Ironias da história de vida do chanceler acidental: defenestrado precocemente, escapou de figurar no processo dos golpistas; sorte dele…
Todos sabem que os verdadeiros chefes do chanceler acidental, enquanto ele esteve à frente do Itamaraty, de janeiro de 2019 a março de 2021, eram, pela ordem de importância política, o Bananinha 03, um mediocre completo e uma ignorância excepcional, e depois pela importância intelectual, o Filipe Martins, vulgo Robespirralho, que tinha algumas luzes universitárias. Aliás, desde antes de 2019, pois que desde 2018, talvez até antes, o soturno diplomata havia começado a colaborar clandestinamente com uma folha digital de extrema-direita do Robespirralho, inaugurando logo em seguida o seu pasquim eletrônico, o blog clandestino “Metapolítica 17: contra o globalismo”, aderindo às aberrações mais bizarras da franja lunática da extrema-direita americana.
Soube, muito tardiamente, que ele se apossou de vários exemplares da revista que eu editava no IPRI, Cadernos de Política Exterior, que continha seu artigo “Trump e o Ocidente”, e foi correndo entregar ao seu guru adorado, mestre Olavo, já instalado numa casa das cercanias de Richmond, na Virginia, em maio de 2018, aproximadamente.
Pronto: foi o que bastou, junto com a sabujice demonstrada nos meses da campanha presidencial aos seus novos mestres e senhores, para que Olavo de Carvalho o recomendasse fortemente ao presidente eleito como seu novo chanceler “sem ideologia” (de esquerda, entenda-se).
Durante todo 2019 e 2020 ele serviu obedientemente a seus dois senhores e cumpriu servilmente todas as loucuras do capitão negacionista e elogiador de torturadores da ditadura militar. Chegou a exagerar na adesão a tudo o que vinha de Trump - invasão da Venezuela, por exemplo - e na oposição a tudo o que fosse do odiado “comunismo chinês”.
Foi o que o salvou, quero dizer, precipitou sua queda, no início de 2021: essa aversão a tudo o que fosse da “China comunista” fez com que a senadora Katia Abreu, que devia estar lucrando muito com as exportações do agronegócio para o gigante asiático, pedisse a sua cabeça ao chefe de governo. Em dois dias ele foi ingloriosamente defenestrado do Itamaraty (que respirou aliviado).
Se o chanceler acidental tivesse sido menos burro e ideológico, ele teria continuado a desgraçar o Itamaraty, e certamente estaria de conluio com o Robespirralho na preparação do golpe do capitão covarde e incompetente.
Em 2025, seu patrão diplomático está quase às portas da prisão e o o chefe deles, o Bananinha 03, que chegou a ser cogitado para embaixador em Washington, amarga um amargo exílio na Trumplândia, sem perspectiva de voltar ao Brasil.
O ex-chanceler acidental também amarga um exílio involuntário, de licença (eterna?) do Itamaraty, sem perspectiva de ser um dia reintegrado ao serviço ativo da diplomacia. Pelo menos escapou da cadeia, e talvez esteja relendo as “Gesamtwerke” do seu guru adorado, ex-comunista, ex-astrólogo, ex-muçulmano e várias outras coisas mais.
A ele eu dediquei o primeiro dos meus cinco livros sobre o bolsolavismo diplomático, “Miséria da Diplomacia: a destruição da inteligência no Itamaraty”, publicado digitalmente logo em junho de 2019. Ele se vingou em seguida: me lotou nos Arquivos e me cortou (ilegalmente) pelo menos dois salários, supostamente por eu não cumprir horário de operário nas catacumbas do Bolo de Noiva.
Continuei escrevendo outros livros sobre seus dois anos de loucuras a serviço dos dois chefes aloprados, entre eles “O Itamaraty num labirinto de sombras”, “Uma certa ideia do Itamaraty” (com um projeto para uma política externa pós-bolsonarista), “O Itamaraty Sequestrado” e “Apogeu e Demolição da Política Externa”.
Eu me diverti bastante criticando o nosso “ornitorrinco diplomático”, e suponho que a cada nova postagem no meu blog Diplomatizzando ele ficasse arquitetando novas formas de me punir arbitrariamente.
Acredito que o mais bizarro chanceler em dois séculos de história de nossa (Santa) Casa deveria sinceramente agradecer à Senadora Katia Abreu sua demissão do Itamaraty, o que lhe poupou também de ser o primeiro chanceler condenado em nossa gloriosa trajetória a serviço do Estado brasileiro.
Ironias bem-vindas…
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 10/12/2025