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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

sábado, 29 de abril de 2017

Prata da Casa: antecipando as miniresenhas de obras de diplomatas - Paulo Roberto de Almeida

A revista da ADB ainda vai demorar um pouco para ser publicada. Por isto, antecipo aqui as seis mini-resenhas preparadas para seu número do próximo quadrimestre.
Paulo Roberto de Almeida 



Paulo Roberto de Almeida
 [Miniresenhas; Revista da ADB, Associação dos Diplomatas Brasileiros (ano XIX, n. 95, fevereiro de 2017 a maio de 2017, p. xx-xx; ISSN: 0104-8503)]


(1) Paulo Roberto de Almeida (org.):
       O Homem que Pensou o Brasil: trajetória intelectual de Roberto Campos
       (Curitiba: Editora Appris, 2017, 373 p.; ISBN: 978-85-473-0485-0)


            Roberto Campos foi, possivelmente, um dos maiores intelectuais brasileiros da segunda metade do século XX, com a peculiaridade de que, além de ser diplomata, se tratava também de um dos grandes economistas, homens públicos e estadistas, que dedicou sua vida a tentar salvar o Brasil de si mesmo, sem no entanto conseguir êxito na empreitada. Organizado por um diplomata que leu, ou releu, toda a sua obra, desde a tese defendida na George Washington University em 1947, até seus últimos escritos, passando pelas suas indispensáveis memórias, o livro também contou com a colaboração de outro diplomata, Carlos Henrique Cardim, que discorreu sobre a participação de Roberto Campos nos encontros internacionais da UnB, que ele também organizou. Paulo Roberto de Almeida traçou sua magnífica trajetória intelectual.



(2) José Vicente Pimentel (ed.):
       Brazilian Diplomatic Thought: policymakers and agents of Foreign Policy (1750-1964)
        (Brasília: Funag, 2016, 3 vols.; ISBN: 978-85-7631-547-6);


Diversos diplomatas colaboraram na empreitada: Synesio Sampaio Goes Filho (Alexandre de Gusmão), João Alfredo dos Anjos (José Bonifácio), Luis Cláudio Villafañe G. Santos (Duarte da Ponte Ribeiro), Luis Felipe de Seixas Corrêa (Honório Hermeto Carneiro Leão), Rubens Ricupero (A política externa da Velha República e o capítulo sobre o Barão do Rio Branco), Carlos Henrique Cardim (Rui Barbosa), Kassius Diniz da Silva Pontes (Euclides da Cunha), Paulo Roberto de Almeida (introdução metodológica e um capítulo sobre Oswaldo Aranha, a partir de texto original de João Hermes Pereira de Araujo), Eugênio Vargas Garcia (Cyro de Freitas Valle), Guilherme Frazão Conduru (José Carlos Macedo Soares), Samuel Pinheiro Guimarães (Afonso Arinos de Mello Franco), Gelson Fonseca (San Tiago Dantas) e Ronaldo Mota Sardenberg (João Augusto de Araújo Castro).




(3) Ives Gandra da Silva Martins; Paulo Rabello de Castro (orgs.):
       Lanterna na proa: Roberto Campos Ano 100
       (São Luís: Resistência Cultural, 2017, 342 p.; ISBN: 978-85-66418-13-2)


Sessenta e dois colaboradores nesta outra homenagem a Roberto Campos, entre eles quatro diplomatas: Eduardo dos Santos (sobre a sua chefia, de 1974 a 1982, da embaixada em Londres), Paulo Roberto de Almeida (Bretton Woods, BNDE e receita para desenvolver um país), Rubens Barbosa (Um homem adiante de seu tempo) e Sérgio Eduardo Moreira Lima (“Bob Fields”: o estigma, o diplomata e os valores nacionais). Cada um deles desenvolve diferentes aspectos da vida, da obra e das atividades econômicas ou diplomáticas de Roberto Campos, sempre enfatizando seus ideais de liberdade, de economia de mercado, de reformas estruturais para arrancar o Brasil de uma situação de pobreza evitável para colocá-lo numa condição de prosperidade possível.




