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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

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segunda-feira, 4 de setembro de 2023

A armadilha que o Brics pode se tornar - André Sacconato (Fecomércio)

EDITORIAL

A armadilha que o Brics pode se tornar

Economista comenta sobre algumas alterações no bloco ocorridas recentemente que podem ser uma armadilha

Economista comenta sobre algumas alterações no bloco ocorridas recentemente que podem ser uma armadilha 

Por André Sacconato*

FECOMERCIO, 04/09/2023

https://www.fecomercio.com.br/noticia/a-armadilha-que-o-brics-pode-se-tornar

 

O Brics se formou como um bloco com o propósito de encaminhar propostas específicas de interesse comum entre os países signatários, o que é totalmente legítimo quando tratamos de demandas desviadas de conflitos diplomáticos (ou mesmo bélicos).

Desde a formação do bloco, em 2009, muita coisa aconteceu. Dentre tantos eventos, dois foram decisivos para testar os limites do grupo: a intensificação do processo de decoupling entre os Estados Unidos e a China, culminando com o radical Chips Act, e a invasão da Ucrânia pela Rússia. De um dia para o outro, metade dos países-membros do bloco se viu envolvida em choques profundos que dividiram o mundo.

Nesse cenário, o grupo tomou uma configuração perigosa. Para o Brasil, não é interessante tomar um posicionamento no conflito entre as duas maiores potências mundiais, tampouco adotar uma postura pró-Rússia, o que seria desastroso tanto em termos diplomáticos quanto humanitários. Assim, a situação é bastante delicada. Surge então, um grande desafio para a diplomacia brasileira, que busca construir voz mais ativa no grupo: como o Brics pode manter uma postura neutra sem tomar nenhum partido nessa conjuntura?

Cabe ao Brasil afastar do bloco qualquer discussão que envolva conflitos geopolíticos, concentrando-se em temas prioritários (e importantíssimos) para todos os membros do Brics no momento. Temas esses que incluem desenvolvimento humano, combate à pobreza, diminuição de barreiras alfandegárias, enfrentamento das mudanças climáticas e promoção de energias limpas. É imperativo manter a conduta de abordar apenas assuntos de interesse mútuo no âmbito do Brics.

Nesse contexto, a aprovação da entrada de novos países no grupo pode ser arriscada, parafraseando o embaixador Rubens Barbosa, isso poderia expor o Brasil a riscos, como a perda de poder de barganha e influência nas decisões, além de obrigar o País a endossar deliberações com as quais não concorda. Além disso, quanto mais membros integrarem o bloco, maior será a probabilidade de situações desse tipo ocorrerem, especialmente ao lidar com nações próximas à Rússia e à China.

Outro aspecto crítico são as questões econômicas. A facilitação das trocas comerciais entre países utilizando as respectivas moedas é um tópico que merece, de fato, discussão. A redução da dependência do dólar nas transações pode ser benéfica, especialmente para países como o Brasil e a China, que sofrem com as flutuações da moeda norte-americana, impactando os seus negócios bilaterais.

No entanto, a ideia de uma moeda única ainda é distante. Para que essa proposta seja considerada, seria necessário haver uma convergência quase obrigatória em termos de condições macroeconômicas, incluindo níveis de dívida, déficits e modelos cambiais (como a livre conversibilidade das moedas).

Não precisa ser um exímio especialista para perceber que as condições econômicas de Brasil e China são muito discrepantes, principalmente considerando a presença da Rússia no bloco. Qualquer discussão em torno desse assunto seria impraticável.

Em suma, o Brics deve concentrar esforços na promoção do crescimento de seus países-membros, evitando se tornar um bloco antagônico em relação aos Estados Unidos e ao mundo ocidental. Não há vantagem para o Brasil em adotar essa postura. Portanto, a diplomacia nacional deve rejeitar essa possibilidade de forma clara. Apesar dos desafios, essa abordagem é indispensável.


*André Sacconato é economista, consultor da FecomercioSP e integrante do CEEP.
Artigo originalmente publicado no Portal Contábeis em 1º de setembro de 2023.

Saiba mais sobre o Conselho de Economia Empresarial e Política (CEEP).

 

 

terça-feira, 25 de maio de 2021

Sun Tzu e Tucídides: da arte da guerra aos erros da diplomacia - Paulo Roberto de Almeida

 Um possível ensaio reflexivo sobre uma das grandes paranoias contemporâneas, não muito diferente, talvez, da ridícula teoria conspiratória sobre a dominação do mundo e a subtração das soberanias nacionais pelo monstro metafísico do globalismo. A primeira lição da História, inventada pelos gregos, é que os homens não aprendem nada com as lições da História...


Sun Tzu e Tucídides: da arte da guerra aos erros da diplomacia

Paulo Roberto de Almeida 

Uma releitura da obra do mestre chinês em estratégia, que é bem mais uma profunda reflexão sobre as virtudes da diplomacia como meio de evitar um tipo de guerra que foi apenas relatado, com os dotes de verdadeiro estadista pelo genial historiador grego da Antiguidade, não teorizado, e transformado em suposta “armadilha”, por cientistas políticos contaminados pela arrogância míope de um império pretensamente hegemônico. 

Analogias históricas são atraentes, mas geralmente, ou inevitavelmente, falsas. A História não se repete, nem como tragédia, nem como farsa. 

Sun Tzu ainda tem muito a ensinar aos contemporâneos, sobretudo aos que equivocadamente imaginam que o mundo gira em torno de seus interesses nacionais. Esse novo tipo de “geocentrismo” está destinado a falhar, como falharam os infelizes equívocos diplomáticos dos atenienses, no trato com seus aliados, tomados que foram pela conhecida  “hubris” sobre a qual alertavam os mesmos gregos da Antiguidade.

A História pode fornecer lições, mas uma das principais é a de que os homens enfrentam algumas dificuldades para aprender com as lições da História. 

Será que a diplomacia não fez grandes progressos desde a guerra de Troia? As paixões e os interesses continuam a prevalecer sobre a modesta racionalidade da ciência histórica, criada pelos mesmos gregos, da poesia de Homero às cruéis realidades descritas por Heródoto e, finalmente, refletidas de forma ponderada por Tucídides? 

Cabe, portanto, destacar, as virtudes do mestre chinês da Grande Estratégia diplomática, em face das deformações militaristas de aprendizes de pequenas estratégias equivocadas, e portanto condenadas ao fracasso. Os paranoicos da “armadilha” inventada fariam bem em aprender com Sun Tzu, em primeiro lugar sua lição principal: a grande sabedoria está em ganhar a “guerra” sem precisar combater.


Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 25/05/2021