Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, em viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas.
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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;
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sábado, 28 de abril de 2018
Marcos Jank: o conflito do frango com a Europa
domingo, 26 de novembro de 2017
Brasil: protecionista e com orgulho de ser - Marcos S. Jank
sábado, 16 de setembro de 2017
Uma outra China fora da China: Sudeste Asiatico - Marcos Jank
sábado, 19 de agosto de 2017
Fabio Chaddad e o Agronegocio - Marcos Sawaya Jank
domingo, 1 de maio de 2016
A agenda perdida da area internacional - Marcos Sawaya Jank (FSP)
A agenda perdida da área internacional
Após o aumento de mais de 40% no número de representações desde o governo Lula, o Brasil se vê hoje na constrangedora situação de ter de fechar postos e reduzir despesas correntes para não ser despejado em alguns países.
Acompanho o trabalho dos diplomatas brasileiros há mais de 20 anos e posso afirmar, com segurança, que a nossa diplomacia se posiciona entre as melhores do mundo. Trata-se de uma das poucas carreiras de Estado bem estruturadas no Brasil, marcada pela seleção criteriosa, pela formação sólida e pela reputação reconhecida no mundo todo.
Mas, apesar dos bons serviços prestados no exterior, muitas vezes de forma heroica e voluntária, a coordenação do governo como um todo deixa a desejar.
Os Ministérios das Relações Exteriores, Indústria e Comércio Exterior, Agricultura e a Apex (Agência de Promoção de Exportações e Investimentos) precisam juntar esforços de forma mais eficiente, definindo claramente as suas atribuições e limites, somando recursos e evitando duplicidades.
Missões esporádicas ao exterior são necessárias, principalmente em nível presidencial e ministerial, mas datas e horários precisam ser respeitados e o follow-up do que foi acordado precisa ser cumprido. Falhas homéricas têm ocorrido –além de sucessivos cancelamentos e atrasos, quase sempre há muito barulho no momento da visita, mas pouco preparo prévio e uma execução deficiente na sequência.
Deveríamos reduzir a busca por holofotes passageiros em megaeventos de custo astronômico e cuidar melhor da relação cotidiana com nossos parceiros comerciais. Por exemplo, na Ásia, região mais dinâmica do mundo, a nossa presença física é tímida e desconectada, menos expressiva do que a de países bem menores do que o Brasil.
No caso das commodities, que representam dois terços das nossas exportações, mais importante do que participar esporadicamente de feiras e rodadas de negócios é direcionar recursos para a labuta diária nos órgãos reguladores dos países-chave: redução das barreiras comerciais, entrega rápida de questionários de habilitação de unidades produtivas, organização de visitas e missões, negociação de acordos bilaterais –sanitários, contra a dupla tributação, de facilitação de comércio e investimentos etc.
Precisamos ultrapassar a fase das demandas unilaterais de acesso ao país-alvo e desenvolver parcerias estratégicas de longo prazo que beneficiem os dois lados. As oportunidades de cooperação bilateral são imensas.
Mas nada disso é novidade, porque já estivemos em melhor posição no passado, inclusive no vasto universo das negociações para a formação de megablocos comerciais, à semelhança dos que hoje proliferam pelo mundo afora.
Não faltam no Brasil cabeças brilhantes para enfrentar o jogo internacional com desenvoltura. O que falta, sim, é organização e foco, envolvendo não apenas os diversos órgãos do governo como também as associações e as empresas do setor privado. É hora de recuperar a agenda perdida da área internacional.
quarta-feira, 28 de agosto de 2013
Brasil: grande produtor agricola, obstaculizado por problemas "made in Brazil" - Marcos Sawaya Jank
Entendendo a queda de preço das commodities
terça-feira, 26 de março de 2013
Apagao logistico e a soja que fica no caminho - Marcos Jank
Marcos Sawaya Jank (*)
O Estado de S.Paulo, 26/03/2013
Volto hoje à carga a respeito do caos na logística de produtos agrícolas que vamos viver este ano. A gravidade da situação está perfeitamente ilustrada na fila de 25 quilômetros de caminhões na Rodovia Cônego Domênico Rangoni, esperando 70 horas para descarregar no Porto de Santos e infernizando também a vida dos que vão para o Guarujá ou para o Litoral Norte.
