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sábado, 7 de outubro de 2023

1822-2022: Bicentenário da Independência - O reconhecimento internacional da independência do Brasil - Paulo Roberto de Almeida (capítulo de livro)

O mais recente trabalho publicado, embora com data de 2022: 

1527. “O reconhecimento internacional da independência do Brasil”, in: 1822-2022: Bicentenário da Independência. Brasília: Secretaria Nacional de Economia Criativa e Diversidade Cultural da Secretaria Especial de Cultura do Ministério do Turismo, 2022, p. 602-620; ISBN: 978-65-00-82564-0; disponível na Biblioteca Digital da Câmara dos Deputados (link: https://bd.camara.leg.br/bd/handle/bdcamara/41362) e na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/107425385/4288_O_reconhecimento_internacional_da_independência_do_Brasil_2022_); divulgado no blog Diplomatizzando (30/09/2023; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/09/o-reconhecimento-internacional-da.html). Relação de Originais n. 4288.



O reconhecimento internacional da independência do Brasil

  

Paulo Roberto de Almeida

Diplomata, professor

(www.pralmeida.org; diplomatizzando.blogspot.com)

Colaboração a obra digital sobre o bicentenário, coordenado por José Theodoro M. Menck.

“O reconhecimento internacional da independência do Brasil”, Brasília, 15 dezembro 2022, 13 p. Publicado in: 1822-2022: Bicentenário da Independência, 1822-2022. Brasília: Secretaria Nacional de Economia Criativa e Diversidade Cultural da Secretaria Especial de Cultura do Ministério do Turismo, 2022, p. 602-620; ISBN: 978-65-00-82564-0;disponível na Biblioteca Digital da Câmara dos Deputados (link: https://bd.camara.leg.br/bd/handle/bdcamara/41362). 

Relação de originais n. 4288; Relação de Publicados n. 1527. 

Postado na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/107425385/4288_O_reconhecimento_internacional_da_independência_do_Brasil_2022_); divulgado no blog Diplomatizzando (30/09/2023; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/09/o-reconhecimento-internacional-da.html).

 

 

A afirmação autônoma do Brasil no cenário internacional teve início ainda antes da independência, mais exatamente em agosto de 1822, quando o príncipe regente D. Pedro autoriza a divulgação de um manifesto às nações amigos, redigido principalmente por seu conselheiro brasileiro em questões diplomáticas, José Bonifácio de Andrada e Silva (1763-1838). O processo, na verdade, teve início quando do “Dia do Fico” (9 de janeiro de 1822), a declaração pela qual D. Pedro se recusa a acatar as ordens das Cortes ordenando-o voltar a Portugal. O príncipe regente nomeia um novo gabinete, com José Bonifácio assumindo a pasta dos Negócios Estrangeiros. A independência já estava praticamente encomendada, sobretudo a partir do “manifesto aos governos e às nações amigas”, de 6 de agosto desse ano, pelo qual D. Pedro os convida a “continuarem com o Reino do Brasil as mesmas relações de mútuo interesse e amizade”, que já mantinham com a Corte instalada no Rio de Janeiro desde 1808. 

Mesmo tendo a maior parte do corpo diplomático saído do Brasil depois da partida de D. João VI, a figura de D. Pedro avulta ao mundo nessa declaração, pois que nela ele afirmava que o Brasil estava pronto a trocar ministros e agentes diplomáticos e que os portos brasileiros estavam abertos a “todas as nações amigas e pacíficas”. D. Pedro aprova a ideia de José Bonifácio de enviar “encarregados de negócios do Brasil” para Londres – Felisberto Caldeira Brant Pontes (1772-1842), já para negociar a soberania do Reino –, assim como para outras capitais: Paris, Viena e Estados Alemães, ademais de Buenos Aires. Já tendo o governo português reconhecido, ainda em 1821, no Rio de Janeiro, a independência da Argentina e do Chile, Buenos Aires, no final de 1822, declara reconhecer o escudo de armas e a bandeira do Império brasileiro (não mais do que isso), mesmo se, em agosto do ano seguinte, o governo argentino convida o Império a desistir da posse da Província Cisplatina.

Nesse manifesto aos governos e nações amigas, de agosto de 1822, que constitui o principal documento que ele preparou como responsável pelos negócios estrangeiros durante a gestão de D. Pedro como príncipe regente do reino do Brasil, ainda unido ao de Portugal, José Bonifácio deixou bastante claro sobre quais seriam as principais diretrizes que deveriam guiar a ação externa da quase nação independente. Em vista da viagem de D. Pedro a São Paulo, o manifesto foi enviado por circular ao corpo diplomático e consular em 14 de agosto de 1822, sob a regência de D. Leopoldina. Dois dias antes, em 12 de agosto, numa clara ruptura para com a diplomacia portuguesa, então dominada pelas tentativas de nova colonização do Brasil, tinham sido designados representantes brasileiros para a Inglaterra, França, Estados alemães e para os Estados Unidos. Mas quais eram os principais pontos do manifesto que inaugurou a presença independente do Brasil no mundo? 

1. manutenção das relações políticas e comerciais, sem dar prioridade a qualquer nação;

2. continuidade das relações estabelecidas desde a vinda da família real;

3. adoção plena do liberalismo comercial;

4. respeito mútuo ou reciprocidade no trato internacional;

5. abertura do país à imigração;

6. facilidade de entrada para a vinda de sábios, artistas e empresários;

7. abertura do país para investimentos estrangeiros. 

 

Depois do 7 de setembro de 1822, mas sobretudo depois de sua coroação, ao estilo do Antigo Regime, em 1º de dezembro, D. Pedro se converte, efetivamente em construtor do Estado brasileiro, mas a unidade da nação estava longe de ser assegurada, a começar pelo desafio português em diversas províncias, em especial na Bahia. Ele teve de atuar não apenas na dimensão política e diplomática – em constante contato com seu pai, em Lisboa, e atento às manobras da Santa Aliança, representada pela pátria da imperatriz Leopoldina, a Áustria, e por Metternich especialmente, mas também pela França dos Bourbons de novo no trono, personificada no vaidoso Chateaubriand, o espírito liberal da Revolução que se havia convertido num reacionário extremado sob a Restauração –, mas também na dimensão militar, na qual revelou seus dotes de comandante no enfrentamento de tropas portuguesas, em especial na Bahia.

