênior na London School of Economics (Reino Unido)

Simon Cheng Man-kit, ativista honconguês e ex-analista de comércio e investimento do Consulado-Geral do Reino Unido em Hong Kong

Steven Levitsky, professor de sistemas de governo e diretor do  Centro David Rockefeller para Estudos Latino-Americanos da Universidade Harvard (EUA)

Susan Stokes, professora de ciência política da Universidade de Chicago (EUA)

Tulia Falleti, professora de ciência política da Universidade da Pensilvânia (EUA)


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Citação do dia :

“Nós vencemos esta eleição, sem qualquer discussão. Foi uma avalanche eleitoral, cheia de energia e com uma organização cidadã admirável, pacífica, democrática e com resultados irreversíveis. Agora, cabe a todos nós fazer respeitar a voz do povo. Procede-se, de imediato, à proclamação de Edmundo González Urrutia como presidente eleito da República”

Edmundo González e María Corina Machado
em comunicado publicado pela oposição venezuelana, e sobre o qual González terá que prestar esclarecimentos à Suprema Corte do país. Órgãos eleitorais proclamaram a reeleição de Nicolás Maduro, mas a vitória é contestada pela falta de transparência.