Não dá para dizer que esse caos seja uma surpresa conjuntural imprevisível. Nos últimos 12 anos a safra brasileira de grãos dobrou de tamanho, enquanto a logística praticamente nada mudou. O que estamos assistindo é à "crônica de uma morte anunciada", após duas décadas de descaso, legislação anacrônica, instalações precárias, burocracia infernal, reserva de mercado e corporativismo endêmico. Enquanto no Brasil o principal modal é o caminhão rodando milhares de quilômetros em estradas esburacadas (55% da distribuição de grãos), nos EUA, nosso maior concorrente, hidrovias construídas há mais de 80 anos nos Rios Mississippi, Missouri e outros respondem por 60% do transporte de grãos.
Hoje nosso maior gargalo está nos portos. A logística portuária começou mal este ano, com 27 dias parados por causa de chuvas - o carregamento dos navios é feito a céu aberto e qualquer indício de chuva interrompe a operação. Além disso, em decorrência da quebra da safra americana, o Brasil tornou-se o maior exportador mundial de milho - com 25 milhões de toneladas exportadas, ante 8,5 milhões na safra passada. Esse imenso volume de milho está atrasando os embarques de soja, que, por sua vez, vão afetar os embarques de açúcar a partir de abril e de milho-safrinha a partir de julho. Na semana passada a fila para carregar soja nos portos brasileiros superou 200 navios, 80 mais do que no mesmo período do ano passado.
De março a julho vamos ter de escoar 7,2 milhões de toneladas por mês de soja e milho pelos portos, valor 25% superior ao do mesmo período do ano passado. Não é difícil prever que esses quatro meses serão um caos, principalmente se chover demais, já que estaremos operando muito próximos da capacidade máxima dos portos. Outra agravante é a nova lei dos caminhoneiros - que determina paradas obrigatórias dos caminhões a cada quatro horas, com jornada máxima diária de 11 horas -, além da falta de caminhoneiros, estimada em 50 mil a 100 mil profissionais. Isso sem contar a deficiência de armazéns, uma vez que só conseguimos estocar 65% dos grãos produzidos no País. Ao contrário do que ocorre nos nossos principais competidores, no Brasil o caminhão tornou-se um "armazém sobre rodas", porque não tem onde colocar o produto e no auge da safra a única solução é a carreta na fila de espera para o porto.
A conclusão é que no curto prazo a única variável de ajuste possível serão novos aumentos de fretes, destruindo a rentabilidade dos produtores e dos traders. Dez anos atrás, o custo de frete no Brasil era duas vezes superior ao da Argentina e dos EUA. Este ano, numa visão otimista, será, no mínimo, quatro vezes superior (mais de US$ 100/t, ante cerca de US$ 25/t nos nossos concorrentes), chegando a ser cinco a sete vezes maior para as regiões mais distantes do Cerrado.
Não é de espantar, portanto, que um grande importador chinês tenha cancelado o carregamento de 33 navios de soja, trocando o suprimento brasileiro pelo da Argentina. Os chineses são extremamente oportunistas nessa hora e, obviamente, utilizam esse recurso para renegociar os seus contratos em melhores termos. Mas a culpa não é deles, é nossa!
A única solução para o caos logístico encontra-se no médio e longo prazos e se chama investimento maciço. Precisaríamos investir pelo menos R$ 40 bilhões no sistema portuário, montante quase três vezes maior que a soma prevista nos programas PAC-1 e PAC-2. Um dos caminhos mais importantes para isso seria a aprovação da Medida Provisória 595, a "Lei dos Portos", ora em tramitação no Congresso Nacional. No entanto, diversos itens do projeto ainda mostram fortes controvérsias entre os vários grupos de interesse envolvidos.
