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sábado, 16 de fevereiro de 2013

Desajustes cambiais: um incomodo inevitavel - Celso Ming

O mundo viveu, entre o final do século 19 e o início da Primeira Guerra Mundial, a ilusão de que seria possível conviver pacificamente num sistema de câmbio fixo, então simbolizado pelo padrão ouro (na verdade, a predominânca da libra esterlina no comércio internacional).
Depois da descida aos infernos do conflito, e dos desalinhamentos e controles que dele advieram, o mundo tentou voltar ao antigo padrão, sem de verdade o conseguir.
A crise de 1929, e a desvinculação da libra do padrão ouro  em 1931 (ao qual ela tinha retornado em 1925) precipitaram o mundo na era das desvalorizações competitivas (e agressivas), que foi na verdade um não sistema monetário ou financeiro, feito de controles, restrições, medidas unilaterais e redução absoluta e relativa nos fluxos comerciais, financeiros e de investimentos. Depois veio a guerra.
Em Bretton Woods, se tentou corrigir o sistema, introduzindo um padrão ouro-dólar.
O mundo viveu, de 1946 até meados dos anos 1960, a ilusão de que poderia conviver pacificamente num sistema de câmbio fixo, que na verdade poucos respeitaram, a não ser, parcialmente, os EUA. Era a predominância absoluta do dólar no comércio e nas finanças internacionais, o que ainda não terminou, a despeito de crescente importância de outras moedas, a última das quais o yuan chinês.
A partir de 1971-73, o esquema de Bretton Woods veio abaixo, sem que nada tenha sido colocado em seu lugar, a não ser esses entendimentos frágeis entre as principais potências econômicas (G7), agora secundadas pelas intermediárias do  G20 financeiro.
Ou seja, vai se continuar falando que todos precisam se comportar razoavelmente bem no plano monetário e cambial, mas na verdade, cada país tenta tirar vantagens do não-sistema, usando moderadamente as alavancas que possui nos terrenos monetário e financeiro.
Nada temos a esperar deste ou de qualquer outro encontro do G20, pois os desalinhamentos vão continuar, embora sem as políticas agressivas do passado do entre-guerras.
Ou seja, não haverá guerra cambial, apenas fricções cambiais e monetárias.
Nada dramático, apenas irritante...
Paulo Roberto de Almeida
Celso Ming
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Diálogo de surdos

16 de fevereiro de 2013 | 2h 07
Celso Ming - O Estado de S.Paulo
 
É desconcertante que as 20 maiores autoridades econômicas e financeiras do mundo, de repente, entendam que a guerra cambial seja problema grave e que, no entanto, não reconheçam que estejam envolvidas nesse e em outros conflitos.

O assunto virou tão importante que atropelou a agenda do encontro de ministros de Finanças e presidentes dos bancos centrais do Grupo dos Vinte (G-20), que começou ontem e continua hoje, em Moscou. Mas nenhum desses senhores do mundo admite que esteja manipulando o câmbio. (Esta Coluna já desenvolveu o tema há dois dias, mas tem de voltar a ele pelos aspectos novos que traz.)

Apenas para relembrar, guerra cambial foi um termo criado em 2010 pelo ministro da Fazenda do Brasil, Guido Mantega. Na ocasião, ele estava preocupado com o efeito sobre o câmbio do Brasil provocado pela ação do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos), que vinha despejando (e continua a despejar) trilhões de dólares na economia, com o objetivo de reativar a atividade produtiva e o emprego.

Essa é uma política que descarrega boa parte da conta da crise sobre os vizinhos. Os mercados de câmbio ficam atolados em moeda estrangeira e se ajustam por meio da valorização das moedas nacionais (baixa do dólar). O resultado disso é o encarecimento do produto nacional em dólares e, portanto, a perda de capacidade de exportar.

No momento, a principal preocupação dos países ricos é o jogo do Banco do Japão (BoJ, banco central) que, por meio da troca maciça da moeda nacional por moeda estrangeira, provocou a desvalorização do iene de quase 20% desde o começo de outubro - veja o gráfico.

Diante do impacto da operação do BoJ, intensificada desde novembro, na última terça-feira as autoridades de Finanças das sete maiores potências do mundo (o G-7) já haviam sentido a necessidade de assinar um comunicado que condena a manipulação do câmbio. Mas as autoridades japonesas não só declararam que essa condenação não tinha a ver com elas, mas também que era a prova eloquente de que não vinham manipulando o câmbio. Ontem, a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional, Christine Lagarde, inocentou o governo do Japão: "O que o BoJ faz é política monetária e não política cambial".

