Meus colegas e amigos acadêmicos James Green e Sidnei Munhoz estão conseguindo fazer, pelo menos em parte, o que eu tentei e não consegui fazer durante minha estada em Washington, entre 1999 e 2003: copiar os arquivos americanos contemporâneos sobre o Brasil.
Assim que cheguei na Embaixada do Brasil em Washington, ajudei a organizar duas reuniões com brasilianistas, e já a partir da primeira, minha proposta foi adotada: efetuar um balanço global da produção brasilianista desde a disseminação do fenômeno no segundo pós-guerra.
O resultado pode ser visto nos dois livros publicados:
O Brasil dos Brasilianistas: um guia dos estudos sobre o Brasil nos Estados Unidos (1945-2000)
(São Paulo: Paz e Terra, 2001)
e
Envisioning Brazil: A Guide to Brazilian Studies in the United States
(Madison: University of Wisconsin Press, 2005)
O outro projeto consistia, justamente, em copiar os arquivos americanos sobre o Brasil, uma tarefa imensa, que requereria pessoal e bastante dinheiro. Depois de visitar os National Archives and Record Administration (NARA) solicitei, por telegrama oficial, 70 mil dólares ao Itamaraty, explicando do que se tratava, mas não tive sequer resposta. Entendi. Ai pedi apenas 4 mil dólares, para copiar os manuscritos da Biblioteca Oliveira Lima sobre o Brasil colonial, que por sinal já tinham sido copiados em 1949, sob recomendação do historiador José Honório Rodrigues, mas o microfilme, enviado ao Itamaraty, já estava dado como perdido há muitos anos. Ninguém, nem mesmo o diplomata que copiou esses manuscritos, Mário Calabria, se lembrava disso (eu ainda não tinha nascido, mas li a correspondência nos arquivos oficiais).
Bem, não tive nada do que queria, mas tive a sorte de conhecer o grande bibliófilo brasileiro José Mindlin, que passou por Washington para uma palestra na Library of Congress. Não sem alguma cara de pau, considerando-o um mecenas generoso, achaquei-o devidamente, explicando meu projeto, não mais de copiar arquivos (pois isso requereria verbas e estrutura de que não dispunha), mas de fazer um levantamento completo de todos os arquivos americanos sobre o Brasil. Mindlin me conseguiu 20 mil dólares, através da Fundação Vitae.
O dinheiro foi aplicado na compra de um computador laptop, um scanner, e talvez uma máquina fotográfico (mas aqui já não me lembro). Paguei um salário de fome a um pós-graduando de história morando nos EUA, Francisco Rogido, mobilizei (desviei seria o termo mais exato) estagiários brasileiros e americanos fazendo estágio na Embaixada brasileira em Washington (talvez fazendo tarefas mais nobres) e coloquei-os para identificar e descrever os arquivos americanos sobre o Brasil, em diversas instituições oficiais, universitárias e privadas, o que envolvia um bom número delas, espalhadas de costa a costa.
O material foi recolhido sob minha direção, ficou pronto já em 2002, e como também ocorre em determinadas circunstâncias, demorou séculos para ser editado pelo Itamaraty. Mas está disponível neste link do meu site:
Guia dos Arquivos Americanos sobre o Brasil
e pode ser downloadado neste link:
http://www.pralmeida.org/01Livros/2FramesBooks/66GuiaArquivos2010.html
Paralelamente, eu fazia contatos com historiadores em diversas instituições para identificar fontes e materiais suscetíveis de serem copiados. Foi assim que cheguei, em 2001, ao "chief historian of the CIA", já com a intenção de copiar o material da CIA sobre o golpe de 1964.
As tratativas estavam avançadas e até almocei com o historiador -- que por acaso era um brasilianista, Gerald K. Heines, cujo livro eu conhecia:
The Americanization of Brazil, sobre os anos Dutra e o segundo governo Vargas -- num clube de Washington, e tínhamos prometido fazer um projeto logo mais adiante.