São eles: 1) A distinção entre os terminais dentro da área do "porto organizado" e os terminais de uso privado fora dela, incluindo a redefinição dos limites geográficos de cada porto, chamados de “poligonal”, um tema extremamente polêmico; 2) a redefinição das licitações para concessões ou arrendamentos, agora com base no critério de modicidade tarifária (maior movimentação com a menor tarifa); 3) o tratamento a ser dado aos terminais de uso privativo hoje existentes dentro de portos organizados, principalmente o dilema do encerramento versus prorrogação dos atuais contratos de arrendamento; 4) o fim da distinção entre movimentação de "carga própria" e "carga de terceiros" como elemento essencial para a exploração das instalações portuárias autorizadas; 5) a nova organização institucional dos portos e a redefinição do poder concedente nas concessões; 6) o compartilhamento de infraestruturas; e 7) o tratamento diferenciado para trabalhadores portuários.
O fato é que, no campo, fizemos muito bem a nossa lição de casa. A produtividade total dos fatores (terra, trabalho e capital) da agricultura brasileira é a que mais vem crescendo no mundo: 3,6% ao ano desde 2000. Mas a logística está destruindo tudo o que foi conquistado dentro das fazendas, não apenas no exemplo dos grãos, mas também do açúcar, das carnes e de outras commodities, hoje igualmente "engargaladas".
Infelizmente, temos de nos conformar com o fato de que o "apagão" da logística chegou. Neste momento, além de rezar para que ele não seja total, deveríamos concentrar-nos na aprovação urgente dos marcos regulatórios e dos investimentos necessários para escapar dessa calamidade. E isso ainda vai demorar alguns anos.
* Marcos Sawaya Jank é especialista em Agronegócio e Bioenergia. Foi presidente da UNICA e do ICONE. E-mail: marcos@jank.com.br
terça-feira, 26 de fevereiro de 2013
Economia: tres posts ultra-pessimistas, helas - Estadao, esse jornalao derrotista
Mas, também o que podem fazer esses jornalões conservadores do PIG: inventar outros números, outros índices, quando os reais estão aí: baixo crescimento econômico, inflação em alta, déficits correntes e fiscais, introversão das políticas econômicas, protecionismo comercial aberto e ilegal, enfim, deterioração geral das condições econômicas, visíveis nas matérias e editoriais postadas abaixo...
Paulo Roberto de Almeida
Crise de produtividade
Até agora, a indústria tem sido o setor mais afetado pela crise de eficiência. No ano passado, a produção física do setor encolheu 2,7%, enquanto a folha de pagamento médio aumentou 5,8%, o número de horas pagas caiu 1,9% e a produtividade recuou 0,8%. O custo da mão de obra, resultante da combinação desses fatores, cresceu 6,6% em 2012, segundo cálculos do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). Foi a maior taxa em 11 anos, embora o pessoal ocupado tenha diminuído 1,4%.
O desempenho variou entre os 19 segmentos industriais considerados na pesquisa. Alguns conseguiram ganhos de produtividade, mas o custo do trabalho aumentou em 18 deles, reduzindo um poder de competição já em queda há alguns anos e sem perspectiva de recuperação a curto prazo. O desemprego no setor ainda é limitado, no entanto, porque o custo das demissões é alto e a reposição do pessoal será complicada, no quadro de escassez de mão de obra minimamente treinada ou passível de treinamento.
Com a queda de 2,7% no ano passado, depois de um crescimento de apenas 0,4% em 2011, a produção da indústria praticamente voltou ao nível de 2008, primeiro ano da crise internacional. Em 2010 a indústria havia aumentado 10,5%, mas havia diminuído 7,5% no ano anterior. A estagnação, portanto, já dura alguns anos. A paralisação das grandes economias e o baixo ritmo de expansão do comércio global tornaram mais dura a competição e deslocaram a indústria brasileira. A valorização do real sem dúvida agravou a situação, mas esse foi só um fator a mais.