O presidente do Fed, Ben Bernanke, mantém seu discurso. Há meses vem declarando que não é operador de câmbio. O que ele chama de afrouxamento quantitativo (quantitative easing) não passa de recursos de política monetária. Limita-se à compra de títulos, logo, à emissão de dólares, para reativar a economia. Ontem ele repetiu em Moscou que essa política não prejudica outros países. Ao contrário, todos deveriam apoiá-la, afirmou Bernanke, porque deverá provocar a reativação da economia dos Estados Unidos - o que é do interesse de todos. E afirmou ainda mais: se algum país se sente prejudicado com ela - e aí vai uma paulada no ministro Mantega -, é consequência das opções de política econômica feitas por seu governo.

Há anos o governo dos Estados Unidos acusa a China de manter um câmbio artificialmente fixo e desvalorizado para favorecer suas exportações em detrimento das outras economias. Curiosamente, desta vez, não é a China que está mobilizando os dirigentes do G-7 e do G-20 contra essa guerra.

O presidente da França, François Hollande, é um dos que reclamam das consequências sobre a economia do seu país, provocadas pelas políticas cambiais dos Estados Unidos e do Japão. Mas o que ele quer não é propriamente o fim desse jogo. Deseja apenas que o Banco Central Europeu (BCE) sacuda sua inércia e também opere o câmbio para desvalorizar o euro e elevar a capacidade de exportação dos países da área.

Nesse diálogo de surdos, o G-20 pode até endurecer seu comunicado sobre o tema, que deve ser emitido hoje - como reivindicam os representantes do Brasil. Mas ninguém espere alguma mudança significativa na ação dos bancos centrais. Essa guerra tem tudo para continuar. Se não por outra razão, continua porque o fim do padrão ouro em 1971 destruiu a estabilidade entre as principais moedas e, de lá para cá, nada foi colocado em seu lugar. Aparentemente, somente a instituição de uma moeda única universal (ou um pequeno número delas) seria capaz de estabilizar o sistema monetário. Mas isso não está no horizonte de ninguém.

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Brevissima aula cambial para uso dos neofitos...

Um leitor me solicita uma opinião -- pois não poderia ser outra coisa -- a respeito desta questão:


Bom dia Paulo!
Não fosse o Real valorizado perante o Dollar, qual seria a classificação do nosso PIB?



Eis o que respondi: 



Difícil especular com valores tão cambiantes quanto taxas de crescimento, estimativas de PPP e taxas de câmbio, mas posso lhe dar uma ideia com base na experiência pregressa do Brasil.
Na valorização anterior do Real -- sabe?, aquela neoliberal dos traidores, submissos e vendidos ao FMI, como foram os reacionários dos tucanos, no Ancien Régime (coisas velhas, você sabe, entre 1995 e 1998) --, o Brasil saiu da 12 posição na economia mundial, para a oitava, ou mesmo sétima, com um PIB que na época beirava os 800 bilhões de dólares. Os companheiros, obviamente, criticavam o "populismo cambial" e recomendavam controles de capitais, desvalorização, políticas ativas nos planos industrial e comercial, enfim, essas coisas que eles sempre recomendam. Não importa se gente da classe D ou mesmo E estava comendo frango, iogurte, e que a classe C já estava indo até para Miami, isso era errado, e a sobrevalorização, como se dizia, iria "matar a nossa indústria".
Aí então veio a crise, mais deslanchada pelo Itamar Franco do que pelos especuladores de Wall Street, mas que importa, o real despencou, e nós passamos de um câmbio a 1,26 para mais de 2,3 em pouco tempo.
Não preciso dizer que nosso PIB despencou para menos de 500 bilhões de dólares, e o Brasil passou a ser a 12, 13 ou até 14a economia mundial, veja como são essas coisas.