(4) Sérgio Eduardo Moreira Lima (org.)
       Visões da obra de Hélio Jaguaribe
       (Brasília: Funag, 2015, 135 p.; ISBN: 978-85-7631-539-1)

Em homenagem feita pelos 90 anos do grande pensador do nacionalismo brasileiro, Samuel Pinheiro Guimarães analisou sua contribuição para a diplomacia, enfatizando a “notável atualidade nas ideias que [HJ] defendeu para a política externa”. Para “demonstrar” tal atualidade, destacou trechos do livro O Nacionalismo na Atualidade Brasileira, de 1958, indicando as similaridades com as políticas e posturas defendidas de 2003 a 2016 pela diplomacia brasileira, da qual ele foi um dos principais ideólogos. As mesmas oposições à época destacadas por HJ, entre o capital estrangeiro e o nacional, a autonomia ou a submissão ao império, a união da América Latina para “neutralizar o poder de retaliação dos Estados Unidos” (p. 89), seriam plenamente atuais (pelo menos para esse ideólogo). Como se queria demonstrar...



(5) Henrique Carlos Ribeiro Lisboa:
       A China e os chins: recordações de viagem
       (Rio de Janeiro: Fundação Alexandre de Gusmão/CHDD, 2016, 334 p.; ISBN: 978-85-7631-593-3)


Em 2012, os Cadernos do CHDD já tinham publicado os relatos dos diplomatas brasileiros que foram à China na famosa missão do governo imperial de 1880, que tinha por objetivo firmar um Tratado de Amizade, Comércio e Navegação com o Império do Meio. Um dos integrantes dessa missão foi Henrique Lisboa, que produziu, em 1888 (com a primeira publicação em Montevidéu), este relato visando informar sobre o que era a China, mas também com a intenção, segundo ele, de “concorrer (...) para a resolução do árduo problema que, há alguns anos, conserva em crise a sociedade brasileira: ‘a transformação do trabalho’.” Ou seja, buscava-se substituir os escravos africanos por trabalhadores chineses, num processo de “imigração livre”, o que não era todavia aceito pelos mandarins das relações exteriores da China. Oportunidade perdida!



(6) Sergio de Queiroz Duarte:
       Desarmamento e temas correlatos
       (Brasília: Funag, 2014, 244 p.; ISBN: 978-85-7631-507-0; Coleção Em Poucas Palavras)


A coleção costuma ter 120 páginas: o tema tratado por Sérgio Duarte exigiu, porém, o dobro da extensão. Ele descreve todo o complexo compreendido no vasto universo das armas de destruição em massa, desde os primeiros esforços de desarmamento, como o programa dos “Átomos para a Paz”, os tratados pertinentes às diversas categorias de armas (químicas, bacteriológicas e biológicas, nucleares), bem como as zonas livres destas últimas, ademais dos vetores (mísseis e foguetes), dos regimes de controle e dos organismos vinculados a esse interminável, e talvez insuperável, esforço. Isso dentro das 120 páginas tradicionais da coleção: as restantes são ocupadas pela listagem dos principais acordos no campo do desarmamento e pela transcrição dos relevantes (Tlatelolco, TNP e Proibição completa de testes nucleares).



[Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 26-27 de abril de 2017; 3107.]

Até o próximo número, com possivelmente mais seis mini-resenhas. Aguardem o livro que vai consolidar o conjunto de mini-resenhas.