A empresa brasileira já operava com desvantagens consideráveis, bem conhecidas e muito mais importantes. Mas o problema do câmbio - superestimado também por muitos empresários - deu ao governo um pretexto para descuidar das questões mais graves e esconder sua inépcia atrás da retórica inútil sobre a guerra cambial. Essa retórica se mantém, porque a instabilidade cambial continua e provavelmente continuará enquanto os bancos centrais do mundo rico sustentarem políticas monetárias frouxas. Nenhum deles mudará de rumo por causa dos protestos brasileiros.
Se cuidasse menos dessa questão e mais de outros desafios, muito mais importantes e passíveis de solução internamente, o governo daria uma boa contribuição para o desencalhe da economia nacional.
A presidente Dilma Rousseff e sua equipe conhecem pelo menos de nome esses problemas. Por isso decidiram no ano passado, com muito atraso, lançar um programa de investimento em logística. Têm tropeçado, no entanto, em detalhes tanto de formulação quanto de execução, por preconceitos ideológicos e por incompetência gerencial.
A direção, pelo menos, é correta. Mas repetem erros bem conhecidos. São incapazes de ir além de programas limitados e mal costurados de desoneração fiscal. Insistem nos estímulos ao consumo, quando os entraves estão do lado da produção. Falam em expansão do crédito, mas são incapazes de ir além das práticas de favorecimento a grupos e setores selecionados para lucrar e crescer. Ao mesmo tempo, o governo se atola em trapalhadas, intervindo na formação de preços, administrando índices em vez de combater as pressões inflacionárias e revelando uma assustadora tolerância à inflação. Diante dos resultados, como resistir à tentação de atribuir os males à tal guerra do câmbio?
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O Brasil fora das cadeias produtivas globais
O governo declara ter uma "política comercial cautelosa" por não querer abrir mão de seu projeto nacional de desenvolvimento e por julgar que, tendo uma indústria diversificada, o Brasil não se deve engajar nos acordos de cadeias produtivas, que levariam a alguma especialização no contexto produtivo.
O processo de globalização vem sofrendo modificações aceleradas, com a tendência de concentração da produção de manufaturas em poucos países e a fragmentação da produção de bens industriais. Nos últimos 20 anos, o comércio das cadeias produtivas (supply chain trade) vem crescendo gradualmente. Trata-se do intercâmbio de bens, investimentos, serviços e tecnologia associado às redes internacionais de produção, que combinam a inovação dos países desenvolvidos com salários baixos dos países em desenvolvimento.
No comércio das cadeias de suprimento, o investimento produtivo dos países desenvolvidos só vai ocorrer desde que certas regras e reformas que garantem a proteção dos bens tangíveis e intangíveis das empresas sejam adotadas pelos países emergentes e em desenvolvimento e caso haja integração da cadeia produtiva no intercâmbio global.
As redes de inovação-produção-comercialização encontram-se dispersas em empresas e países. A ampliação das cadeias produtivas globais e o crescente intercâmbio de partes e componentes está mudando a forma de tratar as trocas tradicionais de bens e serviços. A industrialização e a produção de manufaturas dependerá da participação dos países em desenvolvimento nessas cadeias produtivas de maior valor agregado. Ao ficar de fora do circuito das cadeias produtivas globais, a maioria dos países em desenvolvimento, o Brasil incluído, passa a concentrar suas exportações em commodities e suas exportações de manufaturados tornam-se cada vez mais reduzidas.
A incorporação das cadeias de produção global nos mega-acordos de livre-comércio, como o eventual acordo EUA-União Europeia, representa um desafio adicional, pois traz de volta preocupações geopolíticas para o comércio internacional. Considerações de política externa levam as duas regiões a tentar superar diferenças comerciais em função de interesses comuns para a prevalência de normas internacionais e valores e para a contenção da China.
O mundo está se multipolarizando rapidamente e a produção e as cadeias produtivas estão se multilateralizando. A crescente aceitação desse novo modelo de desenvolvimento pelos países asiáticos e alguns latino-americanos representa um grande desafio para os países emergentes como a China, a Índia, o Brasil e a Rússia, que relutam em aceitar a lógica dos atuais fluxos de investimento e do comércio.