Bem, logo mais adiante veio o Onze de Setembro e todos os arquivos, sobretudo os confidenciais, se fecharam, de uma maneira acintosa (tanto que o presidente George W. Bush chegou a ser processado pela Association of American Historians, por cerceamento de acesso a arquivos já abertos), e não tive mais condições de prosseguir com meus insidiosos projetos.
Depois fui embora e nunca mais tratei desses arquivos, a não ser continuar sempre tentando estimular projetos de levantamento, identificação e cópia, e procurando editar o livro acima que ficou parado um bom tempo.
Por isso, fico contente de saber deste projeto abaixo, cujos resultados espero conhecer em tempo hábil. Haverá um site, bilingue, que informarei aqui, assim que possível.
Boa sorte a todos, meus parabéns ao James Green e ao Sidnei Munhoz, dois historiadores amigos, e a todos os participantes do projeto.
Paulo Roberto de Almeida
Hartford, 10/07/2013
Opening
the Archives Project
James Green, Sidnei Munhoz
(recebido em 10/07/2013)
O Projeto “Opening the Archives:
Access to Information, Memory, and Justice Thirty Years After the End of the
Brazilian Military Dictatorship”(Abrindo os arquivos: acesso à informação,
memória e justiça 30 anos após o fim da ditadura militar brasileira) foi
idealizado pelo professor James N. Green, da Brown University e contou na
coordenação com a parceria do professor Sidnei Munhoz, da UEM.
O projeto tem por objetivo resgatar a
documentação existente nos EUA que possa auxiliar a melhor compreensão do
processo que desencadeou o golpe civil-militar de 1964 e possibilitou a
instauração do regime ditatorial que
governou o Brasil por 21 anos. A pesquisa ainda tem por objetivo, com o
envolvimento de professores e estudantes do Brasil e dos EUA, auxiliar a
Comissão Nacional da Verdade, instituída pela presidenta Dilma Rousseff. O
projeto é resultado de uma parceria entre a UEM e a Brown e ainda tem o National
Archives (EUA) e o Arquivo Nacional (Brasil) como co-parceiros. Para o sucesso
do projeto foi fundamental o envolvimento da administração da Brown e da UEM.
Na UEM o projeto contou com o apoio da reitoria e da Pró-reitoria de Pesquisa e
Pós-graduação e ainda recebeu a colaboração da PJU (Procuradoria Jurídica)e do
ECI (Escritório de Cooperação Internacional).
As atividades do projeto tiveram início
no ultimo domingo dia 2 com um jantar de confraternização organizado pelo
professor James Green, mentor do projeto e nosso principal parceiro na Brown
University. Participaram da atividade todos os integrantes do projeto. A
atividade teve como objetivo promover a apresentação e a integração entre os
participantes do grupo de pesquisa.
Na segunda feira, dia 3, fomos
recebidos por diretores setoriais do Nara (National Archives & Record
Administration) que nos apresentaram o as instalações da instituição e nos
forneceram as informações introdutórias para o desenvolvimento das nossas
atividades, com a atenção especial de William A. Mayer, Executive Director of
Research Services, que é responsável pelo Arquivo Nacional em Washington e
quinze outros arquivos em várias partes dos Estados Unidos. Na ocasião recebemos do Nara uma sala
exclusiva para as nossas atividades durante esta parceria, fato inédito na
instituição.
Na terça-feira no período da manhã
fomos conhecer as Instalações do National Security Archives (sediado na George
Washington University). Na ocasião, fomos recebidos por Peter Kornbluh, um dos diretores
e analista sênior da instituição e assessor da Comissão Nacional da Verdade no
Brasil. Entre outras atividades, Kornbluh é autor do livro The Pinochet File: A Declassified Dossier on Atrocity and
Accountability. O livro foi considerado pelo Los Angeles Times como o melhor livro publicado nos EUA em 2003.
