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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

sábado, 30 de dezembro de 2006

676) Prefacio a um livro de Relacoes Internacionais

Um bem-vindo crescimento na oferta de relações internacionais

Apresentação ao livro Política Internacional, Política Externa e Relações Internacionais
Organizador: Leonardo Arquimimo de Carvalho
(Curitiba: Editora Juruá, 2003)

Que os processos contraditórios e complementares da globalização econômica e da regionalização comercial sejam os elementos característicos da ordem internacional contemporânea pouca gente ainda duvida, sobretudo nos meios universitários, ainda que as atitudes adotadas a respeito de cada um desses fenômenos sejam tão variadas quanto as ideologias políticas ou as crenças religiosas, indo da adesão inquestionável (ou mesmo a aceitação passiva) à avaliação crítica — mais própria dos economistas — e à recusa peremptória, como observado nas ruidosas manifestações contra o chamado “consenso de Washington” e as organizações econômicas multilaterais, a começar pelo FMI. Aspectos menos positivos da globalização são revelados pelos movimentos terroristas, pelos fluxos ilegais de toda sorte — do narcotráfico, à corrupção nos contratos internacionais e à lavagem de dinheiro ilegalmente obtido — ou ainda pelas dificuldades em conciliar os interesses nacionais e os imperativos da administração racional de recursos globais da humanidade, como nos casos da destruição ambiental dentro e fora das fronteiras dos estados, da poluição dos rios, florestas e atmosfera, assim como da regulação do uso de espaços comuns, como ocorre no caso dos mares internacionais.
O Brasil participa plenamente de todos esses fenômenos, processos, instrumentos e movimentos de nossa época, tanto pela sua crescente inserção econômica internacional, como pela vertente sub-regional do Mercosul e pelos esquemas hemisféricos de integração e de liberalização econômica (como exemplificado nas negociações da Alca), sem mencionar o lado mais vasto do sistema multilateral de comércio, hoje regido pela OMC. Ele é fundador e participante ativo de praticamente todos os organismos econômicos e políticos do sistema onusiano, discutiu intensamente a adoção dos principais tratados internacionais regulando espaços comuns — direito do mar, por exemplo —, é parte, ainda que não protagônica, dos instrumentos que regulam o desarmamento e o controle de armas de destruição em massa e sofre, infelizmente, o impacto dos fluxos de capitais voláteis que estiveram na origem do mais recente ciclo de crises financeiras mundiais.
Este livro trata, com saudável diversidade analítica e ampla perspectiva quanto aos temas e métodos, desses fenômenos e processos que passaram a integrar o cotidiano da maior parte dos brasileiros, como uma rápida consulta ao seu sumário poderá revelar. Nele comparecem os problemas da ordem internacional, da ONU, do terrorismo, dos direitos humanos, do direito do mar, da política externa brasileira e da de alguns vizinhos regionais, da globalização e da regionalização, com as questões associadas do Mercosul e da Alca, assim como do papel do capital e do trabalho no contexto da ordem mundial globalizada. Os autores convidados são tanto acadêmicos consagrados nas lides docentes, “escreventes” e investigativas desse campo relativamente novo dos cursos de graduação oferecidos nas universidades brasileiras, como jovens representantes de um terreno de estudos que vem crescendo exponencialmente nos últimos anos.
Com efeito, uma pesquisa perfunctória nas listas de cursos disponíveis nas instituições públicas e privadas nacionais confirmaria essa nova “economia da oferta” no campo das relações internacionais e disciplinas afins. As universidades brasileiras, tanto as públicas como as privadas, mas crescentemente estas últimas, passaram a desenvolver ou ampliar atividades e iniciativas de relações internacionais, desde o estabelecimento de acordos de cooperação com parceiros do exterior, até a criação, em bases relativamente uniformes, de cursos de graduação ou de pós-graduação nessa área, haja vista a enorme demanda despertada, justamente, pelos processos mencionados.
Essa tendência encontra, por sua vez, confirmação no plano editorial, onde as empresas privadas ou essas mesmas universidades, dotadas em grande parte de editoras próprias – já que o avanço da tecnologia e dos sistemas informáticos de editoração eletrônica barateou a montagem de “centrais de produção de livros” –, começaram a criar coleções de livros especializados em temas internacionais, o que representa um significativo avanço para o reforço das bibliografias e materiais didáticos que os professores desses cursos utilizarão em suas aulas. A “economia da oferta” encontra assim a sua própria demanda, numa saudável reedição da “lei de Say” aplicada aos nossos propósitos bibliográficos e universitários.
A bem da verdade, foi Keynes quem fabricou uma versão truncada dessa famosa “lei” com que o economista francês Jean-Baptiste Say intentou fundar, no início do século XIX, sua teoria do valor-utilidade — contra a opinião de Adam Smith e de David Ricardo, que se baseavam na teoria do valor-trabalho, depois retomada por Marx —, afirmando que “a oferta cria sua própria demanda”, quando Say na verdade pretendia dizer que é a utilidade que cria a demanda específica para um determinado produto. Podemos descontar esse pecado venial de Keynes — mais interessado, até por razões políticas, em insistir na demanda agregada e no papel do Estado — e ficar com as geniais intuições de Say sobre o papel dos empresários no sistema econômico, dispostos, segundo ele, a arriscar o seu dinheiro em setores nos quais as ofertas são relativamente raras e onde a taxa de retorno é portanto maior. Segundo Say, a oferta é decisiva e é ela que permite o enriquecimento dos indivíduos.
O presente livro constitui, justamente, um claro exemplo desse enriquecimento, uma vez que ele vem, não apenas, incrementar a qualidade da oferta bibliográfica nesse terreno, como também contribuir para os progressos da discussão acadêmica de bom nível em torno de velhos e novos problemas da inserção externa do Brasil. Constitui, aliás, para mim, especial motivo de satisfação o fato de estar apresentando uma coleção de ensaios de relações internacionais colocada sob o signo de alguns dos temas que têm freqüentado meus últimos livros nessa área: globalização e regionalização, Mercosul e Alca, política externa brasileira, em especial em sua vertente econômica. Ele me parece, pois, ter alcançado êxito no empreendimento, a partir de lentes analíticas tão múltiplas e da já apontada diversidade de perspectivas, como corresponderia, aliás, a um país tão diverso e complexo como o Brasil. Seus autores-colaboradores podem ser considerados como verdadeiros “empresários” da “indústria de relações internacionais” no Brasil, uma das mais prósperas nos últimos tempos de inserção necessária na globalização.
Satisfeita sua demanda com esta nova oferta em relações internacionais, cabe agora ao “consumidor” saborear o produto, tendo eu a certeza de que ele sairá, deste ato deliberado de “consumo conspícuo” — para retomar o famoso conceito do economista genial que era Thorsten Veblen —, muito mais enriquecido do que quando nele inicialmente se engajou. Bom apetite a todos!