RBPI: artigo e entrevista no YouTube - Paulo Roberto de Almeida

Transcrevo novamente o artigo que escrevi a propósito do itinerário da RBPI, desta vez acompanhado do link para a entrevista que concedi a seu editor, Antonio Carlos Lessa, sobre essa trajetória intelectual, indicado in fine.
Paulo Roberto de Almeida 



RBPI: itinerário de uma revista essencial

Paulo Roberto de Almeida
 [Artigo sobre a RBPI; semana RBPI no Scielo] 

Poucas revistas acadêmicas de prestígio reconhecido conseguem, no Brasil, superar o efêmero, ou o conjuntural de uma geração, para projetar-se de forma constante no cenário intelectual do país. A Revista Brasileira de Política Internacional, que já adentrou, na cronologia humana, na temporalidade de três gerações, firmou-se e vem consolidando uma história de longevidade raras vezes registradas no mercado editorial dedicado a esse setor especializado das humanidades, o das relações internacionais. Neste campo, ela é, não apenas a mais longeva, mas a melhor, a mais completa e a mais prestigiosa das revistas que cobrem essa área ainda relativamente rarefeita no Brasil.
Seu itinerário não foi, contudo, uniforme, ou tranquilo, até que ela conseguisse alcançar, na última década, um padrão de qualidade que a coloca entre os melhores e mais qualificados periódicos científicos nesse universo especializado de publicações. Ela nasceu dentro da pequena comunidade que, no Rio de Janeiro de meados dos anos 1950, se dedicava aos temas das relações internacionais e da política externa do Brasil, o que compreendia tribunos de Estado, intelectuais de renome, servidores públicos, entre eles vários diplomatas, políticos cosmopolitas e magistrados interessados nas grandes questões da política, do direito e da economia mundiais.
Em 1958, quando ela foi criada por iniciativa de alguns “empreendedores de relações internacionais”, o universo editorial dedicado ao ambiente externo e à política externa do Brasil não contemplava praticamente nenhuma revista especializada, salvo publicações gerais exibindo eventualmente artigos dentro dessa área: era o caso, por exemplo, da revista da mais antiga instituição acadêmica do Brasil, o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (fundado em 1838), das revistas militares e de algumas poucas outras – como a Brasiliense, ou os Cadernos do Nosso Tempo, que desapareceriam mais adiante – que traziam bem mais artigos de opinião do que pesquisas dotadas de sério embasamento empírico ou conceitual. Os próprios relatórios do Ministério das Relações Exteriores há muito tinham deixado de exibir a mesma qualidade dos relatórios da antiga Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros, do Império, ou os da velha República, e praticamente desapareceram no seu formato tradicional no decorrer da década seguinte.
A RBPI constituiu, assim, o mais importante empreendimento intelectual do seu campo, não ainda, naquela época, dotado dos padrões existentes em revistas similares da Europa ou dos Estados Unidos, mas já engajada na confecção de artigos originais, no estímulo à produção intelectual dos próprios diplomatas, na coleta e publicação de importantes textos oficiais da diplomacia brasileira, bem como de simples resenhas de livros da área ou de notas de conjuntura sobre atividades relevantes da diplomacia oficial. Sem se identificar, ou se confundir, com o Itamaraty, a RBPI representava, nesse sentido, um importante elo de ligação entre o corpo profissional do MRE e a comunidade brasileira e estrangeira voltada para o estudo e debate de temas relativos à política externa. Esse vínculo não afetava em nada sua total autonomia editorial, inclusive quanto à escolha dos temas que seriam abordados a cada número (trimestral).
Os anos da “Política Externa Independente” representaram uma precoce fase de sucesso enquanto empreendimento editorial de política internacional e de diplomacia do Brasil, um prestígio e um vínculo preferencial entre os dois “estabelecimentos” que a crise política do início dos anos 1960 e o golpe militar de 1964 viriam abalar e em parte comprometer durante vários anos. Ocorreu certa retração dos diplomatas participando na e da revista, pois estes passaram a considerar com maior cuidado político a elaboração de artigos de opinião para a RBPI, identificada com aquela fase pioneira de busca da plena autonomia na formulação e implementação da política externa, num período em que os critérios de segurança primavam conjunturalmente sobre os de desenvolvimento e participação no ambiente efervescente dos anos 1960. A RBPI teve a companhia temporária (por apenas três números, entre 1965 e 1966) de um outro empreendimento, a revista Política Externa Independente, que, por acaso, também foi dirigida por um dos nomes mais prestigiosos da intelectualidade brasileira, o historiador José Honório Rodrigues, que durante vários anos nessa década, também foi o diretor do Instituto Brasileiro de Relações Internacionais (IBRI), ao mesmo tempo em que se exercia como editor, aliás excelente, da RBPI.
O outro grande nome dessa fase pioneira, mas que se devotou inteiramente à revista durante suas primeiras três décadas no Rio de Janeiro, foi obviamente Cleantho de Paiva Leite, membro da assessoria especial do governo constitucional de Getúlio Vargas (1951-54), fundador e executivo do IBRI, um dos primeiros representantes do Brasil no BID e animador intelectual e generoso financiador da RBPI durante a sua fase de relativo declínio dos anos 1970 aos 80. Seu falecimento, em 1992, quase constituiu, também, uma ameaça de morte para a revista, finalmente salva ao ser transferida para Brasília, no ano seguinte, por um pequeno grupo de acadêmicos e diplomatas, que se empenhou em resgatar toda a sua memória pregressa – atualmente disponível em formato digital – e em implementar um programa de elevação dos seus padrões editoriais, até que ela alcançasse, já na segunda década do novo milênio, um status e uma qualidade comparáveis aos das melhores revistas internacionais conhecidas. Dois nomes estão associados a essa fase brasiliense da RBPI: o professor titular de história das relações internacionais da UnB, hoje aposentado, Amado Luiz Cervo, primeiro editor, por dez anos, nessa segunda fase, e, em especial, o professor Antonio Carlos Lessa, responsável pelo processo de verdadeira internacionalização da revista, que agora pode estar vivendo sua terceira e melhor fase.
Exibindo atualmente indicadores de excelência editorial no plano internacional, a RBPI promete consolidar-se cada vez mais como a revista por excelência nessa área no Brasil, com uma interface externa, na região e fora dela, cada vez mais intensa e frutífera. Seu corpo editorial testemunha a amplitude dessa internacionalização e a escolha criteriosa dos artigos científicos que serão publicados, agora em fluxo contínuo, reforçam essas características dos últimos anos e do futuro previsível. Como antigo colaborador em sua primeira fase, como um dos responsáveis pela seu renascimento em Brasília, e como parte intelectualmente interessada no seu fortalecimento internacional, nesta nova fase, sinto orgulho de ter ajudado a RBPI a consolidar-se como uma revista essencial ao estudo das relações internacionais nas últimas seis décadas, e mais além, haja visto, também, seu forte conteúdo histórico e, anteriormente, documental. Quem quer que empreenda pesquisas sobre as relações internacionais e sobre a política externa brasileira desde a segunda metade do século XX até os nossos dias tem, na RBPI, um instrumento incontornável de referência e uma fonte indispensável para a leitura de ensaios de qualidade sobre esse universo cada vez mais relevante nas humanidades do Brasil. Ela é a mais antiga, a mais completa, a melhor revista do gênero no país.
Longa vida à RBPI ao início do seu sexagésimo ano de publicação continuada.

1254. “RBPI: itinerário de uma revista essencial”, Brasília, 22 abril 2017, 3 p. Texto de comemoração dos 60 anos da RBPI, para divulgação nos canais existentes. Mundorama (25/04/2017; link: <http://www.mundorama.net/?p=23514>). Relação de Originais n. 3104.

1256. “A RBPI e o pensamento brasileiro de Relações Internacionais: entrevista com Paulo Roberto de Almeida, por Antonio Carlos Lessa, Mundorama – Revista de Divulgação Científica em Relações Internacionais, originalmente publicado no Blog Scielo em Perspectiva – Humanas, em 25/04/2017 [Acessado em 29/04/2017]. Disponível em <http://www.mundorama.net/?p=23555> e <http://wp.me/p71o3r-67V>. Disponível no canal YouTube (links: https://youtu.be/LurXasySFFU e https://www.youtube.com/watch?v=LurXasySFFU&feature=youtu.be). Relação de Originais n. 3104.