A Organização Mundial do Comércio (OMC) procura regular e facilitar o intercâmbio tradicional - que diz respeito a bens produzidos num determinado país e vendidos em outro - com regras que dificultem ou eliminem as barreiras na fronteira (tarifas) e visem a penalizar a competição desleal (subsídios e dumping) com medidas compensatórias. As novas regras do comércio das cadeias produtivas começam a ser definidas de forma ad hoc nos acordos de comércio regional (como os dos EUA com países da Ásia e com a Europa), tratados bilaterais de comércio e de investimento (como os dos EUA e da Europa com a Coreia do Sul e com o países da América Latina) e por meio de reformas unilaterais dos países em desenvolvimento.
Os acordos regionais de livre-comércio (10 acordos dos EUA, 11 do Japão e 58 da União Europeia, segundo a OMC) registram 52 regras, das quais 38 não estão incorporadas à OMC; 14 tocam em disciplinas cobertas pelas regras da OMC, mas vão além delas (OMC plus); 12 das 52 regras estão presentes em 80% dos acordos firmados pelos EUA. A maioria das disposições legalmente obrigatórias são uma ampliação das regras existentes na OMC sobre propriedade intelectual (Trips), garantia de investimento (Trim), serviços, movimentos de capital e cooperação aduaneira.
A nova governança global, portanto, está sendo formada à margem das discussões multilaterais da OMC, com profundas consequências para os países em desenvolvimento.
O Brasil, sem estratégia de negociação comercial e com dificuldades para criar um mercado regional para seus produtos, integrados numa cadeia produtiva regional com os demais países, a exemplo do que ocorre na Ásia e na Europa, está cada vez mais isolado e dificilmente poderá beneficiar-se dessas novas tendências do comércio internacional. Os países que integram a Aliança do Pacífico - México, Chile, Colômbia e Peru - firmaram acordos com os EUA, com a Europa e com a China e estão inseridos no contexto dinâmico dos acordos regionais de livre-comércio. A fragmentação da produção e a exclusão das negociações externas começam a afetar o comércio externo brasileiro de manufaturas pela perda de sua competitividade e pela concorrência da China.
Se a política do governo Dilma Rousseff visando ao fortalecimento da indústria nacional der certo, sem o Brasil estar integrado ao dinâmico intercâmbio da cadeia produtiva global, o máximo que o País pode almejar no longo prazo é manter a produção industrial para o mercado interno com medidas protecionistas, para compensar a maior competitividade dos produtos importados.
O mundo não vai esperar o Brasil. Ou o Brasil recupera o tempo perdido e reformula a sua estratégia de negociação comercial externa, ou vai tornar-se cada vez mais isolado no mundo real do comércio global e de investimentos.
Rumo ao pior ano da logística agrícola
Em recente evento de que participei nos EUA, a principal questão não era saber a estimativa de quanto o Brasil vai produzir nesta safra, mas sim os volumes de soja e milho que serão efetivamente escoados através de nossos portos até o início da próxima safra americana. Ninguém mais tem dúvida de que o Brasil consegue responder rapidamente na produção. Basta dizer que só na soja ampliamos a área plantada em quase 3 milhões de hectares em apenas um ano. A segunda safra de milho - erroneamente chamada de "safrinha" e plantada após a colheita de soja no mesmo ano agrícola - superou a safra de verão em mais de 6 MT nos dois últimos anos. Trata-se de uma notável vantagem competitiva da agricultura tropical, que jamais vai ocorrer em países de clima temperado.
Acontece que em apenas um ano aumentamos a nossa exportação "potencial" de milho e soja em 18 milhões de toneladas, 36% mais do que na safra passada. Vale notar que o grosso da expansão de soja e milho se dá nos Estados de Mato Grosso, Goiás e Bahia, em áreas que se situam entre 1.000 e 2.300 km de distância dos portos. Se somarmos ainda as exportações de 25 MT de açúcar e a importação de 18 MT de matérias-primas para fertilizantes, não é de espantar que este ano assistiremos, passivos e apavorados, à maior asfixia na logística de granéis da nossa História!