A missão de Caldeira Brant em Londres foi muito facilitada por Hipólito da Costa, que pode ser considerado, a mais de um título, o primeiro estadista do Brasil, a despeito de ter vivido parcos anos, em sua infância e na adolescência, em sua pátria. Estabelecido na Inglaterra desde 1805 – depois de ter sido preso pela polícia política portuguesa e entregue, por maçonaria, à Inquisição, que o interrogou durante três anos de cárcere –, Hipólito deu início ao primeiro jornal brasileiro independente, o Correio Braziliense, que editou sozinho em Londres desde a transmigração da corte portuguesa para o Brasil, em 1808, até que fosse confirmada a independência e a separação do, até então, Reino Unido, em setembro de 1822. Nomeado cônsul do Brasil em Londres, por José Bonifácio, Hipólito poderia ter sido um grande diplomata junto à Corte de St. James, e um possível ministro de qualquer gabinete imperial brasileiro, tivesse ele sobrevivido além de seus 49 anos, em setembro de 1823.

Ele e seu amigo José Bonifácio eram duas almas gêmeas em muitos dos projetos para a construção de uma nação próspera e desenvolvida, como possível sede de um grande império luso-brasileiro unificado. A mais importante delas era, evidentemente, o fim do tráfico e da escravidão, no que ambos foram vencidos pelos proprietários de terras e pelos traficantes de escravos que logo apoiaram o Príncipe Regente Pedro na resistência às disposições das Cortes de Lisboa no sentido de fazer o Brasil retornar ao antigo status de reino tutelado pela metrópole. Com José Bonifácio, Hipólito permaneceu um súdito fiel do reino português e um apoiador de um grande império dual, com sede no Rio de Janeiro, até quando pode, ou seja, os primeiros meses de 1822. Mas, com as disposições francamente desfavoráveis ao Brasil tomadas pelas Cortes, Hipólito começou a se render à independência, o que só se deu definitivamente em julho desse ano.

Em dezembro de 1822, quando já considerava praticamente concluída a sua missão iniciada 14 anos antes, Hipólito volta ao tema do “Império do Brasil”, que tinha sido objeto de um longo comentário ao início do empreendimento, em 1808, quando, justamente, a sede do Império se deslocava ao Brasil: 

Cumpriram-se enfim os prognósticos, e alcançaram as Cortes de Portugal realizar a desmembração da antiga monarquia portuguesa, estimulando o Brasil, apesar dos desejos de união daqueles povos, a declarar a sua total independência e constituir-se em nação separada de Portugal; porque não era possível que sofressem por mais tempo ser tranquilos espectadores da guerra civil com que se intentava incendiar o Brasil, debaixo do aparente e enganoso nome de confraternidade e das palavras de iguais direitos, e com os fatos em oposição tendentes a reduzir o Brasil a colônia do Portugal. 

Clamava todo o Brasil que não queria perder a sua dignidade de Reino, posto que desejasse continuar sua união com Portugal; mas as Cortes, com a mais contraditória hipocrisia, pretendiam crer que o povo do Brasil não desejava conservar ao seu país a categoria de Reino e, ao mesmo tempo, que só tendia a fazer-se independente; e nesse sentido continuaram as provocações, e ordem de prisões, contra os cidadãos mais conspícuos do Brasil, não excetuando sequer de seus fulminantes decretos o mesmo Príncipe Regente, cujos serviços na causa da união mereciam os mais cordiais agradecimentos dos Portugueses. 

Chegou por fim o momento em que o povo Brasileiro, desesperado pelo comportamento das Cortes, que não prometia melhora nem oferecia sinais de arrependimento, conheceu que a sua prosperidade, a sua segurança, e até a sua existência como Nação, só lhe podia provir da completa separação de Portugal...

Temos, pois, o Brasil erigido em novo Império e o seu monarca com o título de imperador; e sem nos demorarmos sobre a fórmula escolhida para designar o monarca, passaremos a considerar os efeitos reais da independência do Império do Brasil, tanto no interior como no exterior. (Correio Braziliense, n. 175, vol. XXIX, dezembro de 1822, p. 593-8)

 

Nesse mesmo número final do Correio, Hipólito registra a necessidade de o Brasil constituir-se uma poderosa força naval para defender-se de ataques externos: 

Uma invasão ao Brasil, não dizemos já pelos Portugueses, mas ainda por qualquer nação poderosa, é perigo meramente imaginário: mas é não só possível, mas muito factível, que por mais possante que possa ser o Império do Brasil, se não tiver uma esquadra proporcional à sua extensão de costas e multiplicidade de portos, seja insultado em suas praias até por um bando de corsários, que deseje roubar-lhe suas riquezas; e muito mais é de recear, nesse caso, um ataque de parte de alguma nação, que possua forças marítimas. 

(...)

Fora inútil ao Brasil condecorar-se com o título de Império, e ver-se ao mesmo tempo sujeito a serem suas costas varridas por duas fragatas velhas de Portugal; e seria descuido injustificável declarar-se nação independente, e não cuidar em adquirir os meios de sustentar essa independência; e os meios não são outros senão a criação de poderosa força naval. Sem esta não haverá segurança, nem comércio livre, nem riquezas, nem caráter nacional, nem propriedade individual.

 

A tarefa de fazer o Brasil ser reconhecido como nação independente deve-se, de fato, ou pelo menos no início, a José Bonifácio, que foi o arquiteto que mais contribuiu para a emergência do próprio Estado brasileiro, seguindo escrupulosamente seus conceitos de unidade nacional e de defesa de uma ordem política estável, o que eventualmente o colocou em choque com outros independentistas partidários da república e de uma ordem política federalista, como os revolucionários pernambucanos de 1817 e os de 1824. Opôs-se aos ímpetos republicanos de muitos partidários da independência porque pressentiu que esse regime seria incapaz de preservar a unidade nacional. Desde quando foi nomeado à frente dos negócios do Reino e dos Estrangeiros, depois da partida de D. João VI, José Bonifácio enviou um representante político para Buenos Aires, a título de funções consulares, mas com instruções para propor a criação de uma confederação com as Províncias do Prata. 