Pois bem, como todo político gosta mesmo de valorização cambial, de populismo cambial, os companheiros atuais, mesmo cometendo todos os demais equívocos econômicos, deixaram o câmbio se valorizar como nunca antes neste país, muito mais do que era no Ancien Régime tucanês. O nouveau régime petista levou o dólar a baixarias nunca vistas antes.
Com isso, a economia chegou a esse espetacular patamar de ser a 6a ou 7a economia mundial, e a classe média volta novamente a gastar dinheiro indo duas vezes por ano a DisneyWorld.
Que maravilha, não é?
Como vai acabar isso? 
Provavelmente numa crise cambial e desvalorização forçada por esses mercados perversos, como sempre ocorre e como foi das outras vezes.
Ruim? Depende!
Os industriais não estão pedindo desvalorização? Os companheiros -- mesmo sem ter feito nada -- vão dizer que atenderam esses desejos nada secretos.
E tome protecionismo em todas as instâncias, antes, durante e depois.
Assim vai o Brasil dos ingênuos iluminados.
Paulo Roberto de Almeida 

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Cambio na OMC: wishful thinking (ou, ilusoes são as últimas que morrem...)


Desvalorização das moedas será tema da OMC
Renato Carvalho
DCI, 28/09/2011

A desvalorização artificial das moedas deve ser tema a ser tratado pela Organização Mundial do Comércio. A opinião é da professora da FGV,Vera Thorstensen, que foi assessora econômica da missão do Brasil em Genebra. "Ou a OMC assume a discussão sobre o câmbio ou perde o senso de realidade", afirmou. A manipulação de moedas, além de dar vantagem em relação aos concorrentes, anula o efeito de ações de proteção comercial.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Confusao mental: comportamento cambial erratico do governo...

Bem, falar em governo é um pouco exagerado, neste caso, pois não existe, a rigor, uma política cambial do governo (supondo-se que exista governo, claro).
Existe uma política cambial do Banco Central (com objetivos muito bem definidos, ainda que não explícitos) e existe, ao que parece, uma outra política cambial, esta sim confusa, errática e contraditória, da Fazenda, que parece barata tonta no tiroteio, para usar uma imagem conhecida.
Uma política não bate com a outra, mas a única questão relevante aqui é: a política cambial da Fazenda bate com alguma coisa? Duvido, sinceramente, pois não existe discurso coerente, e sequer existe discurso, apenas frases desconexas, confusas, contraditórias, tropeços verbais no meio da escuridão, gaguejamentos borrachos de quem deveria andar sóbrio (sobretudo numa matéria séria como essa).
Enfim, sem ser especialista, como o citado na matéria abaixo, do sempre competente jornalista do CB, Antonio Machado (nome de poeta espanhol), ouso dizer que o real vai continuar a se valorizar, e que a política cambial (se existe) vai continuar confusa e errática.
O que não se diz, em parte alguma, é o enorme custo fiscal dessa compra sôfrega de dólares, aparentemente até por esse fantasma inacreditável chamado (ao que parece) "Fundo Soberano do Brasil".
Aqui se trata de uma mistificação completa: o Brasil não possui NENHUM dos requerimentos estruturais para ter um Fundo Soberano, que são superávits orçamentários (ou seja, folga fiscal) e superávit em transações correntes. Nada, nadica de pitiribas. E como se constitui esse tal de Fundo que não é fundo? Simplesmente com recursos orçamentários -- ao ARREPIO da LEI, diga-se de passagem -- que depois são usados e abusados pelo governo sem controle parlamentar e sem estar no orçamento. Ou seja, uma fraude completa.
Bem, deixo vocês com o artigo em questão/
Paulo Roberto de Almeida

Câmbio atormentado
Antonio Machado - Brasil S/A
Correio Braziliense, 8.10.2010

Afinal, questiona o especialista em mercado cambial Sidnei Moura Nehme, o que pretende o governo: apreciar ou depreciar o real? A questão parece improcedente, pelo menos depois que o ministro Guido Mantega disse que há uma guerra cambial no mundo, tema até então evitado pelos governos em geral, e que o Brasil não ficaria impassível. O Banco Central lhe dá razão, já que há meses passa o rodo no mercado cambial, enxugando os dólares que entram no país.

Por tudo isso é que Nehme explica que “essa, talvez, seja a questão inicial que os gestores de política monetária, cambial e fiscal do país devem procurar responder e, pelo que se observa”, acrescenta, a pergunta continua sem resposta. Sua certeza sobre a incoerência das ações do governo no câmbio sai da análise dos números apurados pelo Banco Central sobre o fluxo de divisas. São dados públicos.

O problema é que poucos como Nehme, economista e sócio-diretor da corretora NGO, se aplicam a estudá-los. A maioria se satisfaz com o que dizem os manuais de economia, segundo os quais a toda oferta restrita corresponde um aumento de preço. Se o BC enxuga os fluxos líquidos de dólares, o preço em relação ao real deveria aumentar.