Neste momento, as filas de navios para atracar nos Portos de Santos e de Paranaguá estão duas a três vezes maiores do que há um ano. Na última quinta-feira havia 82 navios esperando para carregar grãos no Porto de Paranaguá, ante 31 nesta mesma época do ano passado. Em Santos havia 59 navios, ante 29 há um ano. O custo médio de demurrage de um navio parado esperando carga é de US$ 30 mil por dia. Em seminário do Banco Itaú-BBA realizado na semana passada, operadores relataram que para evitar 45 dias de fila de espera em Paranaguá eles decidiram mandar os caminhões para o Porto de Rio Grande, onde as filas duram menos de dez dias. Ou seja, depois de rodar 2.300 km do norte de Mato Grosso até Paranaguá, a soja ainda tem de rodar outros 1.100 km para pegar uma "fila mais rápida" no Rio Grande do Sul. Uma verdadeira insanidade!
Para complicar ainda mais, a Lei 12.619, que restringe a jornada de trabalho dos caminhoneiros e o tempo de condução dos veículos, teve o efeito prático de "retirar" mais de 500 mil carretas das estradas. Os fretes de cargas já subiram entre 25% e 50% este ano. Além disso, o processo de votação da Medida Provisória n.º 595 - a chamada MP dos Portos, que propõe novas regras para a modernização destes - tem produzido uma sucessão de greves em escala nacional, que só tende a piorar com o avanço das negociações.
Essa situação calamitosa nos leva a pelo menos três reflexões importantes. A primeira delas, e mais óbvia, é a necessidade urgente de votar os novos marcos regulatórios que modernizariam a logística brasileira, particularmente a MP dos Portos. Apesar da calamidade nas estradas, da insuficiência histórica de ferrovias e hidrovias e da falta de armazéns (nossa capacidade de armazenagem equivale a 72% da safra de soja e milho, ante 133% nos EUA), o pior gargalo do País neste momento, de longe, são os portos. É hora de vencer a reserva de mercado, a burocracia e o corporativismo de um dos setores mais atrasados da economia brasileira.
A segunda é a necessidade urgente de viabilização sistêmica da nova logística do Norte do País, traduzida no escoamento pelos Portos de Itacoatiara (Rio Madeira), Santarém (Amazonas), Marabá (Tocantins), Miritituba (Teles Pires/Tapajós) e Vila do Conde (confluência do Amazonas e do Tocantins, no Pará), na conclusão da pavimentação das rodovias BR-163 e BR-158 e das Ferrovias de Integração Norte-Sul (FNS), Centro-Oeste (Fico), Oeste-Leste (Fiol) e Transnordestina. Basta dizer que 60% da produção de grãos se concentra nos cerrados, que serão beneficiados pela nova logística, mas só 14% dela é hoje escoada pelos portos do Norte e Nordeste. A viabilização dos novos corredores permitiria exportarmos com navios Capesize, que transportam 120 mil toneladas de grãos, o dobro da capacidade dos navios Panamax, hoje utilizados. Com a futura passagem desses navios pelo Canal do Panamá, em 2014, será possível reduzir em pelo menos 20% o frete marítimo para a China, que já responde por 40% da nossa exportação de grãos, além da redução potencial dos fretes terrestres, pelo uso de ferrovias e hidrovias.
A terceira reflexão tem que ver com o longo prazo. Precisamos estudar qual seria o melhor modelo de inserção do Brasil no agronegócio global do futuro. Hoje estamos engargalados num sistema ineficiente de transporte de soja e milho por caminhões, portos velhos e caros e navios pequenos. Milho e soja servem basicamente para produzir ração para bovinos, suínos e aves, que vão produzir a proteína animal consumida por países que estão do outro lado do planeta.
Num momento em que vários países constroem políticas comerciais mais agressivas - vide o anúncio do novo acordo EUA-União Europeia e a miríade de acordos asiáticos -, não seria a hora de repensar as nossas cadeias de suprimento, buscando explorar a combinação de maior eficiência e valor dos grãos, carnes e lácteos que serão demandados no futuro?