José Bonifácio instruiu o seu representante a convencer os dirigentes de Buenos Aires sobre a utilidade de uma Confederação ou Tratado ofensivo e defensivo com o Brasil, para se oporem, com os outros governos da América espanhola, aos cerebrinos manejos da Política Europeia. Enquanto José Bonifacio esteve à frente da diplomacia brasileira, ele se ocupou de promover o que chamava de “Sistema Americano”, ou seja, uma política externa decididamente americana, mas que só retornaria novamente a partir das Regências, depois da abdicação do primeiro imperador. Premido pela reação dos autocratas portugueses contra o novo sistema de monarquia constitucional, o Imperador se ocupou bem mais dos assuntos portugueses do que dos assuntos domésticos ou os da diplomacia brasileira. 

Mas, as iniciativas que tinham sido tomadas por José Bonifácio para criar uma primeira possível aliança com os argentinos se chocavam, desde o início da presença da família real no Brasil, com a ocupação do que seria o futuro Uruguai, primeiro por tropas portuguesas, depois brasileiras. A guerra da Cisplatina foi um erro português, em seguida “brasileiro”, o que tisnou a imagem do novo Império do Brasil, uma designação que já denotava sombrias veleidades expansionistas, o que foi ainda aprofundado, anos depois, pelas contínuas intervenções nas constantes lutas entre blancos e colorados uruguaios, levando a um primeiro confronto com o ditador argentino Rosas, desembocando, mais adiante, na “maldita guerra” provocada pelo ditador paraguaio Solano Lopez contra um gigante pouco preparado para o conflito.

No caso dos Estados Unidos, José Bonifácio tomou a iniciativa de propor acordo de cooperação e defesa ainda no início de 1822, portanto, um ano e meio antes da conhecida declaração do Presidente Monroe ao Congresso norte-americano. Ele também foi o primeiro chanceler brasileiro – a rigor, o último do Reino Unido ao de Portugal, sob a regência do príncipe D. Pedro – preocupado com a defesa da soberania e a implementação de uma diplomacia eficiente como o melhor instrumento para a política externa da nação emergente. Com Bonifácio, e a despeito do problema da Cisplatina, as prioridades brasileiras passam a ser a aproximação cooperativa com Buenos Aires, a preservação da autonomia decisória do Estado brasileiro em relação às potências hegemônicas, a estruturação de forças armadas eficientes na defesa da soberania, a proteção à indústria nacional. Em sua busca pela construção da unidade territorial nacional, o ministro estabeleceu projeto para a Nação ainda hoje atual pela amplitude e profundidade das medidas sugeridas: integração nacional das comunidades indígena e africana, com a “civilização” dos índios e o fim da escravidão; reforma agrária; reforma do ensino; desenvolvimento econômico autônomo, com a diversificação das exportações brasileiras, a preservação ambiental e o uso racional dos recursos naturais. Ainda antes de proclamada a independência, ele providencia o envio de um representante do Brasil junto ao governo de Buenos Aires, com o qual as relações seriam as mais difíceis, durante os primeiros anos do novo Império.

Uma vez obtida a independência, sua postura era a de que o reconhecimento do Império seria obtido mais cedo ou mais tarde, não cabendo ao Brasil fazer concessões às monarquias europeias, como ressaltado pelo diplomata historiador João Alfredo dos Anjos: 

O Governo brasileiro sob Bonifácio não estava disposto a oferecer compensações ou aceitar compromissos que representassem prejuízo direto ou indireto para o Brasil, a exemplo do que ocorrera com os Tratados de 1810, firmados por Portugal com a Grã-Bretanha. O Chanceler contava utilizar o interesse econômico das nações europeias no mercado brasileiro, especialmente da Grã-Bretanha, da França e dos Estados Unidos, como instrumento de barganha na defesa dos interesses brasileiros e não como um dado da realidade com o qual ao Governo só restava conformar-se. Por isso, durante sua gestão, determinou a Felisberto Caldeira Brant, negociador brasileiro em Londres, que fizesse ver à Grã-Bretanha que o Brasil: (1) era um país independente e por isso assumiria seu lugar no cenário internacional, sem depender do “reconhecimento”, embora ele fosse importante; (2) que os portos brasileiros seriam fechados a todos os Estados que não reconhecessem a independência e soberania do Brasil unido do Prata ao Amazonas. Ademais, Bonifácio não autorizou Caldeira Brant a contrair empréstimo na praça londrina, empréstimo defendido insistentemente pelo representante brasileiro. Ao contrário, buscou saída interna, com emissão de letras do Tesouro no valor de 400:000$000, além da organização do fundo com Donativos para as Urgências do Estado. (in: José Bonifácio, primeiro Chanceler do Brasil. Brasília: Funag, 2013, p. 91) 

 

Pode-se dizer que José Bonifácio foi pioneiro no reconhecimento da importância de uma política externa americanista, quando até então as relações exteriores do Reino Unido ainda se guiavam pelos negócios europeus de Portugal, como ressalta ainda o mesmo historiador: 

A prioridade no estabelecimento de relações de coordenação política com Buenos Aires, que hoje pode parecer natural, não o era no Brasil do início do século XIX. Ao contrário, as Américas hispânica e portuguesa tinham histórico de conflitos e intrigas políticas, exemplificados na questão da Cisplatina e nos enredos do carlotismo, que pretendeu elevar Carlota Joaquina ao trono do Vice-Reino do Prata. Com Bonifácio, o Brasil saía do paradigma da competição entre Portugal e Espanha e dava o primeiro passo em direção a uma proposta de relação cooperativa com o Prata. (Idem, p. 100) 

 

Como Hipólito, e como tantos outros abolicionistas, José Bonifácio foi derrotado pela coalizão de mercadores de escravos e de grandes proprietários de terras. Bonifácio foi, aliás, abandonado pelo próprio Imperador, que se aproveitou do recrudescer das turbulências políticas na Assembleia Constituinte e das divisões políticas entre os maçons para decretar o encerramento do breve exercício de ordenamento constitucional, “cassar” os seus membros e exilar ou prender toda a família dos Andradas. Bonifácio foi mais uma vez para a Europa, e só retornou ao Brasil para ser preceptor, por breve tempo, do menino Pedro de Alcântara, mas já sem condições de influenciar a política no período regencial. Retirou-se à ilha de Paquetá, e ali dedicou-se novamente aos estudos e aos cuidados botânicos.