Mas o BC faz mais: absorve toda a oferta e mais um pouco, isto é, dólares ainda indisponíveis no país. E o que acontece? O real vem ganhando gradativamente valor sobre o dólar, contrariando a lei da oferta e da procura. É a teoria que não se aplica ao país ou haveria algo mais? A resposta está nos dados tabulados pelo BC.

A eles: do início do ano até setembro, o saldo entre os ingressos e saídas de divisas foi positivo em US$ 17,121 bilhões. No mesmo período, o BC retirou do mercado à vista, por meio de leilões, US$ 29,362 bilhões. Comprou a mais que as entradas US$ 12,241 bilhões.

De onde veio esse “excedente”? Das linhas de crédito no exterior dos bancos brasileiros. A operação é rentável, já que a diferença entre os juros internos (10,75% no overnight) e nos EUA, Europa e Japão, da ordem de zero, pende a favor do aplicador estrangeiro.

Se, além disso, o real valorizar-se entre o ato de entrega dos dólares ao BC e o arremate do crédito externo, obtém-se um retorno irrealizável, a curto prazo, em qualquer outro mercado no mundo.

A história é assim: o dólar cai em todo o mundo porque interessa aos EUA para sair da crise, sobretudo em sua queda de braço com o governo chinês, irredutível aos apelos para apreciar o renminbi. E aqui também cai por razões que nada têm a ver com as diretrizes do governo Obama, mas com as do governo Lula, como Nehme reflete.

Bicicleta dólar-real
Essa bicicleta dólar-real só se equilibra pela certeza de que o BC comprará qualquer excedente de divisas que zanzar pelo mercado. E por que o BC faz isso? Nehme, cujos textos costumavam ser lidos na Fazenda — e talvez ainda sejam — responde. “As compras do BC correspondem a um tipo sutil de interferência [no mercado cambial] habilmente mascarada pelo argumento de que a causa é o fluxo, já que poucos vão conferir os números”, diz. “O objetivo é apreciar o real para que funcione como antídoto a pressões inflacionárias.”

Álibi contra inflação
É para pensar. Repita-se: se não fica dólar dando sopa por aí, a taxa cambial, no mínimo, deveria ficar estável. Com o aumento da tributação sobre os fluxos para aplicações financeiras, parece que o câmbio pode reagir. A ver. Mas nem isso deveria ser necessário.

“Não há porque se falar em impacto do fluxo cambial na derrocada do preço do real, já que foi absolutamente neutralizado pelo BC ao adquiri-lo na totalidade”, reforça o especialista. A combinação de política monetária com política cambial, ele explica, desqualifica o sistema de câmbio flutuante e estimula os bancos a constituir as chamadas posições “vendidas” (apostas na apreciação do real).

BC e Fazenda divergem
E aí vem a Fazenda e dobra a alíquota do IOF, amplia o prazo de provisão do Tesouro para pagar dívida pública externa a vencer e prepara o Fundo Soberano do Brasil para “compras ilimitadas”, nas palavras de Mantega, que também sugeriu ao BC reintroduzir o tal “swap cambial reverso”, equivalente à compra futura de dólar.

Tudo isso é para abater o real. Mas só servirá para intensificar a força do real, como se constatou no passado. “Se não conseguimos nem definir o que queremos, como temos pretensão de nos reunir com o G-20 para debater o assunto?”, provoca Nehme. Com juros em desalinho, poupança interna no osso e mercado de derivativos sem amarras, já seria muito se o governo sanasse suas contradições.

Farol para os aflitos
A pressão de entrada dos dólares existe não só por incoerência de objetivos da política econômica. O problema é global. Agrava-se no Brasil pelo conflito entre a meta legal de inflação, nas cercanias de 4,5% de variação anual, e a sua sequela sobre o preço do dólar.

Sem o cenário de guerra cambial, prioridade na agenda de todos os governos, daria até para aguentar. O overnight a 11%, contra zero nas economias avançadas em crise, no entanto, funciona como farol para todos os que têm dólar na mão, e estão avisados pelo Federal Reserve sobre a iminência de um choque cambial, cujo nome técnico, quantitative easing, ou afrouxamento monetário, não disfarça a intenção. O país precisa proteger-se. Ou tranca transitoriamente o mercado cambial ou corta juros. Ambos juntos poderão ser um risco.