Paulo Roberto de Almeida (www.pralmeida.org)
Washington, março de 2003

Sumário

Mensagem do Organizador
Leonardo Arquimimo de Carvalho
Apresentação
Paulo Roberto de Almeida

I – Política Internacional, Política Externa e Relações Internacionais
1. O sistema mundial e as Relações Internacionais na passagem do século
Paulo Vizentini
2. A Organização das Nações Unidas e a paz possível
Shiguenoli Miyamoto, Patrícia Nasser de Carvalho
3. Unipolaridade: terrorismo e vulnerabilidade latino-americana
Eduardo Viola, Hector Ricardo Leis
4. Limites à política externa brasileira: perspectivas para o governo Lula
Leonardo Arquimimo de Carvalho
5. A Diplomacia Venezuelana Frente aos Estados Unidos no Período Chavez
Rafael Duarte Villa

II – Política Internacional, Política Externa, Globalização e Direito
6. Globalização e regionalização: tendências contemporâneas mundiais
Sonia de Camargo
7. Política Externa, Política e Direito Internacional: a formação de um regime para o uso dos oceanos
Felipe Kern Moreira
8. Direitos Humanos e Globalização: breve leitura hermenêutica
Ivone F. Morcilo Lixa
9. Ética na relação entre capital e trabalho no contexto da globalização
Katie Arguello

III - Política Internacional, Política Externa e Integração Regional
10. Regionalização e Globalização: fenômenos simultâneos
Andrea Sabbaga de Melo
11. Constrangimentos brasileiros frente à ALCA
Tullo Vigevani
12. ALCA: o ‘Cavalo de Tróia’ da integração hemisférica
Francisco Quintanilha VerasNeto

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