Ainda no dia 4, a pesquisadora e
ativista brasileira Janaina Teles fez uma apresentação sobre o seu livro Mortos e desaparecidos políticos: reparação
ou impunidade que relata as atrocidades cometidas pela ditadura militar
brasileira, inclusive contra a sua própria família. Janaina Telles tem
auxiliado a Comissão Municipal da Verdade de São Paulo e a sua obra tem
desempenhado um importante papel nesse processo. Kornbluh ofereceu em sua
residência um jantar para os professores james Green, Sidnei Munhoz, Janaina
Telles e Nina Schneider da Universität Konstanz (Alemanha). A professora alemã
tem estudado o regime ditatorial brasileiro e a atual Comissão Nacional da
Verdade. A recepção foi fantástica e Kornbluh mostrou-se um verdadeiro chef.
Tudo Impecável!!!
Na quarta feira pela manhã tivemos
uma reunião de orientação dos procedimentos técnicos do Nara coordenada por
David Langbert, arquivista com trinta cinco anos de experiência e a pessoa
responsável para os arquivos com o código 59, que são todos os documentos
produzidos pelo Departamento do Estado, que se enfileirados totalizam 709
kilometros de material.
Após a reunião a equipe iniciou
efetivamente os trabalhos de consulta e de digitalização dos documentos
produzidos pela diplomacia dos EUA sobre o Brasil no período que antecede o
Golpe civil-militar de 1964 e sobre os primeiros anos da ditadura. A
documentação está organizada em dois grandes acervos: um relacionado à
documentação produzida pelo Departamento de Estado ou por ele recebida da
embaixada e dos consulados dos EUA no Brasil; o outro é composto por documentos
de diferentes origens e distintos órgãos governamentais ou de instituições
civis dos EUA. Toda a equipe está muito animada com o projeto que a cada dia
ganha uma dinâmica mais poderosa e envolvente.
Na sexta-feira dia 7, os professores
James Green e Sidnei Munhoz e os estudantes do Programa de Pós-graduação em
História da UEM Priscila Borba e Antonio Bianchett foram recebidos na embaixada
do Brasil em Washington. Participou ainda da reunião a estudante Emma Wohl da
Brown que falou em nome dos estudantes estadunidenses envolvidos no projeto. Na
embaixada fomos recebido por Pedro Saldanha, conselheiro da Divisão de
Educação, Raphael Tosti, chefe da Divisão Cultural e por Maricy Schmitz , assistente
técnica da Divisão de Educação.
Na ocasião falamos sobre a
importância do projeto e pedimos o apoio do governo brasileiro para a
continuidade dessa atividade. Fomos recebidos com simpatia e cordialidade pela
equipe da embaixada que demonstrou grande entusiasmo pelo projeto e ficou de
encaminhar os resultados do encontro ao embaixador que se encontrava em viagem.
Segue abaixo a relação da equipe toda
vinculada ao projeto:
James Green (Coordenador); Sidnei Munhoz (Coordenador); Estudantes da Brown University: Adam Waters; Emma Wohl; Michael Hoffmann; John Ford Beckett; Kevin Leitão; André Pagliarini; Erika Manouselis; Clemente Ben Vila; Nicole Cacozza;
Estudantes da UEM: Antonio Batista Bianchet Jr.; Priscila Borba da Costa
LEGENDA
DA FOTO NA EMBAIXADA:
Da esquerda para direita: Raphael Tosti
(Segundo Secretário), Antonio Bianchet (pesquisador - UEM), Emma Wohl
(pesquisadora - Brown), Sidnei Munhoz (Professor responsável pelo projeto -
UEM), James Green (Professor responsável pelo projeto - Brown), Priscila Borba
(pesquisadora - UEM), Pedro Saldanha (Conselheiro da Embaixada), Maricy Schmitz
(Assistente técnica da Seção de Educação).