Durante seu exilio na França, não deixou de acompanhar os acontecimentos políticos do Brasil, em especial as relações exteriores da nova nação independente, formulando, desde Paris, com a Assembleia Geral funcionando, um alerta para o monitoramento da diplomacia, como ainda ressalta em outros trabalho o mesmo diplomata historiador: 

Se pertence ao imperador fazer, como fez, tratados com Portugal, Inglaterra e França, pertence às Câmaras tomar contas ao Ministério [dos Negócios Estrangeiros] destas transações diplomáticas; pesar a utilidade ou os danos que fazem ou não ao Brasil; saber as despesas que se fizeram nas embaixadas e missões extraordinárias. (João Alfredo dos Anjos, “Os 200 anos do retorno de José Bonifácio ao Brasil”, posfácio a José Theodoro Mascarenhas. Bonifácio de Andrada, patriarca da independência. Brasília: Câmara dos Deputados, 2019, p. 219-246, cf. p. 232) 

 

Esse autor do estudo sobre o papel de José Bonifácio enquanto chanceler, durante um curto espaço de tempo, ressalta suas realizações à frente da pasta, que não havia ainda ganho total autonomia de ação em relação aos outros grandes temas da organização do novo Estado: 

Além de organizar e tornar autônoma a Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e dotar o Brasil de seus primeiros representantes diplomáticos, Bonifácio estabeleceu em suas instruções e correspondência diplomática as diretrizes de uma política externa audaciosa e inovadora para o Brasil. (idem, p. 242)

 

Seu exílio, após os tormentosos episódios dos trabalhos da Constituinte e o fechamento desta sob as ordens do imperador, coincidiu com uma infeliz inversão da diplomacia brasileira, sobretudo no sentido da aceitação de acordos comerciais e de empréstimos lesivos aos interesses do Brasil, no contexto das negociações para o reconhecimento da independência do Império, postura que seria objeto de muitas críticas na Assembleia Geral. Tem início, então, o processo diplomático formal de obtenção do reconhecimento da independência do novo Estado, o que se dá através do envio de representantes oficiais aos principais países com os quais o Brasil português mantinha relações antes da separação e que eram estrategicamente relevantes para as relações internacionais do Brasil. 

Esses países eram, pela ordem de importância econômica, comercial e política então estabelecida por D. Pedro I e seus diversos chanceleres a partir de 1823, os seguintes: Grã̃-Bretanha, França, a Santa Sé, Espanha, Áustria, estados da Alemanha, Estados Unidos, Argentina e, sobretudo, Portugal. Por acaso essa é a ordem estabelecida por instrução do presidente Epitácio Pessoa ao Itamaraty – quando da celebração do primeiro centenário da autonomia nacional, em 1922 – no sentido de se reunir a documentação diplomática relativa ao reconhecimento da independência, o que foi feito mediante a elaboração do Arquivo Diplomático da Independência. Sua primeira publicação foi feita em seis volumes pela Tipografia Nacional, entre 1922 e 1925, tendo sido reproduzida fac-similarmente no ano do Sesquicentenário, em 1972, e novamente em 2018, por iniciativa do próprio Itamaraty, como obra inaugural da coleção do Bicentenário da Fundação Alexandre de Gusmão. 

Na verdade, os únicos reconhecimentos que interessavam ao Brasil, nessa fase, eram, segundo Pandiá Calógeras, os seguintes: Portugal, pela legitimação do novo Estado e a cessação da situação de beligerância; Grã-Bretanha, pelo seu poderio naval, pela capacidade diplomática e como fonte dos financiamentos absolutamente necessários; Áustria e França, cuja política favorável às independências latino-americanas enfraqueciam os intentos agressivos da Rússia e da própria Espanha; Roma, pelas exigências da religião do Estado, reconhecida constitucionalmente; e as nações platinas, “pela contiguidade e pelas perturbações de ordem fronteiriça; (...) As demais nações, neste assunto, não passavam de trocos miúdos” (J. Pandiá Calógeras, A Política Exterior do Império, vol. II: O Primeiro Reinado; edição fac-similar; Brasília: Câmara dos Deputados, 1989, p. 386).

De fato, a primeira missão, como já referido, foi feita sob iniciativa de José Bonifácio em direção da Grã-Bretanha, comissionando Caldeira Brant a obter o reconhecimento da “autonomia” do governo de D. Pedro como regente ainda antes da independência formal. Ela prolongou-se no tempo, pois o governo inglês precisava explorar, em seu interesse, todos os aspectos da tripla relação com Portugal e o Reino Unido do Brasil no tocante a um dos seus principais interesses nessa relação triangular: a extinção efetiva do tráfico negreiro, segundo compromissos já assumidos por Portugal no quadro do Congresso de Viena, em 1815, e posteriormente, em 1817, no plano bilateral. Nenhuma das promessas avançou no sentido desejado pelos dirigentes britânicos, e Caldeira Brant retornou ao Brasil em agosto de 1823, deixando a Hipólito da Costa o trabalho de continuar a zelar pelos interesses do país e de manter oficiosamente com o governo britânico entendimentos em torno dos interesses brasileiros nessa relação duplamente estratégica, tanto com respeito a Portugal, quanto na direção do Brasil. Mas Hipólito faleceu repentinamente pouco depois, tendo sido substituído por Gameiro, que tampouco logrou sucesso na empreitada de se obter um rápido reconhecimento. 

Os dois primeiros volumes da obra Arquivo Diplomático da Independência tratam extensivamente dessas negociações, segundo uma seleção de documentos feita pelo jurista Hildebrando Accioly. Uma exploração mais detalhada das delicadas triplas negociações foi feita pelo diplomata Caio de Freitas, que no seu livro George Canning e o Brasil(Brasiliana, 1958) relata a segunda gestão do chanceler britânico (1822-1827), quem designou o diplomata Charles Stuart para sua missão no Rio de Janeiro. Os pontos centrais da demanda inglesa consistiam na já esperada insistência quanto à extinção do tráfico negreiro, assim como na continuidade dos tratados desiguais de 1810, especialmente em seus aspectos comerciais, nos quais obteve sucesso parcial na primeira e praticamente total na segunda. O outro lado das negociações envolvia o interesse de Portugal em transferir para o Brasil uma pesada dívida financeira contraída junto a banqueiros ingleses ainda na fase dos reinos unidos e também pagamentos devidos a D. João VI por suas propriedades no Brasil. 

Tais assuntos se arrastaram penosamente nos dois anos seguintes, até que Stuart logrou obter dos dois Estados a assinatura do tratado de 1825 consagrando o reconhecimento formal, por Portugal, da independência do Brasil, assumindo este os ônus financeiros e diplomáticos tão criticados pela Assembleia Geral quando esta começou a funcionar. As negociações diretas entre representantes diplomáticos do Brasil e de Portugal foram objeto do sexto e último volume do Arquivo Diplomático da Independência, no qual o jovem diplomata Heitor Lira seguiu detalhadamente os passos da missão de Luiz Paulino e Rio Maior em Lisboa na difícil missão de destravar os inúmeros vínculos que diversos súditos da periclitante monarquia portuguesa ainda possuíam no Brasil. Curiosamente, Heitor Lyra era o único sobrevivente da equipe de 1922 que tinha elaborado a obra original do Arquivo Diplomático da Independência, tendo sido requisitado para introduzir sua reedição fac-similar em 1972, quando das comemorações do sesquicentenário.

No intervalo, o Brasil obteve sucesso praticamente total por meio da missão de José Silvestre Rebelo em Washington, em 1824, pelo menos na questão do reconhecimento formal da independência junto aos Estados Unidos e no da construção de navios para a marinha brasileira, mas menos na intenção inicial de José Bonifácio no sentido de se lograr uma espécie de pacto defensivo entre os dois países contra tentativas de recolonização europeia dos novos Estados independentes das Américas, por iniciativa da Santa Aliança. Tal medida foi feita unilateralmente pelo presidente Monroe, por meio de sua mensagem ao Congresso em 1823, pela qual a jovem república americana declarava sua oposição a qualquer tentativa estrangeira de imissão nos assuntos hemisféricos, decisão provavelmente acertada com a Grã-Bretanha, que também se opunha a tais intrusões de seus vizinhos continentais, mas motivada por interesses basicamente comerciais. 

James Monroe, que tinha sido Secretário de Estado sob John Quincy Adams e nessa condição despachado alguns enviados à América do Sul, deu um passo mais ousado em 1823, ao expressar, em mensagem ao Congresso, sua opinião – na verdade plenamente apoiado pela Grã-Bretanha – de que não convinham aos Estados Unidos novas intervenções de potências europeias no hemisfério ocidental. Estava assim aberto o caminho para o reconhecimento dos novos Estados saídos da dominação espanhola nas Américas, processo rapidamente obtido para o Brasil, em 1824, tão pronto consolidada a autoridade de D. Pedro sob o Império do Brasil e imediatamente após o pronto acolhimento por Washington do primeiro Encarregado de Negócios do Brasil, José Silvestre Rebello. Mas as relações com os Estados Unidos não tiveram o desenvolvimento esperado pelo Brasil muito em função do comportamento arrogante do seu representante no Rio de Janeiro, o antigo cônsul na era portuguesa, Condy Raguet, que continuou como um turbulento encarregado de negócios na fase independente.

As relações com as autoridades de Buenos Aires tampouco foram isentas de atritos, a despeito do seu reconhecimento implícito da independência brasileira, não formalizada pelo envio de um plenipotenciário ao Rio de Janeiro, justamente em função das pendências relativas à Cisplatina, antes ocupada por tropas portuguesas e depois brasileiras, e anexada formalmente ao Brasil pela Constituição de 1824. Em 1825, Buenos Aires fornece todo o apoio à incursão do uruguaio Lavalleja contra as tropas brasileiras e a relação se deteriora gravemente numa guerra aberta, que só seria resolvida por nova intermediação britânica, através do armistício de 1828, prevendo a independência da República Oriental do Uruguai. Mas se esta tinha a missão de ser “um algodão entre dois cristais” – Brasil e Argentina –, no dizer de Lord Ponsonby, o diplomata britânico envolvido na contenda, esse amortecedor foi constantemente instável, pelos anos e décadas seguintes, dado o constante envolvimento dos dois grandes vizinhos do Prata nos assuntos internos do pequeno país, dadas as contendas internas entre blancos e colorados, continuadas até a intromissão do paraguaio Solano Lopez, provocando a “maldita guerra” em função da qual se proclamou uma inédita “aliança tripartite” entre os três países na longa guerra travada contra aquele que foi denominado de “Napoleão do Prata”. 

As relações com a Áustria tampouco deveriam ser isentas de conflitos, dados os vínculos familiares estabelecidos entre os Habsburgos e os Braganças – formalizado no primeiro casamento de D. Pedro com Leopoldina –, mas o reconhecimento tardou dada a complexidade dos interesses da Santa Aliança, integrada inclusive pela França da Restauração, nos assuntos da península ibérica, marcada por uma nova guerra civil na Espanha, assim como pela tribulações causadas pela sucessão portuguesa de D. João VI, disputada por D. Pedro (que seria o sucessor legítimo, como D. Pedro IV) e pelo seu irmão D. Miguel, apoiado pelas forças reacionárias da Europa. O “eterno” chanceler austríaco Metternich (cuja gestão se estendeu desde o Congresso de Viena até as revoluções de 1848) chegou a manter correspondência com D. Pedro I, e os dois travaram uma legítima “guerra diplomática” – na expressão de um grande diplomata historiador, Sérgio Corrêa da Costa –, que finalmente se dissolveu no reconhecimento quase geral das monarquias europeias ao jovem Império sul-americano, depois do tratado formal entre Portugal e Brasil em 1825.

Um reconhecimento que tardou em demasia foi justamente o da Espanha, finalmente realizado apenas em 1834, depois da morte dos dois soberanos, Fernando VII da Espanha e D. Pedro de Portugal, depois do seu retorno ao país natal, em 1831, e de sua luta ganha contra o irmão para assegurar o trono português em favor de sua filha, D. Maria da Gloria. As primeiras tentativas para se lograr esse reconhecimento foram feitas pelo futuro Barão da Ponte Ribeiro, enviado como cônsul a Madri em 1825, mas que jamais recebeu o exequator da chancelaria espanhola. À diferença dos procedimentos formais observados nos casos das independências das demais colônias espanholas das Américas, ao cabo de uma década e meia de conflitos políticos e de tentativas diplomáticas ou militares de reconquista, a Espanha não tinha fortes razões para adotar qualquer iniciativa diplomática para o reconhecimento da independência do Brasil. No caso do Brasil, o principal fator obstrutor da obtenção de um rápido reconhecimento de sua independência pelo Reino da Espanha – a despeito de alianças matrimoniais entre as duas casas reinantes – foi a invasão portuguesa da Banda Oriental, posteriormente incorporada ao Império como “Província Cisplatina”, objeto de uma primeira guerra na região do Prata entre os dois grandes Estados em formação.

Segundo informou Duarte da Ponte Ribeiro em 3 de abril de 1827 ao ministro brasileiro dos Negócios Estrangeiros, Antonio Luiz Pereira da Cunha (Visconde de Inhambupe), “concluo que este Governo quer ganhar tempo até ver o resultado da guerra com Buenos Aires (que julgam ofensa própria), e a face que tomam os negócios de Portugal [onde D. Pedro poderia assumir como rei, ou então, seu irmão, D. Miguel, de tendências absolutistas]. Mostram o bem que desejam ao Brasil e à S.M.I. [ou seja, D. Pedro], publicando revezes e fazendo continuamente circular notícias desagradáveis e indecorosas. A questão sobre o reconhecimento já foi agitada no Conselho e alguns membros (...) mostraram as vantagens que a Espanha podia tirar do Brasil; [outros] porém (...), apoiados na maior parte, se opuseram...” (Arquivo Diplomático da Independência, op. cit., vol. III, Representação Brasileira em Madrid, Correspondência expedida, p. 384). O enviado brasileiro chegou inclusive a temer pela sua segurança, ao ser considerado um espião a serviço de D. Pedro, segundo relatou no mês de agosto de 1827.

O reconhecimento formal se deu, portanto, doze anos após a independência do Brasil e nove anos depois do tratado de reconhecimento dessa independência por parte de Portugal. O fato de D. Pedro se alinhar aos liberais, e de poder ter sido um eventual pretendente ao reino da Espanha pode não ter sido indiferente ao longo processo de decisão adotado pela monarquia espanhola quanto às relações diplomáticas com o Brasil. Também subsistiam, no âmbito europeu, questões relativas às lutas políticas entre os liberais e os conservadores, tanto em Portugal quanto na Espanha, no contexto das quais a figura política de D. Pedro – imperador no Brasil e sucessor, como D. Pedro IV, de seu pai, falecido em Portugal em 1826 – poderia ter servido à causa liberal na Espanha, como hipotético sucessor de D. Fernando VII. A relevância conjuntural desses fatores explica que o reconhecimento formal da independência brasileira pelo Reino da Espanha somente seja obtido em 1834, após o desaparecimento físico de ambos os soberanos. 

De certa forma, essa história triangular tampouco pode ser separada, por um lado, da história das relações entre cada um dos Estados ibéricos e as grandes potências europeias da época, em primeiro lugar a Grã-Bretanha e a França, e, por outro lado, das relações entre elas e suas velhas colônias da América do Sul, que estavam conquistando sua independência no mesmo período, processo que enquadra e condiciona o estabelecimento de relações formais (isto é, diplomáticas) entre o Estado do Brasil independente e o Reino da Espanha.

Ainda que o estabelecimento de relações diplomáticas oficiais entre o Reino da Espanha e o Império do Brasil tenha ocorrido apenas doze anos depois da independência deste último, em 1834, com a troca subsequente de encarregados de negócios e de ministros residentes entre os governos dos dois Estados, o primeiro tratado formal estabelecido entre eles tardou quase três décadas mais, e foi representado pela Convenção Consular celebrada em 9 de fevereiro de 1863, para regular os direitos, privilégios e imunidades recíprocas dos cônsules, vice-cônsules e chanceleres, bem como as funções e obrigações a que eles ficavam respectivamente sujeitos nos dois países, segundo um modelo que o Brasil já tinha firmado com outros Estados.

O longo ciclo das independências latino-americanas e as formas diversas assumidas pelas diferentes elites nacionais no decorrer do processo – que se estendeu, praticamente, desde a última década do século XVIII, com a independência do Haiti, até a terceira década do século XIX, quando o Peru consolida sua independência, em 1824, mas que a rigor se estende até o final do século, com a luta delongada dos patriotas cubanos –, determinaram modalidades diferenciadas de reconhecimento formal dessas autonomias conquistadas e de estabelecimento de relações diplomáticas normais, com a conclusão de tratados de reconhecimento e, mais frequentemente, de relações comerciais, consulares e de cooperação em setores diversos. No caso do Brasil, o processo foi obviamente distinto, em função não apenas de sua soberania estar afeta ao outro reino ibérico, como também em razão das lutas políticas e conflitos bélicos que opuseram, em ocasiões diversas os dois reinos, tanto na Europa quanto na América do Sul, em especial na região do Prata. 

O estabelecimento de relações “normais” entre o novo Império do Brasil, herdeiro da casa dos Braganças, e os demais países, sobretudo as monarquias europeias, com as quais Portugal e Brasil tinham e mantiveram vínculos familiares e intensas trocas no início do século XIX, foram sendo normalizadas ao longo das Regências e, sobretudo, a partir do Segundo Império, mas sem mais tratados desiguais no plano comercial e sem as cláusulas iníquas impostas pela potência dominante da época. 

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4288: 15 dezembro 2022, 13 p.

Publicado in: 1822-2022: Bicentenário da Independência, 1822-2022. Brasília: Secretaria Nacional de Economia Criativa e Diversidade Cultural da Secretaria Especial de Cultura do Ministério do Turismo, 2022, p. 602-620; ISBN: 978-65-00-82564-0; disponível na Biblioteca Digital da Câmara dos Deputados (link: https://bd.camara.leg.br/bd/handle/bdcamara/41362). Relação de Publicados n. 1527.


sábado, 17 de junho de 2023

Os Anos 80: da nova Guerra Fria ao fim da bipolaridade - Paulo Roberto de Almeida (capítulo de livro)


  Um capítulo de livro agregado às plataformas abertas aos estudantes e pesquisadores, já publicado em 1997, mas o capítulo em questão tinha sido revisto em 1999 para uma nova edição, o que nunca ocorreu, como explico abaixo: 

Em meados de junho de 1995, residindo em Paris, recebi convite de amigos, colegas professores na Universidade de Brasília, relacionados abaixo, para oferecer colaboração a um volume que estava sendo preparado para publicação didática, tendo apresentado um primeiro esquema de conformidade ao trabalho n. 481, aqui registrado: 

 

481. “Os Anos Oitenta: transformações no cenário mundial”, Paris, 19 junho 1995, 1 p. Projeto de capítulo em obra coletiva sobre a história das relações internacionais contemporâneas, dirigida pelos Profs. Flávio Sombra Saraiva e Amado Luiz Cervo, do Dep. de História da UnB. Em curso de preparação.

 

Atendi ao convite, oferecendo um texto que passou por diversas revisões, inclusive debate presencial em 1996, já de volta a Brasília, até que o trabalho fosse incorporado ao livro abaixo registrado sob n. 519, publicado em 1997, pela editora Paralelo, ainda assim como algumas imperfeições de revisão sob responsabilidade da editora. Dispus-me a oferecer um texto inteiramente revisto, que não recebeu qualquer novo número de original, preparado em junho de 1999, destinado a ser publicado pela Editora da UnB, o que nunca ocorreu, como está registrado abaixo.

 

519. “Os Anos 80: da nova Guerra Fria ao fim da bipolaridade”, Brasília, 19 de março 1996, 21 p. Texto analítico expositivo e interpretativo sobre as grandes mudanças no cenário internacional nos anos 80, destinado a servir como capítulo em livro de história das relações internacionais. Projeto original: Paris, trabalho nº 413, 19/06/1995; 1ª versão preliminar: Brasília, 21/03/1996; 2ª versão preliminar: 27/03/1996; 3aª versão preliminar: 09/09/1996, 41 p.; 5ª versão preliminar: 04/12/1996, 41 p.; 5ª versão, final: 20/03/1997, 42 p. Publicado em Flávio Sombra Saraiva (org.), Amado Luiz Cervo, Wolfgang Döpke e Paulo Roberto de Almeida, Relações internacionais Contemporâneas: da construção do mundo liberal à globalização, 1815 a nossos dias (Brasília: Paralelo 15, 1997), p. 303-353. Relação de Publicados nº 209. Revisão em 17 de junho de 1999, para segunda edição, sob responsabilidade da Editora da UnB; não publicado.

 

Esse é o texto oferecido neste arquivo, ao qual me permiti agregar o esquema original e uma bibliografia preparada anteriormente cobrindo o mesmo período:

 

175. “Os Anos Oitenta: Transformações no Cenário Mundial”, Genebra, 25 novembro 1989, 6 p. Levantamento bibliográfico e seleção de material (inclusive cronologia retirada de números especiais da Foreign Affairs) sobre a evolução econômica, política e diplomática do cenário mundial na década de 80.

 

Disponível via Academia.edu, link: https://www.academia.edu/103480542/Os_anos_oitenta_da_nova_Guerra_Fria_ao_fim_da_bipolaridade_1999_

e via Research Gate, link: https://www.researchgate.net/publication/371667242_Os_anos_oitenta_da_nova_Guerra_Fria_ao_fim_da_bipolaridade 

 

Capítulo VIII:

Os anos oitenta:

da nova Guerra Fria ao fim da bipolaridade

 

Paulo Roberto de Almeida


Sumário:

1. Dez anos que abalaram o mundo

     O ocaso do socialismo e seu impacto nas relações internacionais

     Fim da Guerra Fria e transformações no cenário internacional

2. Nova Guerra Fria e agonia final do socialismo

     Relações entre as superpotências: o momento unipolar

     O socialismo na contracorrente da História

     Razões da derrocada socialista: irrelevância internacional

     Impossibilidade de reforma e perda de prestígio externo

3. A economia mundial: crise, crescimento e diversificação

     Integração de mercados financeiros e anarquia monetária

     Comércio internacional: crescimento e protecionismo

     Globalização e regionalização: tendências irresistíveis?

     Fragmentação e diversificação do Sul

4. Os problemas globais: a nova agenda internacional

     Novos e velhos problemas: a complexa agenda mundial

     Limites da soberania estatal

5. Relações estratégicas internacionais e conflitos regionais

     Controle de armamentos: contenção nuclear vertical e horizontal

     Conflitos regionais: a disseminação horizontal

     A Ásia e o enigma chinês

     Progressos na busca da segurança coletiva

6. A nova balança do poder mundial: um cenário mutável

     A era do Pacífico?

     A emergência de múltiplas polaridades

     A América Latina e o Brasil no contexto internacional


quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

1968-2018: 50 anos do AI-5: como impactou o Itamaraty - Paulo Roberto de Almeida

Dez anos atrás, aos 40 anos do Ato Institucional, fui convidado a escrever um capítulo sobre o AI-5 e seu impacto no Itamaraty. Ao princípio recusei-me, pois não sou da geração impactada por esse Ato da ditadura militar, e na verdade eu estava na oposição ao regime, e por isso passei sete anos num exílio voluntário, a partir de 1970, para ingressar no Itamaraty em 1977, ainda na oposição ao regime militar. Eu não tinha a memória daqueles anos, inclusive porque era muito jovem e não havia ainda ingressado num curso universitário, o que faria no mesmo ano do AI-5. Aliás, eu resolvi deixar o Brasil, logo em seguida, por que o AI-5 do regime militar cassou metade dos meus professores do curso de Ciências Sociais da USP.
Acabei fazendo esse texto porque NENHUM dos diplomatas seniores, da época, que eu contatei, se ofereceu para faze-lo. Fiz uma pesquisa bibliográfica e documental, além de falar com vários dos diplomatas contemporâneos daqueles anos de chumbo.
O resultado está aqui:


O texto completo encontra-se disponível, em princípio, na plataforma Academia.edu:

https://www.academia.edu/5794095/066_Do_alinhamento_recalcitrante_à_colaboração_relutante_o_Itamaraty_em_tempos_de_AI-5_2008_

Se não estiver disponível, podem me pedir, pelo número do trabalho: 1847.

Aqui o sumário e os agradecimentos devidos aos diplomatas que colaboraram com sua redação:

Do alinhamento recalcitrante à colaboração relutante:
o Itamaraty em tempos de AI-5


Paulo Roberto de Almeida 
In: Oswaldo Munteal Filho, Adriano de Freixo e Jacqueline Ventapane Freitas (orgs.),
'Tempo Negro, temperatura sufocante': Estado e Sociedade no Brasil do AI-5
(Rio de Janeiro: Ed. PUC-Rio, Contraponto, 2008; 396 p.;
ISBN 978-85-7866-002-4; p. 65-89). 

Sumário:
1. Introdução: uma Casa conservadora, dotada de pensamento avançado
2. Pré-história: o Itamaraty nos tempos da Guerra Fria
3. Política Externa Independente: uma vocação recorrente
4. O realinhamento de 1964 a 1967: um interregno incômodo
5. Revolução na revolução: o Itamaraty na tormenta
6. Segurança e desenvolvimento: colaboração, ainda que relutante
7. Pós-história: os efeitos de longo prazo 
Referências bibliográficas


[As opiniões expressas neste ensaio são de exclusiva responsabilidade do autor, não representando posições ou políticas das entidades às quais o autor se encontra vinculado. Agradecimentos especiais são devidos aos diplomatas Amaury Banhos Porto de Oliveira, Claudio Sotero Caio, Flavio Marega,Geraldo Egidio da Costa Holanda Cavalcanti, Gonçalo de Barros Carvalho e Mello Mourão, Guilherme Luiz Leite Ribeiro, Marcelo Raffaelli, Márcio Dias, Rubens Ricupero, Sebastião do Rego Barros e Sérgio Bath, pelos seus comentários, correções e sugestões a uma primeira versão deste texto, sem que eles obviamente respondam pelos argumentos desenvolvidos neste ensaio.]


1. Introdução: uma Casa conservadora, dotada de pensamento avançado
As desventuras do Itamaraty e de seus diplomatas com o instrumento por excelência da ditadura militar, o AI-5, representam apenas um curto capítulo – talvez não o mais importante – na trajetória moderna desse órgão de Estado, de uma longa história de confrontos de idéias e de acomodações pragmáticas entre os partidários de diferentes correntes de opinião que perpassam e dividem a agência diplomática, como de resto sempre foi o caso com diversas outras instituições do Estado e com a própria sociedade brasileira. A luta de idéias sempre esteve presente em várias épocas de debate nacional: escravistas e abolicionistas, metalistas e papelistas, industrializantes e agraristas, liberais e protecionistas, estruturalistas e monetaristas, interdependentes (conhecidos também como “associados” ou “entreguistas”) e nacionalistas e outras combinações ocasionais. Embates dicotômicos não foram raros na moderna história brasileira, colocando pessoas e grupos que defendiam posições antagônicas na agenda política em confronto direto, redistribuindo cartas nos jogos de poder que inevitavelmente acompanham esses enfrentamentos e provocando cisões na elite – e apenas na elite – como resultado desses confrontos, de resto mais ruidosos do que verdadeiramente ruinosos, mais ideológicos do que materiais, num país bem mais propenso à conciliação do que à ruptura, na interpretação de historiadores como José Honório Rodrigues.
Com o AI-5 foi talvez diferente, na medida em que se tratou não de um debate no seio da sociedade, mas de uma imposição vinda do alto, de uma cisão no próprio grupo de poder, que provocou profunda rejeição na elite ilustrada que sempre esteve envolvida com a política exterior do Estado, como é o caso do Itamaraty e da comunidade de política externa. Havia, obviamente, uma divisão subjacente na política externa e no corpo funcional do Itamaraty entre, de um lado, os partidários (dentro e fora do Itamaraty) da orientação alinhada e anticomunista da política internacional do Brasil e, de outro lado, os propugnadores de uma nova postura, não alinhada, independente e progressista, para as relações exteriores do país. Os fatos mais relevantes, em termos de seleção de “alvos esquerdistas” no Itamaraty, precederam, na verdade, a “edição” do AI-5, que não trouxe, a rigor, consequências de maior relevo para o ministério ou para seu corpo funcional. As consequências mais importantes, talvez, foram as que incidiram sobre a própria política externa, mas ainda aqui o profissionalismo do Itamaraty atuou para reduzir ao mínimo os “ruídos” e interferências sobre a diplomacia profissional. No âmbito geográfico específico do imediato entorno regional, poder-se-ia talvez falar, nesses anos, de uma “diplomacia militar”, em certo sentido mais importante do que a sua versão tradicional, mais bem comportada, pelo menos no que se refere à colaboração informal com as demais ditaduras militares.

(...)

Ler a íntegra